Vinte e cinco
Passei o resto da semana pensando nas irmãs ciganas, até fiz um desenho sobre elas. Simplesmente não conseguia parar de pensar no que disseram, ninguém merece ser tratado com injustiça, não importa a cultura.
Contudo, decidi dar um tempo sobre esse assunto ou me enlouqueceria. Além do mais sabia que Matthews estava em todos os cantos me vigiando, provavelmente ele sabia das minhas intenções de voltar ao portão do palácio para reencontrar com as ciganas.
Depois do almoço, na quinta feira, fui para o meu quarto ao invés de ir para o salão das mulheres. Nenhuma das minhas criadas estavam lá. Caminhei até a penteadeira e retirei todos os acessórios, colar, pulseiras, anéis e enquanto estava estava tirando um dos brincos, avistei sobre a mesa, uma carta aberta.
Me aproximei, curiosa e sem pensar muito comecei a ler:
A cada dia que se passa, a minha ansiedade para te ver e estar com você aumenta. É quase uma tortura não tê-lá por perto.
Meu coração ganhou um novo ritmo diferente, começou a bater um pouco mais rápido enquanto lia. Aquelas palavras só poderiam ser de Joshua, para mim. Talvez fosse uma resposta ou um agradecimento pelo desenho deixado debaixo de sua porta. Continuei lendo, sentindo a ansiedade crescer e o meu peito subir e descer:
Obrigado por me amar tanto e por se lembrar de mim todos os dias. Eu nem sei o que fiz para merecer todo o seu amor. Tudo o que desejo é poder retribuir a sua afeição e o seu carinho.
Sei que nosso relacionamento é complicado, visto que não temos tantas oportunidades de estarmos juntos. Mas sinto que logo isso não será mais um problema. Ficaremos juntos para sempre, eu prometo!
Me peguei com um sorriso largo no rosto, comecei a sorrir como uma boba. Não podia acreditar que depois de anos, o príncipe de Illéa havia decido se confessar para mim. A rainha Clair, estava certa, o segredo era só ter persistência. A alegria invadia o meu peito, eu estava prestes a abandonar aquela carta e sair correndo ao seu encontro, até desviar os olhos e encontrar assinatura no final da página:
Eternamente seu, Vincent!
E aí, aquele sorriso largo desapareceu na hora. Um véu de decepção caiu sobre mim.
__ Vincent, quem é Vincent? __ Indaguei, intrigada.
Fiz um enorme esforço para me lembrar de algum rapaz que tivera conhecido em algum momento da minha vida com esse nome. Mas era impossível, nunca havia conhecido e muito menos amado algum Vincent, para ele estar agora me agradecendo através de uma carta.
Cheguei a triste conclusão de que aquilo não era para mim. Algo me dizia que uma das minhas criadas tivera esquecido a carta de amor sobre a mesa e talvez nem tivesse notado. Só precisava descobrir qual delas.
A maçaneta da porta girou, em um impulso joguei a carta sobre a mesa no lugar onde estava antes, corri até a minha penteadeira e fingi que estava penteando o meu cabelo. Não queria que me achassem curiosa ou intrometida, então o melhor era fingir que nem tinha visto o papel ali.
__ Ah, a senhorita já está aqui! __ Mariah, exclamou surpresa ao adentrar o quarto, segurando uma bandeja com uma jarra de água e duas taças.
__ Sim, estou com um pouco de sono e por isso não quis ir para o salão das mulheres depois do almoço __ Me expliquei, colocando a escova de lado.
__ Entendi
Observei a criada através do reflexo do espelho, depois que colocou a bandeja sobre a mesa e concertou a posição da jarra, ela deu uma rápida olhada para a carta e discretamente a pegou e guardou muito rápido no bolso de seu avental. Então a carta era de Mariah, ela que tivera esquecido ali.
__ Onde estão as outras? __ Perguntei, me virando para ela.
__ Fiona, acho que está na lavanderia e Jade deve estar dormindo em algum canto
Assenti e continuei observando Mariah.
