Capítulo 16 - Kisses
A governanta assentiu, observando a expressão da jovem à sua frente. Os olhos castanhos de Demetria brilhavam, prestes a transbordar, e Lauren sentiu o peso daquele olhar sobre si. Antes que a tutora pudesse perceber qualquer coisa, virou-se abruptamente, negando-lhe qualquer vislumbre de sua hesitação.
Com passos rápidos, Lauren seguiu até a cozinha. Assim que entrou no ambiente, algo inesperado aconteceu. Pela primeira vez em dias, seu coração se aqueceu, dissipando por instantes as sombras que a perseguiam.
Um coro de vozes infantis ecoou pelo cômodo:
— Surpresa!
O grito veio atrasado, já que Lauren havia notado a decoração antes mesmo das crianças conseguirem se organizar. Mesmo assim, sorriu, sentindo um nó na garganta ao ver o esforço dos pequenos.
— Você demorou, Lolo. — Nell pulou em seu colo, rindo.
Lauren a segurou com carinho, apertando-a contra si.
— Me desculpa, anjinho. Foi uma surpresa e tanto. — Ela beijou a bochecha dos pequenos, o coração aquecido pelo gesto.
— Você gostou? — Luke perguntou animado.
— Fui eu que fiz os brigadeiros! — Flora anunciou orgulhosa, saltitando enquanto apontava para os docinhos.
Lauren sorriu, apertando levemente as bochechas do irmão e depois olhando para Flora com ternura.
— Eu amei, meu amor! Ficaram lindos, aposto que estão deliciosos.
— Mas o bolo deve estar ainda melhor! — Nell se empolgou. — Foi a Tia Demi que fez, sabia, Lolo?
Antes que Lauren pudesse responder, a pequena se aproximou do bolo, afundando a pontinha do dedo na cobertura e levando-a à boca.
— Nellie, não! — Luke e Flora gritaram em uníssono.
Lauren riu baixo, mas logo seu semblante mudou.
Um incômodo cresceu dentro dela. Minutos antes, havia tratado Demetria como se fosse nada. Enquanto isso, a tutora só estava sendo gentil. Seu comportamento era injusto — mesmo que tivesse sido uma tentativa de protegê-la, nunca quis machucá-la. Mas Demi nem sequer sabia o motivo para ser tratada daquela forma... e isso a fazia se sentir ainda pior.
As crianças a tiraram de seus pensamentos, animadas para que ela apagasse as velas e fizesse um pedido. Lauren hesitou por um momento antes de soprar a chama, desejando, em silêncio, que a sombra que a seguia desaparecesse para sempre.
Minutos depois, Demetria entrou na cozinha. Seus olhos estavam avermelhados, denunciando que havia chorado. Lauren percebeu imediatamente e sentiu seu coração apertar.
— O bolo está uma delícia! — Flora exclamou com um sorriso satisfeito, as bochechas sujas de cobertura de chocolate.
— Passou no teste! — Luke brincou, piscando para Demi.
Demetria riu, bagunçando os cabelos do pequeno, que resmungou em protesto.
— Agora chega de comer. Está na hora de escovar os dentes e ir para a cama.
— Vou colocá-los para dormir como forma de agradecimento pela surpresa. — Lauren se ofereceu, aproximando-se das crianças.
Demetria apenas assentiu, beijando a testa de cada um antes de vê-los partir com a governanta.
Ficando sozinha, aproveitou para guardar os doces e limpar a cozinha. Seu corpo pedia descanso, mas o turbilhão de pensamentos a impedia de dormir.
Foi então que um som repentino a fez sobressaltar.
— Podemos conversar?
A voz de Lauren ecoou pelo ambiente, fazendo Demetria se virar bruscamente, apoiando-se no balcão para recuperar o fôlego.
A governanta esperou pela resposta e, após longos segundos de hesitação, a tutora assentiu.
Sem dizer mais nada, Lauren a guiou até a sala de entrada. O espaço estava iluminado apenas pela luz pálida da lua, que atravessava a enorme janela. Pela primeira vez, ambas puderam realmente enxergar as estrelas brilhando no céu.
O silêncio se prolongou até que Lauren respirou fundo e falou:
— Quero agradecer pelo bolo.
A voz saiu baixa, quase tímida.
Demetria apenas assentiu, esperando por mais.
— E... quero pedir desculpas por tê-la tratado daquela forma.
A tutora pressionou os lábios, mantendo-se em silêncio. Não bastava. Ela esperava mais. Precisava de mais.
— Eu entendo que esteja chateada...
Demetria ergueu o olhar, finalmente rompendo o silêncio:
— Era isso? Ou eu vou saber o motivo?
Lauren desviou os olhos, hesitante. Seu corpo enrijeceu, e, de repente, as palavras pareceram lhe escapar. Sua boca se abriu e fechou tantas vezes que perdeu a conta.
Demetria suspirou, arrependendo-se de ter perguntado.
Ela estava confusa.
Não sabia o porquê de tudo aquilo.
Não entendia por que fazia tanta questão de Lauren.
E, mais do que tudo, não entendia por que gostava dela tanto assim — tão de repente.
Frustrada, girou nos calcanhares para ir embora.
Mas Lauren segurou seu pulso antes que ela partisse.
— Se não sabe o que dizer, ao menos me deixe sair daqui. — Demetria sussurrou, sem forças para lutar. — Acho que tem razão, talvez seja melhor nos afastarmos.
Lauren tentou responder.
— Demi, eu... eu...
A tutora fechou os olhos por um instante. Sua mente estava caótica, seu coração pesava no peito.
Não sabia o que fazer.
Não sabia o que sentir.
As mãos da governanta ainda a seguravam, quentes contra sua pele, e, por algum motivo, aquilo a impedia de partir. Nenhuma palavra foi dita. Apenas se encararam, presas em um turbilhão de sentimentos não ditos.
Demetria, então, perdeu-se nos olhos verdes diante dela.
Sentiu o calor subir por seu corpo.
Foi tudo muito rápido.
Ao invés de se afastar, aproximou-se ainda mais. Seus rostos ficaram tão próximos que suas respirações se misturaram, ofegantes.
Lauren tentou se desvencilhar, mas antes que pudesse reagir, sentiu os lábios de Demi tocarem os seus.
O beijo foi urgente.
Demetria puxou-a para mais perto, seus dedos pressionando levemente sua cintura. Lauren, sem muita resistência, cedeu.
Seus lábios se moldaram um ao outro, suas línguas se encontraram em um embate desordenado e faminto. A intensidade do momento as consumiu por completo.
E ali, naquele beijo, ambas souberam.
Aquele era o lugar onde sempre deveriam estar.
Quando finalmente se afastaram para recuperar o fôlego, seus corpos permaneceram colados. O calor uma da outra ainda pulsava entre os espaços inexistentes.
Lauren sentiu o perfume dos cabelos de Demetria invadir seus sentidos.
Seu coração, pela primeira vez em muito tempo, encontrou paz.
Mas então...
Ela viu.
E o mundo desabou novamente.
Os olhos verdes se arregalaram, o medo retornando em uma onda avassaladora.
Lauren se afastou do abraço de repente, seu corpo tremendo.
Demetria a encarou, confusa.
— Lauren...?
Mas a governanta não conseguia ouvir mais nada.
Porque, do outro lado do cômodo, alguém as observava.
E aqueles olhos vazios...
Eram os mesmos que a encontraram na floresta naquela noite.
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