Capítulo 4 parte 1

A fortaleza estava em polvorosa. É sempre um evento de grande importância quando um garoto da nobreza se torna um homem. No entanto, a política por trás desse aniversário era ainda mais complexa. O garoto não era um simples lorde ou mesmo um herdeiro do título de seu pai. João já era um Conde. Além desse fato, que por si só já tornava João alguém com poder e prestígio, ele é enteado do Grão-Duque Sir Ricardo Chiroptera e irmão de criação da herdeira dos dois grão-ducados do reino.

Tudo precisava estar perfeito para tamanho evento e Lady Ruti supervisionava a tudo e a todos. As acomodações para os convidados na fortaleza e a repartição de uma área externa para os servos montarem acampamento, a comida e bebida para os sete dias de festa, o entretenimento durante as noites, a contratação de mão de obra extra para todas as funções, principalmente na cozinha e no estábulo. Além de vários detalhes, como conferir os botões da túnica de João, convencer Sigrid a escovar os cabelos todos os dias e se lembrar de respirar.

Sir Ricardo, que considerava João como seu filho, vinha planejando o maior torneio em décadas. Haveriam justas, luta de espada, luta de espada em grupo, arco e flecha e arremesso de facas. Ao longo dos últimos cinco anos, foram construídas diversas áreas para comportar tamanho evento. Ao contrário dos torneios comuns em que somente nobres são permitidos, Sir Ricardo optara por não vetar a participação dos plebeus nas competições. Os torneios ocorreriam de forma síncrona e culminariam em uma grande final no último dia de festança, justamente no dia em que João faria 12 anos.

Como consequência das festividades vindouras, o grão-ducado começou a receber uma grande quantidade de gente, cada um com uma intenção. Haviam aqueles que foram vender suas mercadorias, compradores de todos os tipos, competidores do torneio, curiosos, larápios e mercenários atuando como um reforço na segurança das vilas e dos viajantes.

Lady Sigrid e conde João mal tinham tempo para estarem juntos. Com a preparação da festa, muitas coisas precisavam ser resolvidas e isso se tornou a oportunidade perfeita para ensinar as crianças. Apesar da tenra idade, Sigrid já era introduzida às tarefas e aos deveres de uma dama e tinha que seguir lady Ruti para todos os lados, enquanto lhe era explicado o porquê da escolha das flores, das cores, da decoração, da roupa dos servos, do cardápio, etc. Para João, as atribuições de um governante começaram-lhe a ser ensinadas quando ainda tinha 10 anos; Sir Ricardo, que se tornara regente do Condado de Campi Verdi, fazia questão de tê-lo junto de si, ao menos duas vezes na semana, para lhe deixar a par do que ocorria em seu condado. No entanto, com a proximidade de um evento tão grande, João começara a passar os dias com Sir Ricardo, que lhe designava tarefas como: a resolução de conflitos entre trabalhadores, a supervisão dos últimos preparativos das arenas, conferir se os gastos estavam condizentes com os serviços realizados, etc.

Faltando duas semanas para o início da festa, os convidados da fortaleza começaram a chegar. Carruagens de todos os tipos e tamanhos adentravam os portões e eram estacionadas na entrada principal da Fortaleza Chiroptera. Governantes (barões, viscondes, condes e duques), Sir, lordes e ladys. Nobres de todos os locais do reino e até mesmo alguns nobres do reino vizinho, fronteiriço ao grão-ducado, foram convidados para tamanho evento.

Devido a chegada de tantos forasteiros, o patrulhamento da fortaleza fora intensificado. Os corredores importantes eram patrulhados por uma dupla de guardas durante todo o dia, fazendo com que os pequenos nobres não mais pudessem sair para se encontrarem com Caleizu. As crianças não podiam nem mesmo sair de seus quartos sem darem de cara com os guardas. Os alojamentos dos nobres, a cozinha e os salões principais estavam tão bem vigiados, que qualquer tentativa de saírem despercebidos seria um fracasso. O patrulhamento também fora intensificado do lado de fora da fortaleza. Guardas faziam rondas em locais que antes não havia patrulhamento algum. As ruas estavam sempre iluminadas por tochas e até mesmo os bêbados noturnos que costumavam vagar sem rumo não eram mais avistados. A população do Vales do Sul nunca antes se sentira tão segura e reclusa.

Como sair de seu esconderijo era arriscado, pois não queriam que descobrissem seu local secreto, as crianças passavam quase todo o tempo em casa. A impossibilidade do encontro com os nobres não afetou de maneira drástica a situação das crianças. Durante o período de agradecimento aos deuses pela melhora de João, os nobres conseguiram entregar muitas coisas aos pequenos, como comida, roupas e até mesmo brinquedos. Havia tanta comida guardada que as crianças puderam, pela primeira vez, comer até sentirem suas barrigas doerem.

Subiam nas costas uns dos outros e, empunhando galhos, encenavam as competições mais famosas, fingindo ser os cavaleiros de tantas lendas e histórias épicas. Quase todas as brincadeiras refletiam a ansiedade pelo início do torneio e a preferida eram as justas.

Essa expectativa pelo torneio era palpável em todo o grão-ducado, independente da idade. Homens, mulheres e crianças só pensavam nisso. Pela primeira vez em muito tempo, pessoas comuns e nobres poderiam participar como iguais. Para os de sangue azul, era a oportunidade de mostrar a todos que os nobres eram escolhidos pelos deuses para governar e, consequentemente, serem enaltecidos perante seus súditos. Para os plebeus, era a chance de se destacarem como guerreiros e, se fossem vitoriosos, de se tornarem cavalariços de algum nobre importante.

Tudo isso, sem mencionar as enormes somas em moedas para os três finalistas de cada modalidade desportiva e para cada competição havia uma premiação diferente. Justa, luta de espada e arco e flecha tinham premiações de 60, 50 e 40 moedas de ouro, respectivamente, para os vencedores. Luta de espada em grupo e arremesso de facas foram acrescentadas na competição como modalidades extras e por isso a premiação era de 20 moedas de ouro para os vencedores.

A justa, a luta de espada e o arco e flecha visavam a exibição da habilidade individual de cada participante na cavalaria, na luta de curta distância e no combate de longa distância. Qualquer nobre que almejasse se tornar um Sir, ou seja, um Cavaleiro do Reino, precisava dominar esses três requisitos e os torneios eram a oportunidade perfeita para demonstrarem suas habilidades. Como o torneio de aniversário não tinha como única finalidade promover jovens nobres, a luta de espada em grupo e o arremesso de facas também foram incluídos. Arremesso de facas eram populares em tavernas e havia uma chance considerável de haver um plebeu como vencedor. Já a inclusão da luta de espadas em grupo como modalidade tinha uma motivação mais pessoal e complexa.

Haviam rumores de insatisfação entre os acordos de paz e limites de terra firmados entre Magna-Arbore e algum ou alguns de seus vizinhos. Sem provas de que essa insatisfação realmente existia e, por consequência, sem saber de qual reino se tratava, Sir Ricardo pensou em unir o útil com o agradável. Como a luta de espadas em grupo consistia em colocar todos os participantes na arena e esperar até o último ficar em pé, poderia demonstrar, com essa modalidade que, caso uma luta fosse iniciada na fronteira, os súditos do rei estavam aptos a protegerem suas terras. Uma pequena demonstração para desmotivar qualquer pensamento de quebra de acordo.


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