Capítulo V
A dor. Ela dói.
Ela me quebrava a cada respirar nesse inútil mundo. A dor me fazia questionar o motivo real pelo qual estamos lutando. Sei lá, tipo um objetivo universal, algo que todos buscam em comum.
Era angustiante refletir sobre isso, pois eu nunca obtive resposta.
A sala e a cozinha da minha casa eram separadas por uma ilha onde havia cadeiras altas para tomar café da manhã. Era muito comum, mas para mim havia um toque diferente, entretanto indescritível.
Eu estava sentado em uma das altas cadeiras, quando ouvi meu nome soar pelo enorme espaço. Minha mãe me encarava de braços cruzados.
— Tenho saudade da época em que meu filho me ajudava, e não ficava com essa cara de peixe morto encarando o nada — murmurou jogando o pano de prato em mim.
Eu ajeitei a postura começando a prestar atenção no que ela dizia. Minha mãe estava iniciando sua fase dramática do dia.
— Bem que Junseo me avisou — ela se virou para o fogão — Não se encante muito, na adolescência ele vai se entreter com as meninas e vai ficar com cara de morto-vivo.
— Mãe!
Meu pulo da cadeira foi ruidoso, mas a mais velha não se deu o trabalho de fingir que se assustou. Ela teve a audácia de sorrir cinicamente.
— Ih, alá o meu homenzinho com a autoestima frágil — Ela apertou minha bochecha com tanta força que eu grunhi.
Sua fala doeu um pouco em mim.
— Vamos meu zumbi, seque essa louça para eu fazer o almoço.
Depois de pedir, e quase concentrar-se em pegar alguns ingredientes, ela me olhou preocupada.
Um olhar frio e pensativo, perto de ser impossível encará-la. Direi o chão por um segundo.
— Algo me diz que não são meninas que estão lhe deixando assim.
Seus olhos analisaram todo o meu rosto. Talvez eu não tenha sorrido como sempre fazia após uma brincadeira sua.
Eu senti um frio na barriga. Eu me desgasto tanto para esconder minha vida escolar dela, para no final ela descobrir por um mero deslize meu.
Sua mão acariciou meu rosto com tanto carinho que quase cedi os joelhos.
— Você não caiu da escada na escola, não é ?
Óbvio que não. Mas ela não precisa saber.
— Taehyung — Seu chamado foi dócil e carinhoso, quase que eu entreguei tudo de bandeja para ela.
Aquele tom era tão reconfortante que me dava preguiça de esconder algo. Por mais importante que fosse mantê-lo em segredo.
— Taeh, o que aconteceu na escola a cinco dias atrás ? — Seu olhar brincalhão passou a ser angustiado. Odiava deixá-la assim.
— Eu entrei em uma briga.
Burro. Burro. Burro.
Eu consegui estragar minha chance de continuar invisível naquela casa. Era nítido que ela ficaria de olho em mim para ver se eu retornaria como uma múmia ou não, pois ela logo descartaria a hipótese de que seu filho era apenas desastrado demais perto de escadas e correndo.
Seus rosto se contraiu. Ela estava desconcertada com o que ouvira.
— Você brigou com alguém? — Ela franziu o cenho — Por que ?
Pensa, Kim, pensa.
Minha respiração falhou. Ela percebeu.
— Taehyung…!
— Por causa de uma garota.
Seu queixo caiu. Sim, ela escancarou a boca por causa de uma garota mencionada em uma simples fala.
Kim Linna era emocionada, sempre ficava chocada quando eu fazia coisas que ela jamais achava que eu faria um dia. E isso se aplica a tudo.
Certa vez ela enfiou na cabeça que eu não seria capaz de ter mais de um amigo, porém não por maldade, e sim pelos fatos. Na época eu era mais tímido do que hoje e, claramente, não dava indícios de que faria mais amizades.
Ela não errou que eu teria poucos amigos, pelo menos.
Minha mãe encarava meus rosto a mais de três minutos sem piscar. Se duvidar, ela mal respirava.
Estou começando a achar que ela infartou.
— Mãe…
— Você entrou numa briga por causa de uma garota ?!...
Eu arregalei os olhos.
— Eu sei que..
— Ela é bonita ?
Franzi o cenho.
— não enten…
— A garota é bonita ?
Ainda de cenho franzido, tentei decidir se realmente iniciaria aquele assunto ou não. Ele poderia simplesmente não dar em nada. Ou poderia me comprometer pelo resto da vida. Minha mãe era imprevisível.
— Talvez…
— Então ela é bonita.
