eu não caio mais

Ele segura o hashi com firmeza. Depois ri. Não, os larga sobre a mesa e bate palmas. Depois cobre os lábios. E se sacode. E abana as mãos. Enquanto a língua enxuga os rastros do queijo nos seus lábios. E eu me questiono, sentado aqui, encostado na parede, por que ele gosta tanto de mim. De repente, eu não acho que mereço sua risada escandalosa.

— Ay, aqui o guardanapo! — arranco alguns pedaços e lhe entrego. Taeyong enxuga os lábios. Ele está rindo da própria piada, fala sério...

— Uh, isso está realmente muito bom... — resmunga, com os lábios no guardanapo, a voz abafada.

— Uhum — ergo minha latinha de refrigerante e espero ele fazer o mesmo. Brindamos a exatamente nada.

Nós nos proibimos de beber álcool.

— Olha só, Ten... — após dar um gole, Taeyong aparece com o celular desbloqueado, me mostrando a agenda de eventos culturais de um teatro. — Vai ter um musical legal no sábado da semana que vem, você vai querer ir?

Estou de boca cheia, mas concordo ao menear a cabeça. Ele está animado e elétrico, e fica lendo sobre a peça ao dar uma mordida na carne. Eu olho como ele morde: os olhos na tela, o queijo escapando por entre os lábios, que por sua vez estão sujos. E agora que a vontade me assola, a quem vou recorrer quando eu estiver a almejar encontar com zelo os dedos na nuca pálida e cofiar o cabelo que por ali deságua? Porque de repente, eu sorrio sem nem achar graça.

— Eu estava assistindo uma série ontem... — ele começa do nada, após ter passado cerca de dois minutos calado comendo. Ele já terminou a segunda porção, e foi bom assisti-lo comer. Eu gosto de vê-lo comer. Gosto mais ainda de vê-lo repetir. Será que agora eu posso acariciar seu cabelo? — E ela me fez pensar sobre umas coisas...

— No quê, exatamente? — dou uma mordida na costelinha e praticamente morro de tão gostosa que está. Quero me casar com quem preparou isso. Holy crap.

— Você já parou para pensar no que poderia acontecer se você tivesse dito ou feito algo? Sabe aqueles momentos em que estamos nervosos para fazer uma prova, então imaginamos que iremos tirar uma pontuação ruim, e com isso não iremos para outra série, e teremos de nos despedir dos nossos amigos e provavelmente nossos pais iriam nos cortar no cinto... Então você iria fugir de casa, roubar um barco e ir para outro país, recomeçar com um novo nome e trabalhar pesando pão numa padaria, para pagar uma kitnet cujo banheiro disputa lugar com a sala?

Quê?

— Não? — eu quase me engasgo com o queijo.

— Mas você já pensou que iria repetir a série, né?

— Não, eu já pensei que iria pular mais uma série — falo honestamente. Meu sonho era pular só mais uma seriezinha e dar no pé da porcaria que é a escola.

— E se você pulasse mais uma série, o que iria acontecer?

Eu não sei aonde ele quer chegar. Por isso, esfrego o guardanapo nos meus lábios e recosto-me outra vez. Taeyong ainda fuma? Porque está parecendo que sim...

— Eu iria estar mais adiantado, então terminaria o ensino básico mais cedo.

— E...?

— Sei lá. Eu iria mais jovem para a França, acho.

Taeyong solta um suspiro um pouco impaciente. Talvez eu não esteja dando as respostas que ele quer que eu diga. Mesmo assim, estou a desabotoar os pulsos para subir a manga da camisa. Ele acompanha meus movimentos por alguns segundos, mas logo retorna ao meu rosto.

— Antes de querer ser gastrônomo, você já pensou em ser outra coisa? — me questiona.

— Sim... Mesmo com o intuito de cursar gastronomia, eu pensei que talvez eu viesse ser bom em outras áreas também — engulo alguns goles do refrigerante, depois afasto um pouco a franja. Taeyong resmunga alguma coisa ao mexer os pés por baixo da mesa.

— Cite.

— Sei lá — dou de ombros. — Químico ou astrônomo. No início do ensino médio eu entrei numa oficina de astronomia e até que gostei. Então eu pensei: como seria se eu realmente me dedicasse a isso?

— Isso! É exatamente isso! — Taeyong se mexe tanto na cadeira que seus joelhos se batem com os meus. — Você já parou para pensar no que aconteceria se você tivesse feito aquilo? Se a linha deste presente tivesse seguido para um futuro condizente? — ele traça uma linha com a ponta do dedo na mesa. — E se isso realmente tiver acontecido? Digo, esse futuro pode ter realmente acontecido e está acontecendo. Mas não aqui nesse presente, mas em outro, um alternativo...

Gente, é sério, que porra é que tá acontecendo com Taeyong? Eu tô vendo que vou ter que tirar a internet dele.

