𝟎𝟒𝖝𝟐𝟓 '𝕿𝖍𝖊 𝕼𝖚𝖊𝖊𝖓'𝖘 𝕭𝖚𝖗𝖉𝖊𝖓'

Rumores sombrios serpenteavam pelos corredores do castelo como serpentes sussurrantes, carregando nas costas um veneno feito de medo e fofocas. Diziam que a Rainha Alyssane, abalada pelo luto, havia perdido o juízo. Era fato que desde a morte de Daeron, ela não deixara seus aposentos, e, no velório público de seu filho, sua ausência era o que mais chamava atenção.

A imagem de Rhaenyra agora se manchava com uma crueldade que o povo não se furtava a repetir. Em tavernas e praças, a Mãe dos Dragões era chamada de assassina, de usurpadora que não hesitaria em matar uma criança para garantir o Trono de Ferro. No entanto, aqueles que antes defendiam Alyssane começaram a trocar a compaixão por desprezo. Alguns a chamavam de covarde, incapaz de enfrentar a realidade, enquanto outros lhe conferiam rótulos mais duros, questionando sua capacidade.

— Onde está a rainha? — murmuravam. — Que mãe não vai ao funeral de seu próprio herdeiro?

Os rumores apenas cresciam, se enredando em conjeturas sobre o que se passava atrás das portas trancadas de seus aposentos. Uns diziam que ela se tornara uma sombra de si mesma, outros, que estava consumida por uma tristeza que a afastara da razão.

Alyssane mal podia suportar a visão de Daella. O rostinho dela, tão semelhante ao de Daeron, era um lembrete constante da perda que consumia seu coração. O peso do luto a impedia de passar muito tempo com a menina, que, sem compreender a razão, começou a sentir a ausência da mãe de forma cada vez mais dolorosa. 

A rainha-mãe Alicent, que observava o sofrimento de sua filha, começou a enxergar com clareza o segredo que, de algum modo, sempre soubera: Daella e Daeron não eram filhos de Aegon, mas sim de Aemond.

Alicent, no entanto, não ousava confrontar Aemond sobre a verdade que carregavam. Em vez disso, continuava a repetir para Aegon que aquelas crianças eram dele, tentando mantê-lo amarrado à narrativa que protegeria a coroa e os manteria unidos. Aegon, por sua vez, estava afundando cada vez mais no abismo de raiva e luto, escondendo-se atrás da bebida para entorpecer a dor e o ódio que cresciam dentro de si.

Enquanto isso, Aemond, embora destroçado pela morte dos filhos inocentes, se agarrava à seriedade que sempre lhe fora característica. Ele usava a dor como combustível, escondendo as cicatrizes por trás de uma fachada impenetrável, ainda que seu coração pulsasse em agonia. 

 Seu foco agora era apenas um: proteger Alyssane e se aproximar do trono, acreditando que talvez, com o poder em suas mãos, ele pudesse moldar o mundo de acordo com seus desejos e proteger aqueles que amava.

Ele caminhava pelos corredores frios e escuros do castelo, seus passos ecoando enquanto a determinação crescia em cada fibra de seu ser. Sabia que não poderia devolver a alegria ao rosto de Alyssane, mas faria o que fosse preciso para garantir que ela ficasse ao seu lado e, acima de tudo, para vingar seus filhos.

Aemond entrou silenciosamente nos aposentos de Alyssane, ciente de que sua presença provavelmente seria indesejada. Mas ele precisava vê-la, certificar-se de que estava ali, respirando, mesmo que o luto a tivesse consumido a ponto de quase não reconhecer o mundo ao redor. O quarto estava mergulhado na penumbra, as cortinas cerradas como um escudo contra a luz do dia, tão fria e distante quanto seu coração agora devia estar.

