Capítulo 1: A Menina do Laço de Fita


Dezembro de 2013

Era uma manhã impressionante, tudo parecia estar em seu devido lugar, o que quase nunca ocorria, exceto em dias de visitas de possíveis pais. Os casais que buscavam adotar crianças, sempre escolhiam os mais novos, bebês a crianças de quatro anos. Os mais velhos, como Anelise, não eram escolhidos. Isso ocorria pelos desafios da puberdade, quais a maioria dos casais não estavam dispostos a lidar. No entanto, a maioria dos adolescentes, estavam no orfanato, porque haviam sido enviados por questões judiciais, vítimas de assédio familiar, agressões e etc. Não era o caso de Anelise, ela vivia ali, desde sempre, a coordenadora sempre dizia, que fora para ainda com poucas horas de seu nascimento que ali chegara, pequena, embrulhada em sua cesta. Era apenas o cobertor, a cesta, e os presentes do fim de ano que mantinha debaixo de sua cama, como os únicos pertences que tinha.

Enquanto crescia, as peças de roupa mudavam, eram doadas aos mais novos, e muita das vezes, ela pouco as via de volta, para manter guardadas como lembranças. Ela pensava que não havia muito o que manter guardado, agora só tinha a jardineira e a blusa creme de manga longa que usava, além do uniforme da escola do bairro, e algumas cinco ou sete peças a mais de roupas que mantinha. Aos quinze anos, a única coisa que sabia era que fora abandonada por seus pais, que não tinha pistas de sua verdadeira identidade, e que fora batizada como Anelise, pela coordenadora e os outros funcionários, assim que chegara.

Lise, era como as outras crianças a chamava. Amarrava a fita vermelha nos cabelos ainda cor de mel, enquanto a maioria descia para conhecer o casal que vinha visitá-los desta vez. E como sempre, ela só seguia as ordens da casa, não mantinha esperança alguma, e esperava que a pequena Grace, de um ano, fosse adotada por eles.

— Vamos Lise— chamaram-na uma última vez, enquanto dava uma última olhada em si no espelho.

Na sala, todos os órfãos se mantinham reunidos, os mais novos eram seguros pelos mais velhos, e alguns dos funcionários, enquanto os mais velhos dos órfãos, ficavam mais atrás, apenas observando o novo casal. Pela aparência de ambos, eles vinham de família de alta sociedade, poderiam não ter filhos, e pareciam ser muito gentis, isso se dava ao fato de querer trocar ao menos cumprimentos com cada uma das crianças. Anelise sorrira, para a colega de quarto ao lado, assim que a mulher colocara os olhos na pequena Grace, era como se ambas dissessem bem, aqui está a escolhida. Mas, ela logo se levantara e seguira dando atenção aos outros. Enquanto caminhava os observando, Anelise, pensava em como estava desejosa por amoras, o pé no jardim do orfanato estava carregado, e ela não via a hora de amanhecer para colher, algumas. A manhã havia chegado, mas, ali estava ela de pé, realizando uma espécie de cerimônia que sempre ocorria, quando algum casal disposto a adotar surgia.

Os olhos da mulher pousaram sobre as crianças menores a sua frente, ela perguntava a idade, o nome, o que mais gostavam, e sorria para todos. Eram sempre ditas as mesmas coisas. Mas, o seu marido, circulava pela sala, acenava para os menores, voltava a ficar ao lado dela, e repetia tudo novamente. No momento em que ela se levantou, ele estava ao seu lado, ela cumprimentou os colegas ao redor, até chegar em Anelise.

De início, Anelise achou que era apenas o costume, um cumprimento qualquer, rápida observação, e seguiam com os cumprimentos por mera educação, o que nem todos faziam. Mas, a mulher não conseguia sorrir enquanto a encarava, sua face tremia, e o sorriso sempre que tentava surgir, vacilava. O seu marido, olhava dela para Anelise, e fazia expressões de surpresa e contentamento. Quando enfim ela conseguira dizer algo, Anelise, sentiu um frio na barriga.

— Como você se chama?— perguntara a ela.

— Anelise— respondera.

— Anelise— repetiu a mulher, assentindo, com os olhos marejando em lágrimas— você tem quantos anos?

— Quinze.

A mulher assentiu, suspirou fundo, molhou os lábios e olhou para o marido com um dócil sorriso, estampado em sua face. Ambos assentiram, e então ela seguiu cumprimentando os outros.

