Capítulo 07 Ela teve um bebê

Pensei que o Rodolfo se afastaria de mim depois do ataque que sofreu na noite do meu porre, mas na verdade, acabamos nos aproximando mais. Quando me sentia triste, ligava para ele, quando me sentia sozinha, trocávamos mensagens, saíamos para tomar sorvete e banho de mar, até passei a acompanhá-lo em sua rotina diária de exercícios na praia. Por fim, viramos a companhia um do outro e isso estava nos fazendo muito bem.

Da noite para o dia Raul virou santo em suas redes sociais. Trocou a farra pela religião, a noitada pela família, já não era mais visto com mulheres, nem bebendo em bares, agora se dedicava ao trabalho e se dizia um novo homem. Com isso, muitas pessoas que torciam para que eu seguisse a minha vida começaram a fazer campanha para salvar meu relacionamento. Como pode mudarem de opinião com tanta facilidade? 

Nunca pensei que esse mundo de exposição na rede social causaria tanta dor de cabeça. As pessoas não entendem que você é um ser humano com sentimentos, elas acham que sabem tudo sobre sua vida e querem ditar as regras. Ou você faz o que a maioria deseja, ou é cancelado. Eu recebi mensagens até de pessoas querendo me converter, outras pensavam que estava ali contra a vontade, surgiu até uma vaquinha para me levar de volta, e olha que nunca nem vi o dinheiro.

"Bom dia, eu sei que muitos de vocês esperam um posicionamento meu, sobre essa comoção a favor da minha reconciliação com meu ex-noivo. Eu gostaria de pedir que respeitassem o meu momento, muita coisa aconteceu e vem acontecendo em minha vida e ainda estou aprendendo a lidar com isso. A única certeza que eu tenho, é que hoje, nesse momento, não existe a menor possibilidade de eu botar um vestido de noiva e trocar votos no altar. O futuro não pertence a mim, e é isso. Eu vivo no presente, e o meu presente é solteira juntando os cacos dos meus sonhos que foram destruídos."

▬☼▬

Era uma tarde chuvosa, Rodolfo foi para o plantão, e o Rafael que voltava de uma viagem com Levi acabou ficando preso no aeroporto devido ao mau tempo. Eu resolvi dormir cedo, sempre tive medo de tempestade, pesadelos com ondas gigantes e o mar estava logo ali do outro lado da rua. O problema é que recebi uma visita inesperada, minha vida nunca mais foi a mesma depois disso.

Eu já estava de pijama quando o interfone tocou e o vigia disse que havia uma moça querendo subir. Demorei assimilar a informação, ela queria falar com um dos rapazes e pela descrição seria o Rodolfo. Eu disse que só voltaria pela manhã, mas insistiu, então liberei a entrada.

— Eu preciso de ajuda.

Mal abri a porta, e uma grávida desesperada me atropelou indo em direção a sala.

— Moça, os rapazes não estão, eu não moro aqui, o que...

— Eu estou grávida.

— Que bom, uma barriga desse tamanho, seria...

— Estou grávida do rapaz que mora aqui, eu vim em uma festa aqui no prédio, bebemos e ficamos juntos, não ia procurar por ele, mas não posso cuidar da criança, e... — ela começou a chorar. — Me ajuda, não sei o que fazer.

— Ele está no plantão, posso ligar se...

— Eu não tenho dinheiro, minha bolsa estourou e...

— Tudo bem, eu devo ter uma sobrando, posso...

— Moça — ela me segurou pelos braços apertando demasiadamente forte. — Você não entendeu, minha bolsa estourou a caminho daqui, meu filho está nascendo.

— Não moça, nascendo não, você tem que ir pro hospital!

— O hospital fica longe e eu... Droga! — ela se encolheu fazendo uma careta estranha.

— Moça, você tá bem?

— Não, né, estou com dor, muita dor!

— Mas, então deveria procurar um médico — olhei para a garota se contorcendo à minha frente. — Tá você procurou um médico, mas ele não está, você tinha que ter ido...

— Aiii! — ela gritou e gritei junto. — Me ajuda, está doendo muito!

— Mas eu não sei o que fazer nunca pari na vida!

— Me ajuda, droga!

A garota se contorcia aos prantos, já entrou ali com cara de choro, e eu queria chorar junto.

— Eu vi num filme que respirar igual cachorrinho ajuda, vai, respira assim.

Eu tremia e respirava a ajudando, a garota se ajeitou no tapete usando o sofá como encosto, não vi outra saída, liguei para o Rodolfo.

— Oi, lora, pode falar — disse ele ao telefone.

— Teu filho vai nascer, o que eu faço?

— É o quê?"

