𝟎𝟐𝖝𝟎𝟗 '𝖂𝖔𝖗𝖉𝖘 𝖔𝖋 𝕱𝖎𝖗𝖊 𝖆𝖓𝖉 𝕾𝖎𝖑𝖊𝖓𝖈𝖊'

No abrigo subterrâneo, o ar era denso e abafado, carregado com a tensão de uma noite que parecia não ter fim. Os passos apressados e decididos dos guardas ecoavam nas paredes de pedra enquanto guiavam o grupo através dos corredores estreitos e mal iluminados. Aemond, com uma expressão sombria e os ombros tensos, mantinha Alyssane firmemente guiada à frente dele, sua mão descansando protetoramente sobre o ombro da irmã.

Ao adentrarem o refúgio, o alívio momentâneo de estarem a salvo não diminuía o peso das preocupações que pairavam sobre cada um deles. Alicent foi a primeira a se mover, rompendo o silêncio pesado com um suspiro aliviado quando viu seus filhos a salvo. Ela se apressou até Alyssane, envolvendo-a num abraço apertado, quase desesperado.

— Graças aos deuses, vocês estão bem. — murmurou Alicent, sua voz carregada de uma emoção reprimida. Alyssane, apesar do cansaço e do resquício de febre que ainda tingia suas bochechas, retribuiu o abraço com força, fechando os olhos por um momento enquanto deixava o calor da mãe envolvê-la.

Aemond permaneceu perto, seus olhos vigilantes escaneando o abrigo enquanto sua mente ainda girava com os eventos da noite. Sua atenção só se desviou quando notou Helaena, já presente no refúgio, sentada num canto com as mãos entrelaçadas no colo. Alyssane também a viu, e a tensão em seus ombros se aliviou um pouco ao ver a irmã mais nova segura.

— Helaena! — Alyssane chamou, a voz rouca pelo estresse. Ela se desvencilhou suavemente dos braços de Alicent e se apressou até a irmã, ajoelhando-se ao lado dela e segurando suas mãos trêmulas. — Você está bem? Eu estava tão preocupada.

Helaena ergueu os olhos, a expressão perdida que tantas vezes a marcava suavemente presente. Ela acenou com a cabeça, tentando forçar um sorriso que não alcançou os olhos.

— Estou... estou bem agora. — Sua voz era quase um sussurro, mas havia uma firmeza subjacente, um eco da força interna que as irmãs compartilhavam.

Enquanto as irmãs se reconfortavam mutuamente, Aemond observava em silêncio, seu corpo ainda tenso, pronto para agir a qualquer momento

Alicent olhou ao redor, notando a ausência de Viserys, que estava sendo trazido por outros guardas. Seu olhar encontrou o de Aemond, que apenas assentiu brevemente em resposta à preocupação muda da mãe.

— Aegon... — começou Alicent, mas a voz falhou, e ela não terminou a frase. Aemond sabia o que ela estava pensando e se forçou a manter a expressão neutra. Não era hora para discussões ou recriminações.

— Ele ainda não está aqui — Aemond respondeu finalmente, a voz baixa e controlada. — Mas ele estará.

A resposta era mais para si mesmo do que para qualquer um, uma promessa vazia, mas necessária. Dentro do abrigo, a atmosfera era pesada, carregada não apenas pelo medo, mas pela incerteza do que aconteceria quando finalmente a segurança da noite fosse rompida pela luz do dia.

— Onde está Aegon? — Alicent perguntou, a voz trêmula, quase histérica. Seus olhos buscavam nos rostos dos guardas, como se esperasse que um deles soubesse a resposta.

Aemond, que até então havia mantido uma postura controlada, fechou os punhos, os nós dos dedos brancos de frustração. O desespero de Alicent o irritava, mas não porque ele não compartilhasse da preocupação — era a constante necessidade de proteger Aegon das consequências de suas próprias ações que o enfurecia. Ele não conseguiu se conter.

— Ele está na Casa dos Prazeres, mãe! — Aemond explodiu, sua voz cortando o ar como uma lâmina afiada. O eco de sua voz reverberou pelo abrigo, e todos os presentes se viraram para ele, surpresos com a explosão. A raiva fervia dentro dele, misturada com um ressentimento que ele mal conseguia esconder.

