Construção - Parte 4

Mais um personagem que não deveria existir nesse mundo ganhando vida. Mais um para que eu cuidasse. Quer dizer, eu acho que não precisava cuidar de ninguém, mas de certo modo eu me sentia responsável pela existência deles aqui nesse mundo.

Fico bem mais preocupada agora.

Como é que eu vou conseguir dar um jeito de salvar os meus amigos, aprisionar o Bruce e ainda cuidar dessa mulher? Logo ela que parece ser bem frágil e não ter nada de magia...

Já estou em um ponto do meu dia que sei que aquilo não tem mais como ser um pesadelo. Minha consciência me avisa que eu não vou abrir os olhos ao escutar o despertador.

A mulher está olhando para nos dois com uma feição bem assustada. E nem tinha como tirar a razão dela, já que o Lee ainda apontava a lâmina em sua direção. Lee não tinha uma feição muito ameaçadora, mas mesmo assim, tem uma arma mortal apontada em sua direção.

Sem falar nada, a mulher vai se afastando de nós, se arrastando no chão. Lee se aproxima ainda mais dela, e ela, começa a se afastar mais rápido, batendo com certa violência as suas costas nos pés da minha cama.

Ela protege o rosto com uma das mãos e desvia o olhar de nós. Ela realmente estava achando que o Lee faria alguma coisa contra ela. E ele faria se ela fosse uma ameaça.

Mas ela não era uma.

— Pode abaixar a espada Lee. Eu a conheço. Ela não é uma pessoa ruim — falo segurando os braços do Lee, o fazendo abaixar um pouco a guarda.

— Sim... Estava desconfiado, mas queria que você confirmasse... — ele relaxa de vez os seus ombros. — Mas quem é a moça?

— Mais uma vez, não sei como, mas essa mulher é fruto da imaginação do meu chefe... — digo baixo, me aproximando mais do Lee.

— Como assim? Não são somente os seus desenhos?

— Pelo visto não... Eu não sei muita coisa sobre a história do meu chefe, mas alguma coisa dentro de mim diz que ela não é uma ameaça...

— Ela realmente não tem essa áurea. Mas pelo o que eu estou percebendo, ela não é muito de falar, não é mesmo?

— Não... Acho que deve estar assustada com tudo o que a cerca. Você tinha o meu cheiro pra se acalmar, ela não tem nada aqui...

— Entendo... Tessa, acho melhor você fazer a aproximação. Acho que ela não vai conseguir ficar muito calma com o cara que estava apontando uma espada para ela, tentando começar uma conversa.

— Também acho...

Eu vou me aproximando lentamente dela. Ela me olha completamente assustada, mas como não tem como ir para nenhum lugar, ela apenas se encolhe cada vez mais.

Ergo os meus braços, mostrando que não quero fazer mal a ela. Seus olhos passam a me olhar com um pouco mais de cuidado.

Eu olhei umas boas páginas do desenho do Tomás. Eu olhei a sua história e os personagens, mas porque diabos eu não conseguia lembrar do nome dela? Mas vai ver é até bom eu não lembrar, eu iria desconfiar muito mais de uma pessoa que sabe o meu nome aparentemente sem nenhum motivo aparente.

— Calma moça — digo com a voz mais calma que consigo. — Nós não vamos te machucar... Você pode ficar calma. Só pensamos que você fosse uma pessoa que fosse nos fazer mal. Mas você não vai nos fazer mal, não é mesmo?

A mulher continua em silêncio, mas pelo menos agora ela responde alguma coisa. Sua cabeça se move de um lado para o outro, negando. Acho que ela encontra alguma coisa em meus olhos, já que percebo um pouco da tensão que se acumulava em seus ombros desaparecer.

Ela coloca uma mecha de seu cabelo atrás da orelha e me olha com um pouco mais de afinco e curiosidade. Deve ter encontrado algo de bom, pois vejo a sombra de um quase sorriso cruzar o seu rosto.

— Que tal levantarmos do chão? — ofereço a minha mão para ajudá-la a se erguer. Ela começa a estender a mão direita, mas muda rapidamente de ideia a me estende a esquerda.