— Teu filho, a bolsa estourou, eu achei que era outra bolsa, mas era a bolsa e ela ta chorando, eu tô com medo!"

— Calma, respira.

— Tô respirando.

— Por que está respirando assim?

— Vi num filme que ajuda.

— Tá, me explica isso direito.

— Aííí, está doendo!

— Quem está chorando?

— A mãe do teu filho, eu disse que vai nascer, o que eu faço?

— Que mãe do meu filho, isso não existe.

— Como não existe a mulher tá aqui na minha frente com uma barriga enorme e uma cara estranha.

— Tá, Cintia, depois veremos isso. Mandarei uma ambulância, e...

— Me ajuda!

Olhei para a garota com cara de sofrimento, fazendo força deitada toda escancarada naquele chão, e senti vontade de pular pela janela e nadar até o Mato Grosso do Sul, e olha que nem é perto do mar.

— Rodolfo, ela está sangrando, tá estranho isso, estou com medo.

— Uma ambulância nesse endereço tem uma gestante em trabalho de parto — disse ele. — Cíntia, fica na linha comigo.

— Você engravidou a garota, seu irresponsável, ela está no meio da sala me pedindo ajuda, tinha que estar aqui!

— Aiiiii — a garota gritava cada vez mais alto. — Eu não quero mais ter essa criança!

— Ela disse que não quer mais, o que eu faço?

A garota se contorcia, e eu olhava para aquela situação com o coração acelerado. Do lado de fora, raios e trovões abafavam os gritos, mas ainda assim ecoavam pela casa.

— Elas falam mesmo, mantenha a calma.

— Calma? Como vou manter a calma, tem uma desconhecida parindo na sala! Eu nem tô grávida e parece que vou parir também, cadê a ambulância?

— Estão a caminho, está tudo alagado, precisa ter paciência.

— Aiiiii, me ajuda!

Eu massageava as costas da moça, olhava para aquela situação e rezava a cada vez que ela fazia força. Coloquei o celular no viva-voz para conseguir ajudar melhor, e já estava quase tendo um treco de nervoso quando começou a piorar.

— Eu não quero mais, me ajuda!

— O moça, dá pra cancelar o parto mais não.

— Cíntia, o que está acontecendo?

A garota me apertava a mão e fazia força, eu suava frio, tentava abanar, fazer massagem, tocava na barriga e ela gritava, eu me encolhia assustada. Nunca vi um trem desse, traumatizei, não quero ter filhos.

— Tem um negócio saindo dela — falei com lágrimas nos olhos, era uma cena muito estranha.

— Faz força — pediu ele.

— Estou fazendo!

— Você não, ela, estou falando com ela.

— Faz força, não, esse negócio vai sair!

— Faz, sim, ajuda ela!

— Tem uma cabeça saindo dela, e essa cabeça deve ter um corpo, vem aqui Rodolfo!

— Aiiiii!

— Força!

— Força, não!

— Cíntia, fica quietinha e me fala o que está vendo.

— Uma cabeça enorme saindo de um buraco pequeno, isso é muito feio.

— Cíntia, por favor, ajuda a moça.

— Você está rindo de mim, Rodolfo?

— É de nervoso, apoia a criança, quando a contração vier ela faz força, pega um pano e apoia a criança.

— Aiiiiii.

— Isso, faz força que vai nascer — ele dizia quando a cabeça terminou de sair trazendo o corpo e um monte de sangue.

— Nasceu, é um menino, ele tem a sua cara — falei colocando no bebê que chorava, no colo da mãe que chorava junto.

— A cara de quem? — perguntou ele quando a campainha tocou.

— A sua ué — dei uma última olhada na moça que estava com a criança nos braços, com o cordão ainda dentro de si, sangue se esvaindo, eu tremia muito quando abri a porta.

— Como ela está? — perguntou o socorrista passando por mim.

— Ela teve um bebê.

Foi a última coisa que eu disse antes de apagar completamente.

▬☼▬

Dizem que o mundo não gira em volta de nós, mas no meu caso girou até demais. Eu tentava abrir os olhos, mas simplesmente não conseguia, só sentia meu corpo sendo levado sabe-se lá para onde.

— Cíntia, você precisa se acalmar.

Aquela voz ecoava lá no fundo, eu não comandava minhas reações, tenho até medo de descobrir o que saiu da minha boca, só sei que me deram algo, e acabei dormindo outra vez.

— Quando ela acordar, me avise.

A voz do Rodolfo me fez despertar, me sentei naquela cama ainda tonta e olhei a minha volta. Eu estava sozinha em um quarto de hospital, tinha sangue em meu pijama, o que fez com que me lembrasse do motivo de ter desmaiado. Me levantei rapidamente, estava descalço, caminhei até a porta e vi Rodolfo entrando em uma sala, achei melhor esperar ali mesmo. Logo alguém viria e então iria para casa.