Sem se deter, ele cruzou o ambiente e começou a abrir as cortinas, permitindo que o sol rompesse a escuridão com seus feixes dourados. No mesmo instante, Alyssane gemeu de dor, encolhida na cama, o cobertor envolvendo seu corpo como uma armadura frágil. A luz parecia feri-la, como se até mesmo o calor do dia fosse um fardo que ela não estava disposta a suportar.

— Pare... — sussurrou ela, a voz fraca e distante, mais um lamento do que um comando.

Mas Aemond ignorou o protesto e continuou, uma a uma, abrindo as cortinas até que o quarto inteiro estivesse inundado de luz. Ele sabia que precisava tirá-la daquela escuridão, ainda que contra a vontade dela. Afastando-se, ele se aproximou da cama e se abaixou para fitá-la, os olhos em chamas, embora a dor ainda estivesse estampada em seu rosto.

— Alyssane, você não pode se esconder aqui para sempre. — Sua voz era suave, mas implacável, uma mistura de preocupação e determinação.

Ela virou o rosto, os olhos fixos em um ponto invisível, negando-se a encará-lo. Mesmo assim, Aemond permaneceu, silencioso e firme, um farol solitário na vastidão daquela tristeza.

Aemond lançou um olhar para a mesa de cabeceira, onde os lanches que ele mandara os servos trazerem jaziam intocados, esquecidos como tudo o mais que ele tentava fazer para aliviar o sofrimento dela. O coração dele afundou, um peso esmagador, como se a falta de apetite de Alyssane fosse mais um sinal de sua desconexão com o mundo que ele se esforçava tanto para alcançar.

Respirando fundo, ele se aproximou dela, sentando-se à beira da cama, e com mãos firmes, porém gentis, segurou o rosto dela. Ele a obrigou a encará-lo, mesmo que seus olhos permanecessem distantes, vagando em outra realidade.

— Alyssane — ele murmurou, a firmeza em sua voz quase cortante. — Você precisa reagir. Não pode continuar se consumindo desse jeito. Eles precisam de você. Eu preciso de você.

Ela não respondeu, mas Aemond não desviou o olhar. Seu aperto em seu rosto se suavizou, o polegar acariciando-lhe a pele fria, enquanto ele tentava de algum modo trazê-la de volta para a vida. Ele não sabia quanto tempo mais conseguiria suportar vê-la tão distante, como se ele fosse apenas mais uma sombra que ela não queria enfrentar.

Aemond passou um braço em torno dela, ajudando-a a se levantar, sentindo o peso frágil de seu corpo mole e sem vida, como uma boneca de pano. Ela se deixou guiar sem resistência, os pés mal tocando o chão enquanto ele a levava até a banheira, seus passos cuidadosos e hesitantes, como se temesse que ela desabasse a qualquer momento.

Quando chegaram ao banho, ele começou a despi-la, movendo-se com uma ternura rara, quase reverente, enquanto tirava cada camada de tecido que a envolvia. Ela permaneceu impassível, os olhos vazios mirando um ponto distante, sem reconhecer seu toque ou sua presença. Ele continuou, paciente, observando cada centímetro da pele dela que era revelado, o coração apertado ao ver o quanto ela parecia ter murchado, se transformado em uma sombra de quem um dia fora.

Aemond fechou o único olho, reprimindo o desejo que o tomava ao sentir a pele dela sob suas mãos. Com cuidado, ele a ajudou a entrar na banheira, seu toque firme, porém terno. Alyssane gemeu baixo quando a água quente envolveu seu corpo, um som suave que reverberou pelo silêncio do aposento e perfurou o coração dele. Aemond a segurou contra o peito, afundando o rosto dela em seu pescoço, enquanto suas mãos deslizavam por suas madeixas prateadas, num gesto de consolo e arrependimento.

A culpa o invadia como uma onda esmagadora. Ele sabia que jamais deveria tê-la deixado sozinha. Se arrependia de cada momento de ausência, de cada oportunidade perdida para protegê-la daquele sofrimento que agora a consumia. 