No fim de todo o processo, eles voltaram a falar com a coordenadora, que muitas das vezes, deixara escapar alguns olhares para onde estava Anelise. A mulher parecia encantada consigo, a ponto de se emocionar, enquanto a menina, se mantinha neutra, apenas desejosa das amoras.

Quando todos foram dispensados, para que o casal e a coordenadora pudessem conversar a sós, Anelise correu para o jardim, colheu suas amoras, e passou metade daquela manhã seguindo um dia qualquer.

— Lise— chamou-a a diretora do orfanato, acompanhada da coordenadora, próximos as onze da manhã, enquanto a mesma, ensinava aos mais jovens, a contar a quantidade de vezes que saltavam a corda.

— Sim— respondeu, olhando em direção delas.

— Poderia nos seguir, por favor— pediu a diretora, com um pequeno sorriso.

Anelise assentiu, se levantou e caminhou com as sobrancelhas franzidas até as mesmas. Não entendia nada do que poderia estar, havendo, mas, imaginava que como não havia feito nada de errado, tudo que poderia acontecer, seria uma surpresa. Ela pôde observar que estava um pouco suada, o sol resolvera aparecer naquela manhã, o que deixara todos animados, assim, como também, a diretora e a coordenadora, pareciam estar.

— Lise, espero que entenda que não está indo receber nenhuma punição— tranquilizou-a a coordenadora. O que ela já imaginava.

Quando entraram na sala, o casal que conversavam baixo entre si, olharam para elas. Pareciam empolgados e animados, e para a surpresa de Lise, aguardavam por ela. Não havia nenhuma criança pequena para ela segurar, e nem mesmo a pequena Grace estava ali. Achou que havia algum engano, mas, depois desistira de seguir em negatividade e percebera que ela havia sido escolhido. Ela, justamente ela.

A hora seguinte, resumira-se em explicações sobre um período de adaptação, o nome e sobrenome do casal, que havia a escolhido para a adoção, e que deveria de imediato ir pegar os seus pertences, para partir com eles. Foram minutos intensos, ela se despedira do lugar onde crescera, dos amigos, funcionários e do amado jardim. Observara receosamente o carro a sua espera, a paciência dos seus novos pais, e de todos acenando para ela, embora, em sua grande parte, não gostassem muito de sua existência.

Fato interessante para Anelise, era que ela sabia que a vida pregava peças em pessoas, ainda mais, quando as pessoas eram desafortunadas como ela, vinha sendo até então. Aceitando sempre o necessário, aprendeu que um sobrenome, não era o mais importante na vida, que zelar pela existência de sua família, sim, esse seria o necessário papel a se cumprir. Sempre caia aos prantos, quando lembrava-se de que não sabia a quem mais se assemelhava, no entanto, jamais ficava cabisbaixa, ignorando outros estarem ainda mais feridos que ela. Ao menos, não fora forçada a trabalho escravo, nem a passar fome ou ser suportando as fortes chuvas e rajadas de vento, exposta ao céu aberto. Nunca diria que teria as piores lembranças de sua vida, por ser apenas uma órfã, pois, de todos os locais quais ela poderia ter sido criada, o melhor fora selecionado para ela.

Uma casa de família. Grande pelo que o casal murmurava, algo que ela poderia gostar muito, mas que deveria ser difícil no início.

— Então, nós vamos ao shopping, compramos algumas roupas, e coisas que possa gostar de colocar em seu quarto...

— É, podemos tomar um sorvete também!

— E sabe aquelas lojas de...

Eles eram incríveis. Tudo neles era amável, mas, não podia esconder, era demais para ela, uma só pessoa, que de repente parecia levar uma peça da vida. Aquelas brincadeiras, das quais você pensa que não importa o quão perfeito esteja, no fim das contas você sempre vai ter um problema para lidar.

No fim de tudo, gastaram metade do que poderia gastar em cinco anos com ela, sendo pessoas de classe média. Compraram em dezenas de lojas, desde peças de roupas a ursos de pelúcia que ela mesma insistira para não ter, porque não houvera ocasiões ou pessoas que lhes dessem estes tipos de presente na infância. Tomaram sorvete de creme, chocolate e morango e ela escolhera chiclete e chocolate com menta, enchera o seu com as bolinhas de chocolate e acabaram a tarde em cachorro quente.

