eu te entendo
Me sinto mal. Não sei se foi o que comi há duas horas atrás ou o fato de estar cansado demais. Ou talvez porque eu não sei o que falar para Taeyong neste momento, embora eu possa compreender o porquê. Porque eu sei o que ele quer dizer, mas não sei como aliviar essa tensão entre nós. É que já estou cansado de manter essas coisas ruins entre nós.
— Eu te entendo — eu respondo. — E eu sinto muito. Sabe, eu sinto muito mesmo.
Pior que eu sinto. Não é da boca pra fora, não estou querendo tapeá-lo. É que ter machucado ele, de repente me machucou também. E foi bem fundo, porque no final eu não soube se a dor era minha ou dele. E claro que ele machucou-me também. Eu achei, eu realmente achei que estava me esforçando para deixar as coisas tranquilas para que dessem certo. Mas não. Não éramos a expectativa um do outro.
Pensar sobre o que fizemos um ao outro me deixa em silêncio e aturdido, então decido parar. Se ambos estamos de acordo em utilizar aquela experiência para crescimento, eu não vejo porquê bater na mesma tecla o tempo todo. Eu quero que ele esteja bem, do mesmo jeito que me sinto. Se ele quiser seguir em frente quanto a isso, eu também farei o mesmo. Mas só preciso saber se está tudo ok entre nós, porque eu não sei o que fazer neste momento.
— Você não precisa dizer isso — ele trava a mandíbula e olha para frente.
Eu acelero, a sinaleira mudou de cor. Não falta muito para chegarmos no restaurante, mas esse caminho parece longo demais. Queria que estivéssemos cara a cara, ao invés de eu ter de dividir sua atenção com lesmas imprudentes.
— Por que não? — questiono.
— Eu te perdoei muito antes de você dizer que sente muito — ele me diz, subindo o vidro escuro da janela. — Porque eu não queria guardar isso. Não mais.
Eu respiro fundo.
— Do mesmo jeito que espero que tenha me perdoado — ele prossegue, teu timbre saltitando pelos meus tímpanos e sussurrando quão felizes estão por voltarem pra casa.
— Eu nunca te culpei, para te perdoar — é o que digo. Olho de relance para ele, mas não consigo ver seu rosto, com clareza, nessa escassa luz do túnel. — Não fizemos de propósito, não foi?
— Não. Acho que não.
— Então... Bem... Eu só falei aquilo mais cedo... Não foi para te confundir ou te deixar com raiva. Eu só queria que você soubesse da verdade — aperto o volante com força, talvez de medo ou hesitação. A questão é: não sou bom em palavras, acaba saindo tudo errado quando tento me explicar. — E teria sido mais fácil se tivéssemos conversado antes.
— Por que não falou comigo?
Engulo em seco, olho pelo retrovisor para evitar que seu rosto esteja em meu campo de visão.
— Eu te liguei uma vez, mas depois desisti — admito. — Porque eu não queria piorar as coisas. E também estive desesperançoso, por isso achei que estivesse melhor sem mim.
— Melhor sem você? — ele fala mais alto do que estava antes. — Dizer que estive melhor sem você é a coisa mais absurda que escutei em toda minha vida.
Não que sinto-me enjoado com essas palavras, porém a turbulência que causa em meu sistema sanguíneo deixa-me internamente agitado. Porque eu pensei que ele não seria tão óbvio quanto isso, mas aqui está ele com os mesmos lábios que beijei, dizendo verdades que eu desconhecia e esperando que eu entenda isso normalmente. Eu acompanhei sua vida, infelizmente acompanhei. Não sei se tenho vergonha ou arrependimentos, mas qualquer novidade sua era algo do meu interesse. E eu sempre pensei que tudo estava bem. Tudo realmente estava bem?
— Que você quer dizer com isso? — estanco a velocidade do carro, uma vez que faltam míseros metros para o restaurante.
— Que não foi tão fácil assim, Chittaphon.
Escutá-lo falar meu nome me agride. Me agride, porque não pensei que faria mais uma vez em toda minha vida. Porque eu pensei que iríamos ficar distantes o suficiente para ele nem lembrar a pronúncia ou escrita. Não que eu estivesse a lamentar isso, mas lamentava a situação. A nossa situação. Estou cansado de me culpar por uma receita mal feita por conta de ingredientes de outro alguém.
— Eu entendo isso, quer dizer... Eu não sabia... Bem, eu poderia imaginar que, talvez, no começo as coisas tinham sido...
— Mas saber que você sentiu minha falta é uma surpresa — ele me interrompe do nada e, sendo honesto, eu não julgo por isso. Eu realmente não sei o que falar agora, pois estou acostumado a falar coisas para contornar assuntos, dedilhar as extremidades das verdades. Talvez eu deva dizer um pouco delas. — Porque você me disse que não sentia, que todos são passageiros e tudo mais.
— Sim, é verdade — concordo. — Mas eu sinto falta da minha irmã também. Sinto falta do meu avô. Sinto falta de...
— Você tem uma irmã? — ele praticamente grita, chamando minha atenção e fazendo-me frear bruscamente. Sua mudança repentina de tom me deixa com o coração acelerado e meu organismo encharcado de adrenalina. Ah, sim... Os surtos dele. Não posso me esquecer disso.