— Mãe se acalme.
— Meu filho entrou numa briga por causa de uma menina…
Se ela não infartou, infartaria logo.
— Mãe..
— Meu filho entrou numa briga por causa de uma menina bonita.
Nessas alturas do campeonato a conversa não era mais comigo, e sim com ela mesma.
Com certeza ela estava com ódio mortal de mim. Ela não criou um garoto que bate em outros.
Nem um que apanha.
— Meu filho entrou numa briga por causa de uma menina bonita, e voltou para casa parecendo uma múmia.
Ela estava zuando com a minha cara..
— Mãe…
— Meu filho brigou por causa de uma menina bonita, voltou para casa parecendo uma múmia, e ainda mentiu dizendo que caiu da escada.
Ah se ela descobrisse que não foi uma briga muito justa. E que seu filho sequer bateu em alguém.
Nesse ponto eu já estava andando de costas, aproveitando que ela estava encarando a geladeira, de costas para mim.
A madeira do piso rangeu.
— Volte aqui, Kim Taehyung !
Sou um menino morto.
Meus passos até ela foram silenciosos e temerosos. Ela devia estar contando minhas respirações.
— Você usou o gancho que seu pai te ensinou?
Eu olhei seu rosto confuso. Ela mudou o tom da conversa ou foi impressão minha ?
— Céus, meu filho parou de usar o cérebro depois de conhecer essa menina — Ela riu — Você usou o gancho, ou não?
Minha boca ainda estava aberta. E eu definitivamente não piscava. Mas balancei a cabeça positivamente, ainda desacreditado.
— Ah, Jesus dos crentes, meu filho está mesmo apaixonado !
Acho que vou me jogar da janela.
༄
— Truco !
Jungkook bateu as cartas na mesa pela terceira vez naquele maltido dia. Eu estava quase batendo a mesa na cabeça dele.
Seu sorriso foi ostentador, mas ao mesmo tempo exagerado.
— Aish, seu ladrãozinho de merda. — Jin gritou ao meu lado.
— Ladrãozinho?!
Uma discussão começou, mas eu não tive vontade de prestar atenção. Peguei as cartas para embaralhar, sem esperar que alguém se dirigisse a mim e recostei na poltrona que eu estava perto. Algo me dizia que não tinha dom para esse tipo de jogo.
Jin era meio cabeça quente quando a questão era as perdas. E Jungkook… Jungkook obviamente tinha vendido a alma para o capeta para nunca perder.
Eu me perdia entre tantos símbolos e números diferentes. Não conseguia me concentrar em formar jogadas e estratégia
Minha mãe cruzou a sala com o telefone no ouvido pedindo silêncio com gestos. Meu grupo estava sendo escandaloso demais, afinal.
— Sim… avisarei meu marido — Ela ajeitou umas mechas caídas no rosto — Obrigada, até mais…
Seus olhos sobre o telefone estavam quase apavorados. Sua mão o apertou com força, ameaçando jogá-lo na parede.
Ela me olhou em seguida.
— Taeh, seu pai terá de viajar essa semana.
Bastou aquela frase para eu entender a raiva de minha mãe. Mas o meu motivo de ficar temperamental era diferente do dela . Para mim, aquilo definitivamente não era bom. Meu pai ir viajar era sinal de ela ir junto. Eu não gostava nem um pouco daquilo.
Seus passos foram sutis até mim.
— Não fique assim.
— Assim como ?— Sussurrei
Eu senti minha garganta fechar.
Se era solitário ter que esconder dela meus espancamentos. E viver nesse mundo como se ela não existisse. Quando minha mãe viajava era uma tortura psicológica muito superior. Pois eu não tinha ninguém adulto ao meu lado.
Minha visão embaçou.
— Calma Taeh, será rápido, logo estarei de volta.
Era fácil falar. Era fácil me fazer criar esperanças. Nunca era rápido como ela dizia.
Jin passou a mão por meus ombros.
— Você tem a gente , pirralho !
Era como um tapa em minha nuca. Mas aquela companhia não era a mesma coisa.
Minha mãe me abraçou, mesmo estando em pé e eu sentando.
— Olha, eu prometo voltar em duas semanas, ouviu ? — Ela acariciou meus cabelos.
Tentei ao máximo memorizar seu cheiro. Uma mistura de manjericão e tomate com rosas e perfume caro. Um aroma de dona de casa e mulher de bens. Era tão único
— Eu te amo.
Eu te amo mais. Não se passou de um pensamento. Um pensamento triste e desesperançado.
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