Eram quase cinco e meia, quando ela colocou os pés para fora do carro, do qual tinha uma bela visão apenas pela janela, da vida incrível que aquele casal deveria ter, vivendo em uma casa enorme, não, melhor, em uma mansão.

Ah, não, com tanto para se ocorrer, ela estava destinada a estar em uma casa de pessoas de alta classe. Uma piada!

Anelise sorriu timidamente e colocou as mãos a frente do corpo, assim que viu os olhos de Genevieve, que toda sorridente apontou em direção a porta de entrada aberta por um senhor muito bem-vestido, que tinha uma postura engraçada.

— Oh senhora, que bom que voltaram— disse ele, com uma simpatia forçada, embora, na verdade estivesse louco para expor sua curiosidade e descobrir quem era a mocinha qual ela acompanhava— senhor Carling.

— Billien— Augusto o cumprimentou, muito contente.

— Vejo que trouxeram uma...

— Está é a criança qual falamos— disse Genevieve, abraçando-a de lado, e sorrindo.

No entanto, Billien não sorrira. Ele ficara impassível, a encarando, até semicerrar os olhos e então suspirar. Provavelmente ele não esperava uma adolescente, ou porque, sua vida era mesmo infeliz.

— Ah, Billien, não seja ranzinza— disse Augusto, lhe dando um leve tapinha nas costas, enquanto ele fechava a porta— vai assustar a nossa nova moradora da casa.

— Está é...

— Anelise, senhor— ela estendeu a mão, para o cumprimentá-lo, deixando que um arquear de sobrancelha em desdém, se transformasse em um aperto de mãos aceitável.

— James Billien, o mordomo, senhorita.

Ela sorriu amistosamente, assentindo.

— O senhor Mitchel disse que vai os encontrar no jantar. O conde e a condessa, virão jantar está noite, e ficarão por aqui, antes de irem para a casa de praia deles.

— Oh que maravilha— exclamou Genevieve batendo palmas— todos a conhecerão, então.

— Creio que não senhora, seu irmão no entanto, disse que não poderá vir com a família.

— Não fico surpreso— zombou Augusto, apanhando uma porção de envelopes e lançando uma piscadela para Anelise.

— E minha mãe?

— Na sala de estar senhora, mas, creio que já tenha...

— Oh, céus— exclamou Genevieve, ao encarar o relógio— já perdemos o chá.

— Era exatamente o que eu ia dizer— resmungou Billien.

— Billien querido— Genevieve depositou uma das mãos no ombro do mordomo— pode pedir que peguem algumas das sacolas que deixamos no carro com o Jackson e que deixem na cama do quarto que separamos para Anelise?

Billien piscou olhando para ela, depois para a menina e por fim, suspirando ele concordou e seguiu para fazer o seu trabalho.

As duas horas que se seguiram, desenrolara-se em uma porção de coisas bobas a serem notadas, como as cores que poderia escolher para pintar a parede, se havia a necessidade de dois ou mais arquitetos para deixar de seu gosto e que terminara com um velho assim está bom. Ela desembrulhara algumas sacolas, tomara um banho, conhecera o que daria para ser uma casa, mas, que na verdade era seu quarto, com direito a banheiro e closet. A menina suspirou, quando pudera ficar sozinha, e com as mãos na cintura, ficara encarando o vestido de rosa de cetim na cama. Estava se sentindo pequena, muito pequena, e embora contente por ter pessoas se importando de verdade com ela, ainda se sentia triste, por ver que muitos tinham tão pouco, enquanto poucos, tinham tudo.

A residência dos Mitchel, era uma imensa, capaz de uma visita se perder facilmente, e como uma nova residente, ela seria mesmo capaz de se perder, com muita facilidade.

— Anelise— chamou Genevieve, empolgada, ao observá-la vestida para o jantar— você está linda, não acha?

Elas se encararam em um espelho em meio ao corredor entre ambos os quartos. Anelise assentiu em silêncio e ambas seguiram unidas para o andar de baixo.

