TRIGÉSIMO QUINTO CAPÍTULO
Apesar de termos ido dormir bem tarde, eu me sentia descansado quando acordamos, poucas horas depois. Harry estava cuidando das malas em nosso quarto enquanto eu dava a mistura que os bebês tomavam na mamadeira. Era um conjunto de leite em pó especial, proteínas específicas e, como Lux precisava de atenção dobrada, a mamadeira dela incluía outras coisas mais nutritivas.
Por sorte, os quatros não eram barulhentos e nem brigavam na hora de comer, a única peculiaridade era que Theo recusava-de a se alimentar caso estivesse longe de Diana. Ele ficava manhoso e balbuciava choramingos altos. Por isso, sempre o colocávamos perto da irmã para poder comer.
— Oi, meu bem — falei quando Olivia agarrou o meu dedo. Seus olhos esbugalhados me encaravam com afinco. — Está gostoso?
Como se respondesse, ela sugou mais forte o bico da mamadeira e suspirou ruidosamente. Sorri para ela e troquei o peso do corpo para a outra perna. Theo e Diana ingeriam o líquido meio pastoso da mamadeira enquanto se davam tapinhas fracos e pontapés desajeitados, contrastando à personalidade calma que Lux e Olivia tinham.
Pensar que aquelas quatro criaturinhas estavam dentro de mim havia pouco mais de três meses era surreal. Eu estava encarando quatro partes individuais que tinham feito parte de mim, e agora aquelas coisinhas pequenas estavam livres e dali a alguns anos poderiam decidir sozinhos o que fazer.
Ri baixinho, pensando no quão ansioso eu me sentia por adiantar tanto as coisas. Meus filhotes ainda eram bebês e eu queria aproveitar muito cada fase de suas vidas, o máximo que eu conseguisse, para que pudéssemos construir memórias, em sua maioria, boas. Queria criar um laço onde, se alguém os perguntasse sobre seus pais, eles tivessem lembranças dos momentos de diversão e amor, e não dos momentos de brigas e tensões.
Quando eles terminaram de comer, recolhi todas as mamadeiras e as coloquei num cesto que ficava ao lado do berço. Peguei dois nenéns por vez para limpar e ninar até que voltassem a dormir por mais algum tempo. Com os quatro cochilando de novo, levei o cesto de mamadeiras sujas para a cozinha, as lavei e botei na água quente para esterilizar. Nesse meio-tempo, Meryl e Ethan chegaram.
— Acordou cedo, Louis — a beta apontou enquanto Ethan guardava as coisas dos dois no armário atrás da despensa.
— Harry e eu vamos viajar, então cuidei dos bebês enquanto ele faz as malas — expliquei. — Quer ajuda com o café?
— Não se preocupe — ela me deu um afago na bochecha com um sorriso carinhoso. — Ethan está livre até durante a tarde, então podemos fazer isso sozinhos. Para onde você e Harry vão?
— Hmm — murmurei pensante. Eles eram bons em guardar segredos, com certeza não contariam nada a ninguém. — Quero levar Harry a um lugar especial, onde fomos uma vez. É uma surpresa, então, por favor, mantenha isso só entre nós.
— Um lugar especial, é? — Ethan sorriu quando retornou. — Espero que possam aproveitar esse tempo por lá. Voltarão a tempo para o Natal?
— Sim, estaremos de volta amanhã à tarde, talvez. É algo rápido.
— Vai ser bom ter a casa cheia no Natal — Meryl comentou enquanto colocava dois bules de água para ferver. Um para o chá e o outro para o café, provavelmente.
— Cheia? — Falei, curioso.
Meryl passou-me um pedaço de bolo, o qual eu aceitei de bom grado, e nós sentamos um pouco para comer. Ela e Ethan pareciam mais descansados desde que os bebês tinham nascido, já que todos os problemas mais graves tinham passado e finalmente minha família tinha sido encontrada.
— Harry fica muito solitário nessa casa enorme nos feriados como Natal e Ano-Novo, então Ethan e eu sempre chamamos nossas famílias para cá, a pedido do próprio Harry, então eu, meu marido e meu filho ficamos aqui.
— E eu trago Ophelia e os meninos, que voltam ao país nessas épocas — Ethan completou ao comer uma garfada do bolo. — Quatro dos sete moram na Argentina, e têm família por lá, também.
— Os outros três são mais novos ou algo assim? — Indaguei.
— Não, são todos homens criados, já. Mas preferiram ficar na Inglaterra.
— Entendi. Ah, Meryl — chamei. — Seu marido e seu filho moram fora, também, não é? Lembro-me de você comentar sobre isso.
