Capítulo 09 - Não Há Para Onde Fugir
Você é uma arma carregada
Oh oh oh
Não há para onde correr
Ninguém pode me salvar
O dano está feito
Bon jovi
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Eu fechei os olhos, encostando a testa no vidro do box enquanto Dess me ensaboava, massageando meu corpo e me livrando de toda a tensão daquele dia. Eu ainda não conseguia entender se Destiny era um anjo que foi enviado para me salvar, ou quem sabe, um demônio enviado para me tentar. De qualquer forma eu desisti de lutar e me entreguei a ela, me sentindo intrigado para descobrir onde aquilo me levaria.
— Você está tão tenso — Destiny comentou com a voz calma — pensei que tivesse te ajudado.
— Você ajudou — eu garanti com os olhos fechados, sentindo a água morna escorrer por meu corpo.
— Isso é apenas o começo, Ethan — Ele se esticou para sussurrar em meu ouvido — em breve você não será capaz de encontrar aquele cara fechado e viciado em trabalho que você deixou no hotel.
— Eu não mudei, Dess — respirei fundo quando ela fechou o chuveiro.
— Ainda não, mas mudará — ela piscou, abrindo a porta do box, me entregando uma toalha antes de se enrolar em outra e ir para o quarto.
Eu me sequei no banheiro, enrolando a toalha na cintura antes de segui-la. Dess terminava de vestir uma saia rodada curta e uma regata, eu fui até minha mala, buscando algo aceitável ali.
— Você tem alguma roupa normal, Mio Caro? — Dess questionou com diversão.
— Talvez — eu murmurei, sabendo que tinha apenas a roupa que comprei para sair com ela na quinta.
Ela se esticou e depositou um beijo em meu rosto, acariciando meu braço no processo.
— Não se preocupe, nós resolvemos isso amanhã.
— Nós faremos compras? — eu ergui uma sobrancelha.
— Eu vou escolher o melhor para você, Mio Caro — ela garantiu, se afastando quando meu celular começou a tocar, passando a escolher uma roupa para mim em minha mala.
— Você quer que eu saia? — ela perguntou despreocupada.
— Não precisa — neguei, procurando o celular no bolso do paletó em cima da cama.
Eu enfim encontrei o aparelho, observando a tela por alguns instantes, ponderando se deveria ou não atender a chamada. Talvez eu devesse ter aceitado a oferta de Dess e ter um pouco de privacidade.
— Ela é bonita — a voz dela me tirou de meu devaneio — quem é?
— Minha namorada — decidi provocá-la.
— Mentiroso — ela sequer piscou antes de sorrir.
— É minha irmã — contei, decidindo atender a chamada.
Eu não queria explicar a ela o motivo de não falar com minha irmã.
— Entendo — Destiny voltou a tirar minha roupa de dentro da mala.
— Valerie — eu atendi.
— Onde você está? Porque sempre que eu tento falar com você dá caixa de mensagens? — Ela reclamou.
— Aconteceu alguma coisa? — Eu questionei, me sentindo um pouco preocupado.
Ela não costuma me ligar a toa.
— Ethan, quando você vai aparecer? — ela perguntou em um tom cansado.
— Eu vou tentar aparecer no próximo mês — eu murmurei — ela está bem?
— Está, mas eu não estou! eu estou exausta — ela reclamou — minhas férias começaram agora, você não pode ficar alguns dias aqui?
— Valerie, é impossível — eu neguei mais uma vez.
Fugir daquelas visitas é o que eu mais tenho feito no último ano. Eu sei que estou sendo injusto com minha irmã, mas não podia mais lidar com aquela situação. Então fugi!
— Eu vou colocar suas roupas no armário — Dess informou, abrindo até uma das portas.
— Quem é que está com você? — minha irmã quis saber — você arrumou uma namorada?
— Mais ou menos, olha eu não posso falar agora.
— Você pode pelo menos vir aqui no fim de semana? — ela suspirou.
— Eu não estou em Boston.
— Onde você está?