— Você viu o bebê que nasceu? — perguntou uma das enfermeiras para a outra que mexia no computador em frente a minha porta.

— Eu vi, o pai sequer quis olhar para a criança, o filho é da mãe mesmo.

— Não, Rodolfo não faria isso — murmurei decepcionada.

— Pois é, o bebê ainda nasceu a cara do traste. Se você visse a frieza dele quando perguntamos se não ia ver a criança, ele disse que está de namorada nova e não quer uma aproximação.

Meus olhos se estreitaram, abri a porta e caminhei até a sala onde o vi entrando. Ele estava sentado em uma mesa conversando com alguns médicos, do lado de fora havia um carinho com alguns frascos de soro, teria que servir.

— Você engravidou a moça e não quer assumir — lancei o frasco em sua direção e ele se abaixou.

— O que é isso!

Todos os olhares se voltaram para mim.

— Cíntia, eu não...

— Não me venha com essa de que o filho é da mãe, Rodolfo!

Outro frasco voou passando muito perto de sua cabeça.

— Aposto cem, que o próximo ela acerta — disse um dos médicos.

— Dá ideia, não, fresco — Rodolfo ia se levantando quando o outro frasco lhe acertou no braço.

— Você vai assumir teu filho, entendeu!

— Que filho, eu não sou o pai daquela criança — ele deu um passo à frente. — Se acalme deu tudo certo, você foi incrível.

— Incrível? Eu quase pari junto com ela, aquela cabeça saindo da garota e você rindo de mim!

Outro frasco voou direto para sua cabeça.

— Que coisa feia, Rodolfo, assume seus filhos — o médico loiro balançou a cabeça aos risos.

— Pare de botar lenha na fogueira, corno! — Rodolfo deu mais um passo à frente desviando do outro frasco que voou.

— Ah, não, me chamou de corno, joga esse que é maior!

O rapaz me deu um frasco de um litro, mas Rodolfo me alcançou primeiro, e me imobilizou com um abraço apertado.

— Me solta que eu quero te bater!

— Chuta a canela dele — o médico com traços orientais gargalhou assistindo a cena.

— Calma, lora, eu não sou pai da criança, nem conheço aquela moça — ele dizia me apertando em seus braços enquanto me debatia tentando soltar.

— Você pode não se lembrar, e...

— Ah, eu me lembraria se tivesse transado com ela, estou solteiro a seis meses, não peguei mais ninguém. Calma Cíntia!

— Calma? Você nem quis ver a criança que tem a sua cara!

— Se toda criança negra que nascer com a minha cara for meu filho, estou perdido, eu vi sim o bebê, sua maluca.

— A moça lá fora disse que você não quer ver seu filho, deveria sentir vergonha por mentir assim — bufei desistindo de tentar me libertar.

— A moça lá fora fala demais, o caso é outro, e esse bebê é possível sim que tenha meu sangue, mas no caso, eu sou o tio.

— Agora quer botar a culpa no irmão, o Rafael é gay, esqueceu?

— Quanta inocência, ele é gay, mas não impotente.

— Rodolfo, se você estiver mentindo — estreitei os olhos bufando feito um touro bravo.

— Vou passar a visita, aposto duzentos que dá casamento — disse o loiro deixando a sala.

— Eu quero ser padrinho — o oriental saiu fechando a porta.

Rodolfo me olhou por um instante e sorriu balançando a cabeça.

— Que surto foi esse?

— Eu pensei que você tivesse...

— Eu não daria um vacilo desse, mas que ideia.

— Está rindo de quê, isso não tem graça.

— O seu jeito, eu... nossa, adoro mulher brava.

Rodolfo me empurrou até a porta e atacou minha boca com um beijo, que mesmo que eu não quisesse, seria impossível não corresponder. O homem tinha o poder de me desestabilizar, até esqueci que estava brava, descalço, e de pijama na sala dos médicos daquele hospital.

— Você com ciúme me atiça, eu não resisto desse jeito.

Sua mão passou pela lateral da minha coxa fazendo com que nossos corpos se aproximassem mais, aquele gesto me causou uma corrente elétrica atiçando as borboletas até então adormecidas em meu estômago.

— Eu gosto quando você me aperta assim .

— Assim?

Ele me puxou para mais perto, como se isso fosse possível, eu literalmente sumia em seus braços.

— Eu vou pro inferno.

— Então me leva junto.