— Sim — ela sorriu. — Meu marido está na África do Sul e meu filho, na América. Porém, eles já estão com as passagens compradas. Se tudo der certo, chegarão depois de amanhã.
— Fico feliz que estaremos com bastante gente na mansão, então — suspirei em meio a um sorriso. — Preciso acabar de arrumar as coisas. Foi bom conversar com vocês. Vamos comer na estrada, portanto não se preocupem em colocar nossos lugares à mesa.
Dei um beijo na testa de ambos antes de subir até o quarto. O alfa estava tomando banho quando entrei, e percebi que a mala ainda não estava completa. Algumas roupas foram separadas sobre a cama, provavelmente que o alfa arrumaria depois de se lavar.
Para adiantar as coisas, comecei a selecionar as peças e organizá-las na mala. Quando fui guardar o excesso de roupas que não precisaríamos para aquele final de semana, reparei em algo guardado no fundo de uma gaveta que Harry usava para pôr cintos e suspensórios. Sorrindo, peguei o objeto e coloquei no bolso de um de meus casacos, no fundo da mala.
— Amor? — Harry chamou ao sair do banho. — Não precisava ter arrumado tudo, eu poderia ter feito isso.
Dei uma risadinha com o tom magoado do alfa. Ele conseguia ser um bobo, às vezes.
— Não tem problema — peguei seu rosto entre minhas mãos para puxá-lo e beijá-lo. — Vamos nos trocar e levar as coisas para o carro. Me espera enquanto tomo um banho?
— Claro — o corpanzil do alfa ficou mole quando acariciei a cicatriz sobre sua glândula. — Quer que eu separe uma troca de roupa para você?
— Seria bom — concordei. Desvencilhei-me delicadamente de seu abraço para poder ir tomar banho. — Não se preocupe com os bebês, já cuidei deles e provavelmente só acordarão quando já tivermos saído — avisei do banheiro.
— Tudo bem! — Ele cantarolou de volta.
Depois de estarmos vestidos e termos colocado a mala no carro, tomamos café com toda a família reunida a pedido de Anne e Jay, que insistiram para que ficássemos mais um pouco. Os filhotes dormiam após a primeira mamadeira do dia, uma vez que ainda era muito cedo para eles acordarem, e eu agradecia mentalmente por não ter que lidar com aquelas quatro criaturinhas depois de uma noite tão exaustiva. Eles eram muito agitados, e eu não teria energias o bastante para brincar com eles.
— Lou — Doris chamou enquanto saboreava suas panquecas com creme de avelã. — Você e Harry vão voltar, né? Não vão embora pra sempre, né?
Olhei para minha irmã, confuso, ao arrumar uma mecha de seu cabelo.
— É claro que voltaremos para casa. Por que essa pergunta?
A pequena alfa deu de ombros, parecendo cabisbaixa.
— A gente se conheceu não faz tempo. Não quero que você vai embora.
Sorri pequeno por Doris ainda não saber falar direito. Johannah tinha me contado que ela e Ernest, apesar de muito parecidos fisicamente, eram o total oposto quando se dizia respeito a suas personalidades. Ela era bastante comunicativa e extrovertida, já Ernest era bastante reservado e tímido. Ele gostava de Artes, Literatura e História, mas Doris era mais chegada em experimentos químicos e Matemática.
A dificuldade dela em aprender gramática era uma coisa com a qual todos os irmãos mais velhos ajudavam. Suas notas eram ótimas, apesar de não gostar de estudar regras ortográficas e tudo mais. Quando eu me sentava para ajudá-la com o dever que Jay passava para compensar a ausência da escola naqueles dias, era mágico o quanto conseguíamos nos conectar e ter mais intimidade.
— Não vou embora — respondi por fim. Tirei sua franja ruiva de seus olhos. — É só uma viagem curta, e estaremos de volta antes mesmo do meu aniversário.
— Promete? — Doris levantou seu dedo mindinho.
— Prometo — entrelacei nossos dedos como um selar. Imediatamente, o rosto da pequena alfa iluminou-se mais uma vez, e ela voltou a comer.
Antes que eu também terminasse meu café da manhã, notei que Harry estava nos observando com um sorriso no rosto, do outro lado da mesa. O que foi?, indaguei ao franzir as sobrancelhas. Nada demais, só é bom ver que vocês se dão bem, ele respondeu enquanto sua aura brilhava em adoração. Senti minhas bochechas esquentarem, mas sorri ainda assim.
