☆《 LEADERSHIP AND RUIN 》☆
☆《 Shane Walsh 》☆
O cheiro ainda tava grudado no meu nariz. Fumaça, sujeira, cinzas, suor. Era como se a cidade inteira tivesse sido transformada num imenso cigarro barato e queimada até o filtro. Atlanta… a grande Atlanta… era inacreditável o que ficou visível aos nossos olhos pela manhã. A cidade toda estava em pedaços, os prédios, casas, lojas, se reduziram a ruínas e escombros. Poucos eram os prédios e estruturas que escaparam. Vi aquelas bombas caírem como se fossem meteoros, e por um segundo juro que esperei ouvir o barulho das sirenes, e os gritos dos meus companheiros pedindo para que liberassem a via para sua passagem.
Mas não veio nada.
Só o som das explosões, uma atrás da outra… e depois o silêncio, o fogo queimando alto e distante. Não tem mais futuro, pensei. Não tem mais amanhã, é isso. Aquele foi o som do fim.
Eu devia estar ajudando alguém, mas fiquei ali parado, com os pés fincados no chão, como uma árvore com raiz grossa e funda. Uma pedra pesada bem no centro do peito esmagando tudo, maior que qualquer escombro daquela cidade, Só o que conseguia fazer era olhar o horizonte e tentar não pensar que esse era o jeito de Deus nos lembrar que a gente foi longe demais. Se é que ainda tinha um Deus aí pra assistir isso. Foi o enterro de qualquer esperança que eu ainda tinha, de que alguém, em algum canto desse mundo estivesse tomando conta de tudo, tentando manter as coisas sob controle, organizando algo pra acabar de vez com essa merda. Mas a verdade era que se tivesse realmente alguem, tinham metido o foda-se grandão pra humanidade.
E sabe qual era a pior parte? Não foi só a cidade que morreu ali, mas a ideia de futuro que morreu junto.
E tinha Anya…
Que tipo de jogo perigoso a gente tava jogando? Até que ponto ela tava disposta a ir com aquelas cartas que colocava na mesa? Eu não sei! Pra falar a verdade eu não sabia mais de porra nenhuma. Minha vida tinha dado um giro tão foda de 360 graus nas ultimas 24h, que pra piorar tudo tinha sido em alta velocidade e eu estava sem a porra do sinto de segurança. Eu me sentia sem rumo… sem destino, e eu detestava me sentir assim, pisando em ovos. Eu gostava de ter certeza das coisas, saber o que esperar. E aquilo tudo era o combo perfeito pra me levar ao meu limite. E olha que nem precisava de muito pra isso.
Nós estávamos parados no meio da rodovia. Antes, aquele lugar era um mar de buzinas, conversas impacientes e o calor da espera por uma passagem liberada. Agora? Silêncio. Lamúrias. Olhares perdidos. Ninguém sabia o que fazer. Nem eu.
Pra que lado íamos? Aqueles doentes podiam aparecer a qualquer instante, e voltar pra cidade? Isso era suicídio.
Eu precisava decidir.
Pensa, Shane.
Só pensa.
Você prometeu.
Prometeu pra ele que manteria a família dele segura. Agora respira. Concentra. Resolve.
Mas a verdade é que, se ele estivesse aqui… Rick Grimes teria uma ideia. Ele sempre tinha. Rick era o cara dos planos. Eu só fazia funcionar. Era assim que éramos uma dupla. Ele bolava; eu botava em prática. Simples.
Então Dale sugeriu a pedreira. Um lugar afastado, com um lago cristalino. Água pra beber, cozinhar, tomar banho. Peixes pra comer, árvores frutíferas. E se juntássemos os suprimentos de todo mundo, dava pra racionar a comida por um tempo. Mas o que realmente me convenceu foi o fato de ser alto. Um morro, uma montanha pequena, tanto faz. O importante era que a visão dali era boa. Qualquer coisa — ou pessoa — que se aproximasse, veríamos a tempo. Isso bastava pra decidir.
Quando chegamos, senti um alívio. Não porque era seguro ou perfeito, mas porque era longe. Longe o suficiente daquele caos que vimos de camarote na noite anterior. Talvez os outros pudessem fingir que aquilo tudo era só um pesadelo. Talvez. Eles sorriam, planejavam onde montar as barracas, onde estacionar os carros. Eu não. Minha cabeça me puxava de volta pro inferno o tempo todo.
