Falsehood
"Existe alguma coisa no amor generoso e abrangente de um irracional que vai direto ao coração daquele que tem ocasião frequente de testar a reles amizade e débil fidelidade do mero Ser Humano"
Edgar Allan Poe.
XXX
Dez de setembro de 1888, segunda-feira (noite) "...?" Inglaterra.
Assim que tudo se acalmou, (por volta da meia-noite) fomos chamados a sala de Marcel, novamente nem me dei conta de como cheguei àquela sala... Amanhã eu juro que vou fazer um mapa daqui para não me perder mais! Lá ele estava sozinho escrevendo algo, onde foi parar o Cheshire? Sentamo-nos e Bankotsu, que estava conosco, começou:
- Sir. Marcel, nós estávamos conversando e a Little Lady levantou uma questão importante. Agora que Jaken foi levado, quem ficara com a guarda dos dois?
- Guarda...? – Marcel disse levantando os olhos. – Ah claro. Bom sem Jaken os senhores não tem tutor, e o que farão ao descobrir isso?
- Com certeza nos levarão a outra reunião chata, aonde ninguém vai nos querer, como da última vez! – Digo indignada.
- Hn sim, mas também não podemos correr o risco de deixar que levem os dois da nossa vista... Bom, pelo jeito teremos que adotá-los!
- O quê? – Eu e Cain perguntamos em uníssono.
- Bom, mas antes teremos que ver quem se voluntaria... – Ele olhou para Bankotsu.
- Por que eu? – Ele começou indignado. – Eu só tenho 20 anos!!! Não posso ser pai dessas crianças!!!
- Convenhamos! O senhor é o único que é "casado" aqui, e com isso pode receber a guarda dos dois tranquilamente! – Marcel finalizou com um sorriso diabólico.
- Mas... Mas... – Ele olhou em nossa direção. – Ah tudo bem, eu aceito!
- Ótimo! Assim que a senhorita Chevonne melhorar, os dois irão cuidar dos papéis da adoção... Por isso, vou escrever um pedido oficial...
Porém assim que Marcel mergulhou sua pena no tinteiro ela flutuou de sua mão, e logo quem a pegara apareceu. Cheshire surgiu na nossa frente, se sentado na mesa. Sorrindo disse:
- Agora a Lady e o Conde vão ter uma família feliz?
- Saia daqui! Eu já pedi para o senhor se retirar! – Marcel disse rispidamente. – Por favor... – Ele então sorriu como o Cheshire.
- Por que eu não posso ficar em sua sala? Sendo que você sou eu, e eu sou você?
- Sim eu sou você e você sou eu, porém sem que eu seja você e sem que você seja eu, por que...
- Calem a boca os dois! Vocês estão me dando dores de cabeça!
- Uh? Desculpe senhorita, sei que sua mentalidade infantil não pode acompanhar nosso raciocínio avançado, mas deixe-nos discutir!
- Hu, é assim que todos me veem? Sinceramente, pensei que seria mais bonito e inteligente. – Marcel disse para Cheshire sarcasticamente.
- Sinto muito se o senhor tem problemas na visão, pois eu sou lindo!
- Ah Sir. Marcel... Sir. Cheshire... Desculpe, mas vamos nos retirar...
- Ah! A família feliz vai nos deixar sozinhos? – Cheshire disse tristemente.
- Tudo bem, senhor Bankotsu. E se certa pessoa possuísse o mínimo de bom senso, se retiraria daqui também...
- Isso foi uma indireta...?
- Vamos antes que eles se matem... – Bankotsu sussurrou para nós.
E juntos saímos, mas não antes de ver o Cheshire desaparecer no exato momento em que um tinteiro voava em sua direção. Mas eu não podia rir agora, pois tenho outro assunto a tratar...
- O que foi isso? O senhor não queria ter sua idade afetada por nossa culpa? Eu não preciso de sua compaixão! Não precisa nos adotar!
Ele então me olhou de cima abaixo, e depois disse irritado:
- Desculpe, eu não queria ter agido dessa forma tão infantil, mas eu só não queria ter os dois me chamando de "papai" por aí o tempo todo... E ainda mais, eu não quero ser um chato como pai. Eu quero ser apenas o amigo chato de vocês! – E finalizou rindo.
Hn? Como assim ele não quer ser nosso pai, por que gosta de ser nosso amigo...? Ah agora entendo um pouco o que ele fez...
- Tudo bem eu te desculpo, "papai"!
- Por favor, não me chame de papai! Lilith!
- Agh... É estranho ouvir o meu nome depois de tanto tempo sendo chamada de "Little Lady"... Vamos fazer um acordo: Nada de "papai" e nada de "Lilith" dessa forma ríspida?!
