❁° 05 ❁°





Cibele não aguentava mais.

Ela simplesmente não conseguia mais ficar naquela casa.

Quantos anos se passaram dês da morte da mãe dela? Décadas? Séculos?

Cibele não sabia com certeza.

A cada dia que ela passava presa naquele lugar, o lugar que deveria ser sua casa, seu porto seguro, ela ficava mais confusa em relação ao tempo.

Lucien ajudava, estar com ele ajudava.

Afinal, ele era a única coisa boa na vida de prisioneira que ela estava vivendo.

Porém, nos últimos tempos, ele precisava ficar em sua própria Corte, as punições e demandas do pai dele, Beron, ficando mais severas a cada dia que se passava.

Cibele olhou para a floresta, pela janela do quarto, que parecia chamar o nome dela.

Há quanto tempo ela não sentia a natureza de perto? A terra sob seus pés e o vento em seu cabelo?

Há quanto tempo ela estava presa naquela casa?

Ela se sentia tão fraca, frágil como quando era criança, quando ela estava doente.

Antes daquela barganha.

A barganha que mudou tudo.

Ela queria sair. Queria sentir a natureza. Queria nadar nos lagos, sentir as criaturas vivas em sua volta.

"ㅡ É para sua proteção. É perigoso do lado de fora. Nossos inimigos poderiam usar você. Você poderia perder o controle, poderia machucar alguém."

"ㅡ É para sua proteção, irmã. Tudo que faço é pra te proteger, como eu prometi para a mãe que faria."

A voz de Tamlin voltava para ela clara como o dia, sempre que ela pensava em sair.

Era para a proteção dela.

Para proteção.

Tamlin era sua família, ele queria apenas o bem dela.

Mas, por que a proteção dele a machucava tanto?

Cibele sabia que Tamlin a amava, no entanto, nos últimos anos, o amor dele a estava sufocando.

Ela não era mais uma criança frágil, doente, e a prisão de sua própria casa estava quebrando seu espírito.

Estava quebrando o espírito dela.

Ela se sentia como uma flor murcha, incapaz de desabrochar sob a sombra opressiva de Tamlin.

Ela não podia continuar assim. Simplesmente não podia.

Porque se ela continuasse com isso, não haveria nenhuma Cibele para suportar àquela provação por mais algumas décadas, ou séculos.

Se ela continuasse ali, ela definharia até a morte, presa naquela casa.

Cibele tomou sua decisão naquele momento, como ela havia feito tanto tempo antes, quando ela era criança e decidiu deixar a mansão, após ouvir a discussão entre os pais.

Ela sabia que precisava encontrar uma maneira de escapar, de recuperar sua liberdade.

Mesmo que isso significasse enfrentar seu próprio irmão. Sua única família. A pessoa que ela mais amava naquele mundo distorcido que vivia.

Tamlin.

Seu irmão mais velho, seu herói quando ela era criança e até mesmo depois.

Aquele que ela amava com tudo de si, mas que agora parecia tão diferente do irmão que costumava a amar de volta.

A sensação de estar encurralada, de ter sua liberdade roubada, a corroía por dentro.

Ela estava presa em uma gaiola dourada, e mesmo que o ouro reluzisse, ainda era uma prisão.

Cibele ainda estava presa.

E ela costumava ter um espírito livre, um espírito que se apagava a cada dia.

Cibele ansiava pela sensação do vento selvagem em seu rosto, pela liberdade de ser quem ela era, sem restrições, sem medo de machucar alguém.

Enquanto Cibele contemplava esses pensamentos sombrios, uma ideia começou a se formar em sua mente.

Uma ideia ousada e perigosa, mas ela estava disposta a arriscar tudo pela chance de liberdade.

Ela sabia que não poderia mais viver assim, aprisionada em seu próprio lar.

Cibele começou a fazer planos secretos, a traçar um caminho para sua fuga.

E, enquanto a noite caía sobre a mansão, Cibele fechou os olhos com determinação, jurando a si mesma que ela escaparia, não importava o que acontecesse.

Ela estava disposta a enfrentar as consequências, mesmo que isso significasse deixar para trás tudo o que ela já conheceu.

A liberdade era a sua única esperança  naquele momento.