Enquanto ele cuidadosamente limpava o corpo de Alyssane, as mãos dele, tão familiares, se moviam devagar, quase com reverência. Ele sentia a tensão aos poucos se esvaindo dos músculos dela, como se, por um breve momento, a dor tivesse deixado de existir. A respiração dela estava leve, e por um instante, ele pensou que talvez pudesse vê-la finalmente encontrar um pouco de paz.

Mas então, com a voz fraca e distante, ela perguntou:

— Onde está Daeron?

A pergunta penetrou o silêncio como uma lâmina afiada, cortando a tranquilidade que ele tinha tentado trazer. Aemond congelou, sua mão parando no meio do movimento. 

Aemond apertou os lábios, o corpo tenso, lutando contra o desespero que ameaçava escapar. Não queria ser o portador daquela dor mais uma vez. Não queria dizer a ela, como se a simples menção pudesse trazer de volta todo o horror. Ele sentiu o peso da tragédia afundar ainda mais no fundo do seu coração, misturando-se à culpa que já carregava.

Aemond respirou fundo, sentindo o peso das palavras não ditas sufocarem o ar entre eles. Com um toque quase imperceptível, ele pousou a mão no ombro dela, como se aquele gesto pudesse proteger Alyssane da verdade que, de novo, a aguardava impiedosa. Seus olhos buscaram os dela, mas Alyssane parecia perdida, um reflexo quebrado de quem fora.

A luz suave que entrava pelas cortinas entreabertas parecia hesitar antes de alcançá-los, como se o próprio sol temesse tocar aquela cena envolta em tanta dor. As gotas de água escorriam pelos braços dela, um fio delicado que serpenteava pela pele como um rastro de lágrimas.

— Ele... — Aemond começou, a voz saindo como um sussurro quebrado, incapaz de proferir a verdade que ambos já conheciam, mas que ela insistia em esquecer. — Ele não está mais aqui, Alyssane.

Ela permaneceu em silêncio, olhando para além dele, o rosto vazio, distante. A dor parecia flutuar sobre eles, invisível, mas ainda assim tão tangível que ele podia senti-la, espessa como névoa. Ele sentiu o peso da culpa, a impotência de saber que nada que fizesse poderia realmente apagar a dor dela.

Tomando um fôlego profundo, Aemond envolveu-a com o braço, puxando-a para perto, deixando que o calor de seus corpos tentasse colar os pedaços quebrados dela, ao menos por um instante. Ele apoiou a cabeça sobre a dela, fechando os olhos, desejando, com todo o fervor, que pudesse arrancar aquela lembrança dolorosa da mente de Alyssane, que pudesse roubar para si o fardo de sua angústia.

— Eu sinto muito — ele murmurou contra os cabelos dela, as palavras se dissolvendo no silêncio. — Nunca deveria ter deixado você sozinha.

As palavras saíram de Alyssane como um sussurro trêmulo, um eco da fragilidade que habitava seu ser.

— Eu sinto falta dele — ela disse, a voz carregada de um peso que quase a fazia desabar. As lágrimas se formaram em seus olhos, brilhando como pequenas estrelas em uma noite escura, prontas para cair a qualquer momento. Aemond sentiu seu coração apertar, uma dor profunda que reverberava em sua própria alma.

Ele suspirou, o som misturando-se ao lamento silencioso que preenchia o quarto. Aemond olhou para ela, e seu próprio desejo de proteger e vingar aquele que fora seu filho se intensificou.

— Eu também sinto — ele confessou, a voz embargada pela emoção. Ele sabia que palavras não poderiam curar a dor que a envolvia, mas precisava que ela soubesse que não estava sozinha em seu sofrimento. — Mas eu prometo que irei vingar Daeron. Daemon e Rhaenyra... eles vão pagar.

