eu acredito em você

De manhã, sinto-me cansado. Mas acordo cedo, como alguma coisa, visto minha roupa para atividades físicas e saio para correr. Porque sei que irei gritar, no mínimo, dez vezes hoje. Irei reclamar dos pedidos que não irão me agradar. Irei surtar com a velocidade dos cozinheiros. Eu quero ser excelente. Não dá pra ser o mesmo sempre.

Compro um smoothie de morango e banana, já de volta para casa, empapado de suor, sentindo o sol da manhã assar meu corpo. Mando a Jaehyun um vídeo meu me exercitando na barra e mostrando quão bom estou ficando nisso. Ele me responde com um áudio rindo, dizendo que eu tenho que dar um baita salto para conseguir alcançar a barra e que demoro deveras para minimamente encostar meu peito no ferro. Mando ele se lenhar e tiro a camisa assim que passo pelo jardim. Meu suor brilha sob o sol, então entro antes que a maresia me pegue.

Eu odeio segundas, mas não perco mais meu tempo percebendo que é segunda. É um dia comum, assim como os outros. Tudo bem que há uma lamentação conjunta sobre o final do fim de semana, porém é algo que não consigo mais me importar. Porque todos os dias são cansativos e acabei percebendo que a diferença entre segunda e sábado é apenas o nome diferente. Por isso que não rosno de preguiça ao arrumar-me para trabalhar.

Meu corpo está ferrado. Quanto mais eu fujo do sedentarismo, mais ele capota na minha cara. Posso até fazer atividades físicas por anos, porém sempre terminarei com uma dor desgraçada e uma vontade de me jogar na cama e nunca mais sair. Sim, eu tenho preguiça. Cristo...

Uma xícara de café deixa-me alerta para tudo. Um jeans preto rasgado deixa-me livre para tudo. Escolho quais brincos irei usar, ponho a máscara no rosto, óculos também, bolsa atravessando o corpo e um pouco de coragem para sair de casa logo quando minha maior vontade é de despencar na cama sem querer e dizer que estou morto.

Assim que meu corpo cai, dolorido, no banco do carro, meu celular choraminga uma notificação. Jogo minha bolsa para o banco de passageiro, puxo as pernas para dentro do veículo e puxo a porta. Eu nem estava tão cansado e infeliz quando acordei, mas de repente essa parada de ser um ser humano saudável, e tudo mais, acabou escorrendo pelo esgoto. Incrível, incrível, eu mal consigo levantar minha perna.

Arranco o celular da bolsa, então vejo que se trata de uma mensagem recebida no Instagram e o user me faz quase tremer. É Taeyong. Taeyong simplesmente me mandou uma mensagem. Ok, não vou surtar por conta disso, mas para alguém que há pouco tempo estava cagando e andando para a minha existência, essa é uma baita evolução. Tipo... Ele me mandou mensagem, né.

Eu visualizo a mensagem: é um endereço. Com certeza é o endereço da floricultura, e eu estava quase esquecendo que ele falou que estava para me passar. Eu não pensei que ele iria realmente me mandar, mas agora que me mandou, eu acabo por questionar se ele realmente quer que eu vá. Bom, poderia ser muito bem um papo furado apenas para ser simpático e eu iria ficar na espera por toda a eternidade — coisa que já fiz demais com inúmeras pessoas —, porém o fato de ele pôr o horário de funcionamento na mensagem acaba por me fazer sorrir sem querer, e balançar a cabeça, incrédulo.

Pergunto se posso realmente ir. Ele responde: "se você quiser" e um emoji engraçado que parece mais uma risada fofa sendo abafada. Imagino ele fazendo essa expressão, com as bochechas vermelhas e tudo, e acabo por ligeiramente rir sozinho disso. Respondo que irei um pouco antes do horário do almoço, ele visualiza mas não responde. Acho que não temos mais o que falar.

