Onze - A luta de classes e a vida de merda.


Duas semanas antes, se alguém perguntasse a Camila qual era a matéria que ela estava mais ansiosa para começar. Sua resposta imediatamente seria literatura.

Como não poderia ser?

Ela compartilhava aquela aula com suas melhores amigas, que a divertiam infinitamente com suas palhaçadas, sua professora favorita estava lá e Mila passaria o ano lendo alguns de seus livros favoritos e desfrutando de literatura boa e clássica.

Mas logo no primeiro dia, Lauren Jauregui tinha caído em sua vida, justamente na primeira aula de literatura como uma enorme bigorna metafórica e agora parecia tudo arruinado. Talvez a afirmação fosse um pouco super dimensional, mas o que Camila podia dizer? Ela tinha sido arrancada da sua zona de conforto, arrastada diretamente a um vórtex de caos, tesão e raiva.

E para alguém que desejava rotina, isso era uma quantidade exorbitante de estresse.

A separação dos seus pais. Ter que trabalhar para conseguir pagar matérias básicos de artes, e o desafio ainda que distante, mas iminente de concorrer para uma bolsa de estudos na faculdade de artes mais renomada do país a deixava a beira de uma crise de ansiedade. Cabello não precisava de mais nada que fizesse sua vida difícil.

Mas então ela se via no meio de uma festa trocando beijos com Lauren e dias depois dando o maior amasso dentro do banheiro, enquanto a tão adorável namorada da jogadora e sua inimiga mundo 1,  buscava a namorada do lado de fora.

Camila foi obrigada a aceitar que se manter longe de Lauren Jauregui, não dependia só da sua vontade.

Por isso, na noite de quarta-feira ainda completamente encharcada e cheirando a Lauren, Camila arrastou suas duas melhores amigas para seu quarto e contou tudo que tinha acontecido nos últimos cinco dias. Desabafar impediria que ela cometesse uma loucura.

Ponderou tudo que elas disseram e se deu conta que parte da sua raiva era por saber que Lauren não era tão mal. Sim, ela tinha um comportamento narcisista algumas vezes, e era um bocado arrogante, mas tinha tentado ajudá-la a sua maneira.

Ela só relutava acreditar nisso, porque dar margem pra que seu coração abrisse as portas, poderia causa que ela acabasse com as pernas igualmente abertas.

Na quinta pela manhã, Camila pulou da cama com um mau humor que a fez se arrumar dez vezes com menos vontade. Foi só na segunda buzinada da sua mãe lá em baixo que ela decidiu pegar suas coisas sobre a cama e descer antes que sua mãe a arrastasse pelos cabelos. Seu desejo era permanecer naquela cama até que aquele dia maldito acabasse.

Minutos mais tarde já na cantina tomando café, suas amigas chegaram, decididas a tirar sua paz.

— Uou, você fica a cara da Cersei Lannister com esse mau humor. – Camila enviou um olhar fulminante na direção de Dinah. – Esses olhos sugerindo que há uma trama maléfica nessa cabeça.

— O que você acha que elas vão fazer primeiro na aula de hoje? Trocar socos ou, – Sophie olhou para os cantos sussurrando: – Sexo selvagem.

— Que tal uma mistura das duas coisas, com direito a sacos plásticos pretos bem ao estilo Piper e Alex.

— Você é péssima amiga, amei.

— Eu estou bem aqui, idiotas! – Camila franziu o cenho, colorindo com raiva uma flecha que desenhou aleatoriamente no fundo do caderno. – Vocês podem fingir que eu nunca disse isso pra vocês?

— Não... – Negaram e Camila até teria respondido a nova provocação se seu celular não tivesse tocado.

Era Brooke. Estavam conversando bastante, e um segundo encontro já havia sido previamente marcado para o sábado. Camila estava verdadeiramente ansiosa para vê-la mais uma vez. Quando Brooke Lauren estava por perto, era mais fácil fingir que Lauren não existia.

— Aposto que foi mensagem da Lauren made in china – Disse Dinah a Sophie assim que Camila trouxe sua atenção de volta a mesa. Suas vozes foram abafadas pelo som da campainha estridente soando para o início das aulas.

Ótimo! Muito bom mesmo.