Lucien havia se apaixonado por Cibele no instante que a viu com aquele vestido rosa cheio de babados e uma fita dourada no cabelo. Tentando ser educada o suficiente para negar o pedido de dança de Eris (que havia sido obrigado a convidar a mais jovem para dançar).

Entretanto, ele só percebeu isso muitos anos depois.

Cibele era a melhor amiga dele, era àquela que sempre esteve lá por ele.

No entanto, Lucien não sentia que estava lá por ela, como ela esteve por ele.

E ele pensou nisso naquele instante, enquanto via Tamlin caminhar de um lado para o outro. Preocupado.

ㅡ O que você quer dizer com "ela se foi há semanas"?

Tamlin o encarou, parecendo cansado e sem dormir há dias.

ㅡ Ela foi embora. Deixou um bilhete dizendo que iria viver na natureza.
ㅡ o amigo de Lucien respondeu.

Lucien estava surpreso. Surpreso que Cibele havia ido embora sem o dizer.

ㅡ Eu não entendo. Eu dei tudo para ela. Fiz de tudo. ㅡ Tamlin murmurou, as mãos na cabeça, como se o pânico estivesse o dominando.

Lucien queria zombar.

A deu tudo, exceto o que ela mais precisava, liberdade.

Parte de Lucien queria gritar com Tamlin.

Tamlin havia feito isso. Ele criou essa situação.

Ele viu àquela criatura selvagem e de espírito livre, a irmã que almejava estar na natureza e a prendeu. A trancafiou naquela mansão, com livros, vestidos e música.

Música.

Que agora ela odiava.

Ele até a deu um piano novo. Um que ela nunca tocou.

Tamlin, alheio, e com tanta raiva em seu ser, tanto rancor para com a vida, não viu nada disso.

Não viu a irmãzinha dele definhando. Dia após dia.

A verdade era que Cibele era apenas uma casca vazia do que ela já havia sido antes.

ㅡ Você mandou alguém atrás dela?
ㅡ Lucien se pegou perguntando.

Tamlin suspirou.

ㅡ Eu mesmo fui a procurar, mas não a encontrei. ㅡ outro suspiro. ㅡ E não posso mandar meus homens. Não sei em que forma ela está. E não quero que isso se espalhe. Que digam que...

Ele não terminou a frase. Mas ele não precisava. Lucien sabia bem o que ele teria dito.

Tamlin não queria que os súditos pensassem que ele não podia controlar nem mesmo a irmã mais nova.

Por que ele deveria? Lucien se perguntava. Por que ele deveria ter de controlar ela?

Cibele sempre foi livre. Uma sonhadora de espírito livre, presa no corpo de uma lady.

ㅡ O que faremos, Tamlin?

Tamlin suspirou.

ㅡ Vá atrás dela, por favor. Traga ela de volta para casa, onde ela estará segura. ㅡ Tamlin pediu.

ㅡ Por que eu?

ㅡ Porque você sabe a verdade, e porque ela nunca negou nada à você.

Lucien quase zombou do Grão Senhor em sua frente. Do que ele estava o pedindo.

ㅡ Tamlin-

ㅡ Ela é perigosa, Lucien. Para si mesma e para outros. Você sabe disso. Sabe que tudo que eu já fiz e faço é pela segurança dela. Ela não entende isso. ㅡ Tamlin se aproximou do amigo, ele parecia tão desesperado, que Lucien estava inclinado a fazer o que foi pedido. ㅡ Se eu a encontrasse, ela se negaria a vir comigo.

ㅡ Tamlin, ela me odiaria se eu a trouxesse à força.

ㅡ Lucien, eu estou pedindo isso como um irmão que se preocupa. Preciso saber que ela está segura. Preciso a proteger. Ela é minha única família, Lucien. Fiz uma promessa à minha mãe de que iria a proteger.

Lucien pensou na falecida mãe de Tamlin, e da promessa que ela arrancou de Tamlin quando Cibele nasceu, uma promessa que as vezes cegava Tamlin, o Vanserra suspirou.

Então ele aceitou.

Ele a encontraria.

É quando ele o fizesse, ele a traria de volta para casa.

De uma forma ou de outra.

Cibele finalmente se sentia mais como ela mesma.

Naquela forma, selvagem e primitiva.