Eu pensei por um segundo antes de responder. Merda, aquilo era a última coisa que eu precisava.
— Hawaii.
— Hawaii!? — ela gritou — isso é perfeito! Eu estou presa aqui, e você curtindo a vida no Hawaii rodeado de mulheres?
— Eu não vou discutir isso com você agora — eu decidi encerrar aquela conversa — não é o que você está pensando.
— Eu estou pensando muitas coisas sobre você agora — ela murmurou — adeus Ethan, você pode telefonar se lembrar da existência da sua família.
Eu desliguei o telefone, tentando controlar minha frustração. Porque ela precisa dificultar tanto as coisas?
— Conversa difícil? — Dess disse despreocupada, me estendendo o moletom que usava como pijama.
— Nada demais, ela apenas queria saber se eu as visitaria — eu desconversei, alcançando uma cueca antes de me livrar da toalha, sob olhar atento de Dess — eu prefiro não falar disso.
— Tudo bem, uma coisa de cada vez — ela deu de ombros — eu te espero lá embaixo, ok?
— Obrigado — eu me senti aliviado por ela não insistir no assunto e arrancar aquilo de mim, como tem feito com tudo.
Eu terminei de me vestir, estendendo a toalha no banheiro antes de sair. Eu desci as escadas um pouco deslocado. Por mais que ela me afirmasse que eu deveria me sentir em casa ali, na prática era mais difícil.
— Só estou falando que eu prefiro não te ouvir transando — uma voz masculina soou clara vindo da cozinha.
— Não é grande coisa, Nicholas — Dess retrucou — tenho certeza que amanhã nós vamos ouvir você e a Mandy transarem!
Eu cheguei até a cozinha, observando a interação entre os dois. Nicholas parecia estava fazendo algumas panquecas enquanto Dess cortava tiras de Bacon.
— Você espera ouvir alguma coisa? A Mandy é quieta como um rato! — Nicholas revirou os olhos — pega aquele prato pra mim.
— Talvez eu deva dar algumas dicas pra ela — Dess gargalhou enquanto eu franzia o cenho diante daquela interação.
O que esses dois representam um para o outro exatamente?
— Hey, você desceu — Dess sorriu ao me notar ali.
— E agora, tem um cara sem camisa na nossa cozinha — Nicholas revirou os olhos — Bem vindo, Roberts.
— Nossa? A cozinha é minha, você está mais para uma assombração que se apossou da minha casa.
— Vocês precisam de ajuda? — eu tentei me sentir um pouco menos deslocado, ignorando o fato de estar mesmo sem camisa.
— Se você puder levar a esquisitinha para longe de mim — Nicholas pediu — acho que essa vai ser uma grande vantagem em te ter aqui!
— Nós estamos fazendo um Brinner, Mio Caro — Dess abandonou o bacon sobre a bancada antes de vir em minha direção — Já tentou algo assim?
— Nós? Eu estou fazendo tudo sozinho! — Nicholas reclamou.
— Um brinner? Vocês fazem sempre isso?
Parece que vamos comer panquecas e bacon no jantar. Qual o problema desses dois?
— Essa é a graça de viver com a gente, Ethan. Não há regras — ela envolveu meu pescoço com ambos os braços antes de se esticar para me beijar — podemos comer frango frito de madrugada, pizza no café da manhã e panquecas no jantar.
Eu a envolvi em um meio abraço beijando o topo de sua cabeça enquanto pensava no absurdo que era aquele estilo de vida.
— Isso quer dizer que vocês precisam de um adulto presente? — eu a provoquei.
Ela me lançou um olhar atravessado enquanto Nicholas gargalhava no fogão, colocando as tiras de Bacon no forno.
— Não se preocupe Roberts, Mandy chegará amanhã — ele respondeu — Ela colocará todos na linha, inclusive você.
— Eu?
— Você acha que o fato de você ter aceitado a ideia louca dessa aí vai passar despercebido? — ele continuou — se prepare para o maior sermão da sua vida!
— Vocês costumam levar sermão dela? — Eu encarei os dois.