A turma já estava quase toda em sala quando Camila entrou e foi direto de cabeça baixa para o seu lugar. Esperava ter que olhar para Lauren só na hora da atividade. Quando ela entrou viu a jogadora de costas, mexendo no celular enquanto Lucy estava dependurada em seu pescoço, com mesmo sorriso arrogante de sempre.

Oh, como Camila a detestava. A ponto de não sentir nem um reflexo de culpa pelos dois beijos que tinha dado em Lauren.

— Bom dia, classe. – Mila ergue-se ao som da voz de Anabeth Thompson. Independente da raiva por suas amigas estarem fazendo piadas, ou pelo azar de ter Lauren como sua parceira, ela adorava a professora. – Bem, eu suponho que vocês leram o capítulo um do livro como eu instruí. Esse período de aula será dedicado a discussão de texto com seus parceiros, bem como a manutenção do tema chave, o que será crucial para a apresentação final que vocês vão me entregar quando terminarmos a primeira parte. – Camila suspirou e retraiu os ombros começando a escrever no seu caderno. Aplicada, ela já tinha adiantado grande parte da atividade, mas ainda precisava saber quais seriam as considerações de Lauren.

Uma sombra pairou sobre ela antes da voz rouca que Camila já conseguia identificar surgir:

— Cabello.

— Jauregui.

Houve um momento de silêncio pungente, no qual as duas meninas fizeram um esforço para não olhar uma nos olhos da outra. Lauren sentou-se graciosamente no assento de frente a Camila colocando seus itens sobre a mesa. Mila notou que ela usava um band-aid do Bob Esponja no dedo mindinho. Era fofo.

Jauregui estava tão bonita quanto qualquer dia. Usava um vestido preto estiloso com um rasgo que ia até os joelhos e botas inglesas nos pés. O cheiro dela vagou pela sala roçando o nariz de Camila como um toque macio. Era doce, mas, ao mesmo tempo, tinha algo selvagem e indomado, talvez o odor corporal da própria Lauren. Feromônio puro.

— Então, que críticas você tem hoje? – Camila começou usando a frase como uma armadilha, sua sobrancelha esquerda acompanhou o fluxo de palavras como se ela esperasse que Lauren dissesse qualquer coisa ruim sobre o livro para que ela rebatesse.

Lauren notou e sorriu sem humor, não estava aberta pra cair nas armadilhas de Cabello.

— Bem, eu tenho um pouco de dificuldade em aceitar as primeiras linhas da história. – Sua voz foi rouca e direta, sem qualquer tipo de emoção.

— É uma das linhas mais emblemáticas da literatura, – Camila disparou de volta. – Nos introduz as expectativas da sociedade da época, bem como lutas de classe.

— É heteronormativo e sexista, – Lauren respondeu tão rápido quanto Camila. – Antes de mais nada, ninguém precisa casar para ser bem-sucedido, e se as filhas do senhor Bennet não quisessem casar?

— Você faz ideia que isso não ocorre no seculo XXI, Lauren os seus ideais são diferentes dos nossos.

— Isso não quer dizer nada, estamos debatendo no século XXI.

— Eu sei, mas você precisa para pra pen-

As duas encerraram o diálogo abruptamente assim que Anabeth parou perto delas.

— Como vão as coisas, meninas?

— Fantásticas, – Mila respondeu sarcasticamente, e Lauren reagiu rolando os olhos. – estávamos discutindo sobre o casamente e a importância dele na vida dos personagens... - Ela se inclinou para frente dando ênfase a última palavra.

— Excelente, eu sabia que você iam se dar bem.

— Nossa, super bem, não poderia ser melhor. – Lauren replicou com sarcasmo e a professora deu um pequeno sorriso antes de ir até a mesa seguinte.

— Por que você tem que ser idiota o tempo todo? – Às palavras simplesmente pularam da boca de Camila antes que ela pudesse controlar.

— Eu? Eu não fiz nada.

— Ah não? - Camila cortou-a, – você fala com esse arzinho arrogante, como se fosse a fosse a dona desse lugar. – Mila teve que se segurar para não falar alto da maneira que gostaria. – Você aproveita sua facilidade para obter benefícios com Tyrone para mudar as regras, quem você pensa que é?

Lauren, neste momento, parecia que se apertasse a mandíbula com mais força, quebraria.

— Preciso te recordar que um desses benefícios te ajudaram?

— Eu não pedi pra você fazer isso, – Camila revidou, ela olha pra Lauren por um momento e depois para trás certificando-se que não tem ninguém ouvindo. – eu posso lutar minhas próprias batalhas. Está óbvio que você não gosta de mim...