Enquanto falava, a chama da determinação acendeu em seu peito, aquecendo-o em meio ao frio que ameaçava consumir tudo ao redor. Ele se afastou um pouco, mantendo seu olhar firme nos dela, esperando que, ao menos, um pouco de sua força pudesse alcançá-la.

— Não vamos permitir que eles escapem impunes — Aemond continuou, cada palavra carregada de uma intenção feroz. 

Alyssane observou-o, suas lágrimas ainda reluzindo, mas agora havia algo mais em seu olhar, uma centelha de esperança que parecia começar a florescer entre as sombras. O coração dele pulsava com a urgência de protegê-la, e, por um momento, o peso da tristeza pareceu um pouco mais leve. Eles ainda podiam lutar, ainda podiam se unir contra as forças que os haviam despedaçado.

Aemond a ajudou a sair da água, suas mãos firmes e gentis, como se quisessem transmitir um pouco de calor ao corpo que parecia tão distante do mundo. Ele envolveu Alyssane em uma toalha macia, os fios prateados dela caindo como cascatas de seda ao redor de seus ombros. Enquanto a secava, ele começou a massagear suavemente seu couro cabeludo, as pontas dos dedos deslizando em um toque carinhoso que buscava trazer um pouco de conforto a ela.

As emoções ardiam dentro dele, e ele não podia deixar de inclinar-se para beijar o pescoço dela, um gesto que carregava a reverência e a adoração que sentia. Cada toque era como uma prece silenciosa, um tributo à fragilidade dela e à força que ele sabia que ainda habitava seu ser.

Ele a adorava com uma intensidade que ia além da posse; era um desejo profundo de ser seu refúgio, de lhe oferecer proteção em meio ao caos. Ele queimava por ela, consumido por um amor que não sabia como nomear. Era uma força primordial, como um dragão em sua essência mais pura.

Mas quando deslizou a língua pelo corpo dela, buscando reacender uma conexão que parecia perdida, algo dentro dele estremeceu. Ele parou, um golpe de realidade o atingindo como um raio. Alyssane não reagiu. Não havia brilho em seus olhos, não havia o traço de um sorriso em seus lábios. Ela não se movia como antes, como se a vida tivesse sido drenada dela, e isso o feriu de uma forma que ele não conseguia compreender.

Aemond sentiu uma onda de desespero subindo por ele. Ele queria que ela reagisse, que sentisse, que lutasse contra a dor que a consumia, mas a passividade dela o desarmava. Ele se afastou, uma tensão crescente entre eles, o calor de sua adoração agora misturado com um medo profundo de que nunca mais a veria brilhar como antes.

— Alyssane — murmurou, a voz quebrando ligeiramente. Ele queria dizer mais, queria que ela soubesse que ele estava ali, que a amava com uma força que desafiava o próprio destino. Mas as palavras pareciam falhar, como se o peso da dor que ambos carregavam fosse grande demais para ser aliviado apenas por promessas.

Alyssane fechou os olhos por um momento, como se desejasse que a escuridão a envolvesse de novo.

— Só estou cansada — sussurrou, a voz um fio tênue que mal cortava o silêncio que os cercava. Era uma confissão de exaustão, não apenas do corpo, mas da alma.

Aemond sentiu uma onda de impotência. Ele não queria que ela se sentisse assim.

— Você ficou na cama o dia todo, por dias a fio — ele protestou, a preocupação tingindo seu tom. — Aetherion está inquieto no Fosso do Dragão. Deveriamos ir até lá.

Ele hesitou, então continuou, a determinação crescendo em sua voz.

— Ou, se não quiser ir até lá, ao menos venha comigo ao jardim. O sol está brilhando, e gostaria que você pudesse sentir sua luz novamente.

Ele se aproximou, tomando suas mãos nas dele, os dedos se entrelaçando como se fossem dois ramos de uma árvore lutando para permanecer juntos em meio à tempestade.

— Vou sair com Vhagar — revelou, a expectativa fazendo seu coração pulsar mais rápido. — Quero que você esteja lá, ao menos para ver o sol, para sentir um pouco de vida.