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O pensamento sobre minha mãe e irmãs dizendo que, quando voltássemos, preparariam um jantar para meu aniversário e para a véspera de Natal, como antigamente, pairava em minha mente com tranquilidade enquanto eu dirigia. Seria bom ter um Natal barulhento e agitado depois de tantos anos passando aquele feriado ao lado de Niall, a família de Jimmy e, de vez em quando, transando com Jack. Ser agraciado com a chance de moldar um novo significado para o meu aniversário ao lado da minha família, que tinha até mesmo crescido, era uma coisa que certamente acalentava meu coração.
Harry estava dormindo no banco do passageiro enquanto eu guiava o carro. Tínhamos conversado sobre várias coisas por algum tempo antes de ele pegar no sono, logo, a música tocando na rádio cuidava de fazer-me companhia. As estações mudavam de acordo com os distritos que cruzávamos, mas as músicas eram sempre agradáveis. Em alguns momentos, meus olhos iam até o retrovisor e encaravam o reflexo do tampão do porta-malas, onde nossas coisas estavam. Inconscientemente, eu sorria.
Após algumas horas de viagem, nosso destino mostrou-se presente com uma bela pintura nova, possivelmente feita depois do tempo que passamos ali; desviei meus olhos do chalé de Antonella para acordar Harry. Com delicadeza, passei os dedos em seus cabelos longos, que tinham crescido nos últimos meses o bastante para voltarem ao tamanho original.
— Hazz, amor — chamei. — Acorde. Acabamos de chegar, acorde.
Ele resmungou, espreguiçou-se e coçou seus olhos pequenos de sono. Adorável, pensei sem deixá-lo saber. Harry me olhou confuso, principalmente depois de notar onde estávamos.
— Voltamos para Ambleside? — Falou. — Por quê?
— Eu só quis fazer uma surpresa — dei de ombros. — Vamos, podemos aproveitar esse final de semana antes do Natal.
Ele aceitou aquela resposta, por mais que o vinco entre suas sobrancelhas tivesse permanecido. Tiramos nossas coisas do porta-malas e, quando entramos no chalé, fomos recebidos por Antonella e Mina, que ficaram surpresas ao nos verem ali. Acabamos pegando o mesmo quarto que da última vez, e pedi para Harry subir nossas coisas enquanto eu cuidava do registro da nossa estadia ali.
— Vocês têm alguma coisa em especial, querido? — Antonella perguntou. — Achei que não voltariam aqui tão cedo.
O chalé tinha sofrido uma mudança razoável, principalmente por dentro. Os móveis eram novos e a pintura tinha sido retocada, fazendo com que o tom bege tivesse dado lugar a um lindo tom de laranja claro. Antonella e Mina também estavam um pouco diferentes. A senhoria do chalé parecia bem mais feliz pelo aumento de hóspedes, e Mina tinha feito algumas tatuagens.
— É verdade — a mais nova concordou ao me entregar a folha do registro para eu assinar. — Além disso, você está lindo. Por que não trouxe os bebês? Seria ótimo vê-los — ela sorriu.
— Eu queria ter um tempo só com Harry — entreguei o papel de volta após assiná-lo. — Podemos trazê-los aqui depois do Ano-Novo.
— Bom, porque eu quero vê-los — Mina riu. — Tudo pronto, Louis. O almoço é só daqui duas horas, OK?
— Certo, acho que vamos passear um pouco pela cidade — falei. — Vocês podem me ajudar com uma coisa? — perguntei baixo ao inclinar-me sobre o balcão.
Elas se entreolharam meio desconfiadas, mas concordaram com a cabeça antes de chegarem mais perto. Garanti uma última vez que Harry não tinha voltado para a recepção e, cochichando, comecei a falar:
— Tenho um plano em mente, mas preciso que mantenham segredo…
Após contar o plano para as duas proprietárias do chalé, subi para o quarto que eu dividiria com Harry por aqueles dias. O alfa tinha arrumado nossas coisas nos armários e, por sorte, cheguei a tempo para que ele não tirasse meu casaco de dentro da mala. Troquei o que eu estava usando por aquele, só por precaução, por mais que o objeto que eu tanto queria esconder estivesse bem fundo no bolso interno.
Aproveitamos para dormir até que o almoço estivesse pronto, uma vez que nossa madrugada tinha sido bastante agitada. Harry estava preocupado comigo, além de tudo, dizendo que eu era quem mais precisava dormir e que ele poderia separar um pouco de comida para mim, ou pedir algo, mas consegui convencê-lo que estava tudo bem.