— Isso é um eufemismo

— Eu obviamente, não gosto de você, – continuou ela, sabendo que ia se arrepender das próximas palavras. – mas se quisermos sair disso, nos temos que nos dar bem e manter a calma. Então, trégua?

— Você começou tudo isso, Cabello – Lembrou Lauren, com a voz começando a ficar alta novamente. – Desde o primeiro dia de aulas você dá sinais claros que minha presença te incomoda, mas acho que você está certa. Não quero passar mais tempo que o necessário perto de você. Aceito sua trégua, mas antes eu preciso lhe fazer uma pergunta...

Camila deixou que os olhos se cruzassem um segundo, esperando Lauren expor o que queria de uma vez.

— Se eu sou tão terrível por que me beijou? – Indagou Lauren.

— Tecnicamente os dois beijos foram iniciados por você. – Replicou Camila.

— Até onde eu sei eu não estava apontando uma arma na sua cabeça.

Camila sentiu o sangue ferver pela milésima vez naquela manhã.

— Por que eu quis Jauregui, tudo foi porque eu quis! – Abaixou o tom mais um vez para sibilar ameaçadoramente: – porque você, infelizmente é bonita e atraente, mas é óbvio que isso é só uma casca já que seu interior é tão danificado quanto sua inabilidade para entender esse livro idiota!

— Incrível como você não me conhece e parece ter todo um perfil traçado pelo que acha que eu sou. – Mila exalou todo ar de uma só vez reprimindo o palavrão que dançou na ponta da sua língua. – Não se preocupe, não vou mais te importunar, Camila. Temos essa tarefa pra acabar, e depois vai precisar conviver comigo só o suficiente e você pode fingir que eu não existo. Farei o mesmo.

Camila ficou alguns segundos observando Lauren puxar sua caneta tranquilamente, e começar a escrever no caderno. Algo dentro dela se remexeu perigosamente, dando indícios de culpa por ter sido tão grossa. Abriu a boca duas vezes para pedir desculpas a Lauren pelo seu comportamento, no entanto, rendeu-se. Fosse como fosse, era melhor manter distância.

A aula acabou sendo menos irritante do que Camila esperava, Lauren de fato era bastante inteligente e não lhe provocou ou rebateu nenhum dos seus argumentos. Continuou escrevendo no seu caderno, e grifando volta e meia um frase aqui e outra ali.

Foi um alívio quando a aula acabou.

— Mando a minha parte pelo e-mail coletivo da sala. – Lauren disse antes de jogar sua mochila nas costas e se virar pra sair.

— Ok. 

Antes que Mila chegasse até a saída, Anabeth pediu um segundo do seu tempo, e Lauren parada ao seu lado, indicou que o papo ia ser com as duas. Mila se posicionou no oposto de Lauren esperando a mulher dizer de um vez o que queria.

— Meninas, eu juro que vou ser bem breve. – Começou sentando na sua cadeira. - Não sei vocês sabem, mas a escola cortou alguns gastos, e um dos projetos que ela atendia foi altamente prejudicado. – Camila não pode evitar olhar pra Lauren como se ela fosse culpada por mais esse corte de gastos. – Deixando algumas pessoas que realmente precisavam desamparados.

— Onde a você está tentando chegar? – Lauren questionou sem controlar sua curiosidade.

— Bem, existe uma creche para crianças na parte mais pobre de Santa Clarita, eu gostaria que vocês fossem lá juntas como voluntarias.

— Senhorita Thompson eu adoraria mas tenho treinos todos os dias, acredito que isso não será possível.

— Eu entendo que o professor Rodgers deseja sua participação em todos os treinos, Lauren, mas uma tarde não prejudicará seu desempenho, é algo pequeno, mas importante.

— Talvez eu possa fazer.  – Disse Lauren.

— E você, Camila?

— Eu posso ir também. – Deu de ombros como se não fosse nada. Ademas, o que seria uma tarde perto de todas as aulas que ainda estavam por vim.

— Espero que sim, eu vou contar essa participação como trabalho extra classe, – Ela curvou-se sobre a mesa e anotou algo rapidamente. – O endereço, sugiro que façam essa visita na segunda-feira a tarde. Juntas. É algo que vai ajudar muito vocês duas, espero que seja uma lição valiosa.

