eu acho isso egoísta
Vai ver eu não tenho jeito mesmo. Se continuo na mesmice ou não, preciso compreender que às vezes eu me sinto menos eu quando penso em gostar de alguém. Não é como aquelas baboseiras adolescentes. Eu nunca que iria padecer por ninguém. Eu só choro quando tem demais, quando tem demais coisas para lidar e eu não sei como falar. Eu não saberia como falar. Tem certos amores que só se vivem chorando de felicidade. Não de dor, não de terror, não porque alguém me deixou. É que pode parecer que sou uma madame egoísta que costuma terminar os relacionamentos, e não o contrário. Sim, pode ser que eu seja fresco e caprichoso. Mas eu sei mais que ninguém sobre inúmeras coisas. E dentre essas inúmeras coisas, eu vi que se ninguém morreu ou ninguém que você ama está desesperadamente sofrendo, não há razão para chorar por ninguém. Foi o que eu disse ao Jaehyun no banheiro da faculdade, provavelmente no segundo ou terceiro semestre. Eu dizia para ele: o ser humano consegue viver sem alguém, porque ele não precisa de ninguém para sobreviver, então pare de chorar. Pare de chorar. E foram essas palavras que eu repetia comigo no assento confortável do avião, quando estava indo à Nápoles. Pare de chorar, Ten. E funcionou.
É que eu olho para o rostinho de Taeyong e me pergunto os motivos que me fizeram sofrer tanto no início. Eu sabia que iríamos nos reencontrar. Que iríamos conversar. Estranhamente, eu acredito nessa parada de "assuntos não resolvidos". É que a vida não passa de um ciclo. Às vezes, achamos que algo acabou, mas de repente retorna. Deixamos algumas pendências para trás, é como uma multa da biblioteca que te impede de concluir sua próxima matrícula. E eu senti isso com Taeyong.
Acho que estava ocupado demais para de fato sofrer sobre algumas perdas. Eu sempre ando ocupado, sempre ando preocupado, às vezes esquecia dele de verdade. Eu só saía com alguns amigos, eu trabalhava, eu estudava, eu fazia turismo. E tudo sumia. Eu me recordava dele em alguns momentos. Às vezes do nada, no meio da madrugada, assistindo algum programa na televisão, ou à tarde cozinhando alguma massa ou fritando alguma coisa. É fácil falar para parar. Difícil é compreender que é preciso parar de pensar naquilo porque aquilo não está te tornando num ser humano mais feliz. E é por isso que, pouco a pouco, me acostumei com as visitas não tão frequentes dele na minha cabeça. Eu estava indo até bem. Até perceber seu nome escancarado a me vigiar na internet.
E agora que nos reencontramos e estamos aqui no carro, cruzando o cinto de segurança pelos nossos peitos, eu sei que eu fiz bastante progresso nesse papo de romantismo & amor & relacionamentos. Se antes eu vomitava com a palavra namoro, atualmente tenho a consciência de que isso pode acontecer a qualquer momento. Meu problema são as interseções. Eu quero estar no mesmo plano cartesiano que alguém. Ele o x, eu o y. Eu o x, ele o y. Independente do quadrante. Estamos no mesmo plano, isso já é o suficiente. Nada de intercessões. Nada de reta batendo com parábola nem parábola batendo com reta. Não é um relacionamento "tanto faz", eu só não quero ter a obrigação de estar grudado a alguém e de ter de fazê-lo feliz até mesmo quando eu estiver cuspindo para a felicidade. É o sentimento de obrigação. Eu não consigo evitá-lo.
Por isso que é mais gostoso assim, sem ele na minha cola perguntando se o amo, dizendo que me ama, querendo me ver toda hora, movendo rios e horizontes por mim... O problema é esse mesmo sobre relacionamentos: ou eu machuco a pessoa, ou eu me machuco. E não é medo da dor nem nada do tipo, é mais uma questão de paciência e habilidade para encaixar alguém num lugar que nem existe na minha vida. Provavelmente vou virar aqueles solteirões de quarenta, se continuar assim. Talvez eu vire um sugar daddy.
— Quer colocar música? — sugiro, para que não tenhamos que ficar em silêncio.