Ele me apertava contra aquela porta, sua boca brincava em meu pescoço subindo pelo meu queixo deixando leves mordidas antes de atacar meus lábios outra vez. Sua mão firme na parte de trás na minha coxa subiu apertando, me puxando para si, Rodolfo tinha um jeito de me tocar que acordava todas as partes adormecidas do meu corpo, mesmo aquelas que nem sabia que existiam. O homem era o verdadeiro sentido da perdição.

— Ah, Cíntia, estou trabalhando não posso... — ele encostou sua testa na minha. — O que você está fazendo comigo?

— Vou limpar a bagunça que fiz — falei me afastando, eu precisava manter distância e me recompor.

Quando saímos daquela sala, fomos agraciados por olhares curiosos e risos de seus amigos, que me pediram um autógrafo por ter vencido o homem que dizia que mulher nenhuma o dobraria mais. Eu não entendi muito bem o que aquilo queria dizer, voltei para o quarto e esperei pelo Rafael, o verdadeiro pai da criança.

— Eu, pai, que loucura — Rafa se sentou à beira da cama quando eu me dirigia até o banheiro para me trocar.

— Você me disse que não pegava mulheres.

— Já tive algumas namoradas na adolescência, mas faltava alguma coisa, e desde que tive a primeira experiência com um garoto, não quis mais estar com mulheres.

— E como é isso? — Apontei a cabeça na porta, vestindo a calça que ele me levou.

— Não é que eu não consiga, só que... você sabe.

— Na verdade, eu não sei, nunca entendi como isso funciona.

— Minhas melhores experiências foram com os homens, eu não me sinto atraído por mulheres.

— E como engravidou a moça? — me aproximei vestindo a camiseta.

— Foi numa festa do prédio, o Felipe me convenceu a fazer um ménage com ela

— O que é isso?

— É quando mais de uma pessoa...

— Tá entendi — desviei o olhar envergonhada.

— Eu não costumo fazer essas coisas, mas aceitei para agradá-lo, agora tem um garoto com a minha cara e uma mãe dizendo que não pode ficar com ele.

— E o que vai fazer?

— Vou fazer DNA, mas até o resultado sair darei toda assistência necessária, e mesmo que não seja meu, posso apadrinhar a criança, não me custa ajudar.

— Eu não esperava menos do que isso — falei o abraçando.

— Você me ajuda a enfrentar esse desafio?

— Como assim?

— Eu estive com a mãe, mas ainda não estive com o bebê ele está no berçário.

— Claro que ajudo, vamos lá.

De braços dados caminhamos até o berçário, o bebê mexia os bracinhos tentando chupar o dedo, foi uma cena muito emocionante. Ali atrás daquela vidraça, Rafael chorava quando a enfermeira se aproximou com o garoto nos braços e deu sinal com a cabeça para que ele fosse até a porta ao lado.

— É tão pequeno, parece que vai se quebrar — ele tremia com o filho nos braços, se parece muito com meu pai, eu tenho uma foto dele bebê, é idêntico.

— Eu acho que ele se parece com você.

— Eu fiz essa coisinha perfeita?

— Pelo visto, sim — sorri com lágrimas nos olhos.

— E eu que apanhei por conta disso — Rodolfo se aproximou com um sorriso fofo ao lado de uma enfermeira.

— O tanto de garota que tenta botar uma aliança no dedo desse homem, se essa criança fosse seu filho se chamaria milagre — a enfermeira deu tapinhas no ombro de Rodolfo. — Ele não é tão fácil assim de fisgar.

— E tem muitas pretendentes? — perguntei inquieta.

— Ele escolhe demais, tanto que ficou para titio — ela sorriu se afastando.

— Você viu, Rô, meu filho, ele é tão lindo. Será que o pai vai ficar feliz? Talvez agora ele tenha orgulho de mim, queria tanto um neto.

— Pois é, meu irmão, quem diria você papai.

— E a mãe da criança?

— Vai lá para casa até se recuperar, aí ela pode pensar com calma no que fará — afirmou Rafael.

— Não acha que está se precipitando? — perguntei preocupada.

— Não sei, só quero fazer a coisa certa.

— Pensa bem, Rafa, não é como se tivessem tido um relacionamento, pode ser um tiro no pé.

— Talvez, mas olha essa carinha.

— Ele é assim, nem tenta — Rodolfo balançou a cabeça negativamente.

— Bem, a casa é de vocês — dei de ombros.

— E você se acalmou? — Rodolfo apertou meu queixo com um sorriso.

— Não, eu ainda estou vendo aquela imagem dessa cabeça passando por... — olhei para os dois que me observavam com as sobrancelhas elevadas. — Eu não quero ter filhos.

— Isso não pode ser negociado? — o gigante piscou de canto.

— O que eu perdi? — Rafael nos olhou desconfiado quando o irmão se afastava.

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