CAPÍTULO 03
Perséfone Angelle
Ser uma Armand era mais difícil do que Rose podia imaginar. Todos os dias ela precisava acordar cedo para aprender a cozinhar, atirar, cortar, lutar, até mesmo estava fazendo aulas de pilotagem de helicópteros. Era torturante, seu corpo estava completamente exausto, apesar de todos serem extremamente atenciosos com ela, era difícil ter que se manter tão forte.
A noite era o único momento de descanso que ela tinha. A garota costumava olhar para o teto de seu quarto todas as noites e observar aquela pintura magnífica feita em seu teto. Após longas noites encarando-a e estudando-a, ela finalmente compreendeu que aquela era uma imagem de Hades e Perséfone, o rei e a rainha do submundo grego.
Ela sentia muita vontade de rir somente em pensar que ela e seu marido desconhecido possuíam o nome de um casal da mitologia grega.
E às vezes ela se pegava pensando nele.
Qual era sua aparência, sua verdadeira personalidade, como ele lidaria com suas irmãs mais novas intrometidas e se em algum momento ele a rejeitaria.
Virando-se na cama, ela enrolou-se em seus lençóis escuros e abraçou o travesseiro. Distraidamente, ela se pôs a encarar o chão do quarto enquanto viajava em seus próprios pensamentos.
Seus pais não ligaram, não havia nenhum segurança atrás dela, sua vida estava agitada como nunca, mas ela estava se sentindo bem mesmo exausta. Ela não tinha tempo para pensar em seus pais indiferentes, não tinha tempo para se preocupar com seus próprios problemas e conseguia entregar todas as suas atividades da faculdade com a ajuda de Priscilla Yang.
A comida não era recusada a ela, não existiam horários para comer rigidamente e sua nova casa apesar de vazia não era nem um pouco rígida. Os amigos de seu marido faziam companhia a ela todos os dias e estavam sempre em sua casa atormentando sua vida e dando aulas. Suas irmãs estavam em algum lugar que ainda não contaram, mas sempre telefonava para perguntar sobre suas sentenças.
E ela não tinha pais negligentes e narcisistas para controlá-la.
Sim, sem dúvidas viver como uma futura Armand era melhor do que viver como uma Angelle.
𑁍
Perséfone encarou a moto na frente dela com um choque visível. Ela olhou para a moto e em seguida olhou para Anthony Rodrigues esperando que ele falasse algo. Mas ele apenas sorriu e piscou para ela.
— Sério isso?
— Presente do seu marido!
— Uma moto?!
— E uma Lamborghini — Priscilla jogou as chaves para ela — Ser uma Armand significa viver cercada de luxos.
— Mas se você quiser, pode escolher outros carros da coleção — Anthony apontou para a garagem — Fique a vontade.
Perséfone esfregou o próprio rosto e marchou para dentro da garagem a qual Anthony havia aberto para que ela pudesse dar uma olhadinha nos carros que haviam ali. Ela passou por todos eles, analisando cada um deles com atenção e buscando por uma outra opção que a deixasse mais interessada. Seus olhos brilharam assim que ela encontrou um carro específico isolado dos outros e muito bem cuidado. Ele era antigo, possuía uma tintura lustrada e na cor vinho escuro, era simplesmente magnífico e estava ao lado de um carro idêntico na cor preto.
— Posso ficar com esse? — ela perguntou em tom de voz algo para Anthony, que estava mais interessado em seu celular do que no que ela fazia em meio a tantos carros — Thony!?
— Qual a marca? — ele perguntou de volta, ainda mexendo em seu celular. — E a cor?
— Chevrolet Impala 1967 na cor vinho!
Rapidamente a atenção dele saiu do celular e se voltou para a garota que estava analisando o carro com extremo fascínio, ela deslizou os dedos pela lateral do carro e tentou espiar para dentro dele, sendo impedida por Anthony, que a puxou para longe do carro e a forçou a andar novamente em linha reta.
— Fique longe dos Impalas — Anthony ordenou — É herança de família, Hades odeia que cheguemos perto deles.
— Mas… — ela se virou para o rapaz e o encarou — Vocês disseram que eu podia escolher o que eu quisesse!
— E pode, menos o Impala!
— Então eu não posso escolher todos.
— Princesinha, escolhe logo outro carro e me ajude a não morrer!
Perséfone parou de andar, cruzou os braços e ergueu a cabeça com um olhar sério. Seu nariz empinado e os olhos azuis brilhantes deixavam claro que ela estava irritada. Anthony desviou o olhar do dela e deu um passo para trás pensando seriamente no que faria.
— Eu vou conversar com o Dawson — ele ergueu o dedo — Por enquanto, fica com a Lamborghini.
Ela sorriu e assentiu.
O rapaz suspirou aliviado e enviou uma rápida mensagem para o amigo, logo, voltando a sua atenção para a mulher que estava esperando suas próximas instruções.
— Você sabe dirigir moto e carro?
— Sei.
