O reencontro com a Safira

"Nunca pensei que um dia, iria considerar um animal tanto ao ponto de sentir um afeto tão grande que nunca senti antes". — Isabelle González

Duas horas se passaram...

Acabei sendo acordada, quando senti alguém dar leves tapas em meu rosto e por impulso, acabei segurando a mão de quem estava fazendo isso:

— O que você está fazendo, Isaac? Por que me acordou? Estava tirando uma ótima soneca aqui que nem você estava, enquanto me matava para acertar cinco vezes naquela árvore... — Resmunguei e bufei um pouco mal-humorada.

— Eu não estavas dormindo e sim, estavas pensando com os olhos fechados, oras. — Se justificou, um pouco sem graça.

— Esta desculpa nem o mais bobo consegue acreditar. Você estava dormindo e ponto final, não é vergonhoso admitir isso. — Falei no tanto emburrada, mas acabei rindo da forma que ele me olhava, como se sentisse ofendido.

Ver ele deste jeito, fez que todo o meu mau-humor se evaporasse rapidamente. Parece que ele consegue mudar o meu humor com muita facilidade que chega a ser impressionante, acho que ele me faz bem de uma certa forma.

E quando pensei que ele não iria tentar me retrucar, o nobre bufou, olhou para os cantos e voltou a olhar para mim:

— Não posso fazer nada, se não acreditas no que estou dizendo-lhe. Mas não temos tempo para discutir sobre assuntos tão triviais e sem sentido como este, precisamos ir ao vilarejo. Porque pelo visto, a minha aprendiz, não sei se posso chamar-lhe assim, conseguiu vencer o desafio que tinha lhe feito mais cedo. Meus parabéns e espero que os próximos, consigas fazer o mesmo feito ou até melhor. — Resmungou, mas finalizou com um leve sorriso nos lábios demonstrando o quão orgulhoso estava por mim.

— Finalmente, os humilhados serão exaltados. — Comemorei com alguns pulinhos.

— Tu és muito estranha, Isabelle. Mas, por favor não exageres tanto no que quiseres comprar. — Pediu, mas sem expressar muita emoção, porém, dava para perceber em teu olhar que estava levemente desesperado.

— Ah, isso não posso te prometer. Sinto muito, Isaac, tu irá ver várias moedas de ouro indo embora de seu bolso. — Brinquei e comecei a rir muito, assim que ele acabou colocando as tuas mãos sobre o rosto e soltou um longo suspiro de arrependimento.

— Isso és sério? Então, acho melhor voltarmos para o castelo e dizer para a Lady Vivian, que o passeio ao vilarejo teve que ser adiado já que tu estavas reclamando de muita dor de barriga e... — Falou, enquanto tentava montar um plano no tanto sem sentido.

— Para de ser uma criança, Isaac. Mas é claro que não farei isso contigo, no máximo só irei querer comprar as comidas típicas de lá e talvez, um presentinho para o Mago Elliott. — Expliquei e revirei os olhos rapidamente.

— Eu sabia. — Disse, um pouco envergonhado.

— Demonstrou perfeitamente que sabia que era tudo uma brincadeira mesmo. Até parece, você só faltou cair duro na minha frente. Acho que não é muito fã neste negócio de gastar, né? — Comentei, enquanto o encarava e o mesmo, não conseguia olhar para mim por conta da vergonha que estava sentindo.

— Não és isso, só me assustei com a forma que falou. E estou acostumado a não gastar muito, acabei aprendendo isso durante estes tempos que viajei sozinho. — Respondeu com uma justificativa que não sei se posso acreditar ou não.

— Não sei se posso acreditar nisso, mas agora relaxe. Porque você é muito jovem para ficar tão nervoso assim e se continuar desse jeito, não irá chegar à velhice. — O avisei e soltei uma leve risada.

— Você tens razão quanto a isso. Enfim, vamos até ao estábulo para pegar os cavalos que o senhor Christian tinha nos dado antes de chegarmos ao castelo de minha família. — Solicitou e antes que pudesse dizer alguma coisa, ele começou a andar passos largos na minha frente.

— Tudo bem, mas não acha que está esquecendo de alguma coisa? — O perguntei, enquanto apontava com o dedo indicador da mão direita para as flechas que estavam presas na árvore.

— Obrigado por lembrar-me disso, juro que se fosse por mim, eles permaneceriam lá para sempre. Minha memória és muito péssima e já levei muita bronca de meus pais por conta disso, quando era apenas um menino franzino. — Respondeu e soltou uma risada logo em seguida, depois andou até parar em frente a mim.

