Capítulo 4: As Tradições


Dezembro de 2013

Não conseguira suportar ouvir calada tamanha difamação em seu nome, quando dito por aquelas duas senhoras que ela não medira esforços para aguardar vê-las. Nem se quer percebeu que era seguida por Gabe, porque só desejava deixar as lágrimas rolarem. Ela era uma excelente aluna, uma jovem que sempre fora considerada muito educada, e não conseguia ser capaz de compreender, porque era tão odiada. Ao menos queria se forçar a acreditar que estava sendo negativa, e que era apenas a sua velha mania de que ela deveria agradar a todos.

Entretanto, ela saíra do salão coberta em lágrimas, pois não possuía uma fisionomia de ferro, seu interior não era de aço, e aquela pressão toda lhe deixara com frio na barriga e a beira das lágrimas.

— Espere Anelise— pedia Gabe, mais atrás a seguindo.

Ela optou por ouvi-lo assim que estavam longe de todos, não queria que a vissem chorar, detestaria ouvir que eles eram capaz de assustá-la, ou pior que ela realmente não era feita para o mundo deles.

— Eles são... tolos— ele murmurou, assim que a viu se virar para ele em pranto— preconceituosos e orgulhos, não tem noção do que estão dizendo e muito menos...

— Saber que isso poderia acontecer, me fez vir de forma... realista— fungara— mas, dói saber que você é tão menosprezada e esnobada apenas por não ter tido sorte ao nascer.

— Isso não é verdade— rebateu ele, desconcertado— você pode se considerar sortuda agora que foi adotada pelos...

— A adoção nem se quer é definitiva— respondeu ela, mais alto do que desejava, secando o rosto de imediato, e dando um longo suspiro— nem se quer...

— Anelise? Caden?— Blanca aproximara-se deles.

— Senhora Mitchel— cumprimentou-a ele— eu estava...

— Ah, querida— dissera ela, em tom de lamento, observando Anelise de modo atrapalhado esconder as lágrimas— eu sinto muito— e então estendeu-lhe os braços para abraçá-la— as pessoas sabem como ser insensíveis em ocasiões como estas— Anelise que aceitara o abraço, nada dissera.

— Queria apenas que esquecessem por um momento que eu sou uma órfã— revelou ela, fungando.

— Isso é tolice minha criança, você nem mesmo é... — Anelise encarou-a abruptamente, achando-a tola, enquanto Blanca, começara a soar frio, por quase lhe dizer o que sabia.

— É claro que...

— A verdade é que ela não pode deixar o preconceito das pessoas, vencer a índole dela— Gabe dissera, ignorando a regra de privacidade de ambas, não verbalizado.

— Ele tem razão— concordou Blanca— eu jamais conheci jovem tão educada e inteligente, em toda minha, e olha que eu tenho muita vivência, algumas irmãs e duas lindas filhas— ambos riram— Anelise, sua inteligência e carácter é muito maior que a mente pequena dessas pessoas, meu amor— insistira ela.

Anelise suspirara, não sabia se deveria mesmo levar em conta o que aquelas pessoas falavam, eram dolorosas tais palavras proferidas, e ainda mais difícil imaginar que se deixara levar por elas, ao invés, de se lembrar quem era de verdade.

— Em breve ela fará parte da St.Paul, assim como você— informou Blanca a Gabe.

Um sorriso tímido brotou em Anelise, enquanto Gabe sorrira e assentira.

— Isso é uma boa notícia— dissera ele.

Menos de dois minutos depois, ambos voltaram para a festa, conversaram sorriram e Anelise fora forte o bastante para tolerar todos os seus problemas, quanto as conversas preconceituosas sobre si.

Na manhã seguinte, a casa parecia vazia, apenas os funcionários trabalhavam em seus ritmos rotineiros. Os donos da casa ainda dormiam, ou ao menos era o que aparentava, já que não havia som qualquer de pessoas conversando.

