eu tô te achando distante

Eu li tudo que Taeyong escreveu sobre mim. Li sobre eu sair à francesa, sobre o primeiro mês, o bebê chorão, as tardes de domingo, sobre ter beijado alguém e não ser justa a minha volta... Li tudo isso. Ele dormia, eu lia. E meu peito foi ficando mais pesado, eu suei até com o ar ligado. Depois guardei o caderno e deitei para dormir. Não consegui dormir. Velei seu sono pensando na gente. Que é 8 ou 80. Que se não for tudo, também nada, não valeria a pena. E o sol já estava a despontar arduamente quando meus olhos ardentes foram fechando aos poucos, até eu escutar um sussurro para que eu acordasse antes que ficasse tarde demais.

Tive quatro horas de sono, fiquei um pouco ansioso. Arrumei minhas coisas, escovei o cabelo, calcei uma bota que não tinha usado nenhum dia na ilha e saí para pegar o ferry. Falei só o necessário com ele, coisas como sairemos daqui a oito minutos, checou se não esqueceu nada, se poderia deixar minha mala apoiada nele para eu tirar uma última foto daqui. Eu não estou machucado. Eu não sei o que sinto. Só quero o silêncio, uma paisagem, puxar e carregar minhas malas como quem está a ir ao outro lado do mundo.

Estava animado. Eu estava demasiadamente animado. Como quando descobri o Google Earth e não parava de admirar o planeta, de ir à Rússia numa esquina qualquer, ou ao Canadá só pra brincar com as palavras, ou ver se o Egito ainda era cheio de pirâmides bonitas e repletas de armadilhas... Mas a animação dissipou. Eu não tenho mais vontade de acordar às sete da matina pra ir checar um buraco diferente no Google só por curiosidade. Também não tenho energia nem vontade de estar animado ao ponto de saltitar ou não parar de falar com ele agora. Ele tenta, mas as águas azuis chamam mais minha atenção. Eu só estou cansado mesmo. Dormi pouco.

Pegamos o ferry. Ele, com seu chapéu na cabeça falando sobre como os dias foram quentes e gostosos e que valeu tudo que aconteceu. Ocupo-me com meu streaming nos fones de ouvido e nego quando ele pede para escutar também. Eu tô pensando no que falar. Olho o mar, meu coração grande chacoalhando depressa. Eu não me sinto tão bem agora, porque a cabeça tomba um pouco, está doendo, e não comi muito no café da manhã. Não consigo parar de dar replay numa canção aleatória sobre desespero, mas talvez eu seja só mais uma poeira assustada nesse universo malfeito.

Chegamos em Atenas perto do meio-dia. Seguimos ao hotel que disse a Taeyong que tinha feito a reserva, porque aí ele me pagaria menos que o valor do outro que, de fato, eu reservei — por esse motivo, cancelei. Ele não sabe disso e está tudo bem. Quase sugeri dormirmos em quartos diferentes, que eu iria pagar o meu, mas decerto que teria discussão. Como não quero discussão, pego nosso cartão no check-in e sigo em silêncio.

Ele não diz nada até estarmos nos acomodando no quarto. Quando ele olha pela janela e acha a vista bela e pede meu celular para tirar foto, eu digo que está descarregado porque, de fato, eu descarreguei ele todo escutando música. Ele se inclina no peitoril e fica olhando a rua por alguns minutos, enquanto eu tiro meus produtos da bolsa de mão para pôr no banheiro e deixo tudo em cima da cama que estou sentado.

— Ten, vem ver... — ele me chama. — Tem uma loja de roupas do outro lado. Ela tem uma fachada tão linda... E tem um moço vestido todo de laranja vibrante... Sério, desde o chapéu ao tênis! Vem logo, senão ele vai embora e você não ver...

— Depois eu olho a rua — é o que respondo, porque realmente não estou com vontade agora.

Quero sair para comer algo, andar um pouco, então terei tempo para ver a rua. Para participar da rua. Mas, mesmo assim, ele caminha até mim e se ajoelha na minha frente. Com seus olhos tímidos, encara-me preocupado. Toma minhas mãos com as suas, guardando-as com cuidado.

— Eu tô te achando distante... Você tá bem? — engatinha para ficar mais próximo. E assim que consegue, apoia os cotovelos nas minhas coxas. — Nós vamos ao Templo de Zeus Olímpico e você nem tá animado? Que foi?

— Nada, só tô cansado...

— Não é só cansaço, é? — com as costas da mão, Taeyong acaricia minha bochecha. — Fiz alguma coisa? Você quer alguma coisa? Você não quer alguma coisa?

— Deixa lá, Taeyong... — encolho os ombros, talvez com medo de iniciar uma conversa que não quero ter agora.