Camila observou Lauren tirar um foto do endereço com o celular e depois entregar pra ela saindo da sala como um furacão de cabelos pretos.

— Parece mais difícil do que realmente é. – Anabeth tentou consolá-la.

Mila tirou os olhos do lugar vago deixado por Lauren na sala, respondendo a professora com um sorriso sem se atrever a dizer o que pensou.

"É mais difícil do que aparenta ser."

Lauren caminha com ligeira pressa em direção ao campo de futebol. A cabeça fervendo e os pensamentos pululando em sua mente como um monte de sapinho depois da chuva. Não queria estar tão chateada com o que Camila disse, mas estava. Parte dela não caminha com mais pressa porque espera que ela retire tudo que disse, e tente ao menos vê-la além do que sua casca apresenta. Mas então ela fica com mais raiva por dar tanta atenção aos pensamentos bobos de Camila sobre ela.

— Você ouviu o que eu disse, babe?

— O quê? - Lauren parece se lembrar apenas naquele momento que Lucy está lhe acompanhando grudada em seus braços, ambas atrasadas para os seus treinos.

Sua namorada fecha a cara e solta seu braço imediatamente.

— Esqueça, por que você está tão estranha? – Perguntou.

— Eu não estou estranha, só estava distraída. Você não pode repetir o que disse?

— Não!

— Ok, eu estou atrasada, não tenho tempo pra essas coisas. - Lauren beijou ligeiramente o rosto da namorada correndo pra a saída.

Da entrada do campo de futebol Jauregui, já podia ouvir a voz grossa do professor Rodgers gritando com o time.

— Estiquem-se até sentir alguma coisa! – Ele olha diretamente para Lauren chegando.

A capitã avança em direção o centro do campo, trocando rapidamente olhares com Alycia e Normani. Elas esperavam que Lauren falasse ainda naquela tarde com o treinador sobre a volta de Verônica. E pelo olhar ofendido da atual goleira do time, a novidade já tinha se espalhado por todas as jogadoras.

O homem de dreads parou um segundo de gritar quando Lauren o alcançou.

— Está atrasada, senhorita Jauregui.

— Eu sei, desculpe. Tive que ficar até um pouquinho depois da aula.

— Problemas? – O homem inquiriu em um tom promissor. – Se a senhorita Thompson estiver te importunando eu posso resolver.

— Não! Ela não está, é só um trabalho extra-classe.

— Isso é importunar, – Ele pontuou. – Seu foco tem que ser cem por cento o time, lembre-se dos olheiros a sua volta.

— Eu estou bem, na verdade, quase isso. – Tyrone virou-se pra a jogadora com os olhos verdes frios em cima dela. – Quero te pedir autorização para uma coisa.

— Siga...

v Verônica Iglesias... – Ela começou, e as expressões faciais do homem mudaram imediatamente ao ouvir aquele nome. – Eu soube que ela foi expulsa do time, mas-

— Isso está fora de cogitação.

— Senhor...

— Verônica Iglesias é passado pra esse time. Você é o futuro o passado e o presente

— Seria interessante que eu pudesse atuar nas onze posições, mas eu não posso. – Lauren respondeu secamente. – Nós precisamos de uma goleira segura ou do contrário o time vai passar vergonha.

— Você precisa focar em si própria.

— Eu não ganho sozinha, nem perco só, professor Rodgers. Eu quero vencer esse campeonato tanto quanto quero jogar no Barcelona.

O casaco preto sobre o homem se retesou em seus braços, evidenciando o quanto aquele assunto o deixava desconfortável.

— Verônica Iglesias é incontrolável, ela vai tirar a harmonia do time.

—Eu posso lidar com ela. – Rodgers franziu o cenho provavelmente em uma luta interna. - Apenas me deixe resolver.

O treinador levou o apito aos lábios e fez o barulho irritante soar mais alto que o possível, antes de murmurar com a voz seca:

— O que acontecer estará em seus ombros!

— Eu não vou te decepcionar.  – Prometeu e Rodgers abriu um sorriso.

— Trazer Verônica ao time é decepcionante, mas você tem minha autorização.

Lauren teve que se conter pra não dar um pulo de alegria ouvindo aquilo. Ela sabia que sua equipe prosperaria com Verônica no gol, tinha lhe visto jogar. Iglesias era uma ótima defensora e um desafio. Lauren sempre cresceu sob pressão.