Acho um pouco estranho, mas mesmo assim a ajudo a levantar.

— Assim é bem melhor — sorrio, tentando fazer com que ela fale mais, mas é em vão.

Vejo o seu rosto se contorcer um pouco e ela parece estar com dor. Olho para o chão e vejo que ela deixou um pequeno rastro de sangue no meu tapete. Na origem do rastro, vejo o meu porta-retratos, um que eu deixava do lado da minha cama, no chão.

Ah, então foi esse o barulho de vidro quebrando. Droga, ela deve ter se cortado.

— Você se machucou não foi? — pergunto. Ela não me responde e parece um pouco envergonhada. Tiro essa sua reação como uma confirmação do seu machucado. — Foi a sua mão direita, certo?

Seus olhos se arregalam um pouco, acho que ela não esperava que eu acertasse. Ela confirma com a cabeça.

Ela não fala muito, mas pelo menos escuta o que falamos.

— Posso ver o ferimento? — peço, estendendo a minha mão para ela. A mulher morde os lábios, mas resolve estender a sua mão direita na minha direção.

O corte em sua palma não era tão grande, mas ao analisar de perto, vi que tinha um pequeno pedaço de vidro preso em sua pele, não parecia que tinha entrado muito fundo, dava pra tirar sem problemas.

— Ah, não parece tão ruim assim... — digo, tentando tranquilizá-la. — Mas vou ter que lavar esse corte, vem cá.

Seguro com delicadeza o seu pulso, sem querer fazer pressão no seu ferimento, e a puxo em direção a cozinha. Mas ela não quer vir. A mulher parece receosa em vir comigo.

Certo.

— Pode não parecer, mas ela sabe cuidar muito bem de ferimentos. Ela tem uma mão suave — Lee fala, e eu sorrio para ele.

— Exato moça. Eu só quero lavar e cuidar desse ferimento. Prometo que é somente isso. Não pretendo fazer nada para te machucar. Se você não cuidar disso agora, ainda vai passar um tempo sangrando...

Acredito que pensando melhor nas minhas palavras, a mulher para de resistir e me acompanha até a cozinha, que era onde eu tinha deixado o kit.

Coloco a sua mão debaixo da pia, e deixo correr um pouco de água por cima do ferimento. Procuro uma pinça dentro do Kit e assim que encontro, retiro o vidro de sua mão. Depois lavo muito bem, passo remédio e enfaixo a sua mão. Faço tudo isso em silêncio.

— Prontinho! — digo assim que termino. Ela tem um sorriso sincero em seu rosto e acho que aquele sorriso é de agradecimento, mas nem assim, ela diz alguma coisa.

Para que eu não me esquecesse que aquilo ali ainda era algo real, meu celular começa a tocar em algum lugar. Sei que ele está perdido em algum lugar dessa bagunça.

Quem será agora?

Antes que eu possa começar a procurar, Lee já vem com o meu aparelho em mãos. Ele segura com cuidado. Assim que me entrega, olho o nome no identificador.

Será que ele deve ter sentido alguma coisa? Era o Tomás.

Mesmo olhando para a mulher que ele tinha criado, estou um pouco na dúvida se atendo a sua ligação ou não. Mas como ele é o meu chefe e eu ainda quero o meu emprego, resolvo atender.

— Olá Tessa! — ele me saúda.

— Oi Tomás! — digo tentando controlar a minha voz. Tinha me afastado um pouco da mulher e do Lee.

— Atrapalho em alguma coisa?

Na realidade, não sei ao certo como eu posso responder a essa pergunta. Atrapalhar? Não sei se essa é a palavra certa, mas com a quantidade de coisa que eu tenho na minha cabeça agora, não quero pensar em outra coisa além de salvar o meu amigo e a minha personagem.

Mesmo com as poucas palavras que eu troquei com o Tomás, acredito que a melhor abordagem que eu posso ter com ele em qualquer momento, é sempre falando a verdade.

Ou pelo menos o que eu posso dizer da verdade agora.

— Um pouco, mas tudo bem Tomás, pode falar...

