The Castrato

Solomon Grundy nasceu na segunda-feira.

Foi batizado na terça-feira.

Casou-se na quarta-feira.

Ficou doente na quinta-feira.

Tornou-se moribundo na sexta-feira.

Morreu no sábado.

E, no domingo, Solomon Grundy foi enterrado em sua sepultura.

"Nursery Rhyme."

Trinta de setembro de 1888, domingo. (Madrugada). Cremorne Garden. (Londres)

Cheshire corre e sigo-o de longe, não queria estar com ele. Ele nos atrapalhou! Ela estava me contando o porquê de odiar tanto a Raposa e ele me atrapalha. E agora, assim do nada, diz que Abel pode estar aqui, e tenho que segui-lo.

- Sinto o cheiro de traidor... – Ele ri.

- Está se farejando senhor? – Indago venenosamente.

- Ah, por favor, o senhor e a Loba é que estavam lá quase se agarrando é que vão fazer isso.

Sinto meu rosto queimar, eu não ia beijá-la! Eu apenas quis ouvir melhor o que ela ia me dizer, mas parecia tão estranho, era como se tudo estivesse embaçado, como um sonho.

- Não vou trair ninguém!

- Como não?! – Ele vira sua cabeça, mas o corpo continua seguindo em frente. – A senhorita Barbie chorará muito ao saber que o senhor prefere mulheres mais velhas!

Não consigo esconder meu choque e ele ri de minha reação. Não estava preparado para isso! Maldito... Não vou traí-la, afinal não há como trair aquilo que não existe entre nós. Recomponho-me e digo:

- Não havia percebido, mas é que elas são mais sensuais.

Ele revira seus olhos e sorri maliciosamente, espero que meu rosto não esteja vermelho, ele se vira para frente e diz:

- Eu prefiro as mais insanas... Como a Dianna.

- Meredianna? – Ele consente. – Ah tudo bem, afinal somos todos loucos por aqui...

- Como o senhor sabe meu bordão?

- Alice no país das Maravilhas é um ótimo livro, o senhor conhece o senhor Lewis Carroll?

- Perfeitamente, ele já passou uma estadia em minha casa... – Escuto-o gargalhar. E estou pasmado novamente. – Somos bons amigos!

XXX

Arfo e derrapo, fazendo Cheshire parar. Sem se importar ele me arrasta para um canto, atrás de uma barraca... O quê?!

- Pare! O que vai fazer comigo?! – Indago me debatendo.

Ele sorri e me ergue, fazendo com que eu o encare. Ele diz calmamente:

- Seu preço...?

- O quê?! Eu não estou entendendo aonde o senhor quer chegar.

- Psiu devagar... – Ele sorri mais. – Eu quero saber quanto você cobra para vir para meu lado?

- Como assim?! Eu não estou de lado nenhum! Eu...

- Posso lhe contar coisas que a Loba não pode.

Congelo, ele sabe que Yue quer que eu a ajude a trair a Nonsense, mas e agora? O que faço? Preciso me acalmar...

- Que lado o senhor está falando? – Digo friamente.

- O sem sentido...

Que vantagens terei de continuar onde estou? Se bem que... Não sei nada sobre a Wonderland e se Yue estiver me enganando? Bem preciso permanecer no lado que mais me trará vantagens.

- Quanto me pagas?

- Segredos? Talvez... Posso lhe contar coisas sobre Wonderland que o senhor nem imagina. Saiba que a Lilith já está do meu lado, e ela sabe muito mais que o senhor...

- Feito! – Sorrio diabolicamente. – Mas não ouse me trair...

- Digo o mesmo ao senhor. – Ele me solta e se volta para fora do beco. – Cheiro de gasolina...

- O que isso tem de mais?

Então vejo o brilho vermelho iluminando a noite... Fogo.

XXX

Chego ao local onde houvera o circo. As chamas dançam pela tenda colorida, engolindo-a e lambendo-a. Que bela visão... Imagino Londres nessa mesma situação, queimando sob minhas chamas, como um segundo grande incêndio. Sorrio satisfeito e me aproximo mais, porém o calor é insuportável.

- Wonderland com certeza. – Cheshire sussurra. – Fogo. Só pode ser...

- Olá Chessiê – A voz gela meu sangue.

Viro-me e vejo a loira caminhando em minha direção. Chevonne... Ou melhor, a Duquesa feia. Recuo. Cheshire se coloca em meu caminho.

- Olá mon amour. – Ele diz com um ronronar.