__ Posso te fazer uma pergunta?
__ Claro que sim senhorita Allison, se eu souber responder ... __ Ela parou na minha frente e concertou a sua postura, como se estivesse se preparando para uma pergunta séria ou de muita importância.
__ Hã, porque não quis se inscrever na seleção do príncipe Joshua? Era uma excelente oportunidade para você!
__ Verdade, seria uma grande oportunidade. Mas as criadas não receberam o formulário para se inscreverem.
Já previa aquele tipo de resposta. Afinal, sabia muito bem que os funcionários do palácio não podiam participar do concurso. Aquilo era só um pretexto para tocar no assunto que eu realmente desejava saber.
__ Mas suponhamos que você tivesse tido a oportunidade de participar da seleção e se casar com o príncipe, você não aceitaria? __ Indaguei, esticando os braços sobre as minhas pernas.
__ Não, eu não __ Mariah, respondeu balançando a cabeça, em um impulso, sem hesitar.
Franzi as sobrancelhas
__ Você já conheceu alguém especial? __ Perguntei pausadamente um pouco receosa. Das três criadas, Mariah era a mais mansa, dócil e gentil e tinha certeza que nunca me daria uma má resposta, mesmo assim tinha medo de que estivesse sendo um tanto intrometida.
Mariah arregalou os olhos e suas bochechas instantaneamente ficaram vermelhas.
__ Por que a pergunta, senhorita? __ Ela soltou uma risadinha nervosa, colocando um fio de cabelo imaginário atrás da orelha.
__ Não é nada __ Disfarcei, me levantando para andar pelo quarto __ Só curiosidade __ Aleguei, mirando o teto.
Era visível que a criada estava se sentindo constrangida e essa não era a minha intenção. De início pensei que Mariah fosse abrir o jogo comigo e revelar sobre o responsável por escrever aquela carta de amor, mas isso não aconteceu. Ela não disse nada sobre, talvez não se sentia à vontade o suficiente para falar sobre a sua vida pessoal ou pensasse que eu não aprovaria.
Fui informada que teria um encontro com Joshua Schreave, depois do jantar, eu deveria encontrá-lo na sala de cinema. É claro que fiquei supresa e também cheia de expectativas. Só queria que o jantar passasse logo para finalmente ir ao seu encontro.
Mas achei que seria uma boa ideia ir até o meu quarto antes de ir para sala de cinemas, para trocar de sapatos, uma vez que estavam deixando os meus pés doloridos.
Em seguida caminhei em direção a sala de cinema cantarolando e deslizando os dedos pelas paredes.
A sala de cinema era pouco iluminada, com algumas poltronas confortáveis. Havia um carrinho de pipoca e uma pequena geladeira no canto.
O telão já estava ligado mas não estava passando nenhum filme.
__ Qual filme vamos assistir juntos? __ Perguntei, enquanto me aproximava, apenas para tentar aliviar a tensão.
Joshua estava parado em frente ao telão, abotoando e desabotoando compulsivamente os botões de seu paletó.
__ Você pode escolher onde vamos sentar __ Ele deu alguns passos para frente e estendeu os braços para as cadeiras. Mas algo estava estranho em Josh. Sua voz saiu instável, seus movimentos eram rígidos, quase igual a um robô e seus olhos perdidos, sem o brilho habitual. Ele não esboçou nenhum sorriso. Me perguntei se tudo aquilo era nervoso por ter um encontro comigo em uma sala mal iluminada.
__ Então eu escolho sentar na primeira fila, não dá para desperdiçar essa oportunidade! __ Me sentei e olhei para o príncipe, sorrindo.
__ Ótimo, você, você quer pipoca? __ Ele perguntou dessa vez com a entonação acelerada, ainda em em pé parado na minha frente, batendo sem parar a sua mão sobre o encosto da cadeira.