— Ótimo, você vai treinar para corridas clandestinas — ele enfiou o celular no bolso — Eu serei seu professor.
— Certo.
Enquanto caminhavam para o lado de fora da casa, ela pode notar a postura completamente relaxada de Anthony Rodrigues. Com o passar do tempo, ela conseguiu analisar o perfil dele e de Jaz, ambos são extremamente tranquilos e relaxados mostrando pouca preocupação com o que acontece ao seu redor.
— Você e Jaz são primos. Correto?
— Correto.
— E foram criados juntos?
— Aham — Anthony assentiu — A mãe de Jaz morreu quando ele era apenas um moleque catarrento de cinco anos, ela e meu pai eram irmãos, então a guarda ficou com os meus pais.
— E o que vocês fazem, especificamente?
— Ah… — o moreno esfregou a nuca — Eu sou detetive e ele é tatuador.
— Tatuador? — ela se impressionou — Eu pensei que ele fosse algum tipo de chef.
— Mas não se impressionou comigo sendo policial?!
— Você deixa óbvio sua profissão.
O mais velho riu e parou em frente a moto comprada especificamente para Perséfone. A auxiliou subir na moto, começando suas instruções, a garota era alta e forte o suficiente para conseguir pilotar a moto que era realmente grande.
— Tenha cuidado, Rose — Anthony pediu, entregando um fone de comunicação para ela — Um arranhão em você, será uma faca em nós.
— Não entendi…
— Apenas tome cuidado.
Ela amarrou os cabelos e colocou o capacete. Começando a seguir as instruções de Anthony através do fone. A garota sempre se impressionava com o tamanho da mansão, e também se impressionou com a “pequena” pista de treinamento que havia no subterrâneo da mansão.
“Talvez até mesmo tenha um mercado debaixo da mansão e eu não saiba” — pensou.
𑁍
O som de batidas na porta a fizeram saltar de sua cama e caminhar lentamente em direção a ela, abrindo-a. Priscilla e Nick estavam parados em frente a sua porta. A mulher sempre com um sorriso animado e o homem com um semblante sério.
— Pois não?
Nick ergueu a maleta em sua mão e apontou para o joelho machucado de Perséfone. Ela abaixou o olhar e percebeu que o machucado estava sangrando novamente, mesmo após o banho, ele voltou a sangrar.
— Nick insistiu que deveríamos dar uma olhada nos seus machucados — Priscilla falou — Bom, eu só vim te trazer o jantar! — ela estendeu uma sacola com comida para Perséfone — Não sou boa com cozinha e preciso ir para casa, então comprei algo em um restaurante. Não conte ao Dawson, por favor.
— Claro…
— Ótimo — Priscilla sorriu e agarrou o rosto de Perséfone, deixando um beijo estalado em sua testa — Boa noite, princesinha!
— Boa noite…
Rose deu caminho para que Nick entrasse em seu quarto e deixou a comida em cima da cômoda, se sentando na cama. O homem se ajoelhou no chão, começando a procurar os utensílios para tratar os machucados da garota.
— Está tudo bem, eu posso fazer isso sozinha — ela murmurou.
Nick Diamond era extremamente silencioso, ela podia jurar que nunca o ouviu falar mais do que dez vezes durante o mês todo. Era um tanto desconfortável o ter por perto, menos quando ele dava aulas de piano para ela, o homem sempre era paciente e dedicado em ensiná-la.
— Ele não vai gostar de saber que você se machucou — Nick comentou com seu tom baixo e ameno — Mesmo que você se machucar faça parte do seu treinamento.
— Com ele você quer dizer…
— Sim.
Perséfone não conseguiu dizer nada, apenas observou Nick pegar algo para limpar seu corte e murmurando um “com licença” antes de limpar o machucado. Ela não reclamou, apenas observou o rapaz terminar de limpar e aplicar uma pomada em seus joelhos, logo os enfaixando com cuidado para não machucá-la — o que era muito engraçado, considerando o fato de Nick ter quase 2 metros de altura e mãos do tamanho de luvas de basebol.
— Pode me falar o que você acha dele? — ela pediu — Por favor.
Nick refletiu.
— Ele é tranquilo — respondeu.
— Ah.
Novamente ele pegou os materiais necessários e apontou para a garota tirar a parte superior do robe vermelho. Rapidamente Perséfone o encarou com desconfiança e apertou o tecido em seu corpo com apreensão.
— Não se preocupe — ele pediu — Ao contrário de Priscilla, eu odeio seios e vaginas.
Durante um bom tempo, Perséfone o encarou em choque, mas logo cedeu, puxando o roupão e expondo seus braços machucados. Ela o deixou fazer novo curativo em seu braços e cotovelos. Antes que Nick pudesse guardar o material, ela tossiu e se levantou, virando-se de costas para ele, movimentando o cabelo para longe da nuca e mostrando outro machucado.
— Se ele vai se irritar, não conte para ele — pediu, enquanto sentia o algodão limpando seu corte — Não quero que vocês sejam repreendidos.