Então, foi correndo até Alycia com uma fúria ardente no peito, pronta pra dar a notícia, seu humor melhorando cem por cento:

— Ele autorizou – Disse em uma respiração só. – Tyrone Rodgers autorizou que eu trouxesse Vero ao time.

— Sério? – Alycia mal esconde sua surpresa. – O velhote te venera mesmo. Essa notícia é ótima! Podemos ir na casa da Vero hoje mesmo.

— Nem acredito que vamos ter uma goleira de verdade. – Lauren desabafou.

— Não fique tão feliz, Michele. Vero não vai ser tão fácil quanto o Rodgers, ela não tá apaixonada por você.

— O quê? Meu Deus, Alycia.

— Eu tou zoando, ok? Vá tirar esse vestido de menininha e volte pra terminarmos esse treinamento.

Lauren voltou ao campo apenas cinco minutos depois, vestida a caráter para o treino. Ela correu um pouco e logo se juntou a Normani e Alycia, correndo mais rápido e mais eficiente que conseguia.

Dentro do campo nada podia alcança-la.

Quando Alycia sugeriu a Lauren trazer Veronica Iglesias de volta ao time, ela sabia de todas as possibilidades e o que o encontro de duas personalidades complicadas como a de Lauren e Vero podia causar.

Sua prima não gostava de lidar com personalidades rebeldes, exceto, claro, por ela mesma, mas eram primas e isso era diferente em vários níveis. Levou anos para Lauren e ela conseguirem aceitar as diferenças e similaridades de suas personalidades, e isso não facilitava no presente, mas não impedia que elas entrassem em conflito. Com Vero, isso seria cem vezes potencializado, ainda mais que Lauren provavelmente não fazia nem ideia que Vero e ela tinham uma pequena coisa em comum.

Alycia podia controlar muitas coisas a sua volta, e imaginava que com tempo  conseguiria controlar as duas. Ou era isso que ela calculou.

No entanto, no início da noite quando Lauren encostou seu carro de luxo na entrada do conjunto habitacional, Alycia se deu conta que ela não tinha calculado exatamente tudo. Havia ido na casa de Verônica umas cinco vezes em companhia da própria, sozinha era um burrice sem tamanho, elas pareciam patricinhas perdidas.

A Santa Clarita que aparecia na televisão convidando turistas, era toda cores, praia e mulheres lindas o tempo todo. A própria definição de comercia de colgate. O american dream em estado absoluto, mas em todo conto de fadas existe uma floresta proibida, Calle dos Vientos era a floresta proibida de Santa Clarita.

Massivamente povoada por imigrantes mexicanos, cubanos e brasileiros, o local era mal cuidado, e recebia pouco incentivo do governo, dando lugar para a criminalidade que assolava aquele lugar agir e causar guerras e guerra entre gangues.

Uma dupla de rapazes, trajando o mesmo tipo de roupas e tatuagens combinando com bigode mustache aproximou-se do carro, batendo no vidro com força.

— Desçam do carro, blancas. – Ordenou o rapaz de camiseta rosa de flores, sem deixar elas abrirem a boca pra dizer nada.

Alycia saí do carro ouvindo as batidas do seu coração. A via estava mal iluminada, e o cheiro de lixo apodrecendo no meio da rua incomodou seu estômago, mas ela não esboçou qualquer reação. Na situação que estavam poderia ofender os dois até com um olhar mal dado.

—O que fazem aqui, gringas? Duas chicas lindas passeando por um lugar como esse?

— Viemos procurar Verônica Iglesias. – Foi Alycia quem respondeu a pergunta, passando a frente de Lauren afim de deixar mais fácil pra sua prima correr se fosse necessário.

— Não conheço nenhuma Verônica. – Ele respondeu hostil.

— Vero, - Alycia informou urgentemente. – Ela deve ser conhecida aqui por Vero.

—Vero... – O mais alta pensou um segundo, e depois olhou pra o amigo. – Y tu, conhece alguma Vero?

Si, - respondeu com desgosto. – Hija de Juan, pero... o que vamos ganhar pra levar vocês duas até Vero?

— Ganhar? – Lauren repetiu debilmente.

— Si, ganhar, não estão na praia de açúcar, nenas...