Ele concorda, felizmente. Eu ligo o carro, ele conecta o bluetooth. Estou um pouco preguiçoso para dirigir, além do sono. O que é uma novidade, já que ultimamente tenho dormido tão tarde que achei que no final de semana eu iria virar a noite acordado neste mau hábito. Mas não, estou até cansadinho agora e é um bom sinal. Vou chegar em casa, tomar um banho e me jogar na cama. Amanhã Jaehyun vai passar a tarde inteira na jacuzzi comigo e eu irei fazer uma torta de maçã para comermos.
Por ora, afundo-me no banco do carro e escuto o início da melodia da canção que Taeyong acabou de escolher. Pelo visor, lá está: There's a light that never goes out. Eu realmente gostaria de entender a obsessão em escutar essa banda quando está comigo. Certas coisas eu acho que nem ele entende.
Entre os "me leve para sair hoje à noite" e os "se um ônibus de dois andares colidisse contra nós", eu vou pegando a essência da letra enquanto dirijo. Sabe, não é uma energia muito positiva para quando se está dirigindo. Porque ela diz que se um caminhão de dez toneladas batesse contra nós — ou um ônibus de dois andares —, morrer ao meu lado seria uma bela maneira de morrer, um privilégio. Eu até olho para Taeyong, mas ele está olhando a rua balançando a cabeça no ritmo da música.
— Sinceramente — ele começa. — Eu sempre quis morrer primeiro que meus pais. Porque não quero vê-los morrer.
Eu engulo em seco. Do nada isso, bicho.
— Eu acho isso egoísta — respiro fundo ao indicar a seta. — Porque você prefere que eles te vejam morrer, do que você vê-los morrer e seguir a naturalidade da vida.
— É ser covarde — Taeyong fecha a janela e começa a olhar a pista à frente. Ele solta um bocejo sem querer. — É quem eu sou, no final das contas.
Olho para seu rosto por alguns segundos. Eu entendo ele.
— Acho que me assusto mais com a possibilidade de lidar com a morte de alguém do que a minha própria — conta ele. Eu queria abraçá-lo. Porque Taeyong sente demais as coisas, mais do que deveria. Sente em dobro, triplo, se acaba pelo fogo. Mas é só uma vela. E nisso ele não tem fôlego para lidar com nada, porque tudo o tira do lugar e da zona de conforto. — Você não?
— Conseguiria lidar com ambas da mesma maneira.
— Como?
— Não sei. Percebi que todos nós não passamos de fotografia — eu sei que é errado, mas dou uma acelerada no sinal amarelo e me livro da parada obrigatória.
— Ay, Ten... Você parece um tiozinho — do nada Taeyong vem com um tom mais casual falar comigo.
— Talvez — faço uma careta. — Mas essa questão de morte nunca foi um problema para mim. Quando eu era mais novo, eu só queria que três coisas acontecessem na minha vida: fazer algo para ficar famoso, transar em local público e morrer jovem, porém com um grande legado.
Taeyong finalmente gira o corpo na minha direção.
— Com quantos anos você pensou nisso, meu lindo? — e então ele cruza os braços. Eu jogo os olhos nele rapidamente. Irra, que homem lindo.
Toda vez que Taeyong dizia que não se considerava bonito e coisas mais, eu tinha vontade de bater tua cabeça num espelho até ele admitir o contrário. Eu sei que assim parece que eu gosto de resolver as coisas no soco, mas quando eu falo ele não acredita, o jeito é descer um murro nele e dizer que foi por uma boa causa.
— Sei lá, uns doze ou treze... — dou de ombros.
— Uma pestinha com a mente bem podrinha, né?
— Taeyong, ninguém com treze ou doze tem a mente limpa — explico, porque é verdade. Um dia eu estava no restaurante e vi um molequinho dando zoom em fotos de artistas femininas e dizer ao irmão que ela era bem gostosa. Senti nojo? Sim. Homem presta? Não. Homem hétero presta? Nem um pouco. Mas temos que lidar né. Na verdade, minha visão mudou quando percebi que homens héteros na verdade sentem atração pela feminilidade.
— Eu tinha.
— Ah, pare... — reviro os olhos. Ele vai enganar é o jegue, não a mim. Menino maluco.
— Sério.