Alyssane, que até então estava ajoelhada ao lado de Helaena, sentiu um frio súbito atravessar seu peito. A revelação de Aemond era como um soco no estômago, mas ela tentou não deixar transparecer a decepção e a vergonha que a inundaram. Sabia que o comportamento de Aegon era uma constante fonte de humilhação para a família, mas ouvir isso em voz alta, especialmente naquelas circunstâncias, a deixou profundamente desconfortável.

Todos os olhares no abrigo se voltaram para ela, como se esperassem uma reação ou uma palavra que aliviasse o constrangimento. Alyssane sentiu o rosto queimar, mas respirou fundo, lutando para manter a compostura. Ela levantou a cabeça, tentando encontrar alguma dignidade na situação.

— Ao menos ele está seguro, então — disse Alyssane, sua voz soando mais firme do que ela realmente se sentia. As palavras saíram com um esforço notável, e embora tentassem trazer algum conforto à situação, elas eram uma admissão velada de algo que todos ali já sabiam: Aegon, seu marido, não estava cumprindo suas responsabilidades, nem como príncipe, nem como marido.

A resposta de Alyssane não fez muito para aliviar a atmosfera tensa. Alicent, ainda em estado de choque, apenas assentiu, incapaz de articular uma resposta. O abrigo mergulhou de volta em um silêncio pesado, quebrado apenas pelo som distante de passos apressados e murmúrios de soldados que se moviam lá fora.

Aemond olhou para Alyssane por um momento mais longo, vendo a tensão em sua expressão, mas sem conseguir dizer nada que pudesse melhorar a situação. Ele sentiu uma onda de arrependimento por ter exposto Aegon daquela forma, mas a raiva e o ressentimento ainda borbulhavam sob a superfície.

A luz do dia já começava a declinar quando o palácio foi finalmente considerado seguro novamente. O ar ainda carregava um resquício da tensão da noite anterior, e as sombras dos corredores pareciam mais longas, como se ainda guardassem vestígios do perigo que havia espreitado tão perto. Guardas extras patrulhavam cada canto, suas armaduras tilintando em um ritmo quase constante, uma prova silenciosa de que o temor ainda não havia se dissipado completamente.

Dentro dos muros de pedra fria, uma longa reunião do conselho real havia consumido a maior parte da tarde. Os filhos de Viserys e Alicent foram mantidos à margem, sem permissão para participar ou mesmo para ouvir qualquer detalhe das deliberações. A portas fechadas, os grandes lordes e conselheiros discutiram sobre o ataque, sobre quem poderia estar por trás dele e, mais importante, sobre como proteger a Casa Targaryen de futuras ameaças. Era um jogo de xadrez político e militar, e nenhum deles era peão ou rei nessa partida — não ainda.

Ao fim da reunião, quando as velas começaram a ser acesas pelos servos nos corredores, Alicent pediu que os gêmeos, Aemond e Alyssane, fossem levados até seus aposentos. O som suave de passos ecoava pelos corredores enquanto eles caminhavam em direção ao quarto da mãe, o silêncio entre eles carregado com a bagagem dos últimos eventos.

Alyssane, apesar de ainda sentir o peso da noite miserável que havia passado, estava se sentindo um pouco melhor. A febre, embora não completamente ausente, havia diminuído para algo suportável, e a dor de cabeça que antes a atormentava havia se tornado um murmúrio distante. Ela usava um vestido simples e escuro, apropriado para a solenidade do momento, e seu cabelo estava preso em um coque que escondia a maior parte do cansaço que ela sentia. No entanto, os olhos dela ainda carregavam uma sombra de preocupação e exaustão.

Aemond caminhava ao lado da irmã, sua postura rígida, como sempre, mas havia algo em seu semblante que sugeria um turbilhão de emoções reprimidas. Ele não disse nada, mas seus dedos se mexiam impacientemente ao lado do corpo, como se lutasse para controlar a inquietação que o invadia.

