Angel Of Death
Suga foi convocado para sua primeira missão dentro do seu pelotão de fuzileiros na próxima madrugada. Era só uma missão de reconhecimento, mas ainda assim era empolgante, eles treinaram por tanto tempo que ele não sabia se um dia isso ia realmente aconteceria.
Parecia crueldade sair por um bairro estrangeiro com um alvo apontado para o inimigo, mas ele só queria entrar em ação, mesmo que fosse para ficar numa montanha vigiando um prédio abandonado.
Ele não conseguiu dormir depois que voltou da reunião de planejamento e estratégia. Suga foi escalado para comandar sua primeira equipe e ele nem estaria em ação, estaria à quilômetros de distância olhando pelos garotos em terra.
Suga pegou seu cigarro na mesa de alumínio ao lado do beliche e atravessou o corredor estreito do navio até o ar livre.
O mar era fascinante e Suga sempre amaria aquilo, mas a sensação flutuante e claustrofóbica que o navio dava do lado de dentro era aterrorizadora, era como se te colocassem numa caixa de 2x2 m2 e o jogasse no fundo do oceano, se as portas não batessem constantemente ele definitivamente pediria para que ela se mantivesse aberta, mas não é como se claustrofobia fosse algo considerado como prioridade no exército.
- O que faz aqui tão tarde? – JHope perguntou detrás de Suga.
Suga jogou o cigarro no mar e se virou prestando reverência ao seu superior.
- Descansar. - JHope falou sorrindo enquanto via Suga voltar a sua posição inclinada no deck do navio.
- Na verdade é cedo Senhor. – Suga falou apontando para o céu se tornando alaranjado.
- Você vai levar um recruta como olheiro hoje. – JHope falou deixando Suga tenso com a informação.
Uma pessoa para ele ficar de babá só atrapalha numa missão.
- Permissão para declinar senhor. – Suga pediu tentando ao máximo não implorar.
- Permissão recusada soldado. – JHope falou rindo ao dar uns tapinhas amigáveis nas costas do garoto.
Suga desrespeitou um oficial ao impedi-lo de agredir um recruta que não conseguiu completar uma das atividades de resistência durante o treinamento em mar aberto. Uns o chamavam de corajoso por ser impor a alguém que abusava de seu poder de patente, outros o chamavam de arruaceiro e desrespeitoso. De qualquer forma, Suga sofria as piores tarefas designadas desde então, desde a limpar banheiros ou até desentupi-los. Ficar com o recruta que todo mundo deveria ter passado para frente até chegar nele, era só mais um deles. Ele obviamente fingia não se importar com nada disso, mas realmente o incomodava ser punido por defender o que acreditava.
Ele acendeu outro cigarro, relaxando com a visão do sol nascendo, mas se distraiu com um garoto sentado numa prancha no meio da imensidão negra que Suga sempre achou assustadora.
Suga já tinha ouvido falar sobre soldados que entravam no mar durante as paradas para equalizar a água do compartimento de flutuação, mas nunca tinha visto um. Ele nunca entendeu porque a prancha, no entanto. Não é como se ondas se quebrassem com frequência em alto mar.
O garoto nadou de volta, subindo as escadas de embarque com dificuldade por causa da prancha. Suga não conseguiu deixar de acompanhar a jornada do garoto.
Ele tinha cabelos pretos que brilhavam diante a luz do sol nascente. Ele se perguntou se era estranho conseguir enxergar gotas de água despontando do seu cabelo molhado e que brilhavam como pérolas nas pontas grossas das mechas pretas.
- Olá. – O garoto falou ao se aproximar.
Suga viu ele andando em sua direção, mas por algum motivo estranho ele se distraiu com o garoto jogando os cabelos molhados para trás com sua mão livre e não notou a proximidade.
- Dahyun. – Ele falou sorrindo, ignorando por completo a posição estática de Suga ao oferecer sua mão para cumprimentá-lo.
- Yoongi. – Suga falou depois que voltou a si.
- O Sniper? – Dahyun perguntou surpreso com a informação, abrindo um sorriso ainda maior quando Suga confirmou com a cabeça.
- Vou trabalhar com o senhor hoje a noite. – Dahyun falou parecendo bem empolgado com a ideia.
- O recruta? – Suga enrugou a testa.
- Também conhecido como olheiro. – Dahyun falou virando a cabeça para trás ao ser chamado por um outro surfista que tinha acabado de subir as escadas de embarque, Suga não tinha reparado que tinha mais alguém no mar além de Dahyun.