Foi divertido almoçar com os hóspedes que estavam no chalé naquele fim de semana. Era um grupo de jovens universitários que viajaram de Oxford até Ambleside especialmente para passarem os feriados de fim de ano com suas famílias. Parecia que, até um momento futuro que eu não sabia quando chegaria, eu ainda encontraria algumas pessoas grávidas ou muito interessadas em gravidez pois, no meio daqueles estudantes, uma ômega começou a conversar comigo, e foi praticamente impossível ignorar sua imensa barriga.
— Eu não faço ideia de quem seja o pai — ela confessou, mas parecia muito bem com o fato. — Eu não dou a mínima, a bem da verdade — riu. — Vou ser uma boa mãe e, acima de tudo, vou ensinar esses meninos a serem melhor do que o progenitor deles.
— São todos meninos? — Eu quis saber, comendo a sobremesa.
— Sim, toooodos os cinco — a ômega deu dois tapinhas leves sobre sua barriga. — Não sei como irei criá-los, mas acredito que minha família me dê certo suporte. Eles não fazem ideia disso.
— Ninguém mais sabe?!
— Não. Só eu e esses idiotas — ela apontou para os amigos que conversavam animadamente. Dava para sentir que eles tinham muito carinho entre si. — E tudo bem se minha família não quiser saber mais de mim ou dos meus filhotes. Sei que tenho a quem recorrer.
Olhei para a ômega, cujo nome eu sequer sabia, e então para os amigos dela. Eu não os conhecia, mas a julgar pela intimidade que eles tinham, deduzi que, sim, ela tinha mesmo várias opções para pedir ajuda. Até mesmo enxerguei-me nela. Obviamente, tínhamos vivências muito diferentes, porém eu sabia bem o que e como era depender de certo reparo dos amigos.
Desviei meus olhos para Harry, que conversava sobre plantas com Mina e Antonella. Nós não poderíamos oferecer àquela ômega um lugar para ficar, uma vez que ela dependia da faculdade para várias coisas, e viajar uma hora e meia por dia para estudar seria bastante complicado.
— Pode me emprestar seu celular? — Pedi.
A ômega, apesar de um pouco confusa, me entregou o aparelho. Adicionei meu número aos seus contatos, devolvendo logo em seguida. Ela encarou a tela por alguns segundos antes de voltar a me encarar.
— Olha, caso você precise de alguma ajuda, pode me ligar, OK? — Expliquei com um sorriso. — Sei que você tem várias pessoas de mais confiança, mas eu entendo, mais ou menos, as coisas pelas quais você está passando. Confie em mim, com toda sinceridade que um desconhecido pode passar.
Nós demos risadas, e a ômega fitou novamente meu contato salvo em seu celular.
— Louis — murmurou antes de sorrir para mim. — Meu nome é Dorothy. Obrigada por isso, de verdade. Significa muito.
— Não é problema, Dorothy — sorri com ternura.
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Acredito que comemos mais alguns bons pedaços de pudim de leite e tomamos, no mínimo, duas xícaras de chá durante a sobremesa, por insistência de Antonella. Segundo a senhora, eu precisava de muita sustância, ainda que já tivesse dado à luz, para recuperar-me melhor nos primeiros meses. Depois, Harry e eu conseguimos desvencilhar de todos no chalé para irmos passear pela cidade.
De forma surpreendente, Ambleside ficava movimentada no inverno por causa da sua pista de patinação especial de Natal, onde você podia patinar com os duendes do Papai Noel, além de ter um incrível tour de trem pela Cidade do Natal, uma estrutura decorada montada especialmente naquela época. No final, você ganhava um presente especial do próprio Papai Noel.
É claro que, como uma pequena implicância, convenci Harry de irmos em quase todas as atrações da praça principal da cidade. Na patinação no gelo, Harry teve como companhia um duende muito mais alto que ele, sério demais para rir dos desequilíbrios que o alfa sofria, e tampouco riu quando os dois esbarraram com um pinheiro de plástico no centro da pista, o que resultou em Harry caindo de uma forma muito desengonçada. Eu assegurei-me de seu bem-estar antes de cair na gargalhada sobre sua cara de tacho.
Já eu fiquei com uma beta muito simpática me guiando. Ela foi bastante cuidadosa, sobretudo após saber que eu tinha acabado de conceber quatro bebês, então foi fácil evitarmos cair. Quando terminamos o percurso todo, Harry reclamou por alguns minutos sobre seu instrutor, dizendo que “ele era alguém antipático demais para trabalhar com crianças. Ele nem sequer deu um sorriso”.