— Dess é expert nisso, os sermões que ela consegue são sempre os mais longos — o rapaz insistiu.
— Podemos mudar de assunto? — a garota murmurou desconfortável, me deixando um pouco curioso.
Nicholas pegou alguns ovos na geladeira logo após virar as panquecas. Então teremos panquecas, bacon e ovos.
— Ela sempre consegue sermões então? — eu a provoquei.
— Ethan, qual é... Deixa isso pra lá — ela murmurou
— Ela é a rainha deles — Nicholas gargalhou.
— Vamos sair daqui, Ethan — Ela murmurou, me arrastando para a varanda.
Nós passamos um tempo deitados juntos na rede, conversando sobre amenidades enquanto Nicholas terminava de cozinhar.
— O que você está achando do Hawaii, Ethan? — Dess questionou aninhada em meu peito.
— Quer mesmo saber? — eu questionei a abraçando.
Como eu terminei assim? Vim para o Hawaii a trabalho, e agora estou abraçado com uma mulher incrível e gostosa, que quer acabar de vez com minha sanidade.
— Claro que sim — ela ergueu o corpo para olhar em meus olhos.
— Não é tão fim do mundo quanto eu imaginava — eu garanti, recebendo um sorriso espontâneo em troca.
— Você está falando sério?
— Não é o que você estava tentando fazer? — Ergui uma sobrancelha — me convencer que aqui não é o fim do mundo?
— Sim, mas eu não esperava que fosse acontecer assim tão rápido — ela voltou a deitar a cabeça em meu peito — como você está se sentindo com tudo o que aconteceu?
— Acho que ainda não consegui assimilar de verdade — eu admiti — é estranho pensar em tudo o que perdi e em como eu terminei aqui.
— Ao lado de uma pessoa louca?
— Duas, na verdade — eu sorri — seu amigo não é muito normal.
— Isso não foi gentil comigo — ela voltou a erguer o rosto — mas eu te perdoo por causa do sorriso.
Nós ficamos em silêncio até que o Bryce nos avisou que estava tudo pronto. Dess se levantou, correndo até a cozinha. Eu estava pronto para segui-la até a mesa de jantar quando eles retornaram, colocando tudo em cima de uma mesa na varanda. Claro, porque podemos ser pessoas normais e comer dentro de casa se podemos comer do lado de fora?
— Mandy embarcaria que horas? — Dess perguntou ao amigo.
— Ela já deve ter saído de Hartford — ele explicou checando o horário em seu celular — ela vai fazer uma conexão em Denver, chegará a Lihue amanhã de manhã.
— Denver? eu fiz a conexão em L.A — eu comentei despreocupado — na verdade eu fiz uma infinidade de conexões, demorei quase vinte e quatro horas pra chegar.
— Sério? — Dess gargalhou — por isso estava tão mal humorado.
— Esses voos são uma porcaria — Nicholas revirou os olhos — se você não souber como escolher, fica preso em conexões eternas..
— Eu fiz praticamente o mesmo trajeto na metade do tempo, Mio Caro — Dess zombou.
— Pobre coitado, passar tanto tempo preso em um avião com ela — Nicholas suspirou.
— Calado, Bryce.
— Quando viemos para a ilha, eu considerei seriamente jogá-la do avião — Nicholas me confidenciou — Ela não parava de falar um segundo sobre como estava animada, e o que faríamos quando chegássemos.
— Vocês dois se conhecem há muito tempo? — eu questionei.
— Nós nos conhecemos na faculdade — Dess explicou — Ele se apaixonou pela minha amiga logo nos primeiros dias, e passou a nos perseguir feito um maluco psicótico. Eu tentei convencê-la a chamar a polícia, mas parece que ela gostou dele.
— Ela não me considerava um maluco psicótico — ele murmurou.
— Não, mas você tem cara de ser um...
Eu avaliei os dois em busca de algum sinal de que algo romântico estava acontecendo entre eles, mas não... Era algo diferente ali.
— E então vocês decidiram morar juntos? — eu tentei entender.
