The Doll

"Se isso fizer diminuir o sangue que escorre por essa coroa de espinhos;

Não me importo de ser sua boneca favorita..."

Kaori Yuki.

XXX

Oito de setembro de 1888, sábado, (tarde/noite), Whitechapel, Inglaterra.

E ela estava lá...

Sentada na cama... Os cabelos ruivos longos... Pálida... Usava um vestido de seda vermelho... Que destacavam seus olhos... Igualmente vermelhos... E a qualquer minuto poderia piscá-los... Respirar... Ou mesmo adquirir vida... Se não fosse uma boneca...

 Como podia ser tão perfeita? Seu rosto, corpo, cabelos a semelhança com um humano assustava! Mas... Seus olhos vidrados fitavam o nada... Seus lábios jamais sorririam... Jamais pronunciaria uma palavra sequer... Sua perfeição estava reclusa a ser um enfeite para sempre...

 - Cain... Foi essa "mulher" que você viu ontem?

- Não tenho dúvidas... Mas... Como? É uma boneca...

- Eu não sei...

- Lilith... Vá e olhe-a de perto... Veja se não possui nenhum mecanismo que a ligue.

- Como? Não! Cain eu não...

- Vá Lilith...

Cain? Era melhor obedecê-lo... Pois mesmo me sujeitando a tudo isso. Ainda assim era melhor tê-lo como aliado do que inimigo. Pois eu sei que ele seria capaz até de me matar, eu que sou sua irmã, para ter o que quer. Afinal... Ele é "Caim"...

Aproximei-me da boneca, cautelosamente, e a olhei por um breve momento, de perto dava ainda mais medo a sua perfeição... Mas Jaken me dissera que não possuía nenhuma boneca. Então como ela...? Deixei meus pensamentos de lado, e comecei a procurar algo que a ligasse quando...

- Cain, ela é movida a corda!

- Corda? Mas como assim?

- Aqui veja em suas costas a uma chave, provavelmente se a girar... Algo acontecerá... – Disse engolindo em seco, com medo do que viria a seguir.

- Gire a chave, Lilith...

- Sim, Cain...

Comecei a girar a chave em suas costas, a cada volta que dava meu coração batia mais forte... Minhas mãos começaram a tremer, pensei em parar, mas da porta ele me encarava, com aqueles olhos frios, e os braços cruzados, não podia contrariá-lo, pois tinha tanto medo dele. Então continuei a girar até que...

"Click!"

Com esse som a chave parou de girar. Senti que ela havia se movido... Ou seria só impressão minha? Minhas mãos não paravam de tremer. Então...

Uma música suave começou a tocar... Era aquela que se toca em caixinhas de música... Ah...! Como fui tola em pensar que algo aconteceria, é só uma boneca... Dei risada após o susto...

- Cain, acho que você se enganou é só uma boneca! Só uma boneca...

Ele me olhava com raiva, mas o que eu podia fazer? Ele estava errado, ele poderia sobreviver com isso. Todos erram na vida...

- Ken... Ja... Ken...?

- Como? – A música cessara.

- Meu mestre...?

A boneca...? Criará vida? Como assim? Com medo corri para perto de meu irmão, mesmo sabendo que ele não faria nada para me proteger...

- Jaken? Onde está meu mestre?

XXX

 Cain sorria maleficamente, como ele sempre acertava?!

- Olá qual é seu nome?

Nada... Ela não o respondeu, mesmo tendo falado e se movido, seu rosto continuava sem expressão, provavelmente, não possuía sentimentos.

- Vamos diga não iremos te fazer mal! – Cain podia ser tão doce às vezes... Outras, porém...

- Onde está meu mestre? Onde está Jaken?

- Não sei, talvez se você me disser seu nome... "Boneca"...

- Esse é meu nome... "Boneca"... "Doll"...

- Doll? Que nome bizarro...

Ela não se sentiu ofendida com esse "comentário" de meu irmão...

- Seu mestre é... Jaken? – Perguntei a ela.

Agora ela me olhava, sem nenhuma expressão e disse:

- Não, meu mestre não é Jaken... Onde está meu mestre? Onde está Jaken? Quem são vocês?

Ah, ela não afirmava "meu mestre é Jaken", ela perguntava onde estava seu mestre e onde estava Jaken... Nesse minuto ouvi passos no corredor... Mas minha fascinação com a boneca era maior, como ela falava? Tão precisa, mas movida a corda...

– Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!!!

Emmeline? De onde ela surgiu?

- Não se aproxime dessas crianças, seu demônio!

Dizendo isso ela nos puxou para longe da Doll, essa que por sua vez não esboçou nada, só a olhou... E bateu a porta do quarto do Jaken, a trancando.

 Emmeline tremia muito, ela estava com muito medo da Doll, mas por quê? Ela não era capaz de fazer mal a ninguém... Ou será que...?

- Por que vocês entraram no quarto do Senhor Jaken?

- Foi apenas por curiosidade Senhorita Emmeline! – Disse Cain afetuosamente para ela.

- Nunca... Nunca mais façam isso! Os dois jamais devem falar com "ela"!

- Por quê? – Perguntou Cain...

Ela nos olhou desamparada com lágrimas surgindo em seus olhos azuis, que se parecia com duas safiras brilhantes, que se destacavam em seu rosto de boneca...

- "Ela"... Ela... Perguntem ao Senhor Jaken quando ele retornar, eu não posso dizer nada...

- Aonde ele foi Emmeline? – Perguntei.

- Nonsense...

 - "Nonsense?" – Ecoei.

- Não posso lhe dizer mais nada Senhorita Lilith...

Dizendo isso ela se retirou, e nos deixou a sós, o quarto em que a Doll estava se encontrava com a porta trancada... Não podíamos mais falar com ela... Quem seria seu mestre?

Já era tarde, não fomos jantar... Eu que não havia almoçado estava com um pouco de fome, mas acho que não conseguiria comer, não depois dos sustos que levei hoje, então não me restava nada além de ir dormir... Nem mesmo esperarei por Jaken, também ainda estou com medo dele...

                                                                       XXX

Mas um dia amanheceu, era o nosso segundo dia nessa casa demoníaca, com uma boneca falante, e moradores tão bizarros quanto à própria boneca... Não me preocupei em me arrumar, afinal eu estava em "casa"... Apenas desci para o saguão do casarão, Cain não estava lá... Nem ninguém... Essa casa é muito estranha...

Ele não estava lá também, não queria me encontrar com Jaken de novo... Mas Emmeline nos disse que ele explicaria quem é a Doll, e porque ela fala... E afinal o que é Nonsense?

Perdida em meus pensamentos, novamente, comecei a comer, pois estava com muita fome...

Quando "algo" me envolveu, abraçando meus ombros, e sussurrando em minha orelha:

- Pequena Lady, não deve invadir o quarto dos outros...

Era ele! Assustei-me e lhe empurrei para longe, não lhe dei um tapa no rosto, pois não sei o que ele faria comigo se eu o batesse não se abalando ele continuou:

- Emmeline me contou sobre o que vocês fizeram ontem, estou chateado... A Doll era um segredo só "nosso"...

Nesse momento percebi um homem que estava atrás de Jaken, não era muito alto, aliás, não era muito maior que meu irmão, usava um tapa-olho sobre o olho esquerdo, mas seu olho direito era de um verde de outro mundo... Vestia um terno preto... Tinha cara de nobre... E estava dando risada de mim... Que vergonha...

- Olá futura Lady, meu nome é Bankotsu Silverback, sou conde da família Silverback, estou encantado em conhecê-la. – Disse ele beijando minha mão gentilmente.

- O que foi pequena Lady? O gato comeu sua língua?

- N-não diga besteiras! Você apenas me assustou! Seu idiota!

Ele riu maldito Jaken!!! Como ele pode ser tão demoníaco e ao mesmo tempo tão idiota?

- Onde está seu irmão?

- Não sei cadê a Emmeline? E a Doll?

- A Doll já se foi senhorita, vim buscá-la ontem a noite, possivelmente ela já deve ter dito, mas eu sou seu "mestre".

- Ah você é o mestre dela?

 - Sim ele é, mas fui eu quem a criou pequena Lady.

- Você? Criou aquela boneca perfeita?

- Sim, eu sei que ela é perfeita... – Disse ele com um olhar vago.

Esse homem é bipolar? Suas emoções passam da "água para o vinho" em poucos instantes...

Cain então entrou no saguão e olhou sem entender para Jaken e para "Conde" Bankotsu... Que, aliás, tem um nome muito excêntrico, de que língua será? O que significa? 