Ao chegarem à porta dos aposentos de Alicent, um guarda se adiantou e a abriu para eles, inclinando a cabeça respeitosamente. Dentro, a mãe os esperava, sentada em uma poltrona próxima à janela, olhando para o pátio abaixo, onde os últimos raios de sol refletiam nas pedras antigas. Ela parecia cansada, mais do que de costume, com linhas de preocupação marcando seu rosto. Ainda assim, quando viu os gêmeos, seu olhar suavizou, um alívio evidente em seus olhos.

— Meus filhos, entrem — disse ela, sua voz baixa, mas firme, enquanto gesticulava para que se aproximassem.

Alyssane e Aemond entraram, o silêncio entre eles persistindo. Alicent se levantou lentamente, caminhando até eles. Primeiro, ela olhou para Alyssane, e seus olhos percorreram a filha, notando o leve rubor febril em suas bochechas.

— Como está se sentindo, querida? — Alicent perguntou, tocando a testa de Alyssane com uma mão suave, uma preocupação maternal clara em seu tom.

— Estou melhor, mãe — respondeu Alyssane, tentando sorrir.

Alicent assentiu, satisfeita com a resposta, embora ainda preocupada. Ela então se virou para Aemond, seu olhar se tornando um pouco mais avaliador. Havia um misto de gratidão e algo mais profundo em seus olhos, algo que ela não precisava verbalizar. Ela sabia que ele havia protegido Alyssane, mas também sabia que havia muito que ainda precisava ser discutido.

— Eu pedi que vocês viessem porque precisamos falar sobre o que aconteceu — começou Alicent, voltando a se sentar e gesticulando para que eles fizessem o mesmo. — Sobre o que aconteceu e sobre o que pode acontecer a partir de agora.

O tom dela era grave, e os gêmeos entenderam que aquela não seria uma conversa fácil. Enquanto se acomodavam, Alyssane sentiu a tensão aumentar novamente. Aemond, por sua vez, endireitou a postura, preparado para o que estava por vir. A noite miserável parecia estar longe de acabar, mesmo com o nascer do novo dia.

— Sobre o ataque — começou ela, sua voz baixa e controlada, como se estivesse escolhendo cada palavra com cuidado. — Todos os envolvidos foram interrogados. Os guardas, os servos... até mesmo os conselheiros. Tudo aponta que, por ora, estamos seguros. Mas... — Ela fez uma pausa, deixando o peso do que viria a seguir afundar sobre os gêmeos. — No meio dessas investigações, algo foi mencionado, algo que não posso ignorar.

Aemond inclinou a cabeça levemente, já imaginando a direção que a conversa estava tomando, enquanto Alyssane sentiu um frio na espinha, antecipando o que viria.

— Os guardas relataram que você, Aemond, estava no quarto de Alyssane, no meio da noite — disse Alicent, o tom dela se tornando mais incisivo, os olhos castanhos fixos no filho, como se quisesse sondar cada intenção por trás de suas ações. — Sabe muito bem como isso pode ser interpretado.

Aemond endureceu a postura, seus olhos violeta brilhando com um misto de frustração e desafio. Ele estava cansado de ser tratado como se tudo o que fizesse estivesse sob suspeita, especialmente quando se tratava de Alyssane.

— Eu estava checando como ela estava — respondeu ele, a voz firme, mas carregada de uma raiva contida. — Ela estava doente, mãe. E se Aegon estivesse cumprindo seu papel de marido, eu não teria que fazer isso.

Alicent cerrou os lábios, mantendo a compostura, mas o olhar dela se estreitou em uma linha fina de desaprovação. Ela sabia que Aemond não estava totalmente errado, mas não podia permitir que essa atitude continuasse.

— Não importa o que Aegon deveria ou não estar fazendo — retrucou ela, a voz dela afiada como uma lâmina. — Aegon é o marido dela, não você. Há uma linha, Aemond, e você precisa respeitar isso. Se alguém mais tivesse visto... se alguém começasse a falar... — Alicent fez uma pausa, o olhar dela agora mais preocupado do que acusador. — Isso poderia ser interpretado de forma terrivelmente errada. Não só por você, mas por Alyssane também. As pessoas não precisam de muito para começar rumores, e você sabe disso.

Alyssane, que havia ficado em silêncio até então, sentiu o coração apertar com as palavras da mãe. Ela sabia o que Aemond estava fazendo, sabia que ele estava tentando protegê-la, mas também sabia que a situação era delicada.