— Vai me dizer que você não ficava distraído olhando, sem querer, para a calça do professor e se perguntando qual seria o tamanho? — eu ainda nego com a cabeça, porque simplesmente não tem como ser verdade. É só uma sugestão, mas Taeyong me olha como se eu fosse um tarado.
— Credo, nunca fiz isso!
— Nem com o professor de educação física? Tipo, olhar a bundinha redonda dele naquelas calças?
— Ten, você fazia isso? — acho que seu tom de surpresa e negação é o que me pega desprevenido. Ué, vou ser julgado agora?
— Eu fui um adolescente com hormônios, Taeyong — reviro os olhos outra vez. E então me dou conta de que sem querer subi um viaduto que não deveria subir, porque não estou indo para a minha casa, e sim para a casa de Taeyong. Agora vou ter que seguir em frente até encontrar uma rotatória, descer o viaduto e passar por outra rotatória. Culpa de Taeyong com esse papo de menino de treze anos que não sente atração sexual por ninguém.
— Eu também fui — ele decide se defender como se fosse mudar alguma coisa. Já tirei minhas conclusões, é melhor ele desistir.
— Você foi o último da turma, né?
— Quê? — ele abaixa um pouco o volume da música. Eu nem percebi que já é outra. Também, todas essas músicas de rock alternativo parecem uma só...
— A entrar na puberdade.
— Shh, shh, Ten. Cala a boquinha, tá? — estica-se no banco e boceja mais uma vez.
— Tá ok. Vá tirar um cochilinho, vá — ligo o ar-condicionado e fecho minha janela.
— Só vai ser um pouquinho, vou descansar os olhos.
Uhum.
Por alguns minutos, eu juro que acredito que ele está descansando os olhos. Não obstante, já perto da sua casa, eu olho para seu rosto e noto que ele está em sono profundo. Pela postura, pelos olhos e mandíbula. Ele já está em Nárnia, sendo que me disse que ia ser bem pouco. Taeyong já não me engana mais, vou ser sincero. Olha só que bonitinho ele todo encolhido no banco, nem parece que é uma pestinha.
Eu até olho para o banco de trás, com o intuito de encontrar algum cobertor. Mas não tem nada. Ele parece confortável até, o que me leva a pensar que realmente está cansado. Parando para pensar agora, não sei como vai ser quando chegarmos em casa. Ou melhor, na casa dele. Por isso já começo a chamá-lo desde já, porque só faltam duas quadras.
— Taeyong — chamo. — Taeyong, peste!
Nada.
— Taeyong, merda! — cutuco seu joelho. Mas não posso ficar mexendo nele, agora preciso focar na baliza. — Taeyong, cabeça de martelo!
Ok, xingamentos não ajudaram nem um pouco. E agora? Bem, eu estaciono o carro, abro a porta e vou até o outro lado. Consigo pegar o celular entre as pernas dele e parar a reprodução de música. Cutuco seu rosto, mas ele apenas diz que já vai levantar, se aninha melhor no banco e volta a dormir.
— Tae, você não vai ir sozinho? — lhe pergunto, acariciando sua franja. — Vou ter que levar você, tá? Deixa eu pegar sua chave...
Preciso tatear seus bolsos para encontrar o molho de chaves. É estranho enfiar a mão no bolso da calça dele, porque a posição que ele está sentado não permite que eu tenha facilidade nisso. Minha mão fica presa, e se não fosse por ele se mexendo pelo incômodo, eu nunca que ia conseguir tirar.
— Sobe aqui, docinho, eu te carrego — me viro de costas e me abaixo para ficar num tamanho que possa facilitar sua locomoção.
Sou ignorado até começar a dar tapinhas na sua perna. Ele acorda por um tempo e sinto seu corpo rastejar até o meu. Preciso ajeitá-lo nas minhas costas a medida que me ergo um pouco, mantendo o equilíbrio. Acho que Taeyong tem um fraco por dormir. Ele morre. Parece que ele é transportado para outra dimensão. Será que ele é um Avatar? Caramba, essa realmente é uma boa teoria!
— Você está mais pesado que antes — comento, mesmo sabendo que ele não vai prestar atenção. Sinto sua respiração no meu pescoço quente e pesada.