- Preciso ir. – Dahyun lembrou de o cumprimentar respeitoso, coisa que esqueceu de fazer ao se aproximar antes e saiu correndo.
Suga jogou a bituca do cigarro fora e voltou para dentro do navio já que tinha dado o horário do café da manhã e logo começariam as reuniões sobre a missão.
...
Já tinham passado alguns meses em que Suga trabalhava em missões em terra na zona de guerra em Sarajevo, Bósnia ao lado do seu fiel olheiro Dahyun.
Os dois pareciam cada dia mais grudados um ao outro. No quartel provisório em terra Suga era conhecido como anjo da guarda por nunca ter perdido um homem durante suas vigilâncias de reconhecimento, que limpava uma área hostil para os soldados do exército americano poderem seguir caminho sem ameaças durante o trajeto.
Os soldados da divisão do exército nos quais a equipe de fuzileiros de Suga ficaram encarregados os chamavam de faxineiros e nunca houve nenhum incidente depois que eles passavam por ali.
- O que você tem hoje Suga? – Dahyun perguntou sentando ao seu lado numa mureta de vigília do quartel que eles apelidaram de farol.
- Só preocupado com a missão de hoje e não me chama assim recruta. – Suga falou sério para Dahyun.
- Sim, senhor. – Dahyun se desculpou realmente preocupado por ter passado dos limites, mas Suga sorriu e bagunçou os cabelos do garoto que o olhava com aquele olhar de um filhote que tinha acabado de apanhar. – Eu não sou mais um recruta sabe. – Dahyun resmungou fazendo Suga dar seu sorriso gengival que foi o que fez Dahyun dar o apelido de Suga para começo de conversa.
- Por que está preocupado? Os drones não pegaram nenhuma atividade no lugar, é só um monte de casas abandonadas. – Dahyun falou tentando tranquilizar Suga.
- Esse é o problema, é o vilarejo principal antes da zona em guerra, não faz sentido nenhum eles não usarem aquilo de base para impedir o inimigo de ultrapassar. Seria o movimento mais lógico, até porque não tem nenhum outro caminho de fácil acesso para lá. – Suga falou entregando as fotos aéreas que o drone tirou do local.
- Onde vamos ficar? – Dahyun perguntou vendo Suga bater com o dedo numa área coberta por mata rasteira, não muito longe do vilarejo.
- Perto assim?
Suga concordou distraído.
- Te vejo mais tarde irmão. – Dahyun levantou vendo que Suga queria ficar sozinho e foi se preparar para a missão, ele sempre fazia isso com horas de antecedência por ser um enorme desastrado.
...
1.06,257 à norte, vento sul 2km, curva de ângulo em 1,5 mm, Dahyun falou com os binóculos eletrônicos que forneciam os dados.
- Alvo localizado, permissão para atirar. – Suga falou no rádio, ouvindo a concessão de volta.
Suga puxou o ar, ajeitando o fusível de quase 5 quilos apoiados em seu ombro direito e arrumou a precisão da arma com os cálculos que Dahyun lhe passou, soltando o ar ao mesmo tempo em que atirou e acertou o alvo que vigiava a estrada de cima do telhado com uma espingarda de cano longo, mas de curto alcance.
A equipe de limpeza seguiu em Terra enquanto Suga vasculhava o perímetro com a mira da arma.
- O que é isso? – Suga perguntou batendo com os dedos no papel que Dahyun andou carregando a semana inteira, o amassando no bolso sempre que Suga tentava olhar.
- Uma tatuagem que eu estou pensando em fazer.
Suga soltou uma risada divertida ao mesmo tempo que focava a arma para uma janela com um movimento incomum longe de onde sua equipe entrava para vasculhar, mas no caminho deles o suficiente para ele verificar.
- Você? O santo Dahyun quer uma tatuagem? – Suga negou com a cabeça enquanto mandava o menor focar na janela com os binóculos.
- Não sei porque me chamam de santo, não é porque eu não vou aos bares de strippers com vocês que eu sou santo. – Dahyun falou triste.
O movimento da janela parou, era provavelmente só alguém curioso. Suga voltou a vasculhar as redondezas, depois de repassar a atividade suspeita ser alarme falso no rádio. O lugar realmente parecia abandonado.
- Por que você acha que eu não vou a esses lugares? – Dahyun perguntou receoso em tocar no assunto, mas não se segurando o suficiente para se manter calado.
- Porque você é gay e não quer que ninguém saiba. – Suga falou se distraindo com outro ponto numa elevação alta do vilarejo.