- Não sou francesa, querido. Pobre Chessiê. Já foi domesticado pelos loucos? – Ela chama-o com um movimento de mão. – Vem bichano!

Cheshire silva e me empurra mais para trás de si.

- O que você quer aqui? Veio encobrir Abel?

- Nãh! – Ela dá de ombros. – Vim por conta própria, o Valete disse que vinha brincar com a garotinha e eu pensei que o menininho quisesse brincar comigo. – Engulo em seco. – E Bell está aqui? Para mim ele havia ficado no palácio da ex-rainha de copas.

- Não sei de nada... – Chess me empurra. – Vamos dançar Duquesa?

Ela levanta o lança-chamas e sorri. Acho que isso é um sim, mas e eu? Chess olha em minha direção e vejo a palavra se formar a frente de seus lábios: "Corra!"

XXX

Viro-me e corro para dentro do circo, tsc não tenho para onde correr mesmo...

- NÃO! VOLTE AQUI! – Escuto-a ganir, não vou olhar para trás!

É difícil correr em meio ao fluxo de pessoas correndo para fora, me acotovelo com o povo e logo estou dentro do circo, o fogo tão belo agora me mata. A fumaça fazendo minha garganta secar tusso. E caio no chão. Não posso morrer aqui!

Olho para cima e vejo os últimos integrantes do circo correrem e olho para ele...

Os olhos de duas cores brilhando, um roxo o outro verde... As tatuagens representando símbolos do baralho em suas bochechas, do lado esquerdo, copas, do direito, paus. As roupas de duas cores combinando com seus olhos. Mas o que mais chamou minha atenção foi seu rosto... Era idêntico ao meu.

XXX

- A... Bel...? – As palavras soam baixas.

Ele não me escuta, não me vê. Seus olhos estão vidrados olhando para a garota tatuada e com a boca costurada que o envolve fortemente. Ele sorri ao notá-la e os dois correm juntos para fora... Não acredito!

Meu irmão está vivo! Meu irmão está aqui! Preciso matá-lo! Não posso descansar, não agora! Maldito! Levanto-me, mas estou tonto. Tropeço. Ele já está longe. Muito longe... Minha visão se turva e caio novamente. O povo passa por mim, mas não me vêem. Não me notam, me sinto um verme rastejando. E é ele que me faz me sentir assim.

Alguém me puxa. A pessoa me analisa, é um homem com pregas prateadas no rosto. E depois me joga de lado, mas balança a cabeça enquanto corre.

Rolo para longe, aqui embaixo a fumaça é rarefeita. Posso respirar melhor. Arrasto-me até sair na parte de trás do circo, não posso correr atrás do Abel assim, sozinho, fraco. Devo estar forte e preparado para matá-lo! Tusso e vejo o fogo a minha volta, droga. Como vou sair daqui. A tontura toma conta de mim novamente. Até parece que há anjos cantando aqui, me levando para o paraíso, ou não. Talvez sejam apenas demônios entoando uma bela música.

Não...! Há alguém cantando! Viro-me em busca da bela voz, mas tudo que vejo é fogo. Corro para trás de uma jaula e vejo-o acorrentado a ela e cantando...

Um garoto com os cabelos tão vermelhos quanto às chamas. Ele canta como se fosse à última coisa que pudesse fazer. Vejo as lágrimas escorrerem por seu rosto sujo, não só pela fuligem. Meu peito se aperta. Por quê? Por quê? É só uma aberração desse circo...!

Mas eu também sou uma aberração, olhe para mim, uma criança desejando matar seu próprio gêmeo. Querendo queimar Londres, eu não sou filho de Deus. Todos erraram ao me chamar assim. Até mesmo eu. Apenas mais uma aberração. E vejo-o me refletir ali, cantando e expiando seus pecados. Sua música me atinge e minha mente fica inebriada. "Irei tocar para você, e você cantará, Cain..."

- Pare... – Sussurro para mim mesmo, mas ele se vira assustado e me encara.

Ele tem cabelos extremamente vermelhos, e sardas espalhadas pelo rosto, mas o que mais prendeu minha atenção foram seus olhos de um verde calmo e suave, ele parece ser um pouco mais velho que eu.

- Fuja, vai acabar morrendo se ficar aqui! – Ele se volta para frente e entoa algumas notas.

- Você também! – Ele me ignora. – Ei! Dá pra me ouvir?! – Pouso minha mão em seu ombro e sinto o calor emanado dele. – Você está bem?

- Nem tanto... – Ele canta mais.