— Como se esse pensamento, esse presente daquela época, tenha criado um ramo de futuros alternativos para ele. Num deles, você pode ter falhado na prova para a Nasa... No outro, você conseguiu... Num terceiro... Talvez você só tenha desistido da gastronomia e, por algum motivo, também desistiu da astronomia, mas já partiu para outro planejamento. E deste planejamento cria-se mais ramos com diferentes possibilidades e diferentes futuros. Tipo, se a gente não tivesse vindo comer aqui, o que estaríamos fazendo? Talvez estejamos fazendo isso agora, mas não aqui neste plano.

— Que plano?

— Neste plano do presente, Ten! — ele praticamente fala um "se toca!" — O que quero dizer é que existem inúmeros futuros e que eles podem coexistir, assim como o presente.

Levo um tempo pensando, para finalmente me tocar de fato sobre o que ele quer dizer. Suspiro num sorriso. Não sei não, Taeyong tem uma mente maluca que voa e eu fico bem besta com isso. Ele é tão adorável...

Eu sei que ele tem namorado e tudo mais, só que sinto que hoje é só eu e ele. Inclino até minha cabeça para o lado e concordo num gesto para dizer que estou entendendo. Ele falou tanto sobre presente e futuro e presente e futuro que eu me perdi no meio das palavras. Mas fico feliz.

— Então paralelamente existe um Ten que não é gastrônomo e um Taeyong que já é doutor em algo? — brinco. Ele gargalha, jogando o corpo para frente.

Acho que ambos estamos boiolas um pelo outro. Não sei se isso é bom.

— Uhum, possivelmente — meneia a cabeça.

— Aliás... — engulo em seco. Eu não quero ser invasivo, mas também não quero sentir que estou pisando em ovos ao conversar com ele. — Você cursa o quê? Eu ainda não soube.

— Filosofia — responde sem olhar para mim. — Mas quero ficar voltado no processo de produção de conhecimento, então pretendo botar a mão na massa na escrita. Quero escrever artigos, teses... Se possível, até mesmo livros. Acha isso possível?

— Você não deve me perguntar isso — ponho a mão no seu ombro, mas deslizo um pouco até sua nuca e acaricio um pouco seu cabelo. Ele não gela com isso, mas sei que está surpreso. — Eu acho que você é incrível e tem muito potencial. Só tem que parar de fazer essas perguntas. Ninguém tem que achar nada.

Ele concorda com a cabeça, então afasto minha mão. Bebo o último gole do meu refrigerante e peço ao garçom mais uma latinha da pequena. Ele diz que vai buscar e, enquanto isso, viro-me para Taeyong.

— Então você poderá usar aquele meme de "eu, um intelectual"? — questiono para ele, porque eu quero brincar um pouco e mostrar que estou demasiadamente orgulhoso. — Te vejo como um deus.

— Ha ha ha, engraçadinho — Taeyong revira os olhos. — Eu só me acabo todo lendo, mas eu que lute.

— Você nunca demonstrou desgostar — eu apoio o cotovelo na mesa e ele me observa por alguns instantes. Me observa de verdade. Desde o rosto ao cós da calça.

Ele está me secando?'??'?'?''?

— Verdade — ele vira de frente.

Ok, talvez a pior coisa que fizemos foi sentar no canto onde as paredes se encontram, e ambos preferimos ficar encostados numa delas. É confortável para conversarmos, e perfeito para alguns beijos. Ninguém olha para cá. Então é só dar uma chegada e beijar sem medo. Bem rápido.

— Mas em excesso é meio... Cansativo — acrescenta ele.

O garçom aparece com meu refrigerante e um canudo. Eu rejeito o canudo, mas peço que ele, por gentileza, lave a parte de cima da latinha para mim, visto que deixei o meu canudinho de inox em casa. Eu também nem sabia que iria comer com Taeyong até ter me dado a vontade mais cedo. E Taeyong fica me olhando e escutando minha conversa com o garçom, que simplesmente curva-se e sai para fazer o que pedi.

— Que foi? — pergunto.

— Nada — e ele boceja. — Você vai beber aqui ou... sei lá, ir bebendo no caminho? Estou com sono...

— Vou beber no caminho, não se preocupe. Quer mais alguma coisa? Alguma sobremesa ou bebida? — sugiro.

— Não.

— Ótimo, vou te comprar um sorvete.

Taeyong me olha com uma cara de quem vai meter a porrada em mim, porém faço a egípcia. Brigamos por cerca de cinco minutos sobre quem irá pagar e no final eu consigo convencê-lo a ficar shiu shiu quieto. Pago tudo no débito e saio com meu refrigerante de laranja e Taeyong a um metro de distância. Passamos numa dessas sorveterias que ficam abertas até tarde e espero Taeyong escolher as porcarias que ele vai colocar junto com o sorvete. Já apareço atrás dele para pagar, após ter jogado a latinha vazia no lixo.

— Não, Ten, não precisa... — ele fala, tirando a carteira do bolso para pegar o dinheiro.

— Eu falei que ia te comprar um sorvete.

— Eu pensei que você queria que eu tomasse sorvete.

— Também. Mas eu quero pagar — afasto a mão dele com as células para entregar ao moço do caixa e jogo meu cartão sobre o balcão. — Joga no débito, moço, por favor.

— Aish, Ten... — ele me empurra para o lado. — Aqui, moço, é mais prático — ele tira meu cartão da mão do atendente e põe as cédulas.