- Visão de atirador à 1.06,167 norte, permissão para atirar. – Suga pediu no rádio, notando que o atirador estava bem disfarçado, mas esqueceu de verificar a direção da refração da luz da cidade que fazia seus binóculos brilharem como espelho no sol, vez ou outra.
- Permissão concedida.
Suga atirou na cabeça do alvo torcendo para que ele não sofresse muito, apesar dele ter certeza de que foi morte certa, mesmo daquela distância.
- Você tem que parar de ficar com dó depois que atira Suga. – Dahyun falou vendo a expressão de Suga.
- Para de me chamar assim e desculpa se eu fico um pouco chateado depois que atiro na cabeça de um ser humano. – Suga falou irritado. – Agora, deixa eu ver essa tatuagem. – Suga pediu a folha para o garoto a colocando no bolso para ver mais tarde, ele não estava interessado, mas sempre tentava amenizar as broncas que dava em Dahyun. O garoto sempre seria seu ponto fraco.
- Ele é um terrorista, Hyung. – Dahyun falou massageando o ombro de Suga que apoiava todo o peso da arma.
- Ele era um ser humano como eu, não tenho direito sobre isso mais do que ele tem. – Suga falou, mas sorriu doce para o garoto antes de voltar a varrer o perímetro do começo, já que tinha rodeado todo o vilarejo.
- Se você sabe que sou gay, por que não me denunciou? – Dahyun perguntou para Suga depois de um tempo.
- Porque não me importa sua opção sexual e não deveria importar para o exército americano também. – Suga falou imaginando que Dahyun sorria do seu lado.
- Você acha que um dia vai se apaixonar por alguém, casar e ser feliz? – Suga perguntou pensativo, se pegando estranhando a movimentação daquela mesma janela, apesar de não reportar pelo rádio, ele pareceria um neurótico se reportasse a mesma merda.
- Eu acho que eu tenho que beijar primeiro. – Dahyun sussurrou.
Suga arregalou os olhos, o olhando por um segundo antes de voltar a atenção no trabalho.
- Nunca beijou na vida? Quanto anos você tem? – Suga perguntou, mas Dahyun não pôde responder, pois um tiroteio começou a soar pelo rádio.
Suga estava tão acostumado com a arma como seu terceiro olho que foi automático virar a lente para onde a sua equipe seguia a pé.
A visão não era clara para ele, porque a área era grande demais e o Sniper responsável por acompanhar a equipe estava do lado oposto deles.
Suga mirou na elevação onde o outro Sniper deveria estar.
- Droga. – Suga xingou baixo vendo seu atirador morto.
- É uma armadilha, permissão para alterar minha posição. – Suga pediu no rádio, mas não teve resposta.
- É questão de tempo nos acharem, eles estavam esperando a equipe chegar no centro do vilarejo. – Suga falou se preparando para mover, mesmo sem ordem.
- Hyung. – Dahyun chamou entregando o binóculo para Suga e passando a posição para olhar.
A maldita casa em que Suga tinha visto uma movimentação estranha agora chovia de hostis, saindo por todos os lados.
Era bem no meio do vilarejo, o que significava que morreriam civis se armassem fogo ali. Suga não podia deixar aquilo acontecer. Ele olhou sua equipe sendo alvejada, eles tinham o carro tanque como proteção, mas era questão de tempo.
- O que foi? – Dahyun perguntou reconhecendo aquela feição de Suga.
- Tive uma ideia suicida. – Suga falou sorrindo maldosamente para Dahyun.
- Aih Deus! A gente vai morrer não vai? – Dahyun perguntou pegando o binóculo de volta.
- Provavelmente. – Suga falou pegando o rifle assim que deitou de volta no chão. – Tem algum atirador nos caçando agora e é questão de tempo para ele nos achar. – Suga falou pedindo a velocidade do vento para a localização em que apontava.
Dahyun pegou a mensagem ao calcular o ângulo do projétil.
- Se atirarmos no máximo de hostis possíveis, podemos liberar passagem para nossos homens.
- Vale mais salvar oito do que dois. – Dahyun falou montando o fusível reserva.
- O que pensa que está fazendo? – Suga perguntou começando a atirar em curva para enganar o atirador que o caçava.
Ia ser quase impossível definir de onde a bala vinha se ela viesse em curvas.
- Se for para morrer, eu prefiro que seja atirando, senhor. – Dahyun falou atirando em curva como Suga vinha lhe ensinando nas últimas semanas, o garoto ainda não era tão bom, errando alguns alvos de início, mas era promissor.