Para acalmar os ânimos de meu alfa, sugeri que comêssemos algumas mince pies que estavam sendo vendidas nas barraquinhas da praça. Harry mostrou-se um grande fã das tortinhas, portanto combinamos de prepará-las em casa, quando voltássemos para Londres.
— Louis — ele chamou enquanto caminhávamos de volta para o chalé.
— Hum?
— Por que viemos para Ambleside?
Suspirei, tentando não parecer ansioso demais.
— Nada em especial, eu só quis passar um tempo com você num lugar bacana antes da mansão ficar cheia de gente — dei de ombros. — Mais do que já está — acrescentei antes de rir.
Continuamos o resto do caminho compartilhando um silêncio agradável, com poucas interrupções para conversar sobre coisas banais ou sobre algo que observávamos pelas ruelas da cidade. Era tudo bastante simples por lá, além de exalar uma energia acolhedora em quase todos os estabelecimentos.
Quando estivermos velhos e aposentados, não seria uma má ideia morarmos num lugar mais tranquilo do que Londres, pensei comigo mesmo ao observar um homem tirar a neve da calha de seu telhado junto com a filha.
Ao chegarmos ao chalé de Antonella, já era próximo da hora da janta. Pedi para que Harry preparasse a banheira para nós enquanto eu checava o cardápio com Mina e, mesmo que meu alfa tivesse estranhado aquilo, obedeceu sem questionar. Na realidade, eu estava indo confirmar com a beta se tudo o que eu havia pedido tinha sido comprado.
Com a confirmação de que, sim, as coisas estavam quase todas prontas, subi ansioso para o quarto. Harry tinha até mesmo separado uma troca de roupa para nós, e uma sensação quente tomou meu peito. Depois de tanto tempo na escuridão, perceber que eu poderia sempre contar com ele para ter amor e admiração era a melhor coisa para me reerguer.
— O que é o jantar? — Perguntou com sua voz grossa ao sair do banheiro. — Já está tudo pronto. Vem cá.
— Peixe e massa — respondi ao me aproximar dele, sempre tendo seus orbes verdes sobre mim.
Cruzei meus braços entre nós, pedindo silenciosamente para que apenas ele me envolvesse. E assim foi.
— Lobo preguiçoso — Harry riu sutilmente antes de me levantar no colo.
Fazendo tudo com bastante delicadeza, meu alfa sentou-me sobre a pia do banheiro e despiu-me. Pedi para que ele colocasse meu casaco sobre a cama, pois gostava bastante dele e queria usá-lo depois. Tendo retornado a mim, Harry também tirou suas próprias roupas. Desviei meus olhos, acometido por uma timidez sem sentido e inesperada, vendo que a banheira do chalé também tinha sido trocada por uma maior.
Pelo cheiro, Harry colocara alguns sais de banho e florais, e o vapor da água quente transportava aqueles aromas de uma forma quase imperceptível. Fechei minhas pálpebras, aproveitando a quentura do ambiente para tentar relaxar um pouco. Eu estava prestes a fazer algo grandioso, e aquela ansiedade tinha se manifestado em tensões por todo o meu corpo durante o dia.
Sobressaltei-me ao sentir os braços de Harry envolverem meu corpo mais uma vez, agora para submergir nossos corpos na banheira. O contato entre minha pele fria e a água quente fez com que calafrios me acometessem, porém tão rápido como me assustei, meu corpo deleitou-se. Harry colocou-me entre suas pernas, de costas para ele, e permiti-me relaxar contra seu tronco firme.
— Você é tão bonito, ômega — murmurou ao esconder o rosto na curva de meu pescoço. — A obra de arte mais bonita que o universo poderia criar.
— Não seja bobo, alfa — dei risada.
Ele rosnou baixinho e me apertou mais um pouco.
— Não deboche. Você é perfeito, deveria ser impossível você não conseguir enxergar isso.
— Gosto de saber que sou assim para você, então — admiti, meio constrangido e surpreso.
— Louis — Harry chamou. Virei meu pescoço para vê-lo. — Bastou um único olhar, desde o começo, para eu saber que estaria perdido. A mais bonita perdição que eu poderia ter, tenho certeza de uma coisa: eu nunca mais quero me encontrar.
Uma ardência irritante pinicou meus olhos, que começavam a marejar. Harry era meu porto seguro, mesmo depois de tantos conflitos que tivemos no começo. Com total firmeza, eu podia dizer que aquele alfa era uma das pessoas mais importantes para mim e que, perto dele, todos os problemas pareciam simplesmente sumir.