Onde ela sentia o vento enquanto corria, sentia a floresta viva em sua volta. Ela ouvia os animais. Ouvia o retumbar da magia em seu peito. A magia da Corte dela. A magia que inundava suas veias.

A magia dela.

A mansão nunca pareceu um lar. Mas a Corte Primaveril, aquelas terras lindas e mágicas, sempre foram um lar para Cibele.

Aquela floresta, aquelas terras a amavam. A aceitavam como ela era. E quando ela era criança, frágil e doente, aquela floresta a guiou para sua salvação.

Mesmo que Velaris tenha tocado o coração de Cibele, aquelas belas florestas tocavam a alma dela. Eram seu verdadeiro lar.

Com o coração cheio de uma alegria que ela não sentia a muito tempo, Cibele mudou para a forma fae novamente.

Conjurando um vestido simples com sua magia.

Seus pés estavam descalços, seu cabelo bagunçado, mas Cibele se sentia mais viva do que nunca.

Ela estava fora há três meses, por todo o verão. E se sentia em paz pela primeira vez dês de que a mãe dela morreu.

Tudo logo desabaria outra vez.

Lucien a encontrou.

Claro que ele o fez.

A magia dela nunca o repeliu.

Muito pelo contrário, havia algo na magia dela que cantava para a magia dele.

Algo que unia as magias de ambos, algo que ele não entendia, mas que já ouvira sussurros de algo assim, um tipo de magia que era unia dois indivíduos, algo que perdeu o nome.

Algo que não existia em Prythian há muito tempo.

Ela parecia tão linda, sentada com os pés em um lago, os olhos fechados enquanto cantarolava.

As próprias árvores pareciam se curvar para escutar e apreciar a melodia dela. Para sentir ela. A magia que ela emanava. Como se ela trouxesse vida.

Lucien nunca viu alguém com uma conexão tão grande com as terras daquela Corte, nem mesmo Tamlin, que era o Grão Senhor daquelas terras.

O Vanserra a observou por algum tempo, ela sabia que ele estava alí, a floresta a teria avisado, ainda assim, ela continuou desfrutando daquela paz.

Lucien se sentia perturbado com o que iria fazer. Se sentia perturbado em ter que a levar para casa.

Aquela fêmea maravilhosa, que ele amava tanto.

Cibele se levantou então, abrindo os olhos para o encarar. Seus olhos estavam vivos, o verde vívido como há muito tempo ele não via.

ㅡ Lucien, você me encontrou. ㅡ ela sorriu para ele.

ㅡ Eu sempre encontro você, Bele.

Ela se aproximou dele, a magia dela cantando para a magia dele.

Magias compatíveis de uma forma que ele não compreendia.

O vestido verde que ela usava era simples, ela estava descalça e havia algumas flores e folhas nos cabelos loiros dela. Uma verdadeira filha da primavera.

Ele encarou Cibele, sabendo que debaixo daquele vestido, em sua costela esquerda havia uma tatuagem, de uma barganha que ela nunca o contou o que era.

Ou com quem ela havia feito tal barganha.

Ela nunca o contou, mesmo naqueles momentos, quando eles se deitavam juntos na cama daquele chalé de caça, nus e felizes.

Quando Tamlin permitia que ela se fosse por dois ou mais dias.

Há muito, muito tempo, ele havia revogado essa permissão, depois de Cibele usar seus poderes para curar alguns aldeões no caminho de volta.

Para Tamlin, era perigoso que outros soubessem os poderes que a lady da Corte Primaveril escondia.

ㅡ Tamlin me mandou a trazer de volta para casa. ㅡ Lucien disse de uma vez, não querendo protelar, não querendo que ela pensasse que ele estava alí para ficar, para apoiar essa ideia dela.

O sorriso de Cibele se foi.

Seus olhos se encheram de um pavor que quase sufocou Lucien.

Cibele olhava para Lucien com uma mistura de surpresa, medo e raiva.

Ela não esperava que seu irmão tomasse medidas tão extremas para trazê-la de volta.

Sua mente começou a trabalhar rapidamente, pesando as opções e consequências de suas próximas ações.

Cibele sentiu como se o mundo ao seu redor estivesse desmoronando.

