eu fico feliz por você
Estala os dedos, as pupilas grudadas às minhas, os joelhos que esticam-se e dobram numa frequência inconstante e um sorriso que surge vez ou outra, no canto dos lábios, rompendo as frases que diz e eu, quieto, escuto como se fosse melodia clássica. Inclino o corpo quando, entusiasmado, conta quão louco Doyoung disse que iria casar-se, que passou o dia inteiro pensando se era verdade ou não. Chega deu o troco errado, contou. Então vou parar de fingir que não sei com o que ele trabalha agora:
— Oh, eu soube da sua floricultura — recosto-me na cadeira. — Posso passar lá algum dia?
— Claro que sim! — sorri, balançando a cabeça. — Eu te mando o endereço...
— Ah, obrigado — sorrio. — Eu fico feliz por você. Sabe, acho que já conversamos sobre isso e você mencionou. E fico feliz que tenha se realizado, isso significa que pôs fé em si mesmo.
Quando eu soube disso, eu praticamente tive um ataque do coração. Porque... Por mais que doesse termos acabado daquela maneira, fui bem afortunado em descobrir por Jaehyun que ele estava a trabalhar na própria floricultura, pois era apaixonado por flores e tudo mais. E que agora andava com um caderno, fazendo desenhos e praticando tipografia em todo lugar. E era esse tipo de coisa que ele faz nas reuniões para o casamento de Doyoung, quando fica quieto demais e usa demais a canetinha esferográfica preta, enquanto deixa o namorado dar opiniões.
— Sim. Na verdade, muito obrigado por me ajudar a pensar nisso — ele sorri orgulhoso. — Não é grande como seu restaurante, mas...
— Deixa disso — cordialmente, ponho a mão em seu ombro — Está tudo indo bem?
— Sim, sim. Melhor do que pensei, honestamente — responde.
— E a faculdade? Está conseguindo dar conta de tudo?
Eu sei o nível de dificuldade que é segurar emprego e estudos nas costas, uma vez que sofri horrores em Paris. E imagino como deve ser cansativo, ainda mais por ele estudar durante a noite. Eu não conseguiria, então o considero um guerreiro.
— Sim, embora eu durma algumas vezes — confessa. Me sinto aliviado por ele estar bem. — Mas estou dando conta de tudo, então me perdôo por isso. Não vou entrar em desespero.
Quero perguntar mais, quero saber mais, sinto que necessito disso. Necessito escutá-lo falar sobre si mesmo, para que eu veja quão bem ele está. Quero vê-lo sorrir também, porque é do seu sorriso que vem o meu. O conforto, o conforto que sinto com o nosso conforto aqui, na luz baixa do restaurante, estirados sobre as cadeiras, as posturas completamente erradas — minha antiga professora de balé diria algo como "você deveria estar tocando os sinos de Notre-Dame" ou "por que não se deita logo?" — e uma proximidade agradável. É bom. É bom, sim.
A porta se abre, então cabelos loiros invadem meu restaurante, cumprimentando a nós dois e aproximando-se sem hesitação alguma. Eu sorrio para Yuta, mas eu sinto que ele quebrou o conforto.
— E aí? — cumprimento.
— Koi... — sussurra Taeyong.
Antes de puxar uma cadeira para sentar-se junto a nós, Yuta inclina-se para deixar um beijo rápido em Taeyong. Viro o rosto, pego o copo d'água sobre a mesa e dou um longo gole. Paro apenas quando o vejo sentado.
Eu gostei de ser amado por Taeyong, porque eu soube bem antes de ele me dizer pela primeira vez. Eu soube pelos seus abraços em Paris, seus abraços fortes. Eu soube pelos seus beijos em Paris, seus beijos de dor. E era difícil lidar, quando eu sabia disso e queria tê-lo por perto. Queria tanto tê-lo por perto. Passei um ano e meio sem Taeyong, então espia só a falta de sentido... Sobrevivi todo esse tempo sem ele. Então por que, antes disso, não afastei-me — como sempre fiz em toda minha vida — e tratei de viver sem ele na minha cola?
Mas não me culpo. Se eu voltasse no tempo e pudesse sentir aquilo de novo, provavelmente agiria da mesma forma. É como se ele fosse uma série gigante da Netflix. Eu digo: só mais um episódio, só mais um, mais um pouco, só mais um tantinho, daqui a pouco paro, daqui a pouco... E quando vejo, já acabou.
— Doyoung tem novidade mesmo, né? — o japonês comenta, como quem puxando assunto.
— Sim — Taeyong responde. — Ele já nos contou, mas vamos esperar ele te contar.
— Aish, que horror... — resmunga Yuta. Ele aproxima-se mais de Taeyong para que possa ter contato físico com ele, então vejo que essa é minha brecha.
— Eu vou ali na cozinha — levanto-me e caminho apressadamente para a cozinha.
Eu ainda não me acostumei com essa ideia de estar num mesmo ambiente que eles dois, ainda mais quando sozinhos. Porque ficam conversando entre si, e Yuta sorri e toca Taeyong. Ele sempre foi assim com Taeyong: abraçando, puxando para beijos, pondo a mão na sua coxa. E desde quando estávamos saindo, eu me incomodava com isso. A questão é que agora não posso mais reclamar, por isso pego meu avental e trato de preparar um tagliatelle à bolonhesa. Estou com fome e aposto trezentos euros que eles também.