Com destreza, virei-me para poder sentar-me sobre seu colo, de frente para ele. Nossos lábios se tocaram com uma voracidade velada, contida ao ponto de a excitação vir rapidamente até nós. Mas, para o meu plano dar certo, eu precisava que Harry não ficasse muito cansado, então mesmo que sua glande tocando minha entrada estivesse sendo uma enorme tentação, separei-nos com beijinhos.
— Não quer? — Ele perguntou com as sobrancelhas franzidas. Achei fofo o jeito que seu beiço se projetou num biquinho manhoso. — Estou fedendo?
Soltei uma risada gostosa antes de negar com a cabeça e dá-lo mais um beijo rápido.
— Não, Hazz, não está — mordi o lábio. — Só quero jantar primeiro.
Ainda meio amuado, Harry concordou. Nós terminamos nosso banho com mais algumas mãos bobas indo e vindo, mas nada muito além daquilo e de beijos mais quentes. Meu corpo respondia a cada toque dele, porém eu precisava mantê-lo um pouco distante; ao menos por mais alguns minutos.
Vestimos roupas quentes, e eu tomei cuidado para não esquecer de colocar o mesmo casaco de antes. Estando prontos, descemos as escadas até a recepção mais uma vez, entretanto impedi que Harry continuasse andando até a sala de refeições ao segurar seu pulso. O alfa me deu um olhar confuso, e apenas consegui sorrir um pouco encabulado por não saber exatamente o que falar.
— Eu sabia — ele disse, desfazendo sua carranca para me dar um sorriso leve.
— O quê? — Agora, eu era quem estava confuso.
— Desde ontem você esteve agindo estranho sobre essa viagem, e hoje continuou omitindo algumas coisas de mim — explicou simplório. O alfa soltou-se de minha mão para poder entrelaçar nossos dedos. — Esqueceu que nos marcamos, Lou? Eu sinto as coisas tanto quanto você.
Abri e fechei a boca várias vezes, procurando algo para falar. Eu tinha esquecido que nossa conexão era forte o bastante para possibilitá-lo de ver uma parte de minha aura, então as palavras simplesmente sumiram de minha mente. Acabei por rir baixinho, envergonhado.
— Opa, parece que fui pego — beijei as costas de sua mão, encostando meus lábios em seus dedos enfeitados pelos anéis. — Era para ser surpresa, mas tudo bem. Pode fechar seus olhos e só abri-los quando eu pedir?
Harry franziu o cenho, e mesmo que ele tenha perguntado sobre aquilo, apenas pedi mais uma vez para que ele confiasse em mim e tapasse os olhos. O alfa obedeceu, permitindo-me ficar atrás de seu corpo para pôr minhas mãos sobre seus olhos fechados, e quando passamos em frente às portas de vidro da sala de refeições, Mina ergueu os dedões num sinal de que tudo estava pronto.
Durante o trajeto até a cabana que ficava aos fundos do terreno do chalé, Harry insistiu em tentar adivinhar o que estava acontecendo, o que nos causou boas risadas ao que ele perguntava se eu iria matá-lo, se iríamos transar em algum local público e todo tipo a mais de asneira. Era complicado andar atrás dele com a neve atrapalhando, além de que eu era relativamente mais baixo do que Harry, mas apoiar meu peso em seu corpo facilitava um pouco.
Estava bastante frio do lado de fora do chalé de Antonella, porém Mina tinha me garantido que o aquecedor da cabana estava funcionando especialmente para nós naquela noite, então agradeci mentalmente quando chegamos.
Era uma cabana de madeira suspensa por pilares acima do nível do rio que passava ao pé da montanha, portanto era naturalmente mais frio ali. O aquecedor ficava do lado de fora, coberto por uma estrutura planejada para que as chuvas e os dias de neve não estragassem o aparelho. As luzes lá dentro estavam acesas e o cheiro da comida estava suave do lado de fora, o bastante para que o nariz comum de Harry não captasse, mas consegui senti-lo.
— Chegamos? — Ele quis saber. — Posso ver? Está congelando aqui, Louis.
— Espera um pouco. Não abra os olhos.
Eu sabia que Harry realmente não os abriria, então tirei as mãos de seu rosto para abrir a porta. Estava tudo perfeito, com a mesa posta, os cobertores formando uma espécie de colchão grande e macio no canto próximo à porta de vidro que dava acesso à varanda dos fundos, além das velas perfumadas. Eu com certeza agradeceria muito a Mina e Antonella por aquilo, e também daria um presente para elas.
Virei-me para meu alfa, mordendo os lábios em ansiedade. Ele estava parado próximo à porta, com as sobrancelhas franzidas, olhos ainda fechados e as mãos se esfregando para se aquecer. Com as bochechas rosadas daquela forma, Harry quase parecia uma criança.