Com o joelho, fecho a porta do carro. Então subo os pequenos degraus antes de entrar no prédio. Escada, fora de questão. Taeyong geme quando o faço minimamente pular para que eu possa deixá-lo mais para cima, porque ele já estava escorregando. Com muita luta consigo chamar o elevador. Com muita luta consigo selecionar o andar... e agora me pergunte aí com que luta vou conseguir abrir a porta do apartamento? Eu só me fodo.
Minha única solução é ter de jogar meu corpo todo para frente, para que eu possa tirar uma das mãos de Taeyong sem que ele escorregue. Eu gostaria muito que ele acordasse agora e dissesse que pode ir sozinho, porque nessa brincadeira aí minha coluna toda vai ficar lenhada. Mas tudo bem. O que importa é ele chegar bem em casa. E já que não sou um desgraçado que acorda todo mundo debaixo de grito, é bom que eu pague o pato pela minha gentileza e deixe Taeyong em casa, são e salvo.
E adivinha só? Sim! Levei tempo pra caralho para abrir a porta, porque não sabia qual a chave, e agora minha coluna está doendo — favor, inserir aqui um emoji de palhaço. Taeyong está realmente mais pesado que antes. Conquanto, não sei se fico triste pela minha coluna ou feliz por ele estar comendo mais do que costumava.
Meu foco é deixá-lo na cama. Bato no interruptor com a bunda dele — sim, já estou bem pistola com toda essa dificuldade, agora foda-se, vou usar a bunda do Taeyong para fazer exatamente tudo — e tenho um vislumbre quase mágico da sala de estar. Tem plantas. Muitas plantas. Plantas até no peitoril da janela. Em cada cantinho, um vaso de planta. E não tem mais televisão. Apenas uma parte da parede toda vazia e nada da televisão de antes. O sofá é o mesmo. A estante de livros parece estar mais limpa. Ele ainda tem mania de deixar roupas espalhadas por todos os cantos da casa, mas não tenho mais tempo para avaliar suas mudanças — ou nem tanto assim. Preciso deixá-lo no quarto.
E já no quarto, despejo seu corpo na cama e solto um suspiro cansado ou escutá-lo gemer alguma coisa. Deu trabalho, mas aqui estou eu. Morri? Com certeza. Mas ele está bem e conseguiu chegar em casa. Tento não olhar para seu quarto e me distrair enquanto abro os botões da sua camisa. Eu não sei com que glória Taeyong não ficou apertando os braços ao redor de mim durante o caminho, porque isso de ficar se grudando a mim durante o sono é a coisa que mais me lembro sobre ele. Porque me irritava.
Teu corpo largado sobre a cama, angelical e frágil, me recorda de quando eu cuidava dele. E de quando ele cuidava de mim. E de quando fazíamos burradas, sobretudo acerca das bebidas alcoólicas e das noites desbravadas. Eu sorrio abrindo o segundo botão. E então o terceiro. O quarto... Até abrir toda a camisa. Não sei o porquê do meu alívio ao checar a ausência de marcas no seu corpo pálido, mas acontece que não consigo evitar me sentir assim.
Acho que não terminei nada com Taeyong. Não terminei de abracá-lo, de beijá-lo, de gostar da sua companhia. E nessas pendências todas, é difícil ignorar e seguir nessa. Eu sei que não é grande coisa e normalmente não me inquieto com essas coisas. Mas constantemente estou preso entre pensar demais e não pensar em nada sobre ele. Porque me sinto até meio desajeitado ao retirar as mangas longas da camisa dos seus braços, e ele nem tchum. Vira-se de lado e solta um gemidinho de incômodo. Então acaricio sua nuca para que não se incomode mais.
Jaehyun diz que sou carinhoso, mas só quando me convém. Eu sempre neguei isso, porque nunca me considerei tão carinhoso assim. Mas reconheço a bestice careta que invento toda vez que estou com ele, como o modo que meus dedos entram no seu cabelo e sentem a textura dos fios surgindo do couro cabeludo. Eu era o aluno chato que passava as aulas fazendo carinho em alguém, com a cabeça no mundo da lua, pensando em miragens ou até mesmo no meu restaurante favorito do momento e qual seria o prato do dia. Eu cresci, mas certas coisas ainda estão em mim. Eu gosto de fazer carinho nele, mas não é que quero ser carinhoso. É algo sem querer.