Decidira checar na sala de jantar, se havia posto algum café da manhã sobre a mesa, o seu estômago roncava e não conseguia imaginar porque comera tão pouco na noite anterior. Bocejava enquanto, caminhava até a sala de jantar.

— Pensei que já houvéssemos resolvido esse assunto Samuel— esbravejava, quase em um sussurro a senhora Blanca Mitchel, para o marido que estava com o rosto coberto pelo jornal.

— Estou em minha casa, minha opinião é está, e não há nada que diga para mim mudar— respondeu ele, rispidamente, no mesmo volume.

— Prometera apoiar Genevieve e Augusto quando a criança fosse adotada— lembrara-o ela.

— Eu nunca prometi nada a eles— respondeu ele, abaixando o jornal— pelo que eu bem me lembre querida, deixei bem claro que isso seria total responsabilidade deles, e que deveriam saber controlar as coisas, para que a criança não sujasse o nome da família.

— Impossível— esbravejou ela— e tudo isso porque seu orgulho pode lhe consumir.

— Isso não é orgulho Blanca, é sacrifício em prol de um bem maior que você em todos esses anos, parece não ter...

— Ah, querida, bom dia— dissera Blanca, o interrompendo, ao notar Anelise aproximar-se da mesa, na maior rapidez em disfarçar a sua discussão matinal.

— Bom dia, senhora Mitchel—respondeu ela, ainda sonolenta.

— Me chame de Blanca, querida— pedira ela— até que se sinta confortável para...

O estalo dos talheres sobre o prato do senhor Mitchel, chamara a atenção de ambas.

— Bom dia, senhor Mitchel— dissera ela, receosa. Sabia muito bem, que o senhor não nutria nenhuma simpatia, ainda menos confiança, em ter ela por perto.

— Humm— grunhira ele, em resposta, lançando um olhar reprovador a esposa, que o ignorava— bom dia— prosseguira, em toda sua má vontade.

— Acordou cedo hoje— observou Blanca.

—Ah— ela grunhira, sentando-se em uma das cadeiras vazias, direcionando seu olhar ao relógio não muito distante dali— acho que mais tarde do que deveria.

— Bem, em ocasiões como essas, nós costumamos demorar um pouco mais para nos levantarmos— explicara ela, sorrindo.

— Besteira— rebateu Samuel— eu não vejo porque mudar minha rotina, só porque dormi mais tarde na noite anterior, do que é costume acontecer.

— Sabemos disso— resmungou Blanca, o ignorando.

— Aliás, Anelise, como fora a festa para você ontem?— algo em sua fala, soava como maldade. Blanca soltara seus talheres sobre o prato, fazendo um estardalhaço maior do que imaginava, e as bochechas da jovem passara a ganhar uma cor cada vez mais avermelhada.

Perdida em entreolhar de um lado para outro, não sabia como explicar o quão provadora fora estar presente na ocasião proporcionada na noite anterior. Limpou as mãos, sobre sua calça, e o respondeu.

— Acredito que tenha sido satisfatória em alguns pontos— nunca imaginara ter de se esforçar tanto para dar uma simples resposta.

Mas, o senhor Mitchel, não aparentava satisfação. Constatar a inteligência da menina, o deixara parcialmente irritado.

— Soube que conhecera alguns jovens muito promissores, quais tenho profunda afeição— a indicação em sua voz era da mais pura indiferença— espero que possam conseguir mudar um pouco o comportamento permitido em entidades que acolhem crianças...

— Não vejo porque ela teria de receber profunda mudança com essas companhias— interrompera Blanca.

— Toda pessoa necessita ser polida, senhora Mitchel— o senhor Green, George, entrara na sala de jantar. Anelise que até então só havia presenciado seu desdém e desprezo, assim como o senhor Mitchel fazia questão de demonstrar, não tivera notado o sotaque implícito que este possuía— principalmente jovens como ela.

— Não seja preconceituoso— interveio Gerda, logo atrás dele, tocando em um de seus braços— papai, mamãe, bom dia— desejou ela, depositando um beijo no rosto de cada um— bom dia, Anelise— desejou ela, carregada de um sorriso meigo.