- Tudo bem, eu aceito esse acordo. – Ele afagou meus cabelos, sorrindo. – Mas agora os dois vão dormir, pois já passou da hora de criança estar acordada!
- Mas nós não somos crianças normais! – Digo contendo o impulso de chamá-lo de papai novamente.
- Mesmo assim! Eu sei que os senhores estão com sono, posso não parecer, mas sou um pai atencioso! – Ele se gabou rindo, mas parou sério. – Ah não! Agora vou ter que me casar de verdade com a Chevonne! E imagine o que ela vai fazer quando descobrir que agora temos "filhos"? Aí que dor de cabeça...
- Ela vai ficar muito feliz, e trate de ficar também!
Ele me olhou sério, mas depois suspirou e sorriu tristemente.
- Acho que vou ter que abandonar minha amada para viver uma vida falsa a partir de hoje... Bom, boa noite...
Dizendo isso ele se virou e nos deixou sozinhos... Será que ele não percebe que a "vida falsa" é a que ele está tendo ao lado de uma pessoa que não está mais viva. E que nem ao menos tem sentimentos?
- O que será que ele fará com a senhorita Doll agora que Jaken não está aqui para consertá-la?
- Eu não tinha pensado nisso, mas ele está certo, eu estou com sono... Cain... Você sabe voltar para o quarto que dormimos ontem?
- Claro, por que a senhorita não sabe?
- Não... Parece que essa casa é mágica... Toda vez que eu ando por ela saio em um lugar diferente, e nunca consigo decorar os lugares daqui.
- Eu sei, também acontece comigo às vezes. Quando eu ando as coisas parecem mudar de lugar.
- Isso é puro Nonsense... – Digo sorrindo.
- Só tenho a concordar. – Cain diz com um sorriso contido ao final.
Então o sigo pelo corredor, acho que é o sono, ou não, mas tudo parece um borrão a minha volta, assim como quando eu saí correndo por aqui. Logo chegamos ao mesmo quarto de ontem, Cain então põe sua mão sobre a maçaneta...
- Você vai dormir comigo de novo...? – Pergunto sonolenta.
- Não me sinto seguro de dormir em um quarto daqui sozinho.
- Isso é um "sim"?
- Aceite como um se quiser. – Ele diz abrindo a porta.
Assim que entro no quarto vou em direção ao guarda-roupa. Só agora noto que minhas roupas não estão aqui, reclamarei com o Marcel amanhã, mas agora vou ver se há algo que caiba em mim... Encontro algumas roupas de mulher aqui, mas são todas grandes demais para mim. Então seleciono o vestido mais confortável que encontro e o visto. Depois de colocá-lo que reparo em uma coisinha... Cain está aqui! Olho, envergonhada, ao redor, mas ele já está dormindo...
Aproximo-me da cama e olho seu rosto. Dormindo ele fica tão sereno... Sem a expressão demoníaca de sempre. Vou até o outro lado da cama e me deito. Logo durmo sem mais preocupações...
XXX
Eu estava errada, meus sonhos são povoados de sorrisos flutuantes, e gritos estridentes, sangue... Muito sangue... Estou em casa, observo um retrato... Papai e mamãe...? Não! Bankotsu e Chevonne...
Retorno aquela cena horripilante, a linda mulher de longos cabelos negros... NÃO! Chevonne está caída no chão... A sua volta, sangue, muito sangue se espalhando pelo quarto... O coração ainda pulsando... A garganta cortada... Os olhos se enchendo de lágrimas... Sua mão ensanguentada se estendendo... NÃÃÃÃÃOOOOOO!!!!!
XXX
Acordo suando frio... Meu coração acelerado... Chevonne...
Foi um sonho! Tudo um sonho! Tento enfiar isso na minha cabeça, mas parece que não dá... Estou muito assustada para isso... Cain...? Viro-me e não o vejo, ele não está aqui no quarto, mas é cedo. O dia nem amanheceu ainda. O que aconteceu com ele? Desesperada, desço da cama e vou em direção a porta. Eu tenho medo de me perder, mas vou ter que procurá-lo ou senão vou morrer de preocupação.
Desço as escadas devagar até chegar a um andar da casa que eu nem lembrava que existia! É um longo corredor escuro e vazio, o lugar me causa calafrios. Continuo a descer até chegar à sala de estar de ontem, e para minha surpresa ele está lá...! Recostado sob uma poltrona em frente à lareira, ele está dormindo?
- Cain...? – Sussurro enquanto me aproximo dele.
- Pois não? – Ele sussurra de volta.
- O que o senhor está fazendo aqui? – Indago me aproximando.