Alycia sentiu o corpo da prima recuar, e suas mãos segurarem discretamente o seu pulso. Porém, o latido de um cachorro pausou as ações dos quatro, obrigando todos a olhar para onde vinha o som. Parada em cima da grama enquanto segurava com força a coleira de um cachorro uma garota usando um moletom da adidas velhos e shorts jeans que evidenciavam seu corpo, com pernas douradas e grossas. Alycia ergueu a sobrancelha devagar, suspirando de alívio:

— Vero! – Exclamou.

Os rapazes não saíram da frente delas duas, ainda olhando-as com desconfiança.

— Conhece essas duas blancas, mama? – O mais baixo perguntou curioso.

Vero repousou os olhos castanhos lentamente em Alycia e demorou-se na até então desconhecida, erguendo a sobrancelha quando reconheceu Lauren Jauregui.

— Pode deixar, Pablito, si? – A moça de cabelos escuros disse ao mexicano tatuado, tentando acalma-lo. - Conheço elas duas.

— Certeza?

- Si, cabron, pode deixar que eu resolvo.

Os dois bateram na mão da garota como se fossem amigos de longa data e depois de mais um olhar ameaçador voltaram a sentar em cima do cadilac parado no meio da rua.

— Figuras muito simpáticas esses dois. – Zombou Alycia voltando a respirar normalmente.

— O que faz aqui, Evans, ainda mais com essa chiquita?

— Lauren Jauregui. – Lauren sentiu-se na obrigação de se apresentar, mas teve sua mão ignorada.

— Eu sei quem é você, jogamos juntas duas vezes, não precisa usar esse tom pomposo pra dizer seu nome.

Jauregui arregalou os olhos começando a ficar desconfortável com o tom daquela garota.

— O que quer de mim, Alycia? .

Pela cara ofendida de Lauren, Alycia sabia que teria que ser ela responsável por intermediar aquela convocação a Vero. Tinha convivido por muitos anos com Verônica Iglesias, e sabia exatamente o que dizer.

— Nós conseguimos... – Começou, afastando-se de Vero graças o rosnado ameaçador do cachorro. - Você está de volta a equipe!

Vero abriu um sorriso, um grande e largo sorriso, que foi se tornando uma mascara de raiva e rancor. Alycia se deu conta mais uma vez que nem tudo se dá pra prever.

— Conseguiram? – Replicou com a voz trêmula. – Engraçado, porque eu passei um ano e meio esquecida por vocês, por todas as 22 duas pessoas que diziam ser minhas amigas e agora do nada me querem de volta? – O cachorro preso na coleira latiu acompanhando a mudança de humor da dona. –Vá se foder, Alycia! Eu não voltaria pra esse time nem que vocês se ajoelhassem a mim.

— Então é isso? – Lauren desistiu de ser apenas expectadora. –Vai deixar seu sonho para trás por magoa?

— O que sabe sobre o que me mágoa? Você não conhece minhas historia, só está aqui porque precisa de mim. – Ela virou-se pra Alycia. –Ela é a nova protegida do velhote? Achei que por ser sua prima ela fosse um pouco mais esperta? O que você está dando a ele?

— Foda-se! – Lauren partiu pra cima de Vero, e só não avançou mais porque Alycia se prostrou na frente das duas. – Não precisamos de você! Acha que vou deixar mais alguém usar esse tom pra falar comigo nessa cidade merda? Não quer participar do time? Ok. Mas não ouse insinuar coisas sobre mim. Volte para sua vida de merda!

— Lauren chega, –Alycia empurrou a prima mais um vez. – Eu disse chega, porra!

Imediatamente a moça pareceu se dar conta do que tinha dito. Voltando aos poucos para o seu estado de consciência normal.

Por um segundo o contraste de como elas pareciam tão bonitas e bem vestidas, com as peles do rosto impecável, andando em carros de luxo, tendo vidas maravilhosas, pesou e foi fundo, ambas estavam envergonhadas, mas quando Lauren voltou para o seu carro com lágrimas nos olhos, Alycia inda estava ali.

— Me desculpe, ela não quis dizer isso.

— Ela quis sim, e isso não é uma mentira. É uma vida de merda.

— Vero. – Uma voz infantil chamou a moça parada na entrada de uma casa feita em partes de madeira no final da rua. – Mama está te chamando, vamos jantar.