- Rápido e limpo, bom garoto. – Suga falou sorrindo com os alvos atingidos de Dahyun.
- Para de me agradar Suga.
- Um elogio e lá se vai o respeito. – Suga brigou, mas sorria apesar do medo de enfrentar a morte com o abuso da sorte.
Ele passou um rádio avisando a área que tinha aberto para sua equipe conseguir sair da cidade, mas o sorriso e a adrenalina morreram ao ver uma criança morta, caída numa poça de água ao lado da sua mãe chorando em cima do corpo.
Suga mal teve tempo de se sentir mal com aquilo, porque foi no exato momento que Dahyun xingou um "porra" baixo e soltou a arma para olhar para o maior.
- Bala reta? – Suga perguntou vendo o menor confirmar assim que um tiro atingiu a lateral do ombro de Suga de raspão.
- Corre. – Suga ordenou, vendo Dahyun correr para área aberta que antecede o jipe, que estava escondido por uma ondulação no deserto ao lado da vegetação rasa em que eles se escondiam.
Suga atirou no alvo que atirava nele, mas virou alvo fácil ali enquanto protegia Dahyun de virar atenção do segundo atirador que ele ainda não tinha encontrado.
- Bala curva ao sul. – Dahyun avisou pelo rádio fazendo Suga acreditar que ele já tinha chegado no jipe.
Suga ouviu uma explosão, mas não soube dizer de onde vinha.
Ele mudou os cálculos pegando as duas possíveis dimensões anguladas até achar o segundo atirador e o matou.
Suga correu sem defesa na direção do jipe, mas ver o corpo de Dahyun caído no chão o fez largar sua arma ao lado do corpo mesmo assim.
- Dahyun? – Suga chamou arrastando o garoto pela areia até ficar atrás do jipe em chamas.
Dahyun gritou com dor pelo seu corpo sendo arrastado na areia fina, mas sorriu ao reconhecer Suga em cima dele no minuto seguinte.
- Você vai ficar bem. – ele falou distraído com lágrimas nos olhos enquanto tirava a própria jaqueta para tampar os buracos que derramavam sangue do peito do menor, tinha estilhaço de vidro por todo corpo de Dahyun.
Suga olhou o carro em chamas ao lado, possivelmente feito por uma bazuca.
- Por que diabos você parece uma peneira? – Suga gritou com lágrimas caindo dos olhos e se misturando com a saliva que escorria da boca.
Ele limpou a boca com o antebraço enquanto pedia resgate aéreo, eles estavam isolados então não seria uma ameaça irem até eles.
- Você precisava matá-lo, Hyung. – Dahyun falou tossindo sangue pela boca enquanto sorria.
Suga arregalou os olhos percebendo que ele descobriu a projeção da bala por se expor como alvo para que Suga tivesse chance de sair vivo dali.
- Você me salvou. – Suga falou rindo através das lágrimas enquanto ouvia pelo rádio que o resgate seria por terra e lhe passando as coordenadas para ir a pé.
Suga olhou para a área aberta que precisaria seguir sem proteção até o ponto de resgate.
- Vai. – Dahyun falou entendendo o dilema de Suga.
- Eu vou te carregar nas costas. – Suga falou colocando os dois fusíveis nos ombros, pendurados em X pela alça.
- Não. Espera. – Dahyun falou quando Suga ameaçou pega-lo no colo. – Por favor. – Dahyun pediu fazendo Suga negar com a cabeça.
- Não, eu não vou te deixar. – Suga falou limpando o nariz com a manga da camiseta de manga longa.
- Não dói mais Hyung. – Dahyun falou sorrindo.
Seus cabelos pretos colavam na testa com areia, suor e sangue, as pupilas dilatadas pelo trauma, os lábios grossos cuspindo sangue toda vez que ele tossia como reação dos pulmões tentando respirar com todo sangue o impedindo.
Dahyun estava morrendo afogado com seu próprio sangue em pleno deserto, existia ironia pior?!
- Eu estou apaixonado por você. – Dahyun falou sorrindo mais largo.
Seus dentes estavam manchados com sangue. Suga alisou o rosto liso e macio do garoto.
- Eu sei. – Suga falou sorrindo. – Ninguém nunca olhou para minha bunda daquela forma durante o banho antes. – Suga falou fazendo Dahyun tossir enquanto tinha outra crise de tosse.