Havia ruídos de conversas logo após o fim da escada, vinha de um dos corredores da casa, e pareciam animados, já que se podia detectar sons de risadas. Suas mãos gelaram, ela soltou um suspiro e agarrou o tecido da roupa que vestia. Um sorriso sem graça brotou em seus lábios, assim que adentraram o cômodo. Uma sala de visitas, provavelmente, com umas cinco pessoas conversando animadamente. Augusto viera em direção delas sorridente, estava animado o bastante, assim como evidenciava. Ele abraçou a esposa, e Anelise se posicionou ao lado deles.

—Gerda —cumprimentou Genevieve, uma jovem mulher, de cabelos cor de palha, trajada de verde-esmeralda, bastante sorridente— quanto tempo minha irmã?

— Bom te ver— disse a mulher, abraçando-a— não a vejo desde Agosto do ano passado, como tem passado?

— Bem, aliás...

— Genevieve— um homem alto, de aparência elegante, cumprimentou-a— Carling— ele esboçou um aceno.

— Pensei que não desceria— observou um senhor apático, sentado sobre a poltrona, cravando o olhar na cena.

— Bom, eu gostaria...

— Nós gostaríamos...

—Sim, nós— recolocou ela, olhando para o marido— gostaríamos de apresentar Anelise, nossa recém-adotada filha.

Todos os olhos se cravaram nela, pareciam curiosos o bastante, para esboçar as mais diferentes reações. Uma senhora de cabelos totalmente brancos e longos, elegantemente vestida, sentava-se em uma poltrona, exibira o mais largo dos sorrisos. O casal a frente, exibia reações opostas. Enquanto a mulher a encarava com ternura, o homem a analisava dos pés a cabeça, de modo esnobe, o qual a fazia pensar que ele torcia o nariz para ela. Já o senhor na poltrona, bastante apático, encarava-a de olhos arregalados, branco como se visse um fantasma, calado.

Aos poucos o velho fora tomando cor, e ficava cada vez mais rosado, avermelhado e no fim, quase púrpura.

— Uma adolescente, suponho?— ele ignorara a menina, e indagara a sua filha— Não um bebê?

— Seja bem-vinda, querida— acrescentou a senhora, carinhosamente.

— Seja bem-vinda a família— acrescentou a jovem mulher, a sua frente.

— Hum— resmungou o homem, enfim retorcendo o nariz.

— Sim, papai— respondeu Genevieve.

— Nós...

— Não imaginei que escolhesse justamente uma...

— Eu acredito que não há como imaginar com a mente dos outros, papai— rebateu Genevieve, rispidamente, segurando Anelise pelo ombro.

— Samuel, não seja mal educado, dê as boas-vindas a menina— ralhou a senhora.

— Posso dar boas-vindas, mas, duvido muito que ela possa ficar muito tempo, afinal, é apenas um período de adaptação, não é mesmo?— indagou o senhor, em tom sério.

— Exato, senhor Mitchel— respondeu Augusto.

— Eu pensei que você optasse por bebês, ou crianças pequenas, Augusto— criticou o outro homem.

— Não faço distinção por idade— respondeu ele— e nós... — acrescentava ele, olhando para Anelise— gostamos muito dela.

— Bem querida— dissera a senhora, notando que Anelise se encolhia nos braços de Genevieve, entristecida pela recepção nada calorosa, afinal, ela aprendera desde muito cedo a lidar com expectativas realistas e não ilusórias, embora não esperasse ser tratada com tamanha apatia— espero que goste daqui— desejou ela— eu me chamo Blanca, sou a mãe de Genevieve e sogra de Augusto, sou a dona da casa, e provavelmente, agora serei sua avó— algo em Blanca iluminou-se quando ela dissera a palavra avó— este homem adorável a sua frente— ela referira-se ao mais alto dos homens— é meu genro, George— o homem, acenou com a cabeça— e ao seu lado, minha filha mais nova, Gerda— está, quando apresentada, aproximou-se dela, com um sorriso e depositou um beijo em sua bochecha.

—Muito prazer.

— E este aqui— ela depositou a mão sobre uma das pernas do senhor ao seu lado, esticando-se até ele— é Samuel, meu esposo.

Samuel que ainda a encarava, apenas balançou a cabeça a contragosto.

— Obrigada e muito prazer— respondera ela, constrangida, erguendo as mãos e as balançando em um aceno.

— O jantar já está pronto, senhor— anunciou o mordomo.

— Bom, então creio que devemos todos ir para a mesa de jantar— disse Samuel, encarando a todos os presentes, com seu pedido implícito.