— Não exatamente, eu decidi largar a faculdade e me mudar para o Hawaii, Nicholas não suportou me ver fazendo algo estúpido sem ele — Dess provocou.
— Você tem razão Destiny, você sempre está envolvida quando eu faço algo estúpido — Ele revirou os olhos.
— Enfim, nós viemos para o Hawaii, e cada um morava em uma casa, mas durante minha última visita à minha mãe, o idiota se mudou para cá — Ela suspirou.
eu voltei a observar os dois antes de dar de ombros. Eu não vou conseguir entender a relação dos dois em tão pouco tempo. O telefone do rapaz acabou nos interrompendo, ele avisou que era a namorada antes de sair para atender, nos deixando para trás com a comida.
— Você já comeu o café da manhã na hora do jantar, Mio Caro? — Dess colocou uma fatia de bacon na minha boca.
— Não, foi a primeira vez — eu admiti, gostando um pouco daquela atenção especial que estava recebendo.
— O que mais você nunca fez? — ela colocou o dedo engordurado na boca.
— Coisas que você já tenha feito? — eu gargalhei.
— Todo tipo de coisa, Ethan — ela retirou o dedo da boca antes de sorrir.
Porque cada gesto dessa mulher parece ser calculado para me tentar?
— Eu não sei, mas tenho certeza que vou descobrir — eu me inclinei em sua direção, enredando meus dedos em seu cabelo, puxando seu rosto em direção ao meu, mordendo de leve seu lábio inferior antes de aprofundar o beijo.
Dess não hesitou em me corresponder, subindo suas mãos pelo meu peitoral nu, esquecendo de vez da comida sobre a mesa.
— Ok, se vocês não transarem em cima da comida, eu agradeço — A voz de Nicholas nos obrigou a nos separar, fazendo com que eu me sentisse um pouco desconfortável com sua presença.
Eu nunca fui de dividir meu espaço com ninguém, nunca morei com uma namorada, preferi pagar aluguel de um apartamento a dividir o quarto com alguém na faculdade, e de repente eu estou vivendo com duas pessoas, e amanhã uma terceira se juntará a nós. Parece que voltei a viver com minha mãe e minhas duas irmãs.
— Nós já conversamos sobre isso, Nicholas — Dess o provocou se afastando — não me culpe por sua falta de sexo.
— Eu já disse o que eu acho desse assunto, não é Destie? — ele gargalhou — será que eu devo perguntar ao Roberts?
— Calado, eu já disse que isso não é do seu interesse — Dess ameaçou.
— Me perguntar o que? — eu observei os dois em dúvida.
— Roberts, você por acaso tem um...
Ele não concluiu a pergunta ao ser atingido no rosto por uma panqueca.
— Eu mandei você ficar quieto — ela rosnou.
— Eu tenho o que? — eu encarei os dois, me sentindo um pouco perdido.
— Que vir comigo fazer qualquer outra coisa — Dess se levantou, me arrastando em seguida.
No fim, nós dois arrumamos minhas roupas no armário, enquanto fazíamos planos para o dia seguinte. Dess me contou alguns detalhes do que ela imaginava para os próximos dias, as cachoeiras que pretendia me levar, as praias, o Waymea Canyon e outros pontos turísticos.
Ela parecia ter um roteiro completo preparado para minha estadia.
Eu demorei um pouco para conseguir dormir, mesmo que Dess tenha adormecido quase que imediatamente. Eu a observei deitada de bruços com o lençol cobrindo parte de seu corpo nu iluminado apenas pela luz do luar que entrava pela janela.
Acariciei sua pele sedosa voltando a pensar em nossa situação. O que eu estou fazendo da minha vida? Eu perdi o juízo de vez?
Enquanto sentia a textura de sua pele, pensei na ligação de minha irmã. Como elas devem estar? Na última vez que as visitei não foi nada fácil. Talvez eu deva ligar para minha mãe amanhã, para garantir que ela está mesmo bem.
Com esse pensamento, descansei minha cabeça no travesseiro, escondendo meu rosto nos cabelos de Dess antes de permitir que o sono me levasse.
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