Felizmente, me deixam a sós na cozinha. Minha mãe já comentou sobre o modo como me afasto das pessoas do nada, mas acredito que isso faz parte de mim. Eu me canso facilmente. E, em falar nela, com certeza seu e-mail para o possível encontro deve estar pintando minha caixa de mensagens. Bem, eu não quero aparecer na Tailândia esse mês, também não quero conhecer o namorado da minha irmã, não quero ter de olhar para a cara do tio ridículo que insistia em dizer que eu era um pedaço de lixo vestido de ouro. Me contento em apenas aparecer por lá uma vez no ano, então por que dessa reunião de repente? Nossa senhora, como eu gostaria de ter desculpas prontas...
E se eu disser que na verdade sou hétero, acabei engravidando minha namorada e agora ela está prestes a ter o bebê e eu não posso perder o nascimento do meu filho? Minha mãe acreditaria nisso?
O calor do molho frita meus pensamentos. São muitas coisas para lidar, estou quase sem ar. Sem ar, porque tudo está em movimento e não consigo fazer com que tudo pare. É minha família esquisita, é Taeyong com Yuta, é meu restaurante para dar conta, é Lucas mandando mensagem a cada duas horas, é o casamento de Dodo agora na Grécia, é Jaehyun com papo de amor... Jesus Cristo, eu preciso me ausentar um pouco. Vou pôr tudo numa fila e ver no que vou dar prioridade em lidar. Porque está complicado.
Não é que eu esteja sobrecarregado, é que há uma violência, uma poluição de gritos e exigências ao meu redor, quando não precisa disso necessariamente. Por isso que pego meu celular, enquanto o macarrão cozinha, e respondo ao e-mail da minha mãe com um "vou ver e te aviso" sincero. Pergunto ao Lucas por que é que está entupindo meu celular de mensagens, porque faz parecer que está desesperado e isso não combina com a boca gostosa dele.
Xuxi só para baixinhos: tô falando contigo se tem como a gente se encontrar de novo
Eu respondo que atualmente minha resposta é não, mas podemos ver algum dia aí para isso. Sendo assim, lhe pergunto qual dia ele tem em mente.
Xuxi só para baixinhos: depois de amanhã ou semana que vem. se a vossa alteza concordar, claro. se quiser, posso te levar a um museu ou a algum concerto maluco de músicas desconhecidas que você gosta.
Lucas é engraçado. Porque ele fica bem fazendo de tudo para me agradar. É como uma troca: eu quero companhia para cultuar minhas artes, meus lazeres; ele quer companhia nos prazeres dele, no beijar, no tocar. Ele sabe como me comprar, sempre sabe meu preço. Mesmo assim, não é como se fosse suprir todas as minhas vontades. Ele mal presta atenção nas coisas, só quer me agradar. Bem, eu não preciso que alguém me agrade. Às vezes Taeyong fazia isso e eu tentava ser simpático, porém grunhia por dentro.
Respondo que ele pode aparecer lá em casa depois de amanhã, uma vez que não quero sair e até posso preparar alguma coisa para comermos.
Xuxi só para baixinhos: uiui vou montar minha barraca. chego no final da manhã, taokei? we need to talk about something. bjos na bunda tchau.
O fato de ele escrever em inglês que precisa conversar comigo acerca de algo só piora a situação. Pensei: já está resolvido o caso Lucas. Depois vem essa. Ah que ótimo, show, incrível. Eu não gosto de falar sobre assuntos sérios com pessoas que não levo a sério. Eu só quero beijar na boca, qual dificuldade tem nisso? Cristo...
Mas não me preocupo mais com isso. Não, não. Guardo o celular, lavo as mãos e volto a cozinhar. Me pergunto em que buraco está Doyoung e Minyoung que até agora não chegaram. Pego até um vinho para beber, ver se distrai minha mente. Ponho um pé fora da cozinha para oferecer uma taça aos dois, mas quando percebo a atmosfera que ronda o ambiente, eu meio que paraliso.
Não sei. Éramos nós dois num horário desses, praticamente dois anos atrás. Fazendo a mesma coisa: o roçar da mão na nuca, o roçar dos lábios nos dos outro, o roçar dos dedos na cintura, o roçar das respirações no silêncio. Sinto meu rosto ficar quente, mas é o álcool. Eu pensaria que é vergonha. Vergonha de mim. Vergonha por ter gritado e reclamado, porque senão seríamos nós dois assim agora. E eu não sei por que é que faço questão disso. Se é corporal, eu não preciso disso. Eu posso encontrar alguém para mim.
E se não preciso disso, viro-me de costas e volto à cozinha. Deixo as taças sobre o balcão, a garrafa também. Pego meu celular, respondo ao Lucas: "vê se não demora, vou estar te esperando!" Eu não preciso disso. É apenas corporal, não preciso disso. Não preciso de nada disso.
Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top