— Quer beijo? Quer água? Quer vinho? Quer sair? Quer dormir? Quer carinho? Quer massagem? — ele chacoalha minhas mãos ao me oferecer. — Quer chiclete? Bolo? Café? Fazer compras? Escutar música? Pirulito? Chocolate? Sexo?

Rio da sua última opção e Taeyong sorri junto a mim.

— Pelo menos te fiz rir — ele então inclina-se para me abraçar pela cintura. — Tudo bem?

Balanço a cabeça positivamente. Tae ergue-se para sentar-se ao meu lado na cama. Agora apenas segurando uma das minhas mãos, avança para um beijo na boca. Eu penso em fugir, mas desmancho todo no meio do caminho. Tem horas que não sabemos do que precisamos até termos. Eu queria fugir, mas me aninho junto a ele. No entanto, repentinamente larga minha mão. Ele se afasta o suficiente para sentar nas próprias pernas, mas não o bastante para romper os beijos que trocamos. E então há um barulho metálico que, quando vejo, percebo tratar-se da fivela do cinto dele. Quase não posso acreditar em vê-lo abrir a calça.

— Taeyong...? — afasto-me dele, tentando entender que diabos está acontecendo. — Taeyong, o que você tá fazendo?

— A gente não vai transar? — ele me olha confuso, as mãos paradas no cós da calça que está no meio das coxas.

— Quê?

— Ah, é que você não demonstrou nada nas outras opções... Aí quando falei do sexo e você riu, achei que na verdade você queria isso — ele dá de ombros

Eu acabo rindo.

— E você quer?

— Você quer?

— Você só quer se eu quiser, é?

— Bem... Se você quiser... Eu posso... Sabe...

— Você não tem que ficar se forçando a fazer coisa só pra me agradar — digo. — E eu também nem estou pensando em sexo, então...

— Ah... Desculpa, então — Taeyong faz o contrário agora, volta a vestir-se e depois se senta normalmente. — Foi mal.

— Não... Está tudo bem — lhe asseguro, pondo minha mão sobre a sua. Gentilmente ele puxa para beijá-la. — É melhor irmos comer algo, estou morrendo de fome.

A real é que estou morrendo de fome mesmo, uma vez que pouco comi nos primórdios da manhã. Agora, início da tarde, o sol é nocivo e aventureiro. Saímos pé ante pé rumo a um restaurante aqui perto, após eu enfiar meu celular na tomada. Comemos um pouco de comida grega. Pouco porque Taeyong deu algumas mordidas, mas não gostou de algumas coisas, então deixou os restos mordidos para mim. Não ligo, juro.

Vamos a andar pela rua de mãos dadas, embora suadas. Sentamo-nos num banco de praça, olhando a rua, os carros a rastejar. Meu picolé derrete fácil, já Taeyong morde o dele com rapidez. Não estamos lívidos, uma vez que a tamanha exposição ao sol está trazendo um pouco de cor e irritação na pele. Voltamos ao hotel ainda a finalizar os picolés, isso porque estávamos levando uma surra solar. Tae comenta que a beleza desse lugar é algo imensurável, enquanto isso procuro o cartão de acesso ao quarto.

Pegamos o necessário para o passeio ao Templo. Sem saber que, de fato, o real templo é o mortal ao meu lado. Eu não estou bravo nem nada, ainda estou cansado, porém creio estar mais compreensível. Ele quer meu bem. Ele quer meu bem e acaba negligenciando o próprio bem. Vamos de ônibus. Lado a lado, sentamos no assento cinza curtido pelo tempo. Ele comenta qualquer coisa que vê e ri de qualquer coisa que escuta... E teu coração simplório exala abastança. Ele tem eu, Atenas e o sol. Não há como estar mais vivo que isso.

— Se eu fosse rico, eu te compraria um templo — ele comenta baixinho, quando deveríamos estar escutando as explicações do guia sobre a história. Taeyong não deve estar entendendo muito, porque o inglês dele é limitado, então acaba me distraindo também.

— Por que eu iria querer um templo?

— Querido, você é um deus.

— Ah-rá — eu finjo uma risada que sai tão esquisita que Taeyong me olha sério por alguns segundos, mas depois nós dois caímos na risada ao mesmo tempo.

Quando você conhece tão bem a pessoa que só em olhar pra cara dela, já sabe que ela quer rir. Que ódio.

— Peça perdão a Zeus, estrupício — ele me dá um tapinha na bunda e acabo olhando ao redor para ver se alguém prestou atenção nessa ousadia. — Mostre respeito. Negócio de ficar rindo no meio de um negócio sério...

— Você está me distraindo — reclamo.

— Eu não tô entendendo muito o que o moço tá falando. Se você pudesse traduzir, eu ficaria agradecido.

— Não.

— Tomara que vá parar no submundo, virar putinha de Hades — o filho da mãe resmunga atrás de mim.

