Perto das oito da noite o Vicente bateu levemente na porta do quarto. Me aconcheguei melhor na cama e pedi que se sentasse.
-A Aurora pediu que te entregasse isto- falou estendendo uma pequena sacola para mim. Pela minha expressão confusa, ele continuou - Aurora é a minha irmã,vocês se davam muito bem juntas. Ela disse está orando por sua recuperação e quer te ver em breve.
-Ah,que gentileza,sinto muito na- fui interrompida por ele.
-Não precisa se desculpar,está tudo bem. - sorri pequeno.
-Me sinto péssima por não lembrar das pessoas. - solto o ar.
-Você pode conhecê-las novamente. Pode começar do zero e aos poucos.
-Verdade…
Um silêncio perturbador surgiu enquanto eu procurava palavras para iniciar aquela conversa.
- Pedi que viesse porque tenho muito o que te agradecer, Vicente. Sei que ficou ao meu lado  o quanto pôde e enfrentou tempestades por mim.
- Você não tem que fazer isto,Emma.
- Eu preciso,é o mínimo que posso fazer. Sei que arriscou sua vida me tirando do carro,que me protegeu das garras da Celina - respirei fundo - e até mesmo fez um acordo com meu pai.
-Emma…- o interrompi.
-Me deixa continuar,por favor. - por um segundo penso em pôr minha mão sobre a sua,mas não me arrisco - Eu sinto muito por não lembrar de tudo que vivemos juntos. Provavelmente éramos muito felizes - sorri fraco - e é em nome do que vivemos que te peço para não se culpar pela decisão que tomou,eu faria o mesmo em seu lugar.
-Você não abriria mão da gente,Emma,eu sei que não.
- Eu faria qualquer coisa para o seu bem,é isso que eu faria e sei que foi isso que fez por mim.
- Sou grato por me compreender - sinto o calor da sua mão sobre a minha e me vejo naqueles segundos de contato,mas o Vicente se afastou um pouco e se desculpou,então voltei a realidade.
- Eu não quero que as coisas fiquem esquisitas entre nós. Não somos estranhos.
- Não,não somos.
- Eu voltarei para faculdade. Gostaria que lembrasse dessa conversa quando me ver. Soube que somos da mesma turma - sorri fraco.
- Eu estaria mentindo se dissesse que não estou com vontade de te beijar aqui e agora. - sua confissão me pega de surpresa e sinto meu rosto ficar vermelho - mas você está tão perto e ao mesmo tempo tão longe de mim. - seus olhos estavam humidos. - Seria doloroso demais para mim,te ver todos os dias e sentir que você não é mais a minha Emma. Eu não posso fazer isso.
-Espera. Onde quer chegar?
-Darei um tempo na faculdade, é o melhor que posso fazer.
-Você não deve fazer isso por mim, Vicente. - franzi a testa.
-Farei por nós dois. Eu nunca havia pensado na possibilidade de um dia você não lembrar mais de mim. Meu sonho passou a ser te ver acordada novamente,com o sorriso que melhora o dia e o humor de qualquer pessoa,não me importava quanto tempo era preciso esperar. E o que eu tanto desejei durante essas semanas aconteceu, você está bem.
-E você está dizendo que sairá completamente da minha vida - falei com um nó na garganta,aquela decisão me abalava profundamente.
-E isso te magoa?
-Porque não magoaria? Você estava presente nos meus piores momentos,e agora que estou aqui você quer ir embora.
-Não quero que pense que está em dívida comigo. Seja lá o que te disseram eu faria tudo novamente e muito mais sem esperar nada de você.
-E eu te pedir pra ficar não mudará sua decisão?
-Minha decisão é a melhor pra você e pra mim.
-Não pode decidir por mim,eu posso fazer isso.
-Olá - meu pai falou entrando no quarto. Eu não esperei que ele realmente viesse até o hospital antes de voltar para o trabalho.
-Oi,pai. - seco algumas lágrimas rapidamente.
-Olá, Sr.Thomas.
-Atrapalho? - perguntou ainda da porta.
-Não,eu já estava de saída. Tchau,Emma - falou apertando levemente uma das minhas mãos. - chego a abrir a boca mas seria errado pedir que ficasse.
-De alguma forma sinto que não devo deixá-lo ir - falo enquanto o observo sair pela porta.
-O que disse? - meu pai se aproxima.
-Não é nada,só pensei alto.

Dá pra acreditar nessa decisão do Vicente?? 
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