- Quem é você? – Disse Cain assim que se aproximou dele.

- Sou o Conde dos Silverback, Bankotsu Silverback... – Disse ele sorrindo.

- Prazer, Conde... – Cain disse sério.

- Pronto! "João e Maria" estão reunidos, agora comam alguma coisa que depois nós precisamos conversar com os dois. – Disse Jaken, e logo saiu de saguão seguido por Bankotsu.

XXX                

- Quem é ele? – Cain perguntou desconfiado.

- Não sei direito, mas ele me disse que é mestre da Doll e apareceu aqui com o Jaken...

- Hu! Jaken... O que é ele?

- Não sei...

Dizendo isso nossa conversa acabou nunca nos comunicamos muito desde pequenos, e ele nunca se importava comigo mesmo...

Depois de tomar café da manhã nós fomos ao encontro dos dois, eles estavam na sala conversando, os dois eram absurdamente bonitos e assustadores, ainda mais o Conde Bankotsu, com aquele tapa-olho e o outro olho de um verde brilhante...

- Finalmente vieram, Conde e Lady, precisamos conversar...

 - Você já disse isso Jaken...

- Sim eu sei, sabe vocês me deixaram muito triste, nunca pensei que fossem remexer meu quarto. Assim como o Barba Azul ao descobrir que sua mulher havia entrado no quarto em que ele a proibira de entrar...

- Barba quem...? – Perguntei.

- Você não conhece esse conto de fadas?

- Não, nunca gostei desse tipo de asneira!

- Como você disse, ela tem uma personalidade forte... – Disse Bankotsu rindo para Jaken.

- Mas... Não retrucarei, por que vocês fizeram isso? – Jaken disparou.

Eles mudaram suas expressões com essa fala, e ele estava novamente com aquele olhar demoníaco, não podíamos dizer que era por causa dos assassinatos, não porque agora acho que se ele for o assassino com certeza nos matará, então disse:

- F-foi por pura curiosidade... Eu queria saber por que você e a Emmeline discutiam, só por isso!

  - Hum e por que mexeu na Doll?

- Porque ela chamou minha atenção só isso! E afinal o que é ela?

- Uma boneca, como a pequena Lady mesma viu.

- Mas, ela fala! E se move, e acima de tudo ela pensa e interage conosco!

- Sim, porque ela é uma boneca, mas... Possui "alma".

- Alma?

- Hu, sim era isso que eu queria falar com os dois, já que vocês a descobriram mesmo, e eu sei que não vão me deixar em paz de qualquer jeito...

- Sim, não vamos te deixar em paz!

Ele riu uma risada meio sombria e triste, seu olhar estava vago, então Bankotsu começou a falar por ele:

- A Doll era minha irmã adotiva quando estava viva.

- "Quando estava viva?" – Perguntou Cain.

- Sim a Doll, ou melhor, a Datsuki, era minha irmã adotiva quando estava viva... Nossa família queria muito um casamento de um de seus filhos com uma família nobre, e a família escolhida foi a Maurêveilles, mas como o filho legítimo do conde não passava de um bebê. – Ele olhou para Cain – E sua filha não havia nascido – Agora ele olhou para mim – Nossos pais optaram por casar minha irmã a um Maurêveilles, mas não aquele que se tornaria conde, e sim a um mais afastado da família...

Ah... Era Jaken, ele estava se referindo a ele... Ele é um membro da família Maurêveilles mais afastado. Um primo nosso. E a Doll... Ou melhor, a Datsuki era sua noiva, e ela morreu. Então Jaken começou a falar:

- A Datsuki era minha noiva, mas eu não me importava com ela, nem ao menos a notava só iria me casar com ela porque meu tutor havia decidido isso, ela era linda, mas eu não a amava... Um dia quando eu havia saído à noite... – Ele parou.

- Minha irmã o seguiu, mas andar a noite por Withechapel sempre foi perigoso... Ela foi assassinada, por um maníaco que foi preso e executado logo em seguida...

- Um maníaco? Assim como o que matou essas mulheres?

- Sim...

- Mas como ela... Ela morreu! Como pode ser uma boneca?

- Eu... Arrependi-me muito de ter sido o causador de sua morte... Por isso que eu criei aquela boneca igual a ela... Foi uma forma de me redimir... Mesmo que ela não me amasse nem eu a ela...