— Estou vendo e tenho medo de que a tua memória possa um dia nos meter em uma confusão e dos grandes. E falando em teus pais, nunca te vi falando sobre o teu pai. Por que? — O indaguei e no mesmo instante, a tua expressão alegre se deu lugar a uma séria e um pouco distante.

— Não gosto de tocar neste assunto, és muito pessoal para mim. Por favor, não perguntes nada que se referes ao meu falecido pai. — Pediu, sem ao menos olhar para mim.

— Me desculpe... Então, vamos pegar as flechas e os arcos para poder guardá-los de onde os encontramos? — O perguntei já mudando de assunto e me sentindo um monstro por ter tocado em um assunto que para todos de ambas as famílias, ainda e sempre será, muito delicada para eles.

Ele apenas assentiu e se direcionou de onde se encontravam as flechas, enquanto eu estava pegando os arcos que estavam jogados no chão próximos a mim. Os guardei naquele buraco que ainda acho que já foi toca de algum animalzinho desta floresta e depois disso, vi o nobre os guardar debaixo de um arbusto que tinha aquelas frutinhas que os tinha comido antes da aula começar de fato.

Depois disso, ele caminhou em direção de onde provavelmente deve ficar os estábulos no qual a minha Safira deve está junto com o cavalo preto de Isaac. Durante o percurso, não trocamos nenhuma palavra e a cada passo, o sentia mais disperso em seus pensamentos e parecia que não queria ficar próximo de mim até chegarmos ao nosso destino final, o local onde os animais estavam nos esperando.

E isso estava me matando, a culpa que nem sabia que estava sentindo direito, estava me consumindo. E conhecendo como eu me conheço, sei que não irei conseguir fazer mais nada até ele aceitar as minhas desculpas verdadeiramente.

Quando chegarmos ao local que serve de moradia dos equinos, irei pedi-lo desculpas, nem que seja de joelhos. Ok, acho que exagerei um pouco ou talvez muito...

Mas não irei a lugar algum até ele aceitar o meu perdão e como sou teimosa ao ponto de chegar a ser muito irritante, sei que não irei desistir por mais que ele brigue comigo. Às vezes me pergunto, como que ainda não apanhei por causa disso, porque sinceramente, sinto que se eu fosse uma outra pessoa, iria querer arrancar o meu couro fora.

Alguns minutos se passaram...

Não demorou tanto para chegar ao estábulo como estava pensando, apesar que este clima super desagradável entre nós, estava sendo super torturante para mim. E espero conseguir reverter isso, antes de sairmos para ir nesse vilarejo que ele mencionou algumas vezes.

O local ficava no máximo uns 2 KM do castelo e era praticamente ao lado de várias pequenas casas nos quais, acho que os guardas reais moram. Era enorme o suficiente para comportar pelo menos, dez ou quinze cavalos tranquilamente. É feito de madeira reforçada e pintada de uma tinta preta ou um marrom muito escuro, não consegui o definir muito bem.

O chão próximo da entrada, estava recheado de capim e fezes dos animais em todos os cantos que se possam imaginar. Acho que se alguém limpasse aqui, seria ótimo e mais fácil de andar sem ter o risco de pisar nestas nojeiras. E nem precisou se aproximar muito do local, para poder ouvir os sons que saíam das bocas dos equinos.

Não precisava ser uma especialista para saber que alguns estavam agitados, como se estivessem loucos para alcançar uma liberdade que fora roubada assim que os capturaram de seu habitat natural. E isso me fez ter quase a certeza que nem todos aqueles animais nasceram no estábulo.

Mas enfim, o foco é outro agora. Primeiro, preciso conseguir o perdão deste nobre que não é nenhum pouco normal e por último, rever a minha menina, Safira. Aposto que ela deve estar linda e forte, se não estiver, eu juro que mato a pessoa que é responsável em cuidar destes animais.

E quando finalmente, consegui focar a minha mente no nobre que era mais alto do que eu, o vejo se aproximando de um homem que tinha idade para ser avô de nós dois. Eles pareciam se conhecerem bem, já que estavam conversando e o mais velho ria em quase todas as palavras que saíam da boca do Isaac.

Este senhor era calvo e os poucos cabelos que tinham eram grisalhos, ficavam na altura próxima da nuca e subiam até um pouco na altura de suas orelhas. O idoso tinha uma verruga monstruosa no canto direito de sua sobrancelha que tenho quase certeza que nunca passou pela pinça na vida.