Assim que bloqueio meu telefone, de repente recebo uma mensagem sua:

"Vê se não se perde dessa vez 🤭"

Qual o problema dele com esse emoji? É muito fofo e engraçado ao mesmo tempo, que inferno. Rapidamente digito que não sou tão ruim em localização, que aquele dia foi só um pequeno azar.

"Eu acredito em você 🤭"

Reviro os olhos, então dou-me conta do horário e já guardo meu telefone. Ponho o cinto, ligo o motor e arranco o veículo pela cidade. E eu simplesmente amo chegar ao restaurante, é como uma casa para mim. Cumprimento todos, vou ao escritório, converso com Jaehyun e depois me jogo na cozinha.

Cozinhar é como o amor mesmo, é egoísta. Eu cozinho porque quero que gostem e se sintam bem, uma vez que isso me traz uma sensação de paz, conforto e autoestima. Fazer as pessoas se sentirem bem ao degustar algo que preparo me alegra. E, no final de tudo, eu saio realizado. Eu sempre saio realizado.

Eu amo cortar, mas também amo molhos. Meu vício culinário é pôr queijo em tudo, mas só faço isso em casa. E orégano. E manjericão. Eu sou apaixonado pelo molho de tomate e manjericão, o molho basílico. E eu amo massas. Amo comida, amo. A culinária me encanta tanto que, quando tudo está calminho e leve, eu faço sorrindo. Xiaojun diz que tenho problemas mentais. Yangyang fala que estou suspirando. Mas não é isso, não. Eu me sinto bem cozinhando, parece que é algo que existe perfeitamente para mim.

— Prova isso — respingo uma gota do molho na mão do Xiaojun e ele lambe.

Suas sobrancelhas ficam arqueadas tão rapidamente que eu nem consigo acompanhar a mudança de expressão. Ele bate no balcão e chama Yangyang para experimentar também.

— Nossa, está muito bom! — Yang experimenta, dando uma olhada na panela para checar. — Ten, você é maravilhoso! Caramba...

Eu sorrio.

— Eu vou incluir no menu italiano — digo, mexendo o molho na panela. Está quente e o aroma está fenomenal. — Mas eu ainda estou pensando nisso. Vou deixar uma parte para receitas originais, outras serão releituras.

— Ah, é por isso que fica até tarde no restaurante? — Xiaojun pergunta, indo para o outro lado da cozinha e voltando aos seus afazeres.

— Também — respondo, enxugando as mãos num pano úmido. Isso não faz muito sentido. — Mas... Eu amo fazer releituras, mas tem certas receitas que não ouso mexer.

— Se lembra da última temporada de Cook & Taste que você participou? — Yangyang quase se esbarra com outro cozinheiro ao tirar alguma coisa da geladeira. — Teve algum participante que fez uma releitura de um Tartar de Salmão sem o salmão. Tipo... Como assim?

Todos da cozinha acabam caindo na gargalhada, inclusive eu, que simplesmente me apoio na bancada para não cair de tanto rir. Eu sei que é errado rir da desgraça dos outros, mas existem releituras que não podem ser consideradas releituras.

— Nossa, eu me lembro... — me recomponho, embora meu abdômen ainda esteja saltitando. — Ele mudou a receita toda! E ainda ficou putinho comigo quando falei que aquilo era simplesmente um prato desconhecido para mim.

— Mas você é cruel, Chittaphon! — do nada, Kun se mete na conversa. Ele normalmente me substitui quando não posso ser o chef aqui dentro, então é a segunda autoridade da cozinha e eu o respeito muito no quesito competência.

Ah, merda. Ainda tenho que dar a resposta sobre o segundo aniversário da Kun. Honestamente, ninguém faz aniversário duas vezes por ano, ninguém comemora meio ano vivido. Kun não faz sentido algum para mim.

— Sabe, você faz comentários bem maldosos. Você tem cara de ser o bonzinho, mesmo que fique sério o tempo todo e só costume rir de deboche. É que você tem esse arzinho que é amável, entende? Mas, caramba... Eu tenho pena dos participantes — acrescenta Kun.