- Acho que vou morrer sem saber o que é beijar um cara. – Dahyun falou parando de sorrir.
Ele estava segurando à vida por um fio aquele ponto.
Suga se aproximou beijando a testa de Dahyun, descendo para selar ambas as bochechas, selando suas bocas por fim.
Não parecia bonito, um beijo misturado com sangue e lágrimas, mas ainda assim Dahyun sorriu na boca de Suga.
- Suga. Você me lembra d... – ele ouviu Dahyun suspirar.
O mais velho se afastou para ouvir o resto da frase, mas o que viu foi os olhos negros de Dahyun se apagarem enquanto olhava para ele, se tornando cinzas e sem vida.
Suga sabia que a última coisa que o garoto tinha visto fora seu rosto e o sorriso na boca do menor demorou a se desfazer. Suga pegou o corpo mole do garoto e colocou em seu colo, se movendo de frente para trás em desespero, muito parecido com a mulher que abraçava seu filho do outro lado daquele lugar esquecido por Deus.
...
- Precisamos continuar soldado. – Alguém falou encostando no ombro de Suga.
Ele não sabia quanto tempo tinha se passado, não se importava também.
Seu rosto virou para o barulho de tiroteio não muito longe dali.
- Precisamos ir. – JHope falou sorrindo triste para ele.
Suga limpou o nariz e os olhos mais uma vez se levantando.
- Não temos tempo para carregá-lo. – JHope falou quando Suga ameaçou a carregar Dahyun.
- Não pedi sua ajuda. – Suga falou colocando o garoto nas costas.
JHope não falou mais nada, guiando Suga pelo resto do caminho.
Suga não sabia se aguentaria muito mais tempo. Dahyun não era pesado, mas os estilhaços que estavam grudado pelo corpo do garoto fincavam nas costas de Suga, rasgando sua roupa e perfurando sua pele.
Eles chegaram na caminhonete que veio para resgate com a segunda equipe não muito longe de onde estavam, mas numa área de menos risco.
Suga colocou o corpo de Dahyun no chão da caminhonete com a ajuda de um outro soldado. O garoto que o ajudou, tirou o próprio uniforme do corpo e cobriu o rosto de Dahyun em respeito, dando a mão para ajudar Suga subir.
- Os terroristas se reuniram no final da área que o senhor abriu para primeira equipe, eles estão presos numa casa próxima esperando resgate. – O soldado que o ajudou falou, entregando uma garrafa de água que Suga usou para limpar as mãos de sangue e beber um gole na tentativa de aliviar a garganta seca que arranhava toda vez que ele ia tentar falar.
- Qual será a tática de ataque? – Suga perguntou para JHope, normalmente encarregado da equipe de desbravamento.
JHope olhou para o soldado com o mapa na mão.
- Foi avistado dois hostis com bazucas no telhado. – JHope falou entregando o mapa para Suga com um olhar triste.
Era quem tinha matado Dahyun. Suga soube assim que viu as coordenadas de localização da casa.
- Um atirador, eu matei o outro. – Suga falou apontando para o telhado.
- Por que o outro não matou você? – O soldado perguntou.
- Porque ele estava distraído matando meu irmão que se sacrificava para que eu pudesse fugir. – Suga respondeu ríspido calando o garoto assustado na sua frente.
- A tática, senhor. – Suga pediu para JHope não muito amigavelmente dessa vez.
- Você traça dessa vez soldado. – JHope pediu com um sorriso triste.
Suga olhou para o mapa mais uma vez enquanto ajeitava as armas em seu ombro para se sentar mais confortavelmente e passou sua estratégia assim que notou que estavam perto do local.
- É arriscado. – JHope falou, vendo os traços que Suga tinha marcado com um lápis que entregaram na sua mão.
- Seria arriscado se eu não subisse nessa torre e atirasse nessa bomba de gasolina explodindo a área leste da casa, os impedindo de fugir enquanto vocês entram pela outra única entrada.
- Como quer a ordem para entrarmos na casa? – O soldado ao lado de JHope falou pela primeira vez.
- Não me importa, desde que entrem fuzilando. – Suga falou batendo na janela do motorista para desacelerar a caminhonete.
- Vamos em silêncio. – Suga falou apontando para o rádio.
- Por que? – Um soldado perguntou assustado.
- Porque eu não sou descuidado e não tem chance deles terem descoberto minha localização sem rastrear a transmissão de sinal. – Suga falou pegando uma bolsa que foi entregue a ele.
- O que é isso? - Suga perguntou abrindo a bolsa e encontrando munição, água, binóculo e granadas.