A notícia de que Tamlin havia enviado Lucien para trazê-la de volta, era como uma punhalada em seu coração.

Aqueles olhos verdes que costumavam brilhar de alegria, agora estavam cheios de tristeza e medo.

ㅡ Ele mandou você. ㅡ murmurou Cibele para si mesma, mais como uma confissão do que uma afirmação.

Tamlin havia mandado Lucien. Lucien, que era capaz de convencer Cibele de fazer qualquer coisa.

Lucien se aproximou dela com uma expressão de compaixão. Ele entendia a luta que ela estava enfrentando.

ㅡ Cibele, seu irmão está preocupado com você. Ele só quer que você esteja segura. ㅡ ele tentou explicar.

Cibele olhou nos olhos de Lucien, e por um momento, o amor e a amizade que compartilhavam pareceram tão distantes.

Ela se sentia traída, como se a única pessoa em quem confiava, agora também estivesse contra ela.

ㅡ Ele não entende. ㅡ sussurrou Cibele, a voz quebrada. ㅡ Ele não entende que pra mim, estar presa naquela casa, é como estar sufocando.

Ela olhou para Lucien, suas mãos agarrando a camisa dele, quase em desespero.

ㅡ Eu não posso mais suportar isso, Lucien. Eu não posso voltar.

Lucien balançou a cabeça, seus cabelos vermelhos refletindo a luz. Ele pegou suavemente as mãos dela.

ㅡ Eu entendo, Bele. Eu entendo mais do que você imagina. Mas você sabe que não posso deixar você aqui sozinha. Se Tamlin me enviou para trazê-la de volta, é porque ele está preocupado com você. Vou convencer ele a deixar você sair mais. Mas você terá que voltar. ㅡ Lucien disse. ㅡ É perigoso. Você sabe que é. E se você não voltar comigo, ele começará a enviar os soldados. Quer mesmo que a Corte descubra seu segredo?

Cibele fechou os olhos e suspirou profundamente.

Ela queria gritar, queria correr de volta para a floresta e nunca mais olhar para trás.

ㅡ Não posso voltar, Lucien. ㅡ ela murmurou, as lágrimas vieram agora.

Cibele estava chorando. E o coração de Lucien estava se partindo ao ver isso. Ao saber que ele fazia parte disso.

Ele a segurou com força, não o suficiente para a machucar, apenas para a manter alí, para que ela não fugisse.

ㅡ Cibele-

ㅡ Não vou voltar. ㅡ ela negou com a cabeça, tentando se soltar do aperto dele. ㅡ Nunca mais falarei com você se me levar de volta.

Lucien a olhou com o coração doendo.

ㅡ Bele, minha lobinha-

ㅡ Vou mudar de forma e arrancar sua garganta com as presas se você me levar de volta. ㅡ apesar de seus olhos terem mudado e suas presas se alongado, Lucien sabia bem que era uma ameaça vazia.

Cibele nunca o machucaria. Em nenhuma forma.

ㅡ Cibele-

ㅡ Vou me recusar a comer. Vou morrer de fome se você me levar de volta. ㅡ ela murmurou, as lágrimas escorrendo livremente por sua delicada face.

ㅡ Cibele, querida.

ㅡ Não me leve de volta. ㅡ ela pediu em meio aos soluços.

Lucien a encarou, seu coração doía como nunca quando ele proferiu a frase final:

ㅡ Por favor, Bele. Volte comigo. Por favor. ㅡ ele a abraçou. ㅡ Por favor. Por mim.

Cibele parou de lutar.

Havia um motivo para Tamlin ter enviado Lucien.

E esse era o motivo.

Lucien era o único que poderia a levar de volta para aquela prisão, com um simples por favor proferido.

E ele fez exatamente isso.

I. Oie pessoas. O que acharam do capítulo? Gostaram?

II. O Lucien levar ela de volta foi o começo do fim para o relacionamento deles. Infelizmente.

III. Próximo capítulo já teremos o primeiro vislumbre de Sob a Montanha, porque terá o famoso baile onde a Amarantha rouba os poderes dos Grã Senhores. E não, vocês não estão preparados para isso.

IV. Por hoje é só, mas nós nos vemos em breve.
Byee♡.

24.09.2023
Duda.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top