O hospital. Rick.
Aquela coisa horrorosa na casa da Anya.
E Atlanta. Sempre Atlanta.
Enquanto todos se espalhavam, tentando organizar o que sobrou das nossas vidas, eu fiquei ali parado, escorado no meu jipe, encarando o caos "organizado" que o pessoal tentava desenvolver. Eu não gostava de bagunça. Sempre fui um lobo solitário, e falação e gritaria só serviam para me dar nos nervos. Mas, pelos próximos dias, teria que aguentar — ou enlouquecer de vez.
Dale, claro, já tinha aberto as portas do trailer como um santuário. O velho era carismático, todo mundo parecia gostar dele, assim como de T-Dog e Glenn, que, transitando com sorrisos e piadas, não pareciam nem um pouco afetados pela merda que tinha estourado bem na nossa cara. Dale tentou dar ordens como um líder, mas ele não tinha a voz que uma liderança precisava.
Merle e Daryl — que estavam ali contra a minha vontade — ficaram afastados, como esperado. Merle Dixon tinha cara de estuprador, e, pra foder comigo, Anya tinha simpatizado com o cara. Preciso ficar de olho nela.
Andrea e Amy se atrapalhavam com a barraca. Percebi a loira mais velha me olhando, sempre com aquele sorriso e um pedido de ajuda silencioso. Promessas não ditas. Talvez Andrea servisse pra uma noite de sexo... Nunca se sabe. Mas o fato é que eu gosto de morenas. Nenhuma loira me deixa louco como uma morena.
E a família Peletier… O que eu iria fazer com Ed? O cara era um cuzão, isso eu percebi assim que botei meus olhos nele. Minha delegacia não era especializada na conduta para mulheres que sofriam agressões dos seus parceiros, mas eu já tinha atendido muitas ocorrências do tipo, já havia lhe dado com muitas mulheres como Carol. Como um bom policial, tudo que eu poderia fazer era conduzir o indivíduo até a carceragem. Mas como um homem de verdade e que não aceitava aquele tipo de conduta, minha vontade era meter uma bala bem no meio da cara, pro maldito nunca mais bater na esposa, e em nenhuma outra mulher. Nunca tinha matado ninguém propositadamente em toda minha vida, mas ali, parado no meio daquelas pessoas, cheguei a conclusão que talvez iniciasse aquele círculo de mortes propositais com Edmundo Peletier.
E tinha as demais pessoas, que seguiam batendo com as estacas no chão, tentando fixar os pés das suas barracas, aquele som repetitivo ecoando dentro do meu cérebro misturado ao falatório sem sentido já estava me deixando com dor de cabeça.
Eles seguiram ali, exatamente daquele jeito, cada um vivendo sua vida, ou o que sobrou dela, mas ninguém tinha coragem de dizer a verdade: Aquilo tudo era só um band aid sobre um corte gigantesco que precisava de cirurgia e não de curativos.
Foi deslizando meus olhos entre aquelas pessoas, que esbarrei minha atenção nela, Anya. Ela tava do outro lado do acampamento, agachada ao lado de Amélia e outra moça mais ou menos da idade delas, conversavam e riam enquanto Anya procurava por algo dentro da sua mochila. Lori e dona Suzi insistiram para que ela montasse sua barraca perto da nossa, mas Anya não aceitou, ela bateu o pé, criou desentendimento e foi lá pro outro lado. A cada segundo que passava eu entendia que tinha algo suspenso entre ela e a irmã mais velha, e acho que em breve iria descobrir o que era.
O cabelo de Anya tava preso num coque bagunçado, o que deixava o pescoço esguio e as tatuagens amostra, porra… porque tinha de ser tão bonita assim? As mãos dela pareciam rápidas e firmes, como se soubesse exatamente o que tava fazendo. E eu? Bom, eu só fiquei ali, encarando ela como o idiota que eu era. Admirando suas curvas e pensando em coisas que não devia.
Era errado, eu sei. Mas droga, não tinha como evitar. Anya era diferente. Não só porque ela era linda, mas porque ela parecia... sólida. Mesmo agora, no meio de tudo isso, tinha alguma coisa nela que gritava: Eu vou sobreviver. Isso me deixava louco. De preocupação e de vontade, tudo junto, o que era um péssimo combo pra minha cabeça. Eu tentei me controlar, mas, porra, é difícil quando ela parece que tá desenhada pra me deixar louco.