Ela hesitou, seus olhos ainda perdidos, mas Aemond viu um lampejo de luta em seu olhar. Era como se, por um breve momento, a sombra que a envolvia se afastasse.

— Eu prometo que não vai doer, Alyssane — continuou, a voz suave como uma brisa que acaricia as folhas. 

As palavras saíam dele como um feixe de luz, desejando penetrar a escuridão que a cercava. Ele queria que ela soubesse que ainda havia esperança, que a vida ainda pulsava além das paredes de seu luto.

— Por favor — ele implorou, um desespero sutil em suas palavras. — Por um momento, o silêncio tomou conta, e Aemond segurou a respiração, aguardando a resposta que parecia pairar no ar, como a expectativa de uma tempestade prestes a eclodir. 

A hesitação de Alyssane era palpável, mas, finalmente, ela acenou com a cabeça, aceitando o convite dele. Aemond sentiu uma onda de alívio misturada à determinação. Com mãos delicadas, ele ajudou a vesti-la, escolhendo um vestido simples, que caía suavemente sobre seu corpo, como uma brisa suave. A leveza da roupa contrastava com o peso do luto que ainda pairava sobre eles, mas ele a desejava leve, como um sonho ainda não esquecido.

Ao terminar, Aemond cruzou os braços com os dela, unindo suas forças em um gesto de apoio. Ao caminhar pelos corredores, a energia entre eles era diferente, uma mistura de determinação e uma fragilidade que eles tentavam ignorar. Desta vez, ele não se importava com os olhares curiosos, os sussurros que flutuavam pelo ar ou a possibilidade de Aegon os ver. A exaustão havia se instalado em seu ser, e ele se sentia cansado de tudo.

Os corredores, uma vez sombrios e opressivos, agora pareciam menos imponentes, como se a luz do sol pudesse finalmente invadir aquele espaço fechado. Aemond conduzia Alyssane com firmeza, cada passo deles ressoando como um pequeno desafio à escuridão que havia consumido seus dias.

À medida que se aproximavam da saída, ele percebeu o olhar de Alyssane vagar, seus olhos refletindo uma mistura de insegurança e desejo de escapar, mesmo que por um momento, das sombras que a mantinham presa. Aemond, com seu coração pulsando forte, decidiu que eles mereciam isso—um respiro, uma chance de sentir a vida novamente, mesmo que temporariamente.

— Estamos quase lá — disse ele, sua voz baixa e encorajadora. 

Finalmente, ao cruzar o limiar do castelo e sentir a brisa fresca do ar externo, Aemond parou, permitindo que Alyssane respirasse profundamente. O jardim se estendia diante deles, uma tapeçaria de cores vibrantes e aromas que flutuavam como promessas de dias melhores. O sol aquecia sua pele, e ele podia sentir a tensão em Alyssane se desfazer um pouco.

Enquanto o sol se erguia no horizonte, tingindo o céu de dourado e laranja, o movimento frenético nos pátios do castelo era evidente. Soldados se preparavam para a batalha em Pouso de Gralhas, armaduras reluzindo sob a luz matinal. Alyssane observava tudo com um nó no estômago. As vozes ecoavam ao seu redor, mas seus pensamentos estavam longe, presos em memórias dolorosas.

Seus olhos se perderam no horizonte, até que se fixaram em uma cena que fez seu coração afundar: Criston Cole, se inclinava para murmurar algo para Alicent. Ele tinha um olhar intenso, um sorriso malicioso que a fez sentir um profundo enjoo. A lembrança da morte de Daeron a atingiu com força, como um golpe.  

Foi em um momento de desespero que ela havia corrido para os aposentos de Alicent, procurando conforto, procurando respostas, mas o que encontrou foi um pesadelo. A infeliz visão de Criston e Alicent juntos, suas figuras entrelaçadas em um momento que deveria ser sagrado, a arrastou para a escuridão. O ato de paixão deles era um contraste tão cruel com a perda que agora pesava sobre seus ombros.

