Prólogo

Não havia mais sangue o suficiente. Não havia mais dor. Não havia mais gritos de escárnio ou desespero. Não sobrou nada. Apenas uma vareta humana jogada de peito para cima na imundície.

Um olho. Duas orelhas. Luo Binghe deixou-os para que ainda pudesse ver e ouvir o que faria com a escória de seu shizun. Mas desde que trouxe a espada Xuan Su nada saiu como previa, foi uma grande empata diversão, na verdade, e o amargor em seu peito demoníaco apenas se aprofundava. Shen Qingquiu gargalhou até quebrar e então não gargalhou mais. Não falou mais. Se não fala, não precisa da língua, Luo Binghe avisou antes de se irritar com o silêncio eterno do Shizun e arrancar a língua venenosa agora dormente. Não lhe trouxe satisfação.

Nada lhe trazia satisfação. Fez todos os jogos possíveis com a vareta humana para tirar algo, qualquer coisa, até os gritos estagnados pela falta da língua eram sem graça. Shen Qingquiu apenas existia. Então, quando Luo Binghe sentado na sua cadeira, que era o camarote onde assistia o deplorável homem ser tratado como merecia, sentiu uma brisa límpida de ar na masmorra úmida do Palácio Huan Hua, apesar de todas as entradas estarem trancadas.

Viu Shen Qingquiu se mover como se tentasse esticar os braços inexistentes para algo acima de si.

Luo Binghe se levantou da cadeira quase derrubando-a e andou até o lixo humano estirado no chão. O olho verde remanescente continha um brilho novo extremamente tênue, o lorde demoníaco por mero instante achou que fosse para si, mas essa ilusão de diversão logo caiu por terra. A escória não olhava para Luo Binghe de verdade. Olhava para além.

Naquela escuridão eterna, Shen Jiu viu um rosto benevolente surgir iluminado. Esse alguém lhe ofereceu a mão como fazia sempre depois de seu irmãozinho se meter numa briga com os outros garotos de rua da qual levou uma surra.

— Vamos embora, Xiao Jiu. Vamos para casa.

— Qi-ge. — Xiao Jiu sussurrou.

Xiao Jiu pegou a  mão da pessoa que ele mais esperou e se levantou daquela imundície sem nenhuma dor. Estavam juntos lado a lado.

Yue Qingyuan alto, nobre e benevolente com a espada na cintura e Shen Qingquiu com o leque aberto em elegância enquanto partiam juntos e alegres para longe. Para a luz.

As belas sobrancelhas de Luo Binghe franziram, Shen Qingquiu olhava para longe dele mais vivo do que nunca nos últimos anos, seus lábios se moveram num esgar sem língua que o lorde poderia jurar se não fosse tolo que saiu como um nome. Então os lábios ficaram parados e do olho brilhante desceu uma lágrima que levou todo o restante de brilho. O grande lorde demoníaco finalmente notou que o brinquedo predileto de tortura  partia sem sua permissão.

— Você não vai escapar. — Luo Binghe rosnou irritado. Abriu um ferimento na mão jogando o sangue nos lábios secos e quebradiços de Shen Qingquiu.

— Você ouviu alguma coisa, shidi? — Yue Qingyuan perguntou.

— Me chame de Xiao Jiu. — Shen Qingquiu falou. — Não, eu não ouvi nada. Tudo que eu ouço é só você, Qi-ge.

Era tarde demais, Shen Qingquiu já estava morto. Nem todo sangue demoníaco dos três reinos o faria obedecer. Luo Binghe olhou frustrado para o cadáver nada parecido com um humano, para o rosto macilento pelos anos de tortura, mas a expressão final calma e esperançosa, a impressão do olhar final ainda ecoando. No final das contas, Shen Qingquiu nem dignou-se a dar um último olhar de desprezo para Luo Binghe, ele olhou para outro lugar e falou com outra pessoa que a cabeça quebrada mostrou, Shen Qingquiu era o seu arqui-inimigo, mas para esse, Luo Binghe não passava de um mero incômodo.

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