— Sim? — recomponho-me, agora tentando dar um jeito que ressuscitar a baliza que estava tentando fazer. — Taeyong...
— Acho que há muitas coisas sobre você que eu nunca soube — conclui ele, assim que ponho o carro quietinho e calmamente próximo ao meio fio. Respiro fundo, ele também. Eu realmente não sei o que falar.
— Há muitas coisas sobre você que eu também nunca soube — respondo. — E as novas também, as quais não sei.
— Não mudou muita coisa...
— Você pintou o cabelo.
— Ah, sim — ele sorri timidamente. Eu acho isso fofo, mas não comento.
— Ficou bonito.
Ele dá de ombros. Meu Deus, essa mania...
— Você também. Está loiro... — acompanho o tamborilar sutil dos seus dedos das mãos nos joelhos. Talvez ele esteja nervoso ou ansioso ou desconfortável. Mas acho que estamos bem conversando. — Está legal. Seu cabelo está quase do tamanho de antes, mas ainda não é a mesma coisa. Você cortou?
Ele está fingindo. Ele está fingindo que não sabe. Porque eu sei que ele viu todas as minhas atualizações nas minhas redes sociais acerca da mudança do meu cabelo. Ele estava lá, assim como tentei estar lá, espionando. Era terrível. Às vezes eu queria dormir, mas não conseguia. Tinham os ruídos da rua, o silêncio inquieto do apartamento, as memórias que meu cérebro insistia em tirar do arquivo para mostrar-me como se fosse nostalgia. Não era nostalgia, era desespero e culpa.
E então eu pegava meu celular, pesquisava seu nome, pesquisava por conhecidos até conseguir algo sobre ele. Eu via seu sorriso, mas não era a mesma coisa. E eu dizia para mim mesmo que teria de parar, que não podia passar o resto da vida checando como ele estava, se realmente estava bem. Não iria acontecer de novo. Sempre acontecia de novo. E aconteceu até mesmo quando voltei para cá, antes de nos encontramos. Meu problema sou eu e minha falta de compromisso com minhas próprias decisões. Sou um rebelde de mim mesmo.
— Sim, no mesmo dia que descolori — conto, sorrindo para ser simpático, porém um pouco receoso por dentro. Desligo o aparelho de som, pois nem estamos prestando mais atenção nas canções que tocam.
Recosto-me com calma no banco de couro, cansado fisicamente, psicologicamente e emocionante. Só quero deitar a cabeça num travesseiro depois de tomar um banho, beber duas taças de uma boa champanhe e tocar três músicas e meia no piano. Só que há ele aqui, de repente isso me parece um conforto. Um conforto ver que toda aquela ansiedade, que aquele desespero e medo eram só a minha mente tentando me sabotar. Taeyong está aqui e não está gritando comigo. E eu gostaria de estar bêbado agora, mas só para dizer as coisas que quero dizer a ele. Eu gostaria de estar bêbado. Sim, álcool iria me ajudar muito.
— Você parece cansado... — comenta, sua voz gentil esfaqueando o silêncio das buzinas. — Vamos entrar?
Concordo com a cabeça, embora esteja com um desejo enorme de estirar meu corpo sobre os bancos traseiros e ficar por lá até sermos amigos outra vez. Eu sempre tive esse meu jeito de procrastinador, de deitar a cabeça numa suavidade, sussurrar palavras de cansaço, apertar os olhos até ver os círculos coloridos, dizer que as coisas tem de se resolver enquanto durmo. Eu dizia, eu dizia que almejava que se, ao sentarmos, pudéssemos gritar nosso desespero e todos os nossos problemas estariam resolvidos quando nos levantarmos. Bem, até hoje tenho isso em mente. Mas aprendi que isso não adianta de nada.
Entramos silenciosamente, eu até ligo as luzes. O vento está fresco, sendo assim abro as janelas. Taeyong olha ao redor, parece estar fora do lugar ou talvez, quem sabe, esteja a analisar. Analisando o quê?, pergunto-me de início. Então recordo-me que não vem aqui desde antes da viagem a Sokcho. E que isso é triste demais, porém quero fugir das coisas de antes.
— Taeyong — chamo seu nome para que ele pare de prestar atenção no pequeno palco da extremidade que montamos para as apresentações semanais.
— Sim? — suas mãos estão cruzadas atrás do seu corpo.
— É que eu acho que... — engulo em seco. — Nos conhecemos no momento errado das nossas vidas.
Teu olhar desvia, cai sem querer nas luzes tonteantes do aquário o qual encantei-me há exatos cinco meses. Sua postura é dura, seu olhar parece estar perdido. Queria dizer que está tudo bem se não ficar tudo bem entre nós. Porque no fundo, no fundo, tenho medo de que estejamos a forçar algo, uma vez que já fomos algo no passado. E foi bom, apesar do final. Então me pergunto se tem como recuperar as ruínas. Sei lá, construir por cima. Talvez algo melhor. Talvez algo mais apropriado. Ele está namorando e eu respeito. Não quero mais nada romântico com ele. Ficaria lisonjeado com sua amizade.
— Eu também acho isso, Ten.
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