Ele levantou uma sobrancelha para o soldado que sorria da boca aberta de Suga.
- É como fazemos em terra senhor. – O soldado falou sorrindo para Suga que fechava a bolsa e a colocava nas costas.
- Nos encontramos do outro lado do vilarejo. – Suga falou apontando para o ponto de encontro.
- Quanto tempo? – Alguém perguntou para Suga que estava prestes a descer do automóvel em movimento.
- Duas horas no máximo. – Suga estipulou, que era o tempo que eles deviam considerar esperar Suga, passando disso ele seria dado como morto ou capturado, o que nas regras dos fuzileiros, significava a mesma coisa.
Suga pulou da caminhonete em movimento, seguindo pelos corredores estreitos, das ruas que continuam no mapa em sua mão.
Ele podia ouvir o tiroteio de longe e viu crianças correndo na rua em direção ao tiroteio.
Hostis normalmente usavam crianças como aviõezinhos. Era mais difícil matar ou torturar crianças em busca de informações.
Suga olhou para o alto e chutou uma porta de madeira, invadindo uma casa para ter acesso ao telhado, ignorando a gritaria dos moradores deitados no chão da cozinha para se proteger de balas perdidas.
O soldado tinha razão em uma coisa. Snipers tinham dificuldades em se mover por terra, por isso normalmente os apelidavam de águias.
Suga continuou seguindo em direção ao tiroteio, mas dessa vez pulando de telhado em telhado, das casas que por sorte eram grudadas umas na outra.
Ele pegou o binóculo na bolsa quando se escondeu entre as discrepâncias dos telhados, conseguindo uma visão limpa do atirador de Dahyun.
Ele queria ter tido mais raiva quando atirou na nuca do terrorista, acertando seu cerebelo e o impedindo de ter espasmos para não apertar o gatilho mesmo depois de morto, como foi treinado a fazer.
Suga voltou a se movimentar. Ele ainda não tinha sido notado pelos hostis, mas não significa que não precisava se movimentar. Afinal alvo em movimento era mais difícil de ser capturado.
Ele explodiu o tanque de trás da casa onde os hostis estavam, dando sinal para a segunda equipe agir com a explosão e desceu até a casa em que a primeira equipe estava cercada para o resgate.
- Anjo da Guarda? Como está vivo? – Um dos soldados que servia com Suga perguntou procurando por Dahyun atrás dele, mas fechou a cara ao ver a expressão de Suga para a pergunta silenciosa em seus olhos.
- A janela de tempo é curta, aqui está a coordenada para a interceptação. – Suga falou entregando o mapa.
Tinha um soldado com a perna destroçada deitado numa maca improvisada, segurada por outros dois de seus irmãos.
- Você não vem? – O soldado perguntou estranhando.
Suga negou com a cabeça sem olhar nos olhos do garoto que entendeu o recado mais uma vez.
- Semper Fi irmão. – Ele gritou fazendo os outros soldados fazerem o mesmo colocando a mão no peito em direção ao coração.
Suga ia numa missão suicida e não pretendia voltar. Ele apontou o rádio para o soldado que o entregou em sua mão.
- Equipe extraída com sucesso, indo para a área de resgate, abortar missão. – Suga falou vendo o garoto arregalar os olhos, mas se retirou sem tentar convencer Suga do contrário. – repito abortar missão. – Suga falou jogando o rádio no chão e pisando em cima, antes de subir as escadas da casa esburacada que foi alvejada esse tempo todo pelos hostis, agora distraídos com a segunda equipe.
Suga foi pelo telhado mais próximo da casa em que ele viu um movimento suspeito na janela e não fez nada sobre, antes daquela bagunça toda começar, parecia há dias atrás e não horas, era óbvio que ele se culparia pelo resto da vista por isso.
Suga atirou bombas de fumaça pela maldita janela voltando a correr pela lateral da casaa sim que a segunda equipe saiu, abortando a missão de invadir como Suga ordenou.
Ele torceu um tornozelo quando tentou descer do telhado por uma lateral alta demais, mas não parou de andar.
Uma criança de uns sete anos o avistou e começou a correr para avisar sua localização, mas parou assim que Suga atirou num vaso de barro na frente de uma casa ao lado dela.
O menino colocou as mãos para cima se virando para Suga que se aproximava com velocidade. O garoto falou algo em croata, mas Suga o interrompeu atingindo a base da arma na cabeça do garoto que caiu nos seus pés. Ele arrastou o garoto para fora da rua estreita, verificou sua respiração e liberou suas vias aéreas para não se engasgar com a própria saliva enquanto estava desmaiado e continuou o restante do caminho por terra.