— Infelizmente, não será possível — Nick respondeu — Seu marido recebe relatórios de todos nós referentes a você. Não podemos esconder nada dele.
— Isso é ridículo! — ela resmungou, puxando a blusa do pijama para cima e expondo suas costelas raladas. — Seria impossível eu não me machucar com esse tanto de coisa! E por que ele se sentiria irritado? Ele nem sabe quem eu sou e eu nem tenho idéia de onde ele está. Não tem motivo algum para ele se preocupar comigo!
Ela conseguiu ouvir uma risadinha de Nick e se virou quando terminou de cuidar dos seus machucados.
— Hm… — Diamond pensou — Hoje vocês completam um mês de casados, escreva uma carta para ele.
— Uma… carta?
— Sim — ele assentiu — Vocês não podem conversar por telefone, então, escrevam cartas como antigamente.
Nick guardou seus utensílios e fez um aceno para Perséfone ao cruzar com Dawson na porta.
— Boa noite, Rose.
— Boa noite, Nick.
Dawson chutou a porta com o máximo de delicadeza que conseguiu e passou pela porta com um buquê de rosas vermelhas vibrantes em suas mãos.
— Pega isso aqui mulher! — ele pediu estendendo o buquê para ela — Seu marido que mandou.
— Hades?
— E você tem outro por acaso?
Perséfone Angelle revirou os olhos e permitiu-se observar as flores. Dawson estendeu para ela um cartão preto, ela segurou o buquê em seu braço esquerdo e agarrou o cartão com a mão direita, abrindo-o.
“Querida, Perséfone.
Entrego-lhe estas rosas como um presente. Tenho consciência de que eu mesmo deveria estar entregando-as em suas mãos junto de um carinhoso beijo, afinal, é nosso primeiro mês de casados, mas temo que demorará um bom tempo para isso acontecer. Peço perdão pela minha ausência em uma data como esta, aceite as flores que carregam seu doce nome como um pedido de desculpas.
Se cuide, Little Rose.
Ass. Hades.”
Um pequeno sorriso surgiu em seus lábios ao observar o cartão.
— Little Rose?
Dawson tossiu, chamando a atenção da garota.
— Precisa de alguma coisa?
— Hm… — ela pensou — Na verdade, sim, mas precisará esperar um pouco.
Dawson sentou-se em uma cadeira, cruzou suas pernas e deixou as mãos entrelaçadas em cima do joelho, esperando pela garota. Ela sorriu, deixando as flores ao seu lado e procurou pelos papéis dentro da gaveta da cômoda. Por sorte, encontrou envelopes vermelhos e pretos, papéis, canetas e cera. Perséfone pegou uma caneta dourada de dentro de uma caixa, uma folha de papel e um envelope vermelho, levando-os até a mesa e sentando-se de frente para Dawson.
— Essa caneta é exclusiva, uma herança, eu diria — Dawson contou — Coloque onde estava.
— Não.
— Não?
— Bom, eu me casei com ele — ela respondeu — tudo que o pertence, me pertence.
Um sorriso brincou nos lábios de Dawson ao ver a verdadeira personalidade da garota surgir aos poucos. Ele a observou escrever no papel com delicadeza, a letra cursiva tão bem feita e desenhada que ele mal podia ler. Quando terminou, Perséfone grudou duas pétalas de rosas ao topo da carta e a dobrou, deixando-a dentro do envelope vermelho. Ela pegou a cera de cor preta e pingou sobre o papel, usando um carimbo para deixar o selo com o desenho de uma rosa.
— Isso é para ele — ela entregou — Avise-o que eu irei enviar cartas para ele, nos fins de semana e em todos os dias 25 do mês.
Dawson agarrou o envelope em sua mão e sorriu ao o observar cuidadosamente.
— Certo, ele ficará feliz em recebê-las.
Perséfone novamente voltou sua atenção para as flores, levantando-se da cadeira e indo até a janela com o buquê ainda nos braços. Ela observou as rodas com tanta dedicação e com um brilho intenso no olhar. Dawson podia jurar que a garota estava quase chorando de emoção, somente em ver aquelas rosas.
Ela tinha aversão a rosas.
Porém, aquela foi a primeira vez que alguém lhe deu flores.
— Dawson — ela o chamou, erguendo a atenção das flores e abrindo um sorriso tardiamente — Diga a ele, que eu adorei as rosas.
— Como quiser, Srta. Rose Angelle.
Ela sorriu e abaixou o olhar para as flores outra vez. O som da porta se fechando ecoou após alguns segundos, ela sorriu ainda mais ao ver as rosas vermelhas vibrantes como sangue escuro perfeitamente alinhadas e com um cheiro inebriante. Novamente, ela leu o cartão que lhe foi entregue, vendo a letra perfeitamente alinhada e dedicada, leu e absorveu as palavras novamente, encantando-se com aquele apelido ridículo e adorável.
— Little Rose… — repetiu em um sussurro e riu baixinho — Ridiculamente fofo.
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