Acho que foi aí que ela olhou pra mim. Só por um segundo, mas foi o suficiente pra fazer meu estômago revirar. Ela sorriu de leve, um daqueles sorrisos que parecem dizer: "Eu tô te vendo, Shane Walsh." Eu tentei sorrir de volta, mas acho que só consegui parecer um cachorro tentando esconder que fez merda.
Foi então que Lori parou ao meu lado, ela segurava umas sacolas, devia ser algumas coisas de Carl. Não percebi ela ali parada me encarando, só quando ela começou a falar que me dei conta, tava tão concentrado em Anya que todo o resto se silenciou.
O que era ótimo pra minha cabeça, precisava prestar mais atenção nela, dessa forma, a bagunça dentro de mim se tornaria zero.
— Tá olhando o que, Shane? — A voz de Lori me trouxe de volta à realidade caótica.
Dei de ombros e resmunguei.
— Só vendo o que todo mundo tá fazendo, tentando garantir que ninguém se mate enquanto monta uma barraca, só isso.
— Hum, sei… poderia me ajudar a descarregar as coisas do Carl e da minha mãe?
Puxei uma respiração profunda e desencostei da porta, dando espaço para ela. Lori me olhava de um jeito estranho, olhar pra ela me lembrava de Rick, de que ele não estava mais aqui.
— Claro, deixe as caixas pesadas comigo. — Estiquei o braço e peguei a primeira caixa de enlatados, ajustando o peso dela na mão enquanto me virava para olhá-la. — Cadê o garoto?
— Tá com minha mãe, ela tá ajudando ele a fazer o dever de casa.
Eu soltei um riso curto, seco, meio anasalado. Dever de casa… ensinar matemática pra uma criança no meio daquilo tudo parecia mais inútil do que tentar plantar flores em uma estrada pavimentada. Pensar aquilo me fez lembrar que seria interessante dar umas aulas básicas de tiro pra todo aquele pessoal. Se todo mundo soubesse se virar, se proteger, não ia pesar pra ninguém. Balancei a cabeça, me afastando do jipe. Senti Lori me seguindo. Fomos andando devagar até sua barraca.
— Certo, não deixa ele circulando solto por aí. Não confio nessas pessoas.
— Então porque estamos aqui?
— Porque é melhor isso, do que ficarmos sozinhos. — Olhei ao redor, analisando a movimentação. Algumas pessoas ainda montando suas barracas, o som de marteladas e conversas ao fundo. — Em uma coisa eu preciso concordar com o velhote, juntos somos mais fortes.
— Entendi… Shane. — Lori tocou meu braço com cuidado, me fazendo parar e encará-la. — Eu confio em você.
— Obrigado, é importante pra mim saber disso.
Fiquei ali parado por alguns segundos, encarando a mulher à minha frente, o toque dela no meu braço pesando mais do que a própria caixa em minhas mãos. Deixei minhas palavras ficarem no ar antes de me livrar do seu toque e voltar a andar na direção da barraca. Dessa vez, fui na frente. Sentia os olhos dela ainda em mim, queimando minha nuca.
A mão de Lori ainda queimava em minha pele, mas não um queimar bom, mas sim como algo que eu queria arrancar de mim. Era pra ele estar aqui… Eu devia ter levado o tiro no lugar dele, porra. Rick sabia o que fazer, era ótimo em liderar. Eu só tava tentando não ferrar com tudo. E precisava botar ordem naquele acampamento ou as coisas iam ruir antes mesmo de começar.
Suspirei, ajeitando melhor a caixa sobre meus braços enquanto finalmente chegávamos onde ela tinha arrumado suas coisas. Rick não tava mais aqui, mas eu sim, e querendo ou não, era o que tínhamos pra hoje.
☆《▪︎▪︎▪︎》☆
Depois do almoço, chamei Dale, Lori, Andrea e Carol para perto da fogueira para termos uma conversa. O primeiro almoço até que saiu melhor do que imaginei que fosse ser. Por mais que parecesse uma cena caótica de algum programa da Discovery Channel sobre sobrevivência e afins, foi até que... normal. Se é que podíamos chamar um bando de desconhecidos se agarrando uns aos outros no alto de uma pedreira e comendo enlatados com medo de que eles próprios virassem a próxima refeição dos zumbis.