— Mãe, eu... — começou ela, mas Alicent levantou a mão, interrompendo-a.

— Alyssane, querida, eu sei que ele estava preocupado com você — disse Alicent, suavizando o tom ao se dirigir à filha. — Mas isso não muda o fato de que, aos olhos dos outros, isso não é apropriado. Aegon é seu marido, e ele deve ser respeitado. Mesmo que ele não esteja fazendo a parte dele.

Aemond apertou os punhos, lutando para manter a calma. A ideia de que ele deveria respeitar Aegon quando este estava jogando sua responsabilidade ao vento o enojava. E, pior ainda, saber que Alyssane estava presa a um homem como aquele... era insuportável.

— Não preciso ser lembrado de que Aegon é o marido dela, mãe — ele disse, a voz um pouco mais baixa, mas com um tom afiado. — Eu sei exatamente qual é o meu lugar. Mas não vou ficar parado enquanto ele negligencia Alyssane. Não vou deixá-la sofrer por causa da incompetência dele.

Alicent suspirou profundamente, a tensão entre eles crescendo como uma tempestade iminente. Ela conhecia bem o temperamento de Aemond, sabia que ele era intenso, protetor, especialmente em relação à irmã. Mas isso apenas tornava tudo ainda mais perigoso.

— Aemond... — começou ela, sua voz agora tingida de cansaço e súplica. — Eu sei que você quer protegê-la. Mas, por favor, entenda que há consequências para cada ação, e nem sempre podemos controlar como os outros veem as coisas. Você precisa ser cuidadoso. Alyssane, você também. — Ela olhou para a filha com um misto de ternura e advertência.

Alicent não tinha ideia do quão profunda era a conexão entre eles, da noite que haviam compartilhado um ano atrás, de como aquela linha havia sido cruzada de maneiras que ninguém poderia imaginar. E mesmo que o tempo tivesse passado, aquela lembrança ainda era uma ferida aberta, uma que ambos tentavam esconder, mas que nunca havia cicatrizado de verdade.

Alyssane, que até então mantivera o silêncio, finalmente falou, sua voz suave, mas carregada de tensão:

— Não fizemos nada, mãe — disse ela, tentando manter a calma, mas a defensiva era evidente em seu tom.

Alicent olhou para a filha, a expressão dela suavizando por um momento, mas logo endurecendo de novo.

— Eu sei, Alyssane. Sei que vocês sempre foram conectados de uma forma especial, desde crianças. Mas isso... precisa acabar. Vocês precisam entender que vocês são princesa e príncipe. 

As coisas mudaram. E, por mais que isso doa, você precisa aceitar que agora é uma mulher casada, e Aemond, um homem crescido com responsabilidades próprias.

A tensão no ar era palpável, e antes que Alyssane pudesse responder, Aemond explodiu, incapaz de conter a raiva que fervilhava dentro dele.

— Isso é ridículo! — Aemond disparou, a voz dele elevando-se com uma intensidade que fez Alyssane estremecer ao lado. — Quando eu estava ignorando Alyssane, você brigava comigo, dizendo que eu devia estar ao lado dela, protegendo-a. Agora que eu volto a falar com ela, a cuidar dela, você vem com isso de novo! — Ele apontou um dedo acusador para a mãe, os olhos ardendo de frustração. — Você está louca, mãe. Louca!

Alicent ficou pálida, o choque visível no rosto dela, mas Aemond não parou.

— E quanto a Aegon? Aquele vagabundo irresponsável! — Ele cuspiu as palavras com desdém, o ódio pelo irmão transparecendo em cada sílaba. — Ele não dá conta nem da própria esposa, como é que ele vai dar conta de ser rei? — Aemond sentiu a bile subir na garganta enquanto falava, as palavras cheias de um desprezo que ele não se incomodava em esconder. — E você quer que eu respeite isso? Respeite o quê? A completa falta de responsabilidade dele? 

Alyssane olhou de um para o outro, o coração batendo descompassado. Ela sabia que Aemond estava certo, mas também via o impacto que suas palavras tinham sobre Alicent. A mãe parecia desmoronar lentamente, cada palavra dele atingindo-a como um golpe.