E então eu vejo seus olhos inchados... Ele estava chorando? Ou só não dormiu direito? Isso está me assustando mais que o corredor sombrio.
- O que foi? O sen... Você está bem?
- Mamãe... – Ele sussurra. – Eu tive um pesadelo. Não quero mais ter mãe! Nem pai, muito menos tutor! Todos morrem! Eu não aguento mais!
- Eu te entendo... Isso faz parte da "maldição dos Maurêveilles".
- Você também vai me deixar! Eu sei disso!
- Não! Quem te disse que eu te abandonaria com toda a diversão? Agora que a gente pode ficar juntos, e até que aqui não é ruim, é perigoso, mas nós gostamos disso, não é?
- Sim... É verdade, promete...? Que você não vai me abandonar nunca...?
- O que...? – Indago.
- Se um de nós... Morrer... Se algo me acontecer, se eu morrer... Você também morrera...? Você não vai me abandonar! Promete...? E que vamos sempre proteger um ao outro...! Entregue sua vida em minhas mãos... Você faria isso...?
- Você morreria se eu morresse? – Acho que já sei a resposta.
- Promete...? – Ele suplica de olhos fechados. – Vem pro além comigo?
Maldito! Ele armou tudo isso para me usar de escudo quando algo mais perigoso acontecer, se fingindo de fraco e pedindo ajuda. Seu lado calculista me faz ter calafrios Cain... É verdade que você conseguiu me enganar por um momento, mas eu também posso brincar disso:
- Eu sempre vou te proteger... Meu amado irmãozinho. – Digo beijando sua têmpora e o abraçando. – Porém a minha vida eu só posso te entregar se você cumprir a promessa que fez a mim há muitos anos.
- Promessa...? – Ele me pergunta receoso.
- Sim, a promessa de que juntos mataríamos aquele que nos tirou o nosso bem mais precioso...?
- Mamãe... – Ele sussurra. – Você quer dizer...? Mas ele já está morto!
- Sim... Mas eu não aceito que ele tenha fugido de nós.
- Louca... – Ele diz afundando seu rosto em meu peito.
- Por que eu sou louca? – Indago docemente, e ao mesmo tempo com um veneno na voz que não parece ser meu.
- O papai está morto! Como você deseja matá-lo?
- Ora! Eu sou a rainha dos demônios não? Basta irmos ao meu reino. Juramos fazê-lo sofrer o mesmo que ela. Mesmo que ele esteja morto... E faremos isso!
- Louca... – Ele repete me abraçando.
E juntos ficamos assim em silêncio. Com as nossas promessas de mentira, e nos envenenando com nossa falsidade. Afinal ele é Cain e eu sou Lilith... A pior dupla do mundo...
XXX
Nenhum de nós conseguiu dormir depois daquela conversa, então retornamos ao quarto, ele para recolher suas coisas, eu para procurar uma roupa para mim. Por isso agora estou com um vestido preto simples, já que é minha cor predileta. Desço as escadas com medo novamente, parece que o corredor sombrio nunca existiu, pois agora tudo o que vejo é a escada que vai em direção a sala. Será que eu estava sonhando com aquele corredor? Que medo...
Ao chegar à sala de jantar sou recebida por um grito agudo, mas não de medo, e sim de alegria...
- Mon doux! Você e mon fille agorra! Estou tam feliz! – Uma Chevonne super-animada grita da mesa para mim.
Pelo visto o corte em seu braço foi sério, mas ela parecia não se importar. Havia até um enorme bolo na mesa, que acredito ter sido feito por ela mesma. E ao seu lado um Bankotsu e Cain desanimados e entediados, igualmente como as outras pessoas que estavam na mesa. Espere um momento... Há uma pessoa a mais aqui!
Uma mulher de longos cabelos cacheados no tom rosa que chegavam a tocar o chão... Seus olhos verdes estavam vendo algo que eu provavelmente não podia ver, já que ela encarava o nada com profunda concentração... Ao notar minha curiosidade Bankotsu diz:
- Essa é a Meredianna, Little Lady... Meredianna a vidente...
Ao ouvir seu nome ela virou seu rosto em busca de quem falara e ao ver o bolo disse sorrindo:
- Oh um bolo... Que bonito... Bonito... – E começou a divagar novamente.
- Essa aí é completamente louca! – Yue diz ao passar por mim. – Vive divagando do nada e se perde até em uma linha reta!
- Yu...? Yu... E! – Ela diz satisfeita por se lembrar do nome dessa.
- Sim! Parabéns! Quer um prêmio Meddi?
- Loup! Non brrigué com a Merredianna! Oh, mas deixe de lado! Deixe de lado! Venha comerr o bolo que fiz em nossa homenagé! Da nossa famille feliz!