— Estou indo Juanita. – Alycia notou que o tom de voz da moça mudou para falar com a criança. Era sua irmãzinha mais nova, alguém que a própria Vero praticamente tinha criado. - Dê o fora daqui, Evans.

E puxou seu cão pela coleira sem dizer mais nada.

A casa pequena tão remendada quanto a roupa que vestia os irmão de Verônica Iglesias, era mofada, apertada e triste. Ao total moravam cinco pessoas dentro da casa, seu pai, Juan, um colombiano bêbado e violento e sua mãe, Villena Acerro, alguém de quem a vida sugou todos os sonho deixando apenas uma casca úmida e vazia.

Sua casa cheirava a suor, e cigarro. Ela invade a porta aberta, contendo as lágrimas que se acumulam ao redor dos olhos. Malditas gringas! O chiado da pequena televisão na sala a traz de volta a sua realidade. Seus irmão disputavam pelo controle. Sentou-se a mesa, soltando seu cão que correu feliz em direção seus irmãos mais novos.

— Eu já mandei se livrar desse animal. – Disse sua mãe.

Vero apenas assentiu, não ia debater mais com seus pais sobre aquele assunto, o que ela poderia fazer? Esperava que ficando quieta eles parassem de encher o saco sobre o cão. Bem verdade, que a sua condição financeira não dava o direito de ter nem um cãozinho, estavam numa situação tão critica que ou comiam eles ou o animal.

— Vou me livrar dele amanhã. – Prometeu, recebendo da mãe um pequeno prato com a sopa cheirando a carne passada.

— Eu tou cansada de sopa. – Juanita, sua irmãzinha reclamou olhando a sopa feita de restos do almoço.

— Coma tudo antes que o papa perceba que está reclamando da comida.

— Mas é ruim, Vero.

— Finja que é bom, – Ela inclinou-se para apenas a irmã lhe ouvir. – Qual sua comida favorita, ninã?

Juanita fechou os pequenos olhos castanhos como se saboreasse em pensamentos.

— Chocolate.

— Finja que essa sopa é uma enorme barra de chocolate.

— Mas-

— O que eu falei sobre conversas na hora da janta? – Seu pai disse com a voz desagradável de bêbado.

Vero ergueu os olhos dando a ele o máximo de desprezo que podia com um olhar. Odiava-o tanto que sentia o sentimento escorrer pelo seu sangue, forte pesado e viscoso, grudando em cada célula do seu corpo.

—  Quem era aquelas duas gringas com você? – Sua mãe perguntou com interesse, dificilmente ela se interessava por Vero e seus problemas. – São do time?

— Sim.

— Trouxeram algum dinheiro?

— Não.

— Não estou surpresa, esse seu sonho nunca nos deu um centavo. – Cuspiu sua mãe. – Apenas migalhas, volte a sua realidade, ou vai viver de barriga vazia.

Vero olhou para o prato de sopa com desprezo. Era só isso, migalhas, sempre o tempo todo.

— Eu já vivo a vida toda assim! – Ela ergueu-se da mesa, decidida a não chorar na frente dos seus pais e subiu os degraus que levavam ao pequeno quarto que dormia com mais 4 irmãos.

As voz da maldita Lauren Jauregui ecoa novamente na sua cabeça, dessa vez mais alto.

"Volte a sua vida de merda!"

— Porra! – Exasperou-se batendo as mãos contra a pequena bancada onde ficavam todos seus troféus e algumas fotos manchadas pelo tempo. Derrubou todos no chão, e chutou eles com vontade, até não sobrar nada alem de pedaços de plastico espalhado.

Jogou-se na cama e encarou a foto que guardava debaixo do seu colchão como um inútil sonho morto, foi com ela que se sentiu feliz pela última vez. E mais uma vez seu sonho morria dentro dela, escorrendo pelo seu rosto com gosto de lagrimas.

— Você está calada. – Lauren murmurou retirando Alycia dos seus pensamentos.

Alycia fecha os olhos, como se quisesse desfrutar mais um pouco do silêncio, antes de virar-se para a prima e dizer:

— Me sinto culpada, Lauren. – Desabafou. Tudo entre elas era simples e direto. Alycia não sentia como se tivesse que esconder seus sentimentos da prima. – Verônica está certa, deixamos ela pra trás tão fácil. Eu mesma, preferi me calar ao enfrentar e descobrir o que tinha se passado. Isso é tão egoísta quanto rude.