Zumbis... Foi assim que ouvi uns caras chamando aquelas coisas na rodovia. Achei meio ridículo no começo, mas, considerando que são cadáveres ambulantes querendo arrancar pedaços da gente, faz sentido. Segundo informações que eles diziam ser confiáveis, as "pessoas" não eram mais pessoas. Eram um tipo de morto-vivo. A pessoa morre e, então, alguma coisa dentro dela a faz voltar daquele jeito. Mas só se tivesse sido mordida.
Isso era outra coisa importante de se lembrar: tínhamos que ficar longe das bocas daquelas coisas. Uma mordida era fatal. Morte certa. E, de quebra? Virávamos um deles.
Pra matar? Isso eu já sabia. Tinha visto Anya colocar fim em uma daquelas coisas. O ferimento letal era na cabeça, e só na cabeça. Qualquer outra parte do corpo não fazia absolutamente nada naqueles monstrengos.
Uma merda, eu sei. Também acho isso. Mas é o que temos agora. E, sem governo ou porra nenhuma pra dar respaldo, não dá pra esperar nada de ninguém. Só viver um dia de cada vez. Até que a merda chegue ao fim.
A fumaça da fogueira subia em espirais lentas, levando consigo o cheiro de comida queimada do fundo do tacho, misturando-se ao cheiro de poeira que esvoaçava com os vários pares de pés circulando sem parar, e ao de suor que exalava dos múltiplos corpos ali presentes. Era tudo improvisado. Me sentei em um dos troncos que Daryl cortou das árvores ao redor e dispôs em torno da fogueira como bancos. Lori se ajeitou ao meu lado, enquanto Dale trouxe um caixote do seu trailer, Carol sentou sobre uma grande pedra, e Andrea permaneceu em pé, braços cruzados, intercalando sua atenção entre eu e Lori.
A ideia daquela reunião era organizar melhor nossa estadia ali, talvez dividir tarefas. Eu tava incomodado pra caralho, e sabia exatamente o que era: falta de organização. Eu gostava de ter o controle sobre tudo, e olhar em volta só aumentava minha sensação de que, mais cedo ou mais tarde, o controle — coisa que já não tínhamos — iria pro caralho de vez.
Dale ajeitava o chapéu na cabeça pela milésima vez, enquanto Andrea e Lori balançavam a cabeça em concordância com as sugestões dele. Carol, por sua vez, encarava a brasa baixa da fogueira como se estivesse em outro planeta. Soltei um suspiro pesado, frustrado, quando Dale voltou a falar. Aquele papo furado só estava girando e girando, sem sair do lugar.
— Talvez devêssemos fazer algo baseado em turnos, ou um sistema rotativo. — Dale sugeriu, com aquele tom de "vamos todos colaborar".
Minha paciência, já por um fio, estava prestes a romper. Não sei se concordava com ele, não estava convencido de que aquilo iria funcionar.
— Não sei, Dale, mas precisamos organizar isso aqui… se não, vai virar bagunça. — Respondi, tentando manter a calma.
Andrea revirou os olhos, entediada o suficiente para quase cair dura para trás.
— Já está uma bagunça. — Afirmou, olhando diretamente para mim, como se quisesse me cutucar.
Ergui as sobrancelhas e dei um sorrisinho de canto, cheio de sarcasmo, inclinando a cabeça de lado e para cima, para conseguir mira seu rosto.
— Valeu, Andrea. Sua observação mudou tudo. Vou até anotar. — Respondi, com uma piscadela que não disfarçava meu desdém.
Lori suspirou ao meu lado, mexendo no cabelo como fazia toda vez que estava prestes a dar uma lição de moral em Rick, sério que ela daria uma em mim? Não perdi tempo com ela. Virei-me de frente para o velhote, minha atenção totalmente fixada nele.
Acho que Lori entendeu o recado, pois ouvi seu suspiro, e senti que se aconchegou um pouco mais ao meu corpo.
Dale ajeitou o chapéu mais uma vez, provavelmente pra não rebater o que eu disse. Andrea deu uma risadinha baixa, e Carol continuou encarando as brasas, alheia a tudo.
— A gente precisa controlar o que tem, mas também deixar que cada família tenha acesso ao que trouxe. — Lori se pronunciou pela primeira vez desde que nos acomodamos ali, braços cruzados e apoiados sobre a coxa.