Anelise permanecia entre Augusto e Genevieve, enquanto George e Gerda, sentavam-se a frente deles, e em cada ponta da mesa via-se Samuel e Blanca.

Uma mesa bem posta, com dois pratos, alguns talheres a mais do que Anelise estava acostumada. Genevieve compreendera a confusão no rosto da mais jovem e resolveu que sussurrar em seu ouvido, seria de grande ajuda para resolver qualquer problema que houvesse, quanto o que usar para comer em determinado prato servido.

Regras da etiqueta, parecia segundo ela, coisas que pessoas que habitavam uma casa digna de ser denominada mansão, ter introduzido em sua educação. Ainda assim, para uma órfã, criada com a mais pura simplicidade, aquilo era mais do que confuso, chegava a se atrelar ao absurdo, enquanto, seu cenho permanecia franzido a encarar cada prato de comida que era posto sobre a mesa de jantar.

— E então Anelise, o que está achando do jantar?— indagou Samuel, que mal pudera prever a jovem, que o mesmo a observava a tempo suficiente de notar a sua confusão.

— Muito bom— respondeu ela, engolindo rápido demais o que comia, quase a levando a se engasgar.

Um riso disfarçado ecoou do outro lado da mesa. George parecia se divertir com a situação.

— Creio que ela se habitue com nosso estilo de tomar as refeições, assim que puder começar algumas aulas básicas de etiqueta— dissera Genevieve, com toda a simpatia do mundo.

— Mesmo?— indagou Samuel, a filha, como se duvidasse do que ela dizia.

Genevieve abandonou os talheres e passou a fitar o pai, com nada menos do que irritação.

— Mesmo— rebateu ela, suspirando em seguida, passando a evidenciar que sua respiração ficava a cada momento mais intensa— todos nós fizemos essas aulas, e conseguimos nos adaptar. Creio que não seja diferente para ela.

Samuel soltou um grunhido semelhante a uma risada.

— Genevieve querida, é uma fase de adaptação— lembrou-lhe ele— até que o momento de adestrar a menina chegue, vocês ainda terão de obter a aprovação da justiça, e claro, dependerá do desejo dela de ficar aqui com vocês— algo em sua fala, fizera Anelise atentar-se a situação. Parecia de modo claro, que com toda certeza, a sua adoção era uma desaprovação por parte da família.

— Não estamos falando de um animal, então não a adestraremos— corrigiu-o ela— Anelise estará aqui, isso é claro, se ela desejar— por um momento, ela voltou o olhar carinhoso para a menina, que comia em silêncio— e para que ela se adapte...

— Precisaremos que todos que vivem conosco, colabore para que ela possa se adaptar ao seu novo lar—intrometeu-se Augusto.

— Mas, é claro— concordou Blanca— até porque deve ser difícil deixar o lugar onde cresceu, não é mesmo meu anjo?

A senhora inclinara-se para a observar, com um olhar maternal, quase sonhador. E quando Anelise entendera que estava a falar com ela, apenas assentiu.

— A quanto tempo você estava vivendo lá?— perguntou Blanca.

— Desde o dia que nasci— respondera, deixando o jantar de lado— foi o que me disseram pelo menos— continuara, dando de ombros— eu tinha poucos dias de vida, segundo o que o médico disse para as administradoras do orfanato. Então, como eu não tinha nem mesmo um nome, elas colocaram Anelise, e me deixaram no quarto das meninas, em um dos berços que possuíam, e foi ali, naquele lugar, que passei toda a minha vida, até então.

— É mesmo uma pena terem lhe abandonado— seu olhar brilhava ao me encarar, parecia emocionada de verdade. Mas, quando encarara o homem de frente para si, no oposto da mesa, percebera de imediato que o sentimento deles sobre ela, divergiam como uma erosão profunda, dividindo um terreno.

Daquele momento em diante, Anelise deixou de ser apenas uma jovem tímida perdida em seu novo lar, ela passou a desejar ser apenas uma sombra, uma perfeita réplica de um fantasma. Já que a divisão era evidente entre a família, ela como uma intrusa, resolvera que não mais faria daquela família, um vínculo de desunião.

Infelizmente o que a pobre menina, sentada sobre a mesa de jantar, encolhida sobre uma cadeira, comendo silenciosamente, não sabia. É o que o motivo da desunião, sempre estaria longe de ser exatamente ela. 

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