Epílogo
Os seus olhos focam-se no ambiente à sua volta e o seu corpo adquire uma posição de alerta a qualquer movimento que surja. A sua estaca encontra-se bem pressionada na palma da sua mão, pronta a ser usada assim que for preciso.
Dá um passo em frente, com cautela. Tudo permanece calmo e falsamente seguro. Dá mais um passo, a seguir mais outro, e uns tantos depois desse. Ela tem noção das dezenas de pares de olhos que a observam e avaliam, escondidos algures nas sombras, mas não se deixa levar pela insegurança. Ela sabe o que vale. As más línguas chamam-na de convencida e arrogante, mas ela sabe que não há nada que assuste mais um humano do que ver alguém que acredita plenamente no seu próprio potencial e que não tem medo de arriscar. Ela adora ter esse efeito de ódio e simultaneamente admiração nas pessoas.
Um bip eletrónico capta a sua atenção e segundos depois um robô volk salta do chão, atacando-a. Num movimento rápido, a rapariga crava a estaca no peito do monstro falso, sem nenhuma dificuldade. Após encontrar e matar tantos volks reais, estes já não traziam qualquer desafio.
O robô de treino retoma a sua posição, camuflado no chão, ao mesmo tempo que a sua atenção se volta novamente para o que a rodeia. A floresta parece mais calma do que nunca, mas ela sabe que isso é apenas uma ilusão. Seria demasiado fácil assim. Há algo mais, para além de volks de treino. Há humanos. É com esses que ela se deve realmente preocupar.
Com atenção máxima, ela retoma o seu caminho, onde tudo é analisado, desde os sons, passando pelos movimentos suspeitos das folhas, até cada pedaço de terra onde as suas botas pisam - especialmente os locais que parecem estar milimetricamente arrumados, levando-a a suspeitar que são uma armadilha.
Ela encontra mais alguns volks de treino e crava a estaca neles apenas para cumprir a formalidade. Os seus olhos reviram de cada vez que encontra um, revoltando-se com o facto de continuar a ser distraída por aquelas coisas, quando o teste real está algures por aí, à espera de um momento de distração dela.
O percurso leva-a a embrenhar-se cada vez mais na floresta, onde as árvores se encontram cada vez mais juntas e um amontoado de silvas raspam na sua pele, deixando para trás linhas finas de sangue. O ardor faz com que ela abrande, mas não para. Numa situação de perigo nunca se deve parar.
Ela anda, derrotando várias armadilhas pelo caminho, até alcançar uma clareira nas profundezas da floresta. As árvores altas impedem que a luz alcance, tornando o local escuro e digno de um filme de terror.
É nesse momento que o perigo a alcança.
Vultos começam a aproximar-se dela, vindos de todos os lados. São tantos que a rapariga nem consegue contar. Todos se aproximam, formando um círculo à sua volta. Ela está encurralada.
Um deles corre na sua direção, mas ela rapidamente o domina. Quando se prepara para cravar a estaca no seu peito, fá-lo com muito menos força do que seria o ideal em situações normais. Mas, neste caso, é o suficiente para o adversário ser considerado morto, mesmo embora o colete o proteja de qualquer ferimento grave.
O homem cai ao chão, cumprindo o seu papel.
Os outros continuam a avançar até ela e, desta vez, atacam vários ao mesmo tempo. Ela defende-se, embora com alguma dificuldade. São apenas humanos, mas são muitos e melhores.
Um deles prende o seu braço, torcendo-o. A rapariga agacha-se, enquanto o homem faz pressão sobre a sua mão, para que a estaca que ela segura, se crave no seu próprio peito e não no dele. Num movimento rápido, a rapariga dá um pontapé no joelho do homem, que cai. Sem perder tempo, ela crava-lhe a estaca, impedindo-o de continuar as investidas.
Ela endireita a sua posição e respira fundo, obrigando-se a focar. Na sua cabeça conta seis pessoas. Quando apareceram pareciam mais, pensa.
Os ataques continuam, bem como ela se continua a defender. Encontra-se cheia de energia e entusiasmada, o que acaba por tornar os seus golpes ainda mais precisos e confiantes.
Um por um, uns com mais dificuldade do que outros, todos são abatidos pela rapariga.
O seu peito ofega, enquanto passa o olhar por cada pessoa que se encontra no chão. Ainda alerta ao ambiente, desconfiada de que podem aparecer mais, ela houve uma campainha estridente.
O teste final acabou.
Completamente suada e estafada, mas consciente do bom trabalho que fez, Rebekah sorri. Parece que está prestes a receber o estatuto de Guardiã.
****
— Juro solenemente não revelar a existência dos volks a ninguém. Irei manter o segredo e lutar para que o meu protegido esteja em segurança. Juro não abusar dos privilégios que me serão concedidos pela profissão e manter o mundo a salvo até ao último dia da minha vida.
Rebekah mantém-se séria, consciente da importância do momento, mas, ainda assim, pela sua cabeça passam imensos comentários sarcásticos sobre como a sua posição formal, com uma mão sobre o peito e a outra sobre o livro de leis dos guardiões, fá-la parecer uma primeira ministra prestes a tomar posse do governo, ou então como as suas palavras lhe fazem lembrar de votos de casamento, onde se promete amar e respeitar até que a morte nos separe.
A cerimónia prossegue com pompa e circunstância. Atrás de si, outros colegas juram honrar a sua profissão e lutar com unhas e dentes pela segurança de todos.
Quando chega a sua vez, Rebekah recebe o seu anel, que a destingirá, onde quer que vá, como uma guardiã. Anel esse que foi feito por medida, especialmente para ela, e que lhe serve na perfeição, ao contrário daquele que usou meses antes, emprestado pelo senhor Smith, numa tentativa de a incentivar a comportar-se como uma guardiã.
Mas aquilo pelo qual Rebekah está mais entusiasmada é pelo envelope, que lhe será entregue no final da cerimónia.
Com o curso terminado, chegou a altura do estágio, que embora já não conte para o seu sucesso académico, é a porta de entrada para a sua carreira de guardiã. Todos os alunos formados recebem um protegido, que terão de acompanhar durante um período de tempo. Todos recebem, mas poucos terminam (até porque muitos morrem antes disso). Chegando ao fim, a probabilidade de permanecerem com esse protegido é muito grande, o que muito anima Rebekah, que está ansiosa por finalmente se tornar guardiã da sua melhor amiga, Emily.
O seu pé bate impacientemente no chão, enquanto aguarda pelo fim da cerimónia.
Assim que termina, e Rebekah recebe o seu envelope, apressa-se a rasgá-lo, com pouca ou nenhuma delicadeza.
Os seus olhos saltam pelas letras, numa leitura apressada.
— Emily Ivanov. Emily Ivanov... — murmura.
Os seus lábios curvam-se num sorriso rasgado quando os seus olhos de facto encontram o sobrenome Ivanov no final do texto.
Porém, uma nova leitura, com mais atenção, fá-la perceber que o nome que antecede o sobrenome Ivanov não é Emily.
— Então? — o Cameron questiona, expectante.
A rapariga encara-o.
O seu rosto, ele rapidamente percebe, traduz uma expressão séria, visivelmente chateada, mas também triste e desiludida.
Eu já devia estar à espera, ela pensa, após tantas demonstrações de falta de responsabilidade da minha parte, era óbvio que eles não me iriam colocar com a futura rainha do País...
— Eu não fiquei com a Emily.
*****
Ups... Já era de esperar, certo? 😇
Não me vou alongar mais por aqui. Falámos no capítulo seguinte, nos agradecimentos 😊
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