Alyssane fechou os olhos, tentando se afastar daquela imagem, mas a dor não se dissipava.

Alyssane sentiu um frio na espinha ao se perder em pensamentos obscuros. A imagem de Criston Cole e Alicent dançando entre a paixão e o dever a atormentava, e a pergunta se ecoou em sua mente: quem mais sabia da infidelidade da rainha mãe? O que mais se escondia sob a superfície polida do palácio, onde sussurros e segredos se entrelaçavam como sombras em um dia nublado?

Foi nesse momento de tormento interno que Gwayne Hightower, seu tio, se aproximou. Ele se aproximou com um sorriso largo, os olhos brilhando de alegria ao ver os sobrinhos. Seu cabelo, um tom de loiro claro, dançava suavemente com a brisa da manhã, e sua presença parecia trazer uma luz temporária em meio ao nevoeiro de desespero que envolvia Alyssane.

— Alyssane! Aemond! — exclamou ele, a voz cheia de entusiasmo. — Que bom ver vocês aqui! 

Alyssane forçou um sorriso, tentando afastar os pensamentos pesados. A vida continuava ao seu redor, e enquanto a dor a esmagava, Gwayne parecia ser um lembrete de que ainda havia luz, mesmo em tempos sombrios.

Aemond, ao seu lado, observou o tio com uma expressão neutra, a tensão sempre presente em seus olhos. Havia muito em jogo, e a diversão leve de Gwayne era um contraste gritante com a gravidade da situação em que estavam imersos.

Aemond, ao seu lado, observou o tio com uma expressão neutra, a tensão sempre presente em seus olhos. Havia muito em jogo, e a diversão leve de Gwayne era um contraste gritante com a gravidade da situação em que estavam imersos.

Enquanto Gwayne se aproximava de Alyssane, tentando tocar seu braço com uma familiaridade despreocupada, Aemond se moveu rapidamente. Ele segurou o pulso do tio, a pressão de seus dedos firme e decisiva.

— Não pode tocar a rainha — disse Aemond, sua voz baixa e grave, mas repleta de uma autoridade que deixou Gwayne sem graça. O cavalheiro hesitou, sua mão ainda no ar, como se a repentina interrupção o tivesse atordoado.

— Ah, é claro, Aemond — Gwayne respondeu, uma risada nervosa escapando de seus lábios. — Não quis ofender. Só pensei que...

— Não importa o que você pensou — cortou Aemond, sua expressão endurecendo. — Alyssane precisa de espaço.

Alyssane observou a interação, um misto de gratidão e desconforto borbulhando em seu interior. Aemond estava sendo protetor, mas o gesto também a lembrava das correntes invisíveis que a mantinham presa.

Gwayne recuou, a cor de seu rosto mudando para um tom avermelhado enquanto tentava restabelecer a leveza da conversa.

— Sim, claro. — Ele forçou um sorriso, tentando dissipar a tensão. 

Gwayne, um pouco mais cauteloso, concordou, e Alyssane, sentindo o calor da tensão diminuir, respirou profundamente. Assim, eles seguiram, com Aemond ao seu lado, sua presença uma mistura de proteção e possessividade. A caminhada se tornava um passeio silencioso em meio a um mar de incertezas, e, enquanto a luz do sol filtrava-se entre as árvores, Alyssane ponderava sobre as sombras que ainda assombravam seus corações.

O dia se arrastava, como um rio lento e preguiçoso sob o calor inclemente do sol, arrastando consigo as horas e as esperanças. Aemond havia partido em Vhagar, o dragão como uma sombra no céu, levando consigo não apenas seu vigor, mas também uma parte do espírito de Alyssane, que agora se via vagando pelos corredores frios do Red Keep, um espectro de si mesma.