Fiquei apenas os observando, pois, não tive muita coragem de me aproximar e com isso, acabar atrapalhando a conversa deles. Então, decidi entrar no estábulo sozinha e espero encontrar a minha menina antes que o nobre perceba a minha ausência, apesar de que tenho quase certeza que não se lembrará tão facilmente de mim já que estava ocupado em conversar com aquele senhor.

Então, comecei a andar até me encontrar dentro do local que tinha um odor nada agradável. Confesso que em alguns momentos, tive que segurar a respiração por alguns segundos, senão, com certeza iria passar mal. Os animais que eu achava que estavam agitados, ainda permaneciam assim e parecia que tinham ficado mais, após perceberem a minha presença.

E isso, estava começando a me assustar ao ponto que me virei para poder sair correndo para a saída do estábulo. Até que ouvi um barulho sutil como se alguém estivesse me chamando, sei que isso é loucura, porém, foi o que meu coração tinha me dito.

Então, me direcionei de onde estava vindo e acabei encontrando o ser que tanto queria rever. Ela estava toda tímida no canto de seu "quarto", não sei como que posso chamar esta parte aqui. Safira parecia que estava muito assustada com todo este alvoroço que os outros animais estavam fazendo e algo me dizia que não gostava daqui.

Acho que ela sente saudade de sua antiga casa e principalmente da liberdade que provavelmente, o senhor Christian a proporcionava de uma certa forma. Sei que posso estar delirando com estas teorias, mas é o que o meu sexto sentido diz.

Sem pensar, acabei abrindo a pequena porta que nos separava e caminhei em direção da égua que estava de costas para mim. Mas antes, peguei um punhado de feno e fiquei do lado direito do animal, fiz carinho nela mesmo achando que não iria me reconhecer já que passamos apenas um dia juntas.

Levei cerca de alguns minutos até que a vi se virando na minha direção e começou a cheirar o feno que eu segurava, depois mordiscou até o comê-lo por inteiro. E logo após isso, começou a cheirar o meu cabelo e confesso que fez um pouco de cócegas.

Aproveitei o momento para fazer carinho no topo de sua cabeça e ela não recuou em nenhum momento. Dei alguns passos para trás e aos poucos, ela começou a andar em minha direção e foi assim até nos depararmos com o lado de fora do estábulo.

E paramos assim que ouvimos algumas vozes masculinas, sendo que uma a conheço muito bem e parece que não estava nada feliz:

— O que pensas que estás fazendo, Isabelle? Não devias ter entrado e tirado esta égua sozinha, tu sabes o quão perigoso és entrar em um estábulo com alguns cavalos que ainda não foram domados? E se eles tivessem conseguido escapar e ter te machucado? — Vociferou, Isaac, que estava andando de um lado para o outro, enquanto o homem mais velho apenas nos observava calado.

— Mas isso não aconteceu. Como pode ver, estou bem e não tenho nenhum arranhão. Calma, eu só queria ver a minha Safira que estava muito assustada quando a encontrei lá dentro. — O respondi e logo em seguida, acariciei o pescoço da égua.

— Você não tem noção do perigo que passou... Ela estás assim por não ter se acostumado ainda com o novo lugar, isso és normal. — Comentou e coçou a barba mal feita como uma forma de se acalmar um pouco.

— Como que sabe disso? Eu não teria tanta certeza nisso, algo me diz que ela não gosta deste local e não está nenhum pouco feliz em ficar num lugar tão barulhento que nem este estábulo. — O expliquei totalmente séria.

— Bom, acho que ela se sentirás bem com o nosso passeio de hoje. Talvez, tenha sentido falta de cavalgar livremente mesmo. E antes que me esqueças, quero apresentar-lhe a primeira pessoa que se tornou o meu amigo de verdade e de confiança, o senhor Patrick Davies. — Falou algo que pela primeira vez, tenho que concordar e depois apresentou o idoso a mim.

— Espero que esteja certo nisso mesmo. Oi, senhor e eu me chamo, Isabelle González. Prazer em conhecê-lo, uma pergunta... Como que o senhor conseguiu aturá-lo por tanto tempo assim? — O cumprimentei com um aceno e lancei uma pergunta no tanto ousada.