- O que? Como assim? Mas ela te seguiu... E foi morta por te seguir, provavelmente ela fez isso para ver se você não ia trair ela!

- Não, a Datsuki só me seguiu por curiosidade para saber aonde eu ia com seu irmão... Porque para ela eu não era nada, assim como ela para mim, o único que ela amava realmente...

- Era eu! Mesmo não sendo seu irmão biológico nossos pais jamais aprovariam um casamento entre nós dois... Ela só foi morta por causa desse amor proibido... Mas que Jaken se culpa mortalmente por ela ter nos seguido...

Jaken então desviou o olhar para a janela, ele se sentia incomodado com o assunto, foi uma história triste... Mas ele não foi o culpado! Por que sofrer tanto com isso? Mas eles não contaram o porquê da Doll falar e criar, de certa forma, vida...

- Mas como ela cria "vida"? – Perguntei cautelosamente...

- Após ter sido morta, sua alma não pode encontrar a salvação e passou a vagar por aí... Então Jaken havia criado a boneca... E com uma "ajuda" conseguimos colocar sua alma na boneca... Mas ela não possui sentimentos, essa é sua maldição...

"Maldição"... Jaken havia dito que sua noiva havia sofrido uma maldição, mas não pensei que fosse essa a maldição dela...

- Sua beleza, sua perfeição, tudo foi mantido na boneca... Mas ela é "vazia"... Ela não tem sentimentos... Eu posso amá-la, mas ela não retribui mais... Posso tocá-la, mas ela é fria por causa da porcelana de sua pele... Ela fala, mas não é a minha Datsuki, ela não tem mais aquela "personalidade forte"... Como a sua, senhorita Lilith...

  Ah, será que era por isso que o Jaken me olhava estranho às vezes? Ele não a amava, mas quando me vê ele pensa nela... E sente remorso com isso... Ah Jaken... Não irei mais te chamar de idiota... Só quando você merecer isso...

 - Ela adorava gritar com todo mundo, era indomável, uma bela rosa na qual ninguém podia tocar por causa de seus espinhos, que tentavam afastar todos dela, mas... Tinha muito medo de perder quem ela gostava... – Disse Jaken triste.

- Agora ela é apenas um enfeite, ela pode falar, pode andar, mas não pode sentir, não consegue sorrir... Não consegue chorar... Nem gritar como gostava de fazer... Essa é sua maldição, ser para sempre uma boneca sem sentimentos...

- Mas se é tão sofrível para todos a ter "viva", por que não a deixam morta, como deveria estar? – Perguntei a eles.

- Não sei, só é bom ter a Doll ao meu lado, senhorita.

"Doll" agora ele não a chamou de Datsuki, como havia feito antes. Até porque como eles disseram elas, a Doll e a Datsuki, só tinham a mesma aparência... E alma, mas mesmo assim não é a mesma pessoa.

- Pronto era só isso que tínhamos para falar com os dois, por isso podem se retirar, mas peço que não falem para ninguém sobre a Doll!

Só isso, mas como a Doll fala? Como a alma dela foi parar na boneca? Quem ajudou vocês a fazer isso? Para onde iam quando a Datsuki seguiu vocês? Queria tanto fazer essas perguntas, mas meu medo por aqueles dois era maior que tudo, eram dois homens assustadores, e ainda mais, como trouxeram a alma de uma pessoa do mundo dos mortos para a Terra?

Porém ele não ia aceitar somente aquela explicação... Jaken e Bankotsu eram homens que assustavam, mas meu irmão não era diferente dos dois. Eles ainda não o conheciam assim como eu, pensavam que ele era só um garotinho tímido e calado, mas não ele era Cain...

Ao olhá-lo vi que ele estava fascinado com a ideia de trazer uma alma de "volta à vida", mas também não se contentara simplesmente com essa curta explicação, ele queria mais, e estava pensando em como conseguir isso... Quando enfim disse:

- Foi a Nonsense que ajudou os senhores a reviverem a Doll?

Acho que ele não devia ter dito isso, pois o modo como aqueles dois o encaram faria qualquer um chorar de medo, qualquer um... Mas ele não era qualquer um, e por isso sorria diabolicamente para Jaken e Bankotsu...

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