- Você vai morrer! Tem muita fumaça! – Tusso. – Vamos sair?!

- Não posso... Não quero.

Encaro-o enquanto ele volta a cantar, mas essa melodia aperta meu peito e esse modo de falar, não é a primeira vez que escuto isso...

- Christopher...? – Chamo sem perceber.

- O que? – Seus olhos verdes brilham. – Você me chamou de que?

Não eram verdes... Eram totalmente cinzas. Pisco atordoado.

- Hã? Ah... P-Por quê? Você não vai ficar aqui e cantar até morrer, vai?

- Sim... Eu não tenho mais nada, tudo me foi tirado, até minha liberdade, fui abandonado aqui para morrer, o que mais posso fazer?

- Não tem mais propósito na vida? – Sorrio diabolicamente. – Salve-me! Seja meu, sirva-me então!

- Por quê? – A pureza explicita naqueles olhos verdes me fazem ter ânsia.

- Porque eu quero você! – As palavras jorram sem meu controle. – Quero te corromper aberração! Lute ao meu lado?!

Ele estende suas mãos acorrentadas e toca meu rosto.

- Mestre... Salve-me? Depois podes me corromper como bem entender.

Sorrio e corro em direção ao fogo, deve ter algo que eu possa usar para arrebentar as correntes. Vejo uma machadinha, pego-a e volto para onde ele está cantando. Não tenho habilidade com isso... E ele me deixa mais estressado ainda com a calma com que canta e permanece com os olhos fechados. E se eu errar? Desfiro o golpe em uma altura segura, deixando um pouco de corrente presa aos seus pulsos. Ele abre os olhos e examina as correntes quebradas.

- Ande! Salve-me! Tire-me daqui! – Grito sentindo a tontura se apossar de mim novamente.

- Sim mestre. – Ele sorri e me pega no colo.

- Não! Assim não! Ponha-me no chão!

- O senhor não conseguira saltar de onde eu pretendo mestre.

Ele salta habilidosamente sobre a jaula. Arfo de medo, como essa criatura conseguiu fazer isso? O abraço mais forte.

- Aonde você quer chegar? – Sussurro.

- Há um lugar seguro!

Onde estávamos se tornou um mar de chamas. E elas estavam se aproximando de onde estávamos agora também. Ele se balança sobre as pernas, e pula, fecho meus olhos e apenas sinto o vento cortar meu rosto, em contraste com o calor de sua pele. Sinto algo diferente, o mundo girar... E então ele diz:

- Mestre. Abra os olhos.

Faço isso e arquejo, estamos agora de cabeça para baixo, acima do fogo. Ele se balança e noto seus pés presos a uma armação do circo. Essa aberração vale muito à pena... Ele sorri e pega impulso, fecho os olhos e espero logo ele está correndo. Espio onde estamos e vejo o chão muito abaixo de nós. Ele está correndo sobre o muro que cercava o circo em chamas...

- Solte-me! Posso correr também!

Ele sorri e solta meu corpo, mas permanece segurando meu pulso firmemente. Corremos até o fim do muro. O circo está a uma distância segura, ele para arfando e gargalha. Sorrio e digo:

- Qual é seu nome, servo?

- Eu não tenho nome, me chamam apenas de Castrato.

- Não tem nome... É? Mas Castrato não é aceitável. – Ele fica triste.

- Então o que...? Ah! – Ele sorri. – Lá atrás você me chamou por um nome bonito.

Engulo em seco, aquele nome não, então qual? Penso um pouco e um nome vem a minha mente.

- Jared. Seu nome será Jared.

- Jared...?! Ah eu tenho um nome! – Ele gargalha e se joga.

Arquejo e tento segurá-lo, mas ele não cai, fica deitado em cima do muro gargalhando. Como ele pode ser tão feliz? Se bem que isso foi à coisa mais arriscada, e divertida, que eu fiz em toda minha vida.

- Qual seu nome? – Ele indaga entre as gargalhadas.

- Meu nome é...

- CAIN?!

XXX

Olho para baixo e vejo uma Lilith arfante e assustada me chamar.

- Seu nome é Cain...? – Ele indaga.

- Sim, é Cain. Mas... Como faço para descer?

- Hu. Você disse que Castrato não era um nome aceitável, mas e Cain?

- Meu nome é muito melhor que Castrato! – Digo ofendido.

- Bem. Diga-me. Onde está Abel, hein Cain? – Sorrio, mas quando vou respondê-lo Lilith berra:

- CAIN!!! PELO AMOR DE DEUS!!!