Ele soltou a primeira granada em uma das janelas que tinha explodido com o gás antes, entrando pela mesma assim que a explosão acabou.
O ombro que tinha levado um tiro de raspão mais cedo, bateu no chão quando ele errou a posição de queda por causa do tornozelo torcido, mas conseguiu se esconder antes de ser visto.
Suga foi treinado para atirar há quilômetros de distância, tendo que calcular a direção do vento e mudança de ângulo de trajetória.
Ele podia matar todos ali só com a visão periférica se quisesse, tiro a roupa é como se tivessem aumentado seu binóculo em mil vezes, mas não significava que ele tinha olho na nuca, então ele escolheu ir com calma e precisão para durar mais tempo, o que significava matar por mais tempo também.
Assim que limpou o primeiro andar, ele invadiu o segundo e desceu uma escada inclinada que aparentemente dava para o porão do lugar.
Ele atirou numa criança que apontava uma espingarda para ele. Seu coração parecia querer explodir pela boca, ele sabia que ia para o inferno junto com aquelas pessoas, mas nunca tinha matado uma criança antes e isso de certa forma o dava um sentimento de ser melhor do que aquelas pessoas. Bom! Não mais, agora ele já podia se considerar tão ruim quanto.
Suga travou os passos ao ver várias jaulas para animais de grande porte empilhadas no canto de um espaço aberto e escuro.
Tinha um montante, do que Suga achava ser cocaína, no meio do espaço e mulheres ajoelhadas, presas dentro das jaulas, tinham crianças também, vestidas com pouca roupa, seriam provavelmente vendidas como escravas. Suga já tinha ouvido falar sobre aquilo naquela área, mas nunca tinham encontrado nada desse tipo.
- Došao sam vam pomoći – Suga falou lembrando das tentativas de Dahyun em fazê-lo gravar frases prontas como aquela.
Por mais que Suga falou que só queria ajudar, ele agiu com cuidado depois que pegou o molho de chaves no bolso do garoto morto que antes as vigiavam e abriu as jaulas, ajudando as garotas a sair.
...
No final das contas aquela área realmente não era usada para armadilhas da zona de guerra mais à frente, mas tinha uma sede de embarque e desembarque de drogas e tráfico humano de que o exército americano não estava ciente.
Quando a quadrilha viu a movimentação do exército, indo na direção deles, tiveram que atacar por medo de terem sido descobertos.
Suga explodiu a casa antes de sair, o que deixou todo mundo bem furioso por causa das evidências perdidas, mas Suga sabia que aquelas drogas desapareciam dentro do próprio exército e que provavelmente seria acusado por atirar em pessoas desarmadas dentro da casa, que infelizmente foi o caso. Suga matou muitos empregados que não tinham nada ver com aquela guerra, por causa das granadas que soltou na casa, mas não é como se ele se martirizasse menos, pelas pessoas de quem suas mortes ele era o responsável.
Armados ou não, aquilo era só hipocrisia na sua opinião, assassinato era errado sempre, não dava para racionalizar em relação a isso.
Nos últimos meses o apelido de Suga passou de Anjo da guarda par Anjo da morte, porque onde ele passava, deixava um banho de sangue para trás. Era efetivo e não teve mais nenhuma morte depois da de Dahyun por causa disso, mas não significava que não assustava.
A equipe sempre tentou desarmar antes de tomar medidas drásticas, mas Suga não tinha mais o mesmo filtro.
- Senhor, está sendo convocado, senhor. – um recruta falou para Suga depois de fazer a reverência.
Suga tinha acabado de voltar de uma missão e tinha tomado um banho. Ele estava sentado no vestiário, com uma toalha amarrada na cintura e a outra no pescoço enquanto olhava para um papel amassado com sangue seco nas pontas.
- Dispensado soldado. – Suga falou sem olhar para o recruta que não tinha saído do lugar.
- Me mandaram te acompanhar senhor. – O recruta falou um pouco indeciso do que fazer.
Suga o olhou nos olhos pela primeira vez sem dizer nada.
O garoto prestou reverência e saiu às pressas da sua vista.
...
- Senhor, apresentando em serviço, senhor. – Suga falou para o comandante responsáveis por ele em terra, mas não deixou de notar JHope no canto da tenda improvisada de escritório.