— Gerda foi altamente polida, e era pouca coisa mais velha que está menina— recordava Samuel, a sua esposa— certamente, está menina necessita mais do que nunca.

Pensara naquele instante, que os breves momentos em que Genenevieve lhe ensinava como segurar uma mera xícara de chá, ou qual era a ordem dos talheres, e como colocar o guardanapo sobre a mesa, e como não encostar o cotovelo nem mesmo nas toalhas de mesa, fosse o suficiente para se encaixar. Obviamente, era o erro de uma principiante, estava mais do que claro, que sempre precisaria de mais.

— Não vejo, motivos para uma mudança drástica— rebateu Blanca, aborrecida.

Um som estridente de toque de telefone soou entre os presentes, George evidentemente deixou claro que se tratava do seu aparelho.

— Me deem licença, mas, preciso atender está ligação— informou ele, educadamente, retirando-se.

— Senhor Mitchel— chamara-o o senhor Billien— há uma ligação no escritório para o senhor.

— Ah, vejam só— exclamou ele, como se fosse uma maravilhosa desculpa, para se retirar, enquanto olhava o seu relógio de pulso— obrigado Billien.

O mordomo acenou com a cabeça e se retirou.

— Genevieve ainda não se levantou?— indagou Gerda, a sua mãe.

— Ah, pelo contrário— dissera ela— disse que precisava sair um pouco mais cedo, mas, que em breve estaria de volta para o café da manhã— por um momento, Blanca encarou Anelise e sorriu.

— Claro— respondeu Gerda.

— Augusto por outro lado, está preparando aquela tradicional torta de abóbora para o almoço, lá na cozinha, com a senhora Constantin— Gerda sorrira, com a informação.

— Que notícia, maravilhosa— resmungou ela— bom saber que as tradições permanecem— ela encarou Anelise pensativa— você também tem alguma tradição Anelise?

Anelise piscou, estava prestes a engolir seu último pedaço de pêssego e desistira de tentar, com a pergunta.

— Na verdade, não— respondera ela— gosto das amoras que nascem antes da neve cair, e das geleias que produzíamos nesta época do ano, com senhora da cozinha do orfanato, mas, era apenas isso— contara, dando de ombros.

— Bom, isso já é alguma coisa— dissera Blanca, na tentativa de consolá-la.

— Ah, tenho mais uma notícia para a senhora— dissera Gerda— infelizmente, George e eu paramos de tentar, já estava na hora de aceitarmos a realidade— uma nébula triste tomou conta do rosto da mulher a frente de Anelise— é difícil para ele, tanto quanto é para mim.

— Ah, querida, eu sinto muito— Blanca, imediatamente se virou para abraçá-la— sei que é um assunto muito doloroso— afagando-a, ela voltou seu olhar de soslaio para Anelise— tenho certeza, que se puderem considerar, seguir o exemplo de Augusto e Genevieve, seria uma boa opção.

Ambas, se soltaram e discretamente Gerda limpou o canto dos olhos.

— George deixou claro, que não deseja realizar uma adoção— de alguma forma, o falar de Gerda indicava que escondia algo a mais, por trás desta decisão de seu marido.

— Compreendo— assentiu Blanca se calando.

As horas que se seguiram foram bastante tediosas, Augusto passara o resto da manhã na cozinha, onde Anelise sentia que ainda podia não ser bem-vinda. Por algum motivo, pensava que os funcionários a rejeitavam, tanto quanto a maioria dos membros da família. Genevieve chegara apenas minutos antes do almoço, quando trouxera com ela, um enorme pacote, que entregara a ela, e o pequeno Sam, revelara adquirir um novo hobby, seguir Anelise, enchendo-a de perguntas.

— Abra-o — pediu Genevieve, eufórica— quero...

— Pela empolgação parece até que colocou um cachorrinho ai dentro, Vi— dissera Gerda, em tom de brincadeira, trocando um olhar amigável com a irmã.

— Cachorrinho— Celebrou Sam, em gritinhos.