— Mas isso só vai gerar mais confusão! — Dale afirmou, coçando a cabeça por cima do seu chapéu.
A conversa começou a se arrastar, como a porra de um carro atolado, que patinava e patinava, mas não saía do lugar. Todo mundo tinha uma ideia, mas ninguém chegava a lugar nenhum. Eu sentia as gotas de suor brotando na raiz do meu cabelo e começando a descer pelo rosto, enquanto apertava a ponta do nariz, tentando segurar a raiva que crescia no fundo do peito.
— Pelo amor de Deus, a gente vai ficar discutindo essa merda o dia inteiro ou tomar uma decisão logo? — Minha voz cortou o grupo, seca, mas parecia que ninguém tinha ouvido. Aquele grupo precisava de um líder, tudo ia foder bem rápido.
Olhei em volta, tentando fugir por um segundo daquela discussão que me causava dores de cabeça agonizantes. O som de conversas, gente ainda se arrumando, batidas de martelo e estacas ecoando pelo ambiente aberto. Era uma bagunça. Gente demais, sem rumo, sem comando. Rick fazia falta; ele saberia o que fazer, como organizar. Mas ele não tava aqui. Sobrava pra mim.
Foi quando percebi as garotas por perto: Anya, Amelia, Amy e Lauren. Estavam um pouco mais afastadas, escoradas no trailer do Dale, mas os quatro pares de olhos seguiam presos em nós. Os meus cruzaram com os de Anya, e uma corrente elétrica, forte e quente, pareceu cortar o ar e nos ligar automaticamente. O que ela tinha que me fazia tremer por inteiro?
Anya cruzou os braços e deu um passo à frente, arqueando uma das sobrancelhas em desafio. Endireitou a coluna e os ombros, e ficamos lá, nos encarando.
Um sorriso torto escapou antes que eu conseguisse segurar. "Essa garota vai me matar," pensei, mas talvez fosse uma morte da qual eu não reclamaria.
Eu me sentia um completo idiota, um adolescente besta flertando, mas era mais forte que eu… aquela menina me quebrava de um jeito...
— E vocês aí? — Foi Dale quem perguntou, tirando o chapéu e virando a cabeça para olhá-las por cima do ombro. — Vão ficar aí paradas ou têm algo pra dizer?
— Queremos dar uma sugestão… — a voz dela era clara, de quem sabia o que tava fazendo. Anya foi direto ao ponto, diferente do restante que ouvi até então. — Por que a gente não junta todos os mantimentos que cada um trouxe e coloca alguém pra protocolar tudo? Assim, toda entrada e saída seria registrada. Desta forma, quando ficarmos com poucos, poderemos organizar uma busca antecipada e nunca passaremos necessidades.
Encarei aquelas quatro garotas, tombando a cabeça de lado e deixando um leve sorriso escapar dos meus lábios. Todas na casa dos vinte anos, acho que no máximo vinte e seis… por que eu não as chamei ao invés dos mais velhos? Teria evitado uma porra de uma conversa chata e sem fundamento.
A ideia de Anya era prática, simples. E o melhor… FUNCIONAL.
— Protocolar? — perguntei, só para saber até onde elas tinham pensado.
Lauren, que eu nunca tinha nem ouvido sua voz, era uma moça muito bonita, tímida, na dela, deu um passo à frente e falou enquanto esfregava o braço, meio sem jeito.
— Eu era agente comunitária antes de tudo isso. Sei exatamente como organizar essas coisas. Se você deixar, posso mostrar como.
Por um segundo, ninguém falou nada. Lori foi a primeira a torcer o nariz.
— Não sei se isso é uma boa ideia... Cada família trouxe suas coisas. Não é justo…
— E quem garante que essa pessoa responsável não vai comer mais que todo mundo? — Andrea completou.
Revirei os olhos. Claro que elas iam reclamar. Já tinha percebido que as duas sempre tinham uma objeção para qualquer coisa que não fosse ideia delas. Lori, com a porcaria da mania de controlar tudo, e Andrea, como se tivesse algum senso moral superior. Lori eu já conhecia, e compreendia um pouco… Agora, Andrea… parecia brava com alguma coisa, e pra ser sincero? pouco me importava.