- Sente-se fuzileiro. – O comandante falou sem olhar para ele enquanto mexia em alguns papéis, mas apontou para a cadeira dobrável na sua frente de qualquer forma.
- Sua ficha é excelente, apesar das imensas lacunas sem respostas nos relatórios de missão. – O comandante falou esperando Suga agradecer, mas Suga não falou mais nada.
- Mesmo que eu não me importe com o que tem no papel e sim com o resultado impecável de seu trabalho, seu oficial em comando pediu sua liberação. – Ele falou apontando para JHope que abaixou a cabeça para não olhar direto para Suga.
- Posso saber por que senhor? – Suga perguntou confuso.
- Aparentemente você não está mais suscetível a cumprir ordens. – O comandante falou olhando para Suga com brilho nos olhos.- E não vamos nem comentar sobre seu ato suicida há alguns meses atrás, por mais que pareça soldado, não criamos heróis aqui.
- Eu executo o serviço com metade do tempo que dois dos seus melhores atiradores de elite precisam para fazer o mesmo, senhor, não entendo o porquê de ser rebaixado por isso. – Suga falou olhando para JHope que parecia querer sair correndo dali.
- Sinto muito, mas não é assim que o exército funciona. Existe uma hierarquia em comando e você não está obedecendo ela. – O comandante carimbou uns papéis suspirando com tristeza por fazer aquilo. – Você parte amanhã cedo no helicóptero que nos traz os mantimentos, foi uma honra conhece-lo soldado. – O comandante falou estendendo a mão para cumprimentá-lo.
Suga pegou na mão do comandante e saiu depois de prestar uma reverência a ambos dentro da tenda.
- Suga, espera. – JHope gritou fazendo Suga travar os passos, mais por causa do apelido que ele usou do que por querer conversar.
- Veio girar a faca que enfiou nas minhas costas? – Suga perguntou se virando.
- Desculpa por isso, mas você está indo por um caminho sem volta. – JHope falou triste.
- Eu estava fazendo meu trabalho. – Suga falou entredentes.
- Não. A esse ponto você só estava atirando em alvos em movimento. – JHope falou olhando nos olhos de Suga. – Tenho medo de olhar nos seus olhos um dia e não encontrá-lo mais aí dentro.
- Eu não consigo sair do meu corpo estando vivo. – Suga falou como se desejasse exatamente aquilo.
- Não é de você que estou falando. – JHope falou causando um silêncio desconfortável entre eles.
- Te vejo no inferno irmão. – Suga falou se afastando de JHope que o chamou algumas vezes, mas foi ignorado.
...
Solo Americano
- Pois não? – um cara todo tatuado com alargadores de madeira enormes em ambas as orelhas perguntou para o homem que entrava no seu estabelecimento.
- Quero tatuar isso. – Suga falou entregando o papel amassado com sangue nas pontas para o tatuador que olhou curioso para a folha.
- Tem certeza? – ele perguntou olhando para Suga que acenou com a cabeça.
A folha tinha um desenho de um gatinho calico, deitado enrolado no próprio corpo e uma frase em coreano rodeando o bichano em um círculo que dizia: 나는 너와 함께 우리 집을 기억한다.
- O que a frase diz? – O tatuador perguntou depois de ter terminado.
Ficou idêntico ao papel. Até mesmo o gato desenhado de forma infantil e relaxada à letra parecendo que uma criança a tinha feito e não seu pequeno Dahyun, que na visão de Suga era realmente uma criança, sua alma era tão inocente e pura.
- Diz: Você me lembra de casa. – Suga falou vestindo a blusa e pegando o papel das mãos do tatuador depois de pagá-lo pelo serviço.
- Não quer que eu passe uma pomada? – o Tatuador perguntou quando Suga já estava quase na porta, onde tinha um gato da sorte balançando sua pata na janela de vidro em exposição que dava para rua, foi por isso que Suga escolheu ali na verdade.
- Já lidei com queimaduras piores. – Suga respondeu fechando a porta, deixando um barulho de sinos atrás dele.
Ele olhou para o céu escuro assim que saiu do estúdio de tatuagem abafado e sorriu para as estrelas desejando que Dahyun estivesse em algum lugar por ali, rindo da cara dele pelo seu jeito emocional nada comum de levar a situação.
Suga colocou a touca da blusa na cabeça por causa da garoa fina, típica de Nova York naquela época do ano e se misturou na multidão acelerada da cidade, desaparecendo entre os guarda chuvas e os casacos grossos da cidade cinza de onde ele era só mais um forasteiro.
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