Eu sei, está tarde já, hoje tenho coisas para fazer também. O dia já virou e ainda estou aqui. Tiro seu tênis, tiro suas meias. Puxo seu corpo para o centro da cama — talvez eu tenha me esforçado demais para deixá-lo confortável. Penso em beijar-lhe a bochecha. Desisto. Seria estranho. É estranho.
Abro a janela, o vento que entre e lhe dê um pouco de frescor. Seu corpo está meio grudento, porque ele começou a suar. Notei isso ao tirar sua camisa. E quando viro meu corpo de volta para ele, fico me questionando se tiro sua calça ou não. Sim? Não? A dúvida é cruel. Me aproximo na pontinha do pé, imperceptível, rapidinho, e abro o botão para deixá-lo mais confortável. Pronto. Só isso. Só isso, Ten.
Eu vou é embora, ficar aqui vai me matar de vez. E também já fiz o que tinha que fazer. O celular dele está aqui, então coloco carregando sobre a bancada, ao lado das chaves. Eu até mando uma mensagem para ele ler quando acordar. A tela acende, estampando a notificação. Checo.
Tennie1️⃣0️⃣: taeyong, você dormiu no meu carro, então te levei em casa. quando acordar, me mande mensagem para eu saber que está tudo bem. vê se não dorme muito e não morre sem querer. bye ~
Meu Deus. Não sei se rio da breguice de usar esses emojis ou o apelido no meu contato. Talvez eu esteja com demasiado sono para pensar direito sobre essas coisas. Eu sorrio com isso, passo a mão uma última vez no seu cabelo e depois saio desligando as luzes.
Quando olho para a sala com mais calma, eu meio que sinto falta daqui. Agora tem umas três pilhas de livros espalhadas aleatoriamente. O sofá é o mesmo, porém parece mais abatido. E tem uma mesinha ao lado dele. E sobre esta mesinha tem um projetor. E eu quero chegar perto, mas minha facilidade em captar as coisas sempre foi boa. Meu problema é ser observador demais.
Porque agora sei que Taeyong não assiste mais televisão, ele vê tudo pelo projetor. Ele tem preguiça demais de levantar-se para pegar livros na estante, por isso os deixa empilhados no chão da sala. E ele mudou a cortina da sala, agora é bege claro. E tem ramos de flores jorrando do seu peitoril. Tento até não notar os desenhos de botânica na parede, acima da bancada de bugigangas. Ou o cinzeiro em formato de concha sobre a mesinha de centro. Inefável o modo que sinto-me ao simplesmente olhar ao redor. Olhar e olhar. Olhar que há velinhas aromáticas e flores dentro de vasos de cerâmica no formato de cabeça de deuses romanos. E que há um difusor em formato de lótus ao lado dos vasos. Ele deve não ter usado hoje comigo... E eu não sabia que ele fazia aromaterapia.
Respiro fundo, porque já chega disso tudo. Abro a porta, desligo a luz e saio. Não sei do que estou brincando quando atravesso o corredor e chamo o elevador. Não sei muito bem porque desisto de esperar e vou de escada. E também não sei porque esqueço que vim dirigindo e fico à procura de um taxi, então preciso voltar ao notar que é meu carro estacionado aqui ao lado. Eu entro, e ainda não sei do que estou brincando. Dirijo até em casa, em silêncio, sem rádio nem bluetooth. O peso instalou-se em mim. Entro em casa. Eu entro e não sei de nada. Tomo uma ducha fria. Jogo-me na cama. Olho as mensagens pendentes, mas não respondo nenhuma. Sinto-me cru e instável. Hipócrita. Eu não posso mais passar por isso. Nada é tão fácil para mim. E eu não sou tão bom. Eu queria tanto, tanto, mas tanto... me trancar e ficar tudo bem, me refazer, ficar bem quieto, me encaixar apenas em mim. Eu gosto de gostar de todos. De todos que conheço, de todos os lugares, de tudo que vai ser passageiro. Gosto quando passa rápido, rápido. Mas não passa mais. E eu não presto para isso, não mesmo. Para ser sincero, está tudo errado. Gostar de alguém por tanto tempo é como ver uma comida azedar na sua frente. Você sente vontade de jogar fora.
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