—Você não é culpada, Al, pare com isso. Eu é que deveria estar me sentindo um lixo. Eu explodi e pareceu que estava zombando da condição de vida dela.

— Algo aconteceu pra o professor Rodgers ter caçado Vero.

— Eu não penso assim, o professor Tyrone-

— Por favor, Lauren, não defenda-o. – Disse Alycia exasperando-se. – Não é possível que você não questione o seu caráter só por um segundo!

— Sim, mas-

— Mas é melhor pra você fingir que ele é uma boa pessoa?

—Eu não disse isso, Alycia!

— Mas pensou. Você viu a realidade da Vero, essa grana que ganhamos da escola é algo pouco dentro da sua realidade, dentro da minha realidade, mas faz muita falta dentro da realidade dela. Será que ele nunca se sentiu mal por estragar o sonho de alguém assim?

— Nós não sabemos o que aconteceu, Alycia.

— Pare de tentar relativizar a culpa desse filho da puta!

Alycia sabia que Lauren tinha um senso de justiça apurado, mas o seu silêncio feriu um pouco as suas expectativas. Nunca antes tinha gritado com a prima, nunca usando um tom como aquele. Mas seu peito queimava em fúria, ela sentia raiva de Lauren, raiva por defender alguém que destruía sonhos como pisa em castelos de areia.

— Pare esse carro! –Alycia ordenou bruscamente. – Agora.

— Pra onde você vai?

— Preciso beber um pouco.

— Você está brava comigo, – Lauren notou como se não fosse óbvio.

— Eu estou. – Alycia desprendeu o cinto e abriu a porta, voltando-se pra dizer. – É foda ter que te dizer isso, mas as vezes Camila tem razão. Você é egoísta pra caralho quando quer.

E saiu do carro batendo a porta com força. Se tinha uma coisa que Alycia detestava era ter que brigar com Lauren, mas o sentimento fraternal que as unia podia ser abalado, ainda mais quando Lauren parecia tão cega a cerca das atitudes duvidosas de Tyrone Rodgers. Doia mais nela que em Lauren, mas algumas verdades precisavam ser ditas.

E com Vero voltando ao time ou não, ela estava decidida a descobrir o que tinha acontecido e quando descobrisse, o reinado de Tyrone naquela escola estaria em perigo. Isso ele podia ter certeza.

Medo do que vcs vão pensar sobre esse capitulo, pq de fato ele vai contra tudo que escrevi em TDC até hoje, mas como sempre vi Verônicas, com a personalidade mais parecida com a da Alycia quis inverter os papeis nessa fic.

Quando eu disse que a Camila e Alycia eram meus personagens favoritos da historia toda, acho que vocês vão começar a entender agora.

Temos um segredo a desvendar, né? O que será que o Tyrone fez com a Vero?

POREEEEEEEEEEEM, assunto serio, real! Por favor, leiam.

Quando eu comecei a escrever Teoria do amor ao caos, a mais ou menos uns dois anos e meio, eu tinha na cabeça que a historia teria mais ou menos 50 capítulos, algo totalmente novo pra mim, que sempre terminava minhas historias com no máximo 25 capitulos, primeiro porque eu me inspirei 100% em novelas e series que eu assisti minha vida toda, (Malhação, Rebelde, PLL, e Gossip Girl) com muitos personagens e muitas histórias paralelas às dos personagens principais e segundo porque eu me sentia mais próxima dos meus ídolos, dando vida nova a eles ainda que na ficção. Bem, quando eu terminei de escrever a história toda, ela tinha 60 capítulos, e duas fases, mas eu contei tudo que tinha pra contar e amarrei todas as pontas da maneira que minha cabeça queria, PORÉM, eu sei que nem todo mundo gosta de ler histórias enoooooooormes, então eu vim perguntar a vocês uma coisa muito importante:

Vocês querem que eu dê uma "compactada" na história pra diminuir o número de capítulos e excluir alguns conflitos? Se quiserem, me deixem saber, porque eu estou indo pra um ponto crucial da história, e o momento da mudança é agora.

Sei que é chato esses textos enormes no fim de capítulos, mas eu quero que vocês estejam envolvidos na historia, porque quem lê são vocês, não faz sentido eu fazer algo pra me agradar quando eu não sou meus leitores. Obrigada de verdade, você são mais do que eu esperei.

Vejo vocês no próximo sábado <3


ATÉ MAIS <3


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