- Estou sem fome. – Digo irritada.
Mas a expressão dela é de tanto descontentamento que sou forçada a me sentar a seu lado e comer seu bolo, fabuloso, mas desde aquela conversa acho que acabei perdendo a capacidade de sentir felicidade...
Lembrar daquele sonho, minha mãe... O fato de ela ter sido morta por meu pai... Tudo isso é atormentador, ainda por cima, Cain vem falando aquelas coisas de "vem pro além comigo", como se ele realmente se importasse comigo. Tudo isso me mexe por dentro. E eu não sei dizer qual é a proporção de confusão que está ocorrendo em meu interior. Eu não sei o que fazer...
Então noto os olhos verdes dela me encarando. No exato momento em que ela levanta suas mãos para tocar meu rosto, Bankotsu a impede, ela se vira para ele e com uma voz sinistra diz:
- Seu corpo cheira a morte.
E isso não lhe traz sorte.
Abandone seu passado, não olhe para traz.
Siga em frente, siga em paz.
- Eu odeio suas indiretas rimadas Meddi! – Ele diz rispidamente.
- Hu, fez bem em não deixá-la tocar na Lady, senhor Bankotsu. – Matthew diz rindo. – Eu não gostaria de ouvir uma profecia nova esta manhã. Certo, senhorita Meredianna?
- Oi...? Hã...? O que houve...? – Ela diz voltando a divagar.
Ah essa é a Vidente. Sim agora eu entendo, se ela me tocasse eu "ganharia" uma profecia. Ainda bem que o Bankotsu a impediu de fazê-la. Eu não sei se iria gostar de uma profecia logo no café da manhã. Bankotsu a senta devagar em outro lugar da mesa, e ela fica lá, dando risada ao ver seu reflexo na colher...
- Bom. Distraçons á parrte vamos celebrar!
- Eu já estou satisfeita... Senhorita Chevonne. – Digo deslizando para fora da mesa.
- Oh non! Volte aqui fille! E me chame de maman!
- Eu também vou sair Chevonne. – Bankotsu diz se levantando. – Preciso concertar a Doll antes que ela "morra" de novo.
Acho que ele disse as palavras erradas nesse momento. Ela lhe lança um olhar desolado, onde foi parar a felicidade até a pouco estampada em seu rosto?
- Oui... Acho que je também vai... Vai... Sair...
Dizendo isso ela saiu correndo... Chorar provavelmente. Sem se abalar Bankotsu sai, deixando a, todos no recinto, mudos diante da sua frieza. Como ele pode fazer isso com alguém que o ama tanto...?
Não sei de mais nada... Saio andando também, não quero ver Cain, Bankotsu muito menos a Meddi! Ela me assusta, e quanto mais longe melhor. Caminho sem rumo, o que era de se esperar, essa casa é louca! Sigo a passos firmes que me levarão a algum lugar.
Quando cruzo em frente a uma porta escuto alguém fungando, Chevonne, provavelmente, ou algum Wonderland infiltrado. Empurro a porta e o que encontro não é nenhum dos dois...
- Emmeline...? – Sussurro.
Ela estava chorando... Pobrezinha, ela gostava do traste do Jaken, não consigo conter o impulso de consolá-la, ela é uma pessoa tão boa.
- Aí Lady...! Não me veja agora... Estou horrível, o mestre Jaken ia me odiar ver desse jeito! – Ela diz começando a chorar.
- Emmeline, não chore por ele, e eu sei que o Jaken odiaria-te ver desse jeito, assim como eu!
Ela para de chorar e começa a soluçar freneticamente, acho que eu devia colocar ela e a Chevonne juntas, para ver quem chora mais. Ou quem faz o maior escândalo por seu "amado".
- Sabe se eu colocar você e a Chevonne juntas eu não sei quem vai ganhar no quesito "drama por seu amado"! – Digo venenosamente.
- Pois bem! Eu perderia pra aquela francesa fresca, e com orgulho! Mas se isso for realmente uma categoria, acho que é bom incluir o Sr. Bankotsu também, já que ele faz parte disso como nós.
- Não o quesito dele é "não consigo acordar pra realidade". – Digo sorrindo. – E aquilo ainda vai ser meu pai...
- Seu pai...? Como assim senhorita Lilith? – Ela me pergunta receosa.
- Pode me chamar apenas de "Little Lady". Bom eu vou te contar tudinho, senhorita Emmeline. – Digo como ela.
E assim começo a contar sobre tudo o que aconteceu, enquanto a consolo e a faço esquecer o Jaken, eu acho que posso chamá-la de... "Amiga"... A partir de hoje...
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