Peguei seu pulso delicadamente, o trazendo para dentro da cabana antes de fechar a porta para impedir que a neve e o frio impregnassem o lugar.
— Tudo bem — falei, porém mais pareceu um sussurro alto. — Pode abrir.
Aos poucos, Harry abriu suas pálpebras, e pude notar que suas pupilas diminuíram um pouco pelo desconforto pela meia-luz amarelada das velas. A transição entre a confusão e a admiração de sua expressão deu-me uma sensação de orgulho muito boa por ter conseguido surpreendê-lo.
— Louis — Harry arfou após alguns segundos. — O que é isso?
— Eu sei que foi bem em cima da hora que viemos para cá — eu comecei a explicar, coçando a nuca. — Mas, eu quis fazer algo bonito para curtirmos nossa companhia a sós, pelo menos um pouco, principalmente depois do nascimento dos filhotes e a casa cheia como está. Você… Gostou?
Harry fitou-me, parecendo processar aquela pergunta. Por fim, ele veio até mim para envolver-me em um dos abraços mais sinceros e apertados que eu já recebera em toda minha vida. Mesmo um pouco atordoado, agarrei seu casaco ao retribuir. Senti-me em casa.
— É claro que eu gostei, Lou — pude notar que sua voz estava um pouco embargada. — Obrigado, sweetcheeks. De verdade, acho que nunca poderia te retribuir o suficiente. Você é incrível.
Desfizemos o abraço para darmos um beijo verdadeiramente apaixonado e, depois, nos sentamos à mesa para comer. Eu tinha oferecido pagar Antonella e Mina para que elas me ajudassem com aquele jantar, mas as duas teimaram em fazer daquilo um presente para nós — com exceção das bebidas alcoólicas e da carne, que eram as coisas mais caras e, portanto, paguei mesmo com as insistências delas.
Comemos com muito apreço a janta que tinham preparado. Um delicioso purê de batatas com aipo, carne e uma salada com vegetais e frutas. Eu não sabia como aquela mistura poderia ser boa, porém rendi-me ao sabor agridoce que ela trouxe à minha boca. Nós tomamos champanhe, também, pois eu queria experimentar aquilo pela primeira vez. Mina comprara um de pêssego, e mesmo não tendo muitas expectativas sobre uma bebida com baixo teor alcoólico e cheia de bolhas, foi algo realmente gostoso.
Depois de jantarmos, colocamos algumas músicas na antiga jukebox da cabana e dançamos ao som das melhores canções românticas de Elvis Presley, Whitney Houston e, quando The Manhattans começaram a cantar Shining Star, eu e Harry nos abraçamos para dançarmos colados um ao outro. O cheiro dele era tão bom ao misturar seus hormônios com seu perfume preferido e o sabonete que foi quase impossível não suspirar para pegar mais dele.
— Hazz — chamei-o sentindo meu corpo entorpecido. — Você me ama, não é?
O alfa riu suavemente, apertando-me um pouco mais em seus braços.
— É claro que amo, Louis. Por quê?
A bem da verdade, esperei que minha ansiedade fosse maior quando, tomado por um ímpeto de coragem e euforia, enfiei a mão dentro do bolso do casaco e segurei entre meus dedos o objeto que mantive em segredo desde a noite anterior.
Com delicadeza, empurrei o corpanzil de meu alfa para trás a fim de que ele sentasse no montante de cobertores e edredons. Nitidamente, seus olhos brilharam em confusão, mas aquilo logo mudou para certa expectativa quando eu me sentei sobre suas pernas. Quase que na mesma hora, suas mãos cheias de anéis alcançaram minhas coxas, mas não fizeram nada além por não ter permissão.
— Eu quero falar algumas coisas e, talvez, demore, então peço para que me escute sem interromper, OK? — Mordisquei meu lábio inferior.
Um vinco formou-se entre as sobrancelhas de Harry. Sua aura amuou-se por nervosismo, mas mantive-me firme para não perder a calma naquela situação.
— Tudo bem… Eu preciso me preocupar? — Ele riu esganiçado, porém engoliu em seco.
— Não — sorri antes de me inclinar para bicar seus lábios. — Não precisa. Só quero que você não diga nada até eu acabar.
— OK, eu não vou — Harry concordou com a cabeça.
Puxei um longo fôlego e estralei o pescoço.