Seus pés, antes leves, agora se arrastavam como se a própria gravidade do luto a prendesse ao chão. Ao atravessar os salões, Alyssane se permitiu um momento de reflexão. A beleza do castelo, com suas pedras antigas e tapeçarias desbotadas, agora lhe parecia distante, como se pertencesse a um mundo diferente, onde a dor não a assombrava.

Foi então que, em meio ao sussurrar das cortinas e ao eco distante de passos, ela ouviu as vozes elevadas de Aegon e Otto. A voz do rei era uma batata amolecida, cheia de frustrações e vacilações, mas ainda ressoava com a autoridade que lhe era devida.

— Você não é mais a minha mão — Aegon bradou, o tom desafiador reverberando nas paredes como um trovão.

Alyssane bufou, uma irritação súbita como uma chama acesa em seu peito. Aegon era, sim, um rei, mesmo que se comportasse como um menino caprichoso. Merecia respeito, mesmo que seu comportamento muitas vezes o tornasse digno de desprezo.

Otto, a figura austera e sempre alerta, não se deixou intimidar. Seu olhar afiado atravessou a sala, e ao cruzar os olhos com Alyssane, um aviso silencioso passou entre eles. Ele se virou para sair, mas não antes de lançar uma última frase, como uma pedra jogada em águas calmas.

— Cuide-se, minha neta. O que está por vir não será leve — disse ele, a gravidade de suas palavras pairando no ar como nuvens carregadas, prenunciando uma tempestade.

Alyssane sentiu o frio da premonição invadir seu ser, como o vento cortante de uma noite de inverno. Enquanto Otto desaparecia pela porta, ela ficou paralisada por um momento, o eco de sua advertência ressoando em seu coração. O peso da realeza, as intrigas e as traições dançavam à sua volta, como sombras que a seguiam, mesmo em sua própria casa.

E assim, com o espírito agitado e o futuro incerto, Alyssane caminhou de volta para seus aposentos, onde o silêncio a aguardava como um amigo traiçoeiro, e a lembrança de Aemond a perseguia, como um dragão espreitando nas alturas, sempre presente, mas nunca perto o suficiente.

Mais tarde, com o sol já se pondo, tingindo o céu de laranja e púrpura, Alyssane decidiu que era hora de sair de sua prisão pessoal. Uma pequena vitória, um passo adiante, ao deixar a cama duas vezes em um só dia. Em um movimento hesitante, ela se dirigiu a uma torre, buscando um lugar elevado, onde pudesse observar o mundo abaixo.

Ali, encontrou Alicent, que olhava o pátio de cima, onde os estandartes verdes da Casa Hightower se balançavam lentamente, como se dançassem ao sabor de um vento invisível. A visão dos emblemas familiares a fez sentir um misto de nostalgia e tristeza, um lembrete constante das alianças e rivalidades que moldavam seu mundo.

— Como você está? — Alicent perguntou, sua voz suave, mas carregada de uma preocupação que ressoava em suas palavras.

Alyssane respirou fundo, o peso do luto sobre os ombros, e deixou escapar um suspiro cansado.

— Estou cansada — respondeu, a vulnerabilidade permeando sua voz. — Sinto falta do meu filho.

Alicent suspirou, como se o próprio ar tivesse se tornado denso com a dor da perda.

— Ser rainha não é uma tarefa fácil, Alyssane — disse, os olhos fixos no horizonte, onde o céu se fundia com a terra. Havia uma sabedoria amarga em sua voz, um conhecimento adquirido por meio de batalhas invisíveis.

Alyssane, com as mãos tensas segurando a muralha da torre, começou a raspar as peles das unhas, uma mania que ela não sabia que havia herdado da mãe. As pontas dos dedos ficaram brancas, e a dor serviu como um lembrete físico de seu estado emocional.

— Já notei que não é fácil — murmurou, a tristeza refletida em seu olhar. — Era mais feliz quando não era rainha.