Ele entende e me ajuda a me apoiar no muro e descer. Nunca fiz isso antes, mas mesmo assim é reconfortante estar tão longe do solo, tem algo de familiar nisso, talvez seja pela minha outra forma.

Toco o chão ofegante, e ele saltita elegantemente até parar atrás de mim encarando Lilith curiosamente, ela o encara e depois diz rispidamente:

- Onde você estava?

- Com Cheshire, estávamos indo atrás... Dele. Então a Duquesa apareceu e Chess ficou lá lutando com ela, por quê?

- O Valete... Ele nos atacou. – Ela desvia o olhar. – Chevonne disse que estava tudo bem, eu tentei ajudá-la...

Ela cobre seu ombro e desvia o olhar, então vejo o líquido vermelho sujar suas vestes. A máscara que ela usa também está manchada. Puxo seu braço e ela resmunga algo.

- A senhorita é uma idiota. Onde Chevonne está?

- C–com a Barbie... – Ela me encara com empolgação. – Cain ela é incrível, nunca pensei que veria aquela criatura chata fazer aquilo!

- Barbary? Hu, só acredito vendo com meus próprios olhos...

- Quem é você? – Ele pergunta timidamente.

- Quem é você! – Lilith puxa seu braço. – Por que está com o Cain?

- Sou Jared. – Ele faz uma mesura. – Acabei de receber esse nome de meu mestre. Olá.

- Hn... Cain agora você sequestra crianças de circo dos horrores? – Viro-me e vejo Chessiê se aproximar mancando. Ele sorri ao nos ver. – Os reforços chegaram. E meu dever é levá-los até a mansão.

- Não! – Lilith esbraveja. – Chess o Valete...

- Valete...? – Vejo seus olhos brilharem. – Mas eu apenas encontrei a Duquesa. Não me diga que... – Ele procura por ela. – Chevonne...?

- Sim... – Lilith diz abaixando o rosto.

- Maldita cabeça dura! Tentem não se matarem!!! – Ele grita para nós.

E depois some.

XXX

- Precisamos segui-lo! – Lilith grita me puxando.

- Não... Não precisamos. Mas... – O que mais podemos fazer?

Ficarmos expostos dessa forma não será bom. De forma alguma. O que podemos fazer...? Talvez se nós formos para dentro do circo? Sou tirado de meus pensamentos por um súbito acesso de tosse de Jared. É mesmo, ele estava com febre, mas agora parece algo mais sério. Ele se curva, Lilith esquece Chevonne e se aproxima dele, mas as palavras que ela diz não me trazem uma sensação boa.

- Sangue...

- O que...? – Digo me abaixando.

Vejo suas mãos escorrendo sangue, puro e vermelho. Desvio o olhar, o que ele tem?

- Eu estou bem... – Ele seca as mãos nos shorts surrados. – Isso é comum, é só uma gripe. Mas eu estou bem...

- Isso não está certo. – Resmungo. – Gripes não causam isso. Vou tratá-lo. Fique vivo até retornamos a nossa casa.

- Sim mestre. – Ele sorri. – Mas uma gripe não pode me matar.

- Cain... – Lilith se aproxima. – A mamãe não pode morrer...

- Eu já disse, a senhorita Chevonne não é nossa mãe!

- Você pode não considerá-la sua mãe, mas eu sim! E eu não quero perdê-la. Não aguento mais! – Ela cobre seu rosto com as mãos. – Quero Jaken de volta... Só você pode me ajudar com isso. O Chess disse que se você for para o nosso lado eu posso salvá-lo.

Ah... Agora faz sentido.

Os dois só querem me usar. A Lilith só fez tudo isso para que eu fosse para o seu lado, para ela salvar Jaken, ninguém se importa verdadeiramente comigo, sou apenas um capacho para todos. É por isso que não posso perder... Devo ganhar desses vermes, e assim será a minha vez de pisar em todos. Sorrio e digo:

- Tudo bem, irmãzinha. Eu já estou do seu lado.

- O quê? – Ela indaga me olhando com uma leve esperança no olhar.

- Estou do seu lado. Sou um sem sentido agora. Afinal, não somos todos loucos por aqui?

- Sim...! Somos todos loucos por aqui!

Ela sorri, mas acho que ela já sabe. Que eu só faço aquilo que me beneficia. E ficarei do seu lado apenas enquanto isso for possível. Logo que meu beneficio se esgotar...

Hu... Será uma maravilha!

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