— Há uns meses, você me pediu em casamento e, para ser honesto, eu surtei. Existiam muitas coisas acontecendo naquele momento, e saber que eu estaria noivo poderia ser um tipo de... Alavanca? Acho que essa é a palavra. Enfim, serviria como uma alavanca para que eu nutrisse uma ansiedade que me faria pensar de forma negativa sobre o nosso noivado. E eu não queria ter nenhum tipo de pensamento negativo sobre nós. Especialmente naquela época.
“Então, eu recusei. No final das contas, passamos por toda aquela merda e ficamos bem, tivemos nossos filhotes e, agora, nossas famílias estão juntas. Sinceramente, eu nunca nutri muitas esperanças — sequer cogitei a ideia, na verdade — de que elas estivessem vivas. Nunca achei, antes, que poderíamos conquistar tudo isso juntos.
“Nós mudamos bastante desde o começo, quando eu cheguei à mansão. Eu te achava um completo estúpido, e por mais que sua mudança repentina tenha me assustado um pouco, foi ótimo quando nos demos bem. E, como eu disse na noite em que fomos ao cinema, você entendeu seus erros, se redimiu enquanto me permitia entrar na sua vida, depois de muito tempo não tendo confiança nas pessoas para isso. E sou tão grato por ter tido essa chance... Você não tem ideia, Harry.
“O ponto no qual eu estou querendo chegar é, observando você, aprendi muito sobre mim mesmo. Suas mudanças, por mais que pequenas e graduais, serviram para que eu mesmo pudesse evoluir. Aprendi a ter mais paciência, e a parar de julgar as pessoas sem saber de suas vidas. Eu condenava quem fazia isso, e sequer percebi que era uma dessas pessoas. Você me ajudou, direta ou indiretamente, entende?
“Agora que as coisas mais pesadas passaram, e que enfim temos tudo nos eixos de novo, acho que eu estou pronto para avançar mais esse degrau.”
Harry chorava. Após ouvir tudo, meu alfa estava emotivo e com as bochechas molhadas pelas lágrimas. Seus olhos apresentavam-se tão profundos pela vermelhidão da pele irritada que o verde de suas íris parecia muito mais viçoso. Agora, sim, meu coração palpitava fortemente dentro de meu peito, o que julguei ser uma possível taquicardia. Mordi o interior da bochecha, fechando os olhos por apenas alguns segundos.
— Acho que me embolei demais — eu ri enquanto secava minhas próprias bochechas com uma mão, apenas então percebendo que ainda mantinha meus dedos fechados em meu bolso. Tirei de lá a caixinha com a aliança que Harry havia comprado, meses atrás. — De toda forma… Aceita casar comigo, Harry? Dessa vez para valer?
Era um pouco doloroso, para mim, observar o quão vermelho todas as partes do rosto dele estavam. Testa, bochechas, olhos, boca. Era como um menininho feliz. Ele separou seus lábios, fazendo-me notar o quão apertados eles estavam, antes, um contra o outro, e foi como se Harry estivesse procurando palavras. Entretanto, numa atitude inesperada, o alfa inclinou seu corpo para frente e me abraçou tão forte que foi impossível evitar de arfar alto.
— É claro que eu aceito, Louis — ele soluçou.
A partir dali, o interior da cabana pareceu implodir para uma bolha só nossa, cheia de amor, calor e sensibilidade. Era como se cada célula do meu corpo sentisse o toque de Harry, e clamasse por mais.
Aos prantos, nos distanciamos somente para nos beijar e colocar as alianças. A minha, de duas camadas e adornada, tinha uma pedra delicada e que refletia um azul-claro bonito. A dele era robusta, porém a prata era tão fina quanto a minha, além de uma pedra semelhante estar cravada em meio a alguns desenhos ornamentais sem uma forma certa.
Mal notei as lágrimas engrossando ao observar nossas mãos juntas. Era algo tão surreal. Meu único instinto foi subir minha boca até a sua para beijá-lo, de novo e de novo, desejando ser capaz de transmitir pelo menos metade das coisas que eu sentia.
— Harry — chamei. Paramos o beijo, mas nossos lábios raspavam suaves um no outro pela mínima distância que colocamos entre eles. — Faça amor comigo, por favor.
Com fervor, o alfa aceitou e voltamos a nos juntar, despejando em nossos corpos todo o amor que sentíamos um pelo outro.
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Só mais dois capítulos até a história principal terminar, mas lembrem-se que ainda teremos os capítulos extras!
Não esqueça de VOTAR e COMENTAR para eu saber como estamos indo até aqui. Além de ajudar a fanfic, isso me deixa muuuuito feliz :)
Até o próximo, amo vocês ♡
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