Franzi as sobrancelhas e o encarei por um segundo
__ É, eu acho que sim __ Respondi no automático, a cada minuto me sentia mais apreensiva e nervosa. Uma tensão pairava no ar, mas eu ainda não conseguia identificar o que estava acontecendo ou que estava prestes a acontecer.
Joshua foi até o carrinho de pipoca eu fiquei o observando de longe. Ao parar de frente ao carinho, ele encheu a boca de ar, sacudiu o seu paletó algumas vezes e mexeu no cabelo.
Desviei o meu olho por alguns instantes e me distrai com o tamanho do telão, até que de repente o barulho dos baldes de pipoca caindo no chão, causando bagunça e agitação, me assustaram e me fizeram olhar para o príncipe novamente.
__ Droga! __ Ele bufou, passando as mãos pela cabeça e chutando o carrinho.
Engoli em seco e me levantei rapidamente
__ Josh você está bem? __ Me aproximei com passos cuidadosos.
Ele se virou, evitando contato visual, e se apoiou no carrinho de pipoca, como se buscasse segurança. Sua cabeça estava abaixada, escondendo o rosto contorcido em dor. Sua respiração era rápida e superficial, com arfadas desesperadas. Gotas de suor escorriam pela testa, revelando o pânico que o dominava.
__ Josh, o que está acontecendo com você? __ perguntei, com voz baixa e preocupada.
Joshua não respondeu. Seu olhar perdido se escondia atrás das pálpebras fechadas. Ele balançou a cabeça, um gesto desesperado, e levou a mão ao peito, como se tentasse conter a ansiedade que o sufocava. Seu corpo se curvou, como se o peso do mundo o esmagasse.
__ Ei, fique calmo, está bem? Eu vou procurar ajuda __ Com uma voz mansa, dei um passo para frente e estava prestes a repousar a minha mão no seu ombro, quando ele deu um passo brusco para trás como se eu fosse uma ameaça.
O encarei, sem entender sua atitude
__ Joshua, o que foi isso? Eu só quero te ajudar
__ Eu não quero sua ajuda, eu quero que você fique longe de mim. Eu quero que você saia! __ O príncipe ordenou levantando o tom de voz. Ele levou as mãos até a cabeça e ficou olhando para os lados desesperado, algum tipo de medo e pânico que só existiam dentro da sua mente, tomava conta de si.
Vê-lo daquele jeito também estava me causando aflição e desespero por dentro, mas sabia que tinha que me controlar e manter a calma diante daquela situação, caso contrário, talvez Josh ficasse ainda mais agitado e nervoso.
__ Você só está tendo uma crise de ansiedade isso vai passar __ Assegurei, me aproximando novamente __ Tente respirar algumas vezes!
No entanto o príncipe saiu andando, escapando de mim, até bater as suas costas do telão.
__ Eu já lhe disse para ficar longe de mim
__ Eu só quero ajudar Josh! __ Elevei o meu tom de voz às oitava, me sentindo impaciente e irritada com o seu comportamento rude.
__ Eu não preciso da sua ajuda Wendy, só saia daqui! __ Ordenou mais uma vez, praticamente gritando e apontando para a porta. Parecia que lhe faltava fôlego e suas mãos tremiam bastante.
Fechei a cara para o príncipe, sentindo meus nervos pulsarem de raiva e os meus olhos marejarem e sem dizer mais nenhuma palavra, virei as costas para ele e sai da sala de cinema com passos rápidos e fortes, limpando bruscamente uma lágrima solitária que insistiu em rolar pelo meu rosto. Apenas o deixei lá sozinho, em um péssimo estado e não me atrevi a olhar nenhum única vez para trás.
Pensei que depois da noite em que tomamos sorvete sozinhos na cozinha, naquele momento havia nascido uma amizade, porém estava enganada. Mesmo não estando nada bem, o príncipe de Illéa ainda era capaz de me desprezar e de não aceitar a minha ajuda. Aquilo para mim foi a gota d' água. Talvez Joshua Schreave não merecesse toda a minha consideração.
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