As palavras se arrastaram como o tempo, cada sílaba carregando o peso de sua resignação. O vento suave parecia sussurrar segredos antigos enquanto os estandartes continuavam a balançar. Ela olhou para baixo, para o pátio que havia se tornado um campo de batalhas emocionais, onde as esperanças e os medos se entrelaçavam como raízes de uma árvore antiga.

— O que fazemos agora? — indagou Alyssane, a incerteza na voz. A fragilidade de sua posição se manifestava, e o peso da coroa que não desejava ser sua se tornava insuportável.

Alicent, percebendo a profundidade do desespero da filha, respondeu, mas as palavras não saíram. A solidão da rainha estava latente, e ali, nas alturas, elas compartilhavam não apenas o peso da realeza, mas também o fardo do luto e da perda.

Alicent respirou fundo, seus olhos refletindo a complexidade da situação que enfrentavam.

— Você precisa entender, Alyssane — começou, a voz carregada de uma tristeza pesada, mas firme —, agora você aguenta e continua. É um conselho cruel, eu sei, mas é a realidade. A coroa exige sacrifícios, e o luto, por mais doloroso que seja, não pode ser a sua prisão.

Alyssane observou a mãe, os traços de sua expressão revelando um cansaço que parecia atravessar gerações.

— O mundo não se importa com seu sofrimento — continuou Alicent, com uma sinceridade cortante —. E cada dia que você se permite sucumbir a isso, os inimigos ao seu redor se fortalecem. É um jogo de poder, e você deve ser parte dele, se quiser proteger aqueles que ama.

As palavras de Alicent reverberaram na mente de Alyssane, como ecos de um aviso que ela temia, mas sabia que precisava ouvir. A ideia de continuar, mesmo em meio à dor, parecia uma montanha intransponível, mas a força da mãe servia como um lembrete sombrio de que a fraqueza não era uma opção.

Enquanto as duas mulheres se apoiavam em um silêncio tenso, um mensageiro entrou nos aposentos da torre, seu semblante pálido como a lua cheia em uma noite sem estrelas.

— Minha Rainha — anunciou ele, a voz tremendo —, notícias de Pouso de Gralhas.

Alyssane e Alicent se viraram ao mesmo tempo, os corações pulsando no peito, como se já pressentissem a tempestade que se aproximava.

— Metade de nossos soldados caiu na batalha. Rhaenys e seu dragão foram mortos... Aemond os derrotou.

As palavras cortaram o ar como uma lâmina afiada, e um silêncio pesado se instalou entre elas. Alyssane sentiu o estômago revirar, enquanto Alicent piscava, tentando compreender o que isso significava para seu filho e para o reino.

— E Aegon? — perguntou a rainha mãe, a incerteza tremendo em sua voz.

O mensageiro hesitou, como se as palavras fossem venenosas.

— O Rei... está desaparecido.

Alyssane sentiu uma onda de pânico subir por seu corpo, a imagem de Aegon em meio à batalha, desprotegido e perdido.

— Ele não deveria ter ido — murmurou Alicent, o desespero começando a se infiltrar em sua expressão. — Mandamos ordens para que Aegon não se envolvesse. Ele deveria ter ficado no castelo.

— Ele ainda assim foi a batalha, senhora. — O guarda respondeu. 

A sombra de Vhagar passou sobre a torre, escurecendo o ambiente por um breve momento, como se o próprio dragão estivesse trazido o peso da tragédia. Alyssane olhou para a janela, o coração acelerando, esperando ver seu irmão aparecer, mas a imagem do dragão em meio ao céu nublado trouxe consigo uma sensação de que as coisas não poderiam ficar mais sombrias.

— Aemond... — sussurrou Alyssane, um nó se formando em sua garganta. O que ele tinha feito?

Alicent, porém, manteve a compostura, embora a tensão em seu corpo revelasse a batalha interna que travava.

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