Eu não acredito que ele fez aquele show todo de viajarmos juntos para me falar isso. Viro-me para ele e sorrio, erguendo a mão para um aperto:

— Prazer em te conhecer, Hades.

Taeyong leva alguns segundos sem entender nada, depois aperta minha mão rindo.

— Você é minha putinha, então?

— Com toda a certeza.

Então nós dois rimos, tentando segurar o riso a todo custo. Ademais, o tour foi interessante. Deixo o show de lado e traduzo algumas partes para Taeyong, depois tiramos algumas fotos legais. Inclusive uma dele me beijando, porque fez isso no exato segundo que fotografei. Peço para um senhor tirar algumas nossas, tanto juntos quanto separados. Agradeço após uma sessão, depois fico a checar as imagens enquanto espero Taeyong ir ao banheiro de um posto de gasolina aleatório que encontramos no meio do caminho para o ponto de ônibus.

— Acho que vou editar essa — digo, assim que ele sai. Mostro a tela do celular em que pode-se ver a imagem minha e dele num ângulo inferior, as ruínas do templo detrás, Tae com a mão na minha cintura e eu encarando a câmera. O tiozinho sabe tirar uma boa foto.

— Vai colocar um filtro? — Taeyong quer saber.

— Também. Mas vou jogar no Photoshop e cortar você da foto, porque sua beleza está ofuscando a minha... — guardo o celular no bolso traseiro da bermuda.

Taeyong ri.

— Amon-rá! Que menino abestalhado! — joga o braço direito ao redor do meu pescoço e tenta fazer uma chave-de-braço falsa que logo se desfaz. — Pode cortar, eu não mereço estar ao seu lado... Sou um mero mortal que não possui tamanha beleza e importância.

— Que moleque chato... Deixa eu te elogiar, caramba! — lhe dou um empurrão durante o caminho para o ponto.

— Tá bom, tá bom... — ele sussurra, finalmente deixando.

— A propósito... Você aceitaria a honra de se tornar lockscreen e wallpaper do meu celular?

— Até parece que você vai fazer isso...

— Tá duvidando, Lee Taeyong? Eu sou doido, é só alguém duvidar que eu faço só de ódio...

— Brincadeira tem hora, Chittaphon.

Sentamo-nos nos bancos do ponto: eu, de pernas cruzadas; ele, todo arreganhado. Olhamos a rua a movimentar. Nossas mãos agarram-se, entrelaçam, os pulsos grudados pouco enxutos... como se estivéssemos a almejar a sensação da pulsação do outro. Encosto a cabeça em seu ombro, a respiração um pouco ligeira, pois o calor é demais e o amor é demais... Não cabe no meu corpo, eu preciso expirar. O dia é lindo e azul, o tempo é pilantra e galanteador. Eu me recolho na tua companhia para sentir carinho e proteção. E Tae, meu felizardo, acaricia meu queixo levemente chato, depois cheira meu cabelo. Queria dizer que ambas ações me são estranhas, mas não são. Ele realmente é assim.

— Eu não brinco quando quero demonstrar que você ocupa uma posição importante e especial na minha vida — segredo-lhe, olhando os números dos ônibus para encontrar o nosso. — Desculpe se parece que vai ser como da outra vez... Não é minha intenção. Tá escutando?

— Sim — ele responde baixinho.

— Tô te dando o máximo que posso te dar agora — aperto minha mão na sua. — Eu fazer isso ou aquilo... Te dizer isso ou aquilo... Não significa que te amo menos ou mais. Às vezes eu preciso, ok? Desde que te conheci tento te proteger das coisas, principalmente de mim... Eu sempre falho, me desculpa. Mas não brinco, não. Jamais. Confia em mim. Confia nisso — sacudo nossas mãos, para que ele entenda a que me refiro. — Farei o possível para te proteger, para nos proteger... Mesmo que isso venha desfazer o nós.

— Então... — ele engole em seco. — Pode ser que não fiquemos juntos?

— Não estamos juntos? — afasto minha cabeça do seu ombro para olhá-lo nos olhos.

— Digo... Por mais tempo... Por bastante tempo...

— Se for para te proteger, é melhor não...

— Pra que merda me proteger, Ten?

— Você não tem ideia do mau que posso te fazer, docinho.

— Que tipo de mau você faria em mim?

— Citá-los irá te magoar — solto um suspiro e, percebo, que ele está com a mão mais folgada, como quem quisesse desvincular da minha. Merda. — Mas estamos bem agora. Só não pense muito no futuro.

— Você tá escondendo alguma coisa?

— Não.

— Tem certeza?

— Confia em mim — encosto meu rosto em seu peito. — Confia em mim, eu estou melhor dessa vez. Prometo.

Taeyong me enrola num abraço forte.

— Confio em você — sussurra. — Está tudo bem, não se preocupe... Confio em você.

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