— Cachorro? Onde?— indagou a outra senhora Mitchel, em desespero.

— Acredito que não, haja cachorrinho— Respondeu Blanca, tranquilizando-a.

— Vamos lá, Ane, abra, abra— empolgado com o pacote, Sam pedia em pulos.

— Ane— murmurou ela, sorrindo por ganhar mais um apelido.

Ela então seguiu o pedido de Genevieve, abrira o pacote e se deparara com materiais escolares, mochila e uniformes, que ela costumava ver apenas em filmes.

— Ah, a velha saia escocesa— resmungou Gerda, em desanimo.

— Você passou todos esses anos, como uma das generosas doadoras da escola, para deixar eles ainda fabricarem essas saias?— o resmungo de Gerda, fizera Blanca e Genevieve sorrirem.

— Se lembra delas, com a mesma impaciência dos velhos tempos de escola— dissera Genevieve— mas, e quanto a você Anelise, o que achou?

O uniforme era azul e branco, St. Paul, estava bordado na saia e na camisa, e tudo parecia diferente o bastante para ela.

— É... bonito— respondeu ela, encarando o uniforme.

— Não gosto?— perguntou Genevieve.

— Só achei diferente do que estou acostumada— respondeu ela com sinceridade.

— Como se uma órfã tivesse opção de escolher.

— O nome dela é Anelise— rebateu Genevieve, irritada com a cunhada— Anelise— sibilou ela.

— Tanto faz, é o que ela é, e se estivesse no lugar dela, ficaria grata o bastante por estar em uma escola tão prestigiada, qual tivera a sorte de conseguir uma vaga no meio do ano, por ser apenas uma Mitchel— rebatera a mulher, empinando o nariz e saindo da sala.

— Ignore-a— pediu Genevieve— ela é detestável.

— Vi— repreendeu-a Gerda.

— Todo mundo aqui concorda— insistiu Genevieve, e todas caíram na gargalhada.

— Acho que você pode gostar de lá— dissera Blanca, carregada de positividade.

— Só há duas coisas que quero explicar— disse Genevieve— primeiro, a academia St. Paul, é um internato, mas, diferente das escolas públicas, você não volta para casa no fim do dia, você fica na escola, o que implica em morar lá, semanalmente. A segunda coisa, é que nos fins de semana, os alunos voltam para casa, é um costume pelo qual eu e meus irmãos passamos, e é bom para estreitar laços de amizades.

— É eu bem me lembro dos laços de amizades que você estreitou com o Carling— brincou Gerda, fazendo ambas, rirem.

— Você fez bons amigos Gerda— lembrou Blanca.

— Péssimos também— resmungou Genevive, pigarreando em seguida, para que mais ninguém, escutasse ela— bom, estive falando com a diretora, você...

— Conseguiu encontrá-la em meio a esse clima?— indagou Blanca— Deve ser muito importante mesmo.

Genevieve sorriu.

— Bem Anelise, as aulas começam no dia dois, e sei que o quarto que ficar, vai ter algumas colegas junto e...

— Você deverá tentar estreitar amizade com elas...

— Ou ao menos se respeitarem— dissera Blanca.

— Isso poderá ajudar você durante o ano escolar— concluiu Genevieve, semicerrando os olhos para a mãe a irmã.

— Você está cada dia mais parecida com a mamãe— comentou Gerda, rindo.

—Eu?

— Eu me lembro de dizer isso a vocês— disse Blanca.

O resto da semana fora muito agradável, embora, houvessem ocasiões em que Anelise se retirasse para controlar a imensa vontade de chorar. Genevieve demonstra-se muito protetora, e uma grande mãe, e jamais poderiam esquecer a deliciosa torta de abóbora de Augusto, e os bonecos de neve de Sam, que gostavam de acertar o cabelo de Anelise, com bolas brancas e geladas.

Samuel, George e Carlos, felizmente tinham sempre muito trabalho e Augusto, era um ótimo pai para ela. Mas, como todos os homens da casa, ele também estava sempre abarrotado de trabalho. 

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