— Aemond... — Alicent tentou falar, mas a voz falhou, subjugada pela dor e pela surpresa.

— Não me peça para respeitar um homem que não merece sequer esse título — continuou Aemond, o tom dele abaixando, mas ainda carregado de veneno. — Eu fiz o que tinha que fazer, e se não fosse por mim, Alyssane estaria desamparada. Não vou me desculpar por isso. Nunca.

Alicent piscou, tentando segurar as lágrimas que ameaçavam transbordar. Aquelas palavras cortavam fundo, não apenas pelo que significavam, mas porque, em algum lugar, ela sabia que havia verdade nelas. O silêncio que se seguiu era sufocante, pesado com todas as palavras que não podiam mais ser retiradas.

Aemond respirou fundo, tentando conter a fúria, mas não conseguiu. O olhar dele era sombrio e cheio de uma intensidade que fazia as palavras dele soarem como uma lâmina afiada.

— Se eu não tivesse estado no quarto dela na noite passada, quando foi invadido, agora Alyssane estaria morta ou violada. — A voz dele era baixa, mas cada palavra saía carregada de veneno. — É isso que você queria, mãe? Que a sua filha fosse deixada à mercê de qualquer um que pudesse entrar naquela porta?

Alicent ficou pálida, a dor evidente nos olhos dela ao ouvir aquilo. Ela abriu a boca para responder, mas as palavras não vieram. Ela sabia que o que Aemond dizia era verdade, mas isso não diminuía o medo que ela sentia pela situação em que todos estavam envolvidos.

— Você realmente quer que eu me afaste dela, mesmo sabendo dos riscos? Mesmo sabendo que o próprio marido dela não estava lá para protegê-la? — Aemond continuou, a voz dele tremendo de frustração. — Eu sou o único que realmente se importa com ela, o único que faria qualquer coisa para mantê-la segura. E você quer me condenar por isso?

Alyssane sentiu o coração apertar com as palavras dele, mas ela também percebeu a tensão que aumentava entre eles. Alicent, por mais que tentasse manter a compostura, estava à beira de um colapso, as palavras de Aemond atingindo-a com uma força devastadora.

— Eu... eu não queria... — Alicent começou, mas a voz dela falhou, e as lágrimas finalmente rolaram pelas bochechas dela.

Aemond deu um passo para trás, ainda respirando pesadamente, como se as emoções dele estivessem em ebulição. Ele olhou para Alyssane, a expressão dele suavizando por um momento ao encontrar os olhos dela, mas logo endureceu de novo quando se voltou para Alicent.

— Não vou pedir desculpas por proteger ela. — disse ele, finalmente, a voz firme e resoluta. — E se isso significa que vou enfrentar todos vocês, então que seja. Eu nunca vou abandoná-la, nunca.

A sala ficou em um silêncio opressor, e Alyssane sentiu o peso da tensão pairando sobre eles como uma tempestade iminente. As palavras de Aemond haviam sido um golpe duro, mas elas também carregavam uma verdade inegável. E, enquanto Alicent tentava recompor-se, Alyssane percebeu que, independentemente do que acontecesse, a dinâmica entre eles nunca mais seria a mesma.

Aemond saiu da sala em um acesso de raiva, os passos firmes e decididos ecoando pelos corredores de pedra. Alyssane observou a porta se fechar atrás dele, sentindo um nó apertar em sua garganta. Ela queria correr atrás do irmão, mas sabia que seria inútil tentar acalmá-lo naquele momento.

Ela voltou-se para Alicent, os olhos cheios de preocupação e tristeza. Queria entender o que se passava na mente da mãe, queria resolver a tensão que pairava entre todos eles. Mas antes que pudesse dizer qualquer coisa, Alicent, ainda abalada, levantou a mão em um gesto de cansaço.

— Não, Alyssane, não agora. — A voz dela estava baixa, quase exausta. — Vá verificar se Aegon já voltou para o castelo.

As palavras soaram frias e impessoais, como se Alicent quisesse se afastar de tudo aquilo, incluindo a própria filha. Alyssane hesitou por um momento, mas percebeu que insistir só traria mais dor para ambas.

Com um aceno silencioso, ela saiu da sala, sentindo-se mais sozinha