Olhei para Dale, esperando ver algum sinal de que ele tava comigo. Ele sorriu de lado, um sorriso meio torto de velho que já viveu mais de meio século.
— Parece justo. — Ele disse, balançando a cabeça, a voz ja rouca devido a sua idade.
— Eu também gosto, acho que é o melhor que temos. — Concordei, olhando de relance para Anya. A malditinha tinha um jeito, alguma coisa que me fazia admirá-la. Mesmo que olhá-la por tempo demais me deixasse desconcertado.
Lori e Andrea fizeram caretas, mas eu não tava ali pedindo aprovação de ninguém. Isso não era uma votação. A gente precisava pensar no grupo, não em quem trouxe mais enlatados. Carol apenas analisava tudo, em silêncio.
— Tá decidido. Lauren, você vai liderar essa operação. — Fiquei em pé e apontei pra Anya. — E você vai ajudar. Amélia e Amy, vocês também tão nessa juntas, podem começar já se quiserem, se precisarem de ajuda para recolher os mantimentos é só me falar.
As meninas trocaram olhares e sorrisos, deram pulinhos e bateram as mãos, depois um abraço coletivo. Assisti a tudo, hipnotizado. Os cabelos negros de Anya se soltaram do coque frouxo e caíram sobre os ombros. O vento jogou algumas mechas para frente do rosto, e quando ela foi ajeitar os fios, nossos olhos se encontraram. Foi como um soco. Um calor abrasivo percorreu meu corpo. O que aquela mulher tinha? Que porra de poder era esse, que bastava um olhar para me tirar do eixo? Anya Benett. Maldita.
Ela sorriu daquele jeito de menina travessa, um canto da boca levantando como se prometesse o mundo. Um sorriso que dizia: "Você não tem ideia do que posso fazer." E talvez nem ela soubesse. O laço escorregou dos seus dedos enquanto ela tentava prender o cabelo de novo.
Se abaixou para pegar.
Devagar.
E eu sabia.
Ela sabia.
Diaba desgraçada.
Anya empinou a bunda na minha direção... foi de propósito. Fiquei ali parado, estático, olhando como um idiota. Dale, Carol, Andrea, até Lori desapareceram. Só existia ela. Aquela bunda… Minha nossa… deixaria suas nádegas marcadas, minhas digitais ficariam impressas na sua pele. Fechei a mão em um punho, o sangue quente, fervendo. Se eu pegasse ela… Ah, Anya ia pagar caro por cada maldita ideia que me fazia ter.
Ela se levantou, finalmente prendendo o cabelo, e olhou de novo para mim. As bochechas estavam coradas. Vergonha agora? Sério? Foi ela que começou o jogo. E eu? Eu sabia jogar, e modéstia parte, eu jogava bem pra caralho.
Acabei sorrindo maior, balançando a cabeça em negação, desviando meus olhos do seu corpo. Aquela malditinha era minha perdição, ja tinha sacado isso.
Olhei em volta e bati palmas, chamando a atenção do acampamento. No mesmo instante, os olhares pesados e curiosos recaíram sobre mim.
— Escutem aqui, pessoal! — Dei alguns passos para frente, e eles começaram a se mover na minha direção, como se ainda estivessem tentando entender o que fazer. — A partir de agora, a gente vai ter um sistema. Cada um vai ter uma função, e todo mundo vai contribuir pro funcionamento desse acampamento.
Esperei alguém se opor, mas tudo que recebi foi silêncio, então continuei:
— Eu, Dale, Daryl, Merle, Glenn e T-Dog ficamos com a segurança e a vigia, Daryl e Merle, pelo que vi vocês também caçam, quando não estiverem de vigia, façam isso, vai ajudar muito. Carol, Lori e Andrea, vocês cuidam das refeições e das roupas. Lauren, Anya, Amélia e Amy, vão ficar responsáveis por protocolar tudo: alimentos, remédios, qualquer merda que aparecer. Nada entra ou sai sem passar por vocês. As crianças ficam com vocês também, se revezem em duplas, são poucas, vocês dão conta.
Dei mais um passo, encarando o resto do grupo.
— Qualquer coisa que precisarem sobre mantimentos ou medicação, falem com essas garotas. Elas vão arrumar sua porção do dia. E agora, vamos juntar tudo que trouxeram. Não quero ninguém guardando nada escondido. Vamos montar uma puta dispensa e fazer essa merda funcionar enquanto der.