O mais velho apenas ficou parado como se não soubesse no que me responder, como se estivesse totalmente constrangido pela minha pergunta. Ele que era super pálido, ficou vermelho que nem pimentão e alguns segundos depois, ele começou a gaguejar:

— Bo-bom, acho que irei buscar o ca-cavalo do Lorde Isaac. Por favor dê-me licença e ju-juro que não irei demorar muito. — Avisou através de muita gagueira e depois se direcionou para a entrada do estábulo.

E enquanto o senhor não retornava com o animal que ainda não tinha sido batizado com algum nome pelo nobre a minha frente. Ficamos nos encarando por longos minutos, até que acabei me cansando e fiquei acariciando a égua que estava comendo as pequenas gramas que cresciam por ali.

E no meu íntimo, dizia para aproveitar o momento para pedi-lo desculpas pela pergunta que tinha feito lá na floresta. Mas estava com medo de acabar piorando mais ainda a situação, porém, tinha que resolver isso o quanto antes.

A não ser que eu queira me sentir culpada para todo o sempre. Então, irei perguntá-lo e torcer para que ele não fique mais bravo ainda:

— Isaac, será que posso te pedir uma coisa? Juro que não tomarei tanto tempo desta vez. — O perguntei, um pouco insegura.

— Podes. — Respondeu, simplesmente.

— Poderia me perdoar pela pergunta que tinha lhe feito antes de chegarmos aqui? — Fiz o pedido, mas já temendo pela resposta negativa dele.

— Estás perdoada. E já estavas me esquecendo disso, só estou bravo pela imprudência que cometeu agora a pouco. Mas por outro lado, acho que teria feito a mesma coisa se tivesse no teu lugar. — Comentou, enquanto passava a mão esquerda na nuca.

— Será? Acho que teria feito algo mais imprudente do que eu, isso sim. — O provoquei sutilmente.

— Isabelle, não abuses da minha bondade. Não sou tão bobo como pensas e não, eu teria sido mais cauteloso possível e... — Dizia, mas não terminou a fala por conta que avistou o senhor Patrick trazendo o cavalo preto com o auxílio da rédea.

O mais alto foi até lá e agradeceu o velho amigo que o entregou todos os equipamentos para usar na montaria da minha égua, Safira. Já que o outro se encontrava arrumado e como sempre, o macho exalava toda a sua exuberância e beleza.

Alguns instantes depois...

E não demorou muito até que já estivéssemos na estrada a caminho do vilarejo. Durante o trajeto, acabei descobrindo o nome que o Isaac escolheu para colocar em seu cavalo, ele se chama "Escuridão". Até que achei um nome bastante original, melhor do que qualquer outro que eu pudesse pensar que o combinaria.

E quando estava com os pensamentos longe como sempre, acabei sendo despertada quando senti uma nuvem de terra sobrevoar na minha frente. E acabei percebendo que estava sozinha com a minha égua, já que o Isaac estava há alguns metros de distância de mim e tinha feito o animal correr super rápido.

Acabei tossindo até não poder mais e o meu rosto ficou totalmente sujo por conta desta nuvem, fiquei sem reação por conta deste ato tão repentino dele. Mas acho que isso foi uma forma de dizer que estava apostando uma corrida comigo, o meu lado competitivo foi ativado e ele irá se arrepender disso.

Bati as rédeas com uma certa delicadeza e a Safira começou a galopar o mais rápido que podia. Tenho quase certeza que agora ela se sentiu tão viva como eu estou me sentindo neste exato momento. Estava adorando sentir o vento bater no meu rosto e não estava ligando dos meus cabelos cobrindo o meu rosto em alguns momentos durante a corrida.

A adrenalina do corpo estava na flor da minha pele. Demorei, mas consegui alcançá-lo e quando estava prestes a comemorar por este feito, o idiota bateu as rédeas com mais força e fazendo o pobre animal correr mais rápido ainda.

Mas eu não tive a mesma coragem de fazer isso com a minha menina, porém, ela acelerou os galopes mesmo assim. Acho que ela é mais competitiva do que eu ou apenas estava adorando a sensação de liberdade depois de semanas presas naquele lugar.

E quando menos esperávamos, já estávamos quase na entrada do vilarejo que era bastante desenvolvido, mas nem tanto que nem a do Reino. Só que o achei bem mais animado e barulhento, isso me fez sentir um pouco mais a vontade de um jeito bem curioso.

Os animais cavalgavam bem devagar e podia-se ouvir as respirações ofegantes deles, acho que exageramos um pouquinho. Mas o importante é que se divertiram no mesmo tanto que nós e isso já bastava para mim.

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