— Ah, então será melhor eu ligar um outro momento?

— Pode falar agora... Tudo bem. Pra falar a verdade, eu estava mesmo lembrando de você agora...

— Lembrando de mim?! Espero que pelo menos no bom sentido...

— Hmmm, acho que podemos dizer que sim, é bom.

— Maravilha! Mas sim, voltando ao motivo de ter te ligado...

— Você precisa que eu volte ao estúdio? — não sei o que eu faria se ele falasse que sim. Por isso nem respirei enquanto esperava a sua resposta.

— Não é nada disso! Eu te dei o dia de folga. Isso é porque você não me conhece muito, mas eu mantenho a minha palavra.

— Muito obrigada — digo aliviada.

— Pode parecer meio ridículo, e é pra falar a verdade, mas eu estava passando pela sua mesa, e eu fiquei completamente hipnotizado por essa espada dourada... Sei que poderia ter esperado você voltar, mas a minha curiosidade falou mais alto...

— Como? — eu tinha escutado aquilo direito?

— Essa espada dourada... Queria saber onde foi que você comprou... Ela parece tão legítima... Ela é tão brilhante! Desculpe se estou sendo inconveniente...

— Espada dourada? — eu escutei direito dessa vez. Ele realmente falou espada dourada... Não tinha como ser apenas uma coincidência.

— Sim... — ele parece um pouco confuso agora. E com razão, eu mal estou acreditando no que ouço.

— Tomás, você nem imagina como eu fico feliz em saber disso! — digo quase dando pulinhos de empolgação.

— Você não lembrava que tinha trago ela para cá?

— Sim! Não me lembrava onde essa espada tinha ido parar! Ainda bem que estava ai na minha mesa! Será que eu posso passar aí no escritório para pegar a espada?

— Er... Claro... Mas você realmente não vai me dizer onde foi que você comprou essa belezura?

— Um pouco complicado explicar onde foi que eu consegui... Quando eu passar aí pra pegar a espada eu te dou uma versão resumida sobre como eu consegui, pode ser?

— Tudo bem então... — a voz dele sai um pouco esquisita.

Penso um pouco melhor sobre, e acho que ele pode aceitar um pouco melhor sobre a história da espada mágica e tudo o que está acontecendo se ele ver com os seus próprios olhos o desenho que ele fez.

Ou ele aceita mais fácil tudo ou então ele vai enlouquecendo aos poucos, assim como eu.

— Tomás, eu tenho uma coisa para mostrar pra você... — digo para ele, esperando que assim ele consiga se preparar, nem que seja um pouco para ver a mulher dos seus desenhos.

Mas eu sei que isso não é possível, pois ninguém nunca vai estar preparado para ver uma coisa dessa natureza...

— Pra me mostrar? Tá certo então...

— Eu vou sair de casa. Devo chegar aí o mais rápido possível. Questão de minutos acho, isso se o trânsito colaborar.

— Tudo bem. Te espero Tessa — ele parecia um pouco estranho, mas acho que deve ser a curiosidade dele.

Desligo a ligação bem animada. Volto para onde o Lee e a mulher estavam. Os dois estavam em silêncio, mas o Lee parece ser contagiado pela minha alegria, pois sorri comigo.

— Lee, o meu chefe encontrou a espada dourada. Mais uma vez você tinha razão sobre os lugares onde as coisas que eu desenho aparecem, realmente são locais que eu tenho apreço.

— Não disse! E onde a espada estava?

— Na minha mesa no trabalho! E nós vamos lá agora para pegar a espada. Quanto mais magia melhor, não acha?

— Nesse caso sim!

Mesmo sendo uma notícia que não se espera receber, sei que no fundo, depois de passar o susto, ou seja lá qual for a reação do meu chefe, ele vai ficar muito feliz ao ver a sua personagem. Eu ainda estou quase nas nuvens por ter o Lee aqui comigo. Todo desenhista ficaria feliz se pudesse ter essa chance.

Não importando qual seja o personagem. Por isso que estou bem decidida a levá-la ao encontro do Tomás. E ele pronto ou não, estou a caminho!

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