Parei por um momento e deixei minha voz pesar mais:
— E, por hora, precisamos de um líder. Essa vai ser minha função. Vou garantir que nada saia do controle. Alguma dúvida? Ou todo mundo aqui já entendeu como a banda vai tocar?
O silêncio que se estabeleceu foi quebrado por uma risada alta e escandalosa. Merle se inclinava contra uma árvore, rindo como se tivesse ouvido a melhor piada do mundo. Ele se aproximou, andando daquele jeito de malandro, polegares apoiados no cós da calça.
— Olha só, o xerife tá dando cargos. Por que não me coloca como líder, hein, Shane?
Eu levantei a cabeça e lancei um olhar direto pra ele, sem paciência pra palhaçada.
— Vou te dar um cargo, sim, Merle. Idiota oficial. Perfeito pra você.
Merle fez que ia avançar na minha direção, eu só queria que ele viesse, queria batesse de frente, seria um motivo pra mandar ele vazar, mas antes que ele pudesse responder, Anya virou pra ele se metendo em sua frente, espalmando uma das mãos em seu peitoral e disparou:
— Cala a porra da sua boca suja e leva essa sua bunda pra longe antes que arrume confusão...
O sorriso debochado do Merle só cresceu, ele balançou a cabeça e olhou pra Anya, seus olhos deslizando pelo corpo dela de cima abaixo, com aquela expressão de quem tava avaliando, gostando do que via.
Meu sangue ferveu na hora. Que porra ele achava que tava fazendo?
— Gostei da patricinha maconheira.
Anya nem piscou, só virou as costas lentamente e com a cabeça erguida se afastou outra vez para perto das meninas, ignorando ele como se fosse nada. Merle só calou a boca, porque eram "amigos" não gostava de Anya perto dele. Não gostava nem um pouco...
Todo mundo murmurou assentindo. Ninguém reclamou, nem mesmo Lori. Eu podia sentir a tensão no ar diminuindo, mas sabia que isso não ia durar muito.
Enquanto me afastava, Lori segurou meu braço, os dedos apertando de leve, como se fosse um gesto íntimo.
— Você tá fazendo o que Rick faria. — Ela sorriu, o polegar deslizando devagar sobre minha pele.
Eu engoli em seco, sentindo o nome dele pairar pesado e sufocante sobre nós. Rick deveria estar aqui, não eu. Não importa o quanto eu tente, nunca vai ser a mesma coisa.
— Só faço o que precisa ser feito, Lori. Por você, pelo garoto, por Anya, Amélia e sua mãe.
— Claro… Nós sabemos, e somos gratas por isso.
Me soltei do aperto dela e fiquei ali por um momento, meus olhos inevitavelmente indo parar em Anya, que observava tudo de canto. Percebi quando mordeu o lábio inferior, não do jeito sexy que ela costumava fazer, mas como se estivesse incomodada com algo. Seria com a mão de Lori em meu braço?
Quando ela virou as costas e saiu com as meninas, não consegui evitar um sorriso de canto. E mesmo que tudo tivesse de cabeça pra baixo, era só olhar pra ela e tudo parecia magicamente se ajeitar. Ela era uma tempestade controlada, e eu, no fundo, queria ser arrastado. Vocês acham que seria loucura correr na direção da tempestade ao invés de fugir dela?
Pensei comigo mesmo, quase rindo: Se alguém aqui tá esperando que isso vire uma porra de uma democracia, vai esperar sentado, porque de pé vai cansar as pernas.
🌶🍫《▪︎ Mais um capítulo escrito com todo carinho e amor pra vocês! Espero que tenham gostado.
🌶🍫《▪︎ Huuuum! Sera que vai começar um joguinho de provocação aqui??? Quem vai ceder primeiro??? Shane, ou Anya?
🌶🍫《▪︎ A Lori e a Andrea se roendo por dentro akakakakak eu amo!!!
🌶🍫《▪︎ Ain, Shane de líder minha nossa... me bota Shane te sugo a muito tempo akakakak
🌶🍫《▪︎ Me contem uma coisa, como vcs acham que vai ser o primeiro hot deles? Eu só vou dar um spoiler: CERVEJA.
Beijos da mama Hana pa voxes! Não esqueçam dos votos e coments, isso me deixa muito feliz!!
❤️
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