Cruzo meus braços sobre o avental levemente respingado de molho.

— Eu sou pago para isso — dou de ombros.

— Amado, quando o Ten disse que nem para um cachorro ele daria aquele Tartar... Jesus, ainda bem que não me inscrevi nesse programa! — Yangyang para no meio da cozinha, chamando a atenção de todo mundo. Só vou deixar ele falar isso e logo darei as ordens para que volte ao trabalho e deixe de conversa fiada. — Eu não teria psicólogico. Tipo, o Ten com a cara dele séria, daí ele lança aquele olhar mortal de desgosto dele, e então todo mundo está em silêncio... Do nada, ele fala "produção, preciso de um copo d'água para tirar esse gosto da minha boca!" Eu já estaria tremendo, aí quando ele dissesse que não daria nem pra um cachorro, eu teria um ataque cardíaco no meio do programa. Sério.

— Mas vocês sabem que preciso ser duro mesmo, né? Eu não exagerei, estava realmente ruim. Mas depois eu falei o que estava errado e quais foram os erros, então no final foi algo construtivo, apesar da cena que montei. Eu tenho que montar cena, vocês sabem que é pra aumentar a tensão do programa e entreter os telespectadores. Quem não gosta de assistir uma crítica dura? Ainda mais quando tem uma ceninha... — vou explicando.

Programas de televisão são puro drama e armação. Eles nos dão papéis. Eu tenho que ser o jurado duro, falar a primeira coisa que pensar. Se gostar, gostei. Elogio, dou dicas, parabenizo. Sério, fico sério e não faço brincadeiras que não sejam irônicas, sarcásticas, para fermentar o deboche que vez ou outro ponho em prática. E ele aparece quando não gosto. E quando não gosto, nunca é demais falar algo que provocará comentários no público, fazer algo que irá repercutir no Twitter. Televisão faz tudo pela audiência. E a audiência faz tudo pela televisão.

— Agora deixem de conversa e voltem ao trabalho! — e só em falar isso, vejo Yang tomar um susto e correr de volta ao fogão.

Termino de fazer o que preciso fazer, já que o horário que planejei ir ver a floricultura está para chegar e eu preciso lavar as mãos e tirar o avental. Dou as ordens de que Kun assumirá e saio apressado. Jaehyun já sabe do que se trata, porque comentei logo quando cheguei. Ele me olhou daquele jeito que me olhava quando eu costumava dizer que havia passado um tempo com Taeyong. Não sei se concordando ou discordando, mas como alguém que está apenas observando sem posicionar-se.

Confio no Google Maps para ajudar-me neste momento e, por incrível que pareça, percebo dar certo quando conserto o óculos no rosto e vejo a floricultura de longe. Estou um pouco nervoso, mas ansioso para saber como é. E assim que estaciono o carro, vejo o colorido das flores enfeitando a calçada em que as pessoas passam e contemplam por alguns segundos.

A porta está aberta, há um pequeno quadro negro do lado de fora informando alguns preços. Não conheço tanto de flores ao ponto de saber o nome das quais estou a ver, porém sei o suficiente para reconhecer algumas que já ganhei ou comprei. Desço do carro, olho ao redor, todas essas pessoas passando, indo de um lado para o outro... Faço parte delas agora.

Exalando ânsia, entro no estabelecimento mais clareado por luz natural que entrei na vida. Apaixono-me pela estética exterior, pois é como se estivesse a cuspir as flores para fora de tanta formosura que se há por dentro. Passo pela placa de madeira identificando a floricultura, escrita numa letra vintage pintada. Sou inundado por um cheiro bom. Não bom, mas... Bom. Esse lugar parece um soneto, e o autor finge que não gostou por forçar a modéstia, ele está praticamente estirado sobre o balcão bem do outro lado.

— Você veio! — nota minha sombra dura no assoalho de madeira.

— É, eu vim.

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