13 - As meninas das rosas vermelhas

Agora

Uma semana se passou enquanto Aiyra esteve no circo se inteirando sobre o que acontecia lá. Conheceu algumas pessoas e alguns números, mas, é claro, o Circo era grande demais para achar Nevere. Além disso, ela estava muito ocupada se deslumbrando com as inúmeras possibilidades com a magia que eles possuíam ali. Era algo de deixar qualquer um abobalhado e sem saber por onde começar. Ela via de tudo um pouco. Conheceu os trapezistas, as contorcionistas, as que treinavam para um dia serem assistentes de palco de Pefrus e os palhaços, que nada mais eram que bobos da corte que, jurados de morte pelo rei de seus países por alguma piada que fizeram, acharam refúgio no Circo. Na verdade, eram poucos os que conseguiam escapar.

Com os trapezistas, ela não somente viu os números como tentou performar algumas coisas. Não tinha muito jeito, diziam que ela era dura demais, mas se divertiu horrores  com eles. Apesar de estranhar muitas coisas no começo, já estava começando a se acostumar com a sensação de surpresa e dúvida que trazem as novidades. Foi assim no trapézio, quando viu que usavam roupas coladas no corpo como se estivessem sem nada, ela se assustou.

Por um longo tempo pensou que estivessem nus e que fossem exigir que também ela retirasse suas roupas. Já estava pronta para recusar e procurar outro lugar quando chegou mais perto e viu que se tratavam se figurinos de um tecido viscoso e brilhoso, com detalhes em bordado que ficavam em alto relevo, como borboletas pousadas prestes a saírem voando. Ela viu também que estavam sempre com muita pintura no rosto, o que tornava difícil de enxergar e discernir suas micro expressões. Todavia, os seus sorrisos se intensificavam. Era como se houvesse apenas dentes e marcas de expressão, e eles se fundissem ao ar a sua volta, como se seus sorrisos flutuassem no ar para adentrar ao seu coração e fazê-la corresponder.

Era impossível não se sentir à vontade com eles. Impossível não gargalhar junto, não aceitar tomar um chá junto, participar do treino deles e não deixar pintarem também o seu rosto. Eram todos simpatia e magnetismo. Pessoas das quais era difícil se desvencilhar e complicado não procurar sempre estar por perto.

As contorcionistas, por sua vez, eram pessoas tão flexíveis quanto seus corpos. Aceitavam tudo o que lhes era proposto e estavam sempre de bem com a vida e conformadas com suas posições. Se adequavam a tudo em que eram inseridas e bastou apenas alguns dias com Aiyra para emularem alguns de seus costumes, o que a fez se sentir em casa, já que eram todos ali tão diferentes. Zyskla dizia que preferia os trapezistas. Eram flexíveis o suficiente e não tentavam te bajular, dizia ela. Mas permaneceu ao lado de Aiyra a todo momento. Quando foi dito a ela que poderia sair, ela se recusou, deixando bem claro que Pefrus nao somente gostava de seu trabalho bem feito como também amava receber relatórios no fim do dia.

Por alguns momentos, Aiyra pensou se não havia escolhido o grupo errado para se aproximar, pois havia uma infinidade de pessoas das quais Zyskla não gostava. Pelo menos Badika parecia muito feliz na companhia das contorcionistas.

- Não é só da companhia que ele gosta. - sussurrou Zyskla, uma vez, no ouvido da outra, que tentou fingir que não havia ouvido nada.

Quando Aiyra indagou a Zyskla sobre o seu próprio grupo onde ela havia treinado, ela explicou que havia sido contorcionista antes de treinar para ser assistente de palco de Pefrus, mas era tão boa que conquistou seu próprio número solo. As meninas aprendizes de assistentes de mágico deveriam abdicar de todas as coisas para apenas treinarem. Não podiam mais participar de número algum, e não tinham garantia de que seriam escolhidas. Algumas ficavam velhas demais e eram jogadas para qualquer outra coisa que estivesse precisando de pessoas. Passavam o dia inteiro do resto de suas vidas treinando para nada.

Não eram escolhidas com frequência, pois para ser assistente de Pefrus era preciso ganhar a confiança dele primeiro. Ele tinha que aprovar, que gostar, ele tinha que se deleitar do que via. Apenas quando ele adorava a este ponto, alguém era escolhido. Como na última apresentação Jasným deixara seu posto vago para permanecer na Vila, as meninas se perguntavam qual delas seria a próxima felizarda.

Quando chegou lá, Zyskla precisou informá-las de que o próprio Pefrus queria Aiyra ali, pois elas estavam tão focadas no seu treinamento que não teriam permitido a entrada nem dado o mínimo de atenção para as duas caso fosse diferente.

O lugar era lindo, todo adornado de rosas vermelhas, mas o clima ali era diferente. Estranho, talvez. Competitivo, com certeza. Badika inventara uma desculpa mais cedo para não ir. Tudo o que elas realizavam, faziam olhando umas para as outras, como quem procura por defeitos ou vantagens nos corpos alheios. Quase deixaram Aiyra cair quando tentou um número arriscado que pediram para ela.

Deixavam muita comida. Apenas aquelas extremamente finas se permitiam comer um pouco mais. Inclusive, estas que achavam-se a precisar de um corpo mais bonito e esguio, olhavam para os pratos daquelas finíssimas com os seus olhos verdes. Aiyra não soube se o verde era de inveja ou era apenas fome.

Ela perguntou para que servia o racionamento de comida se a tinham com abundância. Elas responderam:

- Precisamos caber nos nossos figurinos.

- E por que motivo não fazem figurinos maiores?

Elas apenas riram, amargamente.

Saiu dali dizendo que as meninas eram muito agradáveis. Parecia que estava aprendendo a mentir.

Na realidade, sempre soube, apenas não desta forma tão descarada.

A barriga de todos sempre doía de tanto dar risada quando passavam o mínimo de tempo com os palhaços. Com Aiyra e Zyskla não foi diferente. Badika chegou mais tarde e foi pego de surpresa quando viu as meninas enxugando as lágrimas do canto de seus olhos. Os antigos bobos da corte não deixaram ele de fora, logo foram fazendo palhaçadas. Ele era mais difícil de se fazer rir, mas quando começaram uma imitação caricata de Pefrus Artem ele não aguentou e explodiu numa gargalhada.

Aiyra nunca o havia visto rir desta maneira tão espontânea e solta. Ele se esqueceu do que estava a sua volta e tocou o ombro dela enquanto se recuperava da risada. Ela se encolheu um pouco, mas permitiu. Tinha decidido dentro de si quando escolheu ir embora com o Circo de Xalen de que precisaria se acostumar com isto.

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