— Ah, então você quer praticidade? — arranco um punhado de cédulas da minha carteira. Estou com tanta raiva aqui agora que nem vejo quais são e quantas são, mas minha vontade é pegar o sorvete do balcão, puxar Taeyong pelo braço e dizer para o moço que ele fique com o troco. — Aqui. Vou querer um picolé de morango, então só junta com o sorvete dele.

Taeyong fecha a cara e guarda o dinheiro. Eu recebo o picolé — que nem queria — e o troco. Mas o importante é que ganhei, né. Porque seria injusto ele pagar por algo que eu sugeri que faria. Maluco. Agora quero dar um quilão na cabeça dele.

— Sorvete de quê? — pergunto assim que abro a embalagem do picolé, quando já estamos andando de volta ao estacionamento. De repente me deu uma preguiça de dirigir...

— Enguiço na panela de feitiço — sua resposta me faz questionar que porra deu em Taeyong hoje. Será que tinha soju no refrigerante dele?

— Quê?

— Você não teve infância? — seu rosto vira-se para mim, e eu vejo a palheta do sorvete arrastar-se pelo seus lábios.

— Que isso tem a ver? — reviro os olhos. — Só te perguntei o sabor do sorvete.

Nedá.

Que diabos de sabor é esse?

Nedá? — repito?

Nedá sua conta — e então ele ri de uma maneira infantil e se afasta de mim, porque percebe no ar minha vontade de lhe descer um soco.

Ele põe um pouco de sorvete na boca e dá uma corridinha. Eu apenas sacudo a cabeça e calmamente continuo a caminhar. O pesar dos meus passos dramatizam a raiva que finjo sentir. De fato, realmente estou irritado pela brincadeira, mas ele deixa tudo muito mais leve com seus pinotes e essa áurea gentil dele. Eu o puxo pelo braço de volta e digo que ele vai cair se correr assim de novo.

— Eu não caio mais — vai me dizendo. Ai, ai, vou fingir que acredito.

— Tem certeza?

— Uhum — ele arranca um pedaço do sorvete e faz um "ah" com os lábios, aproximando a palheta de mim. Ele quer que eu prove. — Descubra o sabor.

Penso por uns dois segundos antes de abocanhar o sorvete cheio de calda e granulado. Rapidamente descubro qual o sabor do sorvete e ele não me surpreende em nada. Queria dar um soquinho em Taeyong para ver se ele diversifica um pouco as coisas.

— Café, Taeyong? — digo. Ele sorri e concorda.

— Deixa eu provar esse seu picolé vermelho de Chernobyl — ele pede, então aproximo o picolé que ainda nem provei. Na verdade, eu não quero muito o picolé.

Taeyong vai tentar morder de uma vez só, mas acaba que ele não se parte e, com isso, não sai totalmente. Eu rio da cara de idiota dele por ter sido ludibriado por um picolé e ele, por sua vez, resmunga um palavrão.

— É que você não chupou ainda, então está muito grosso — ele se explica. Oh, Taeyong, cala a boquinha... — Chupe primeiro, depois eu mordo.

Essa conversa tá estranha.

— Morda primeiro, depois eu chupo — faço o caminho inverso.

Taeyong morde os lábios por alguns segundos, como quem segurando uma gargalhada. Eu estou amando ter contato com ele assim, de uma maneira brincalhona e casual. Sinto-me quente, reluzente. E ele também brilha, brilha tanto quanto a lua prateada no céu. Quanto as estrelas vivas e mortas. Quanto aos corpos celestes que vagam por aí que nem sabemos da existência. Ele consegue ser maravilhoso neste plano presente, mas também nos inúmeros outros. E no futuro. E no passado. E, sendo ele, não tem como não causar rebuliço. Sua presença é como jogar cebola no óleo. Começa o chiado, o respingo, a agonia, a emoção. Tudo fica tão lindo quando ele está por perto...

— O picolé é seu, chupe você — ele já empurra o picolé de volta para mim. Eu sorrio sem saber o que fazer. Quero empurrar esse picolé para ele, depois abraçá-lo bem forte.

— Já que você quer experimentar, chupe você — lhe entrego o picolé e pego o sorvete da sua mão.

— Eu? Chupar seu picolé? — a dramatização dele acerca de uma possível rejeição acaba sendo o estopim para que eu lhe acerte o braço com um leve tapa. — Tá, fique com o meu sorvete. Eu fico com seu picolé. Eu sei que você não quer ele.

Eu sorrio e nada digo. Ficamos assim mesmo. Eu tomo seu sorvete cheio de coisa, e ele fica com meu picolé Chernobyl de morango. Nós dois, caminhando lado a lado nas ruas já vazias, tudo pacato, meio morto, meio sem cor. O sol nem aqui está, mas me sinto quente. Sinto minha pele quente. E se ele não pode jogar o braço ao redor dos meus ombros e me puxar para perto, eu fico feliz mesmo assim. Porque eu aprendi como é gostar de alguém e não querer ser correspondido. Já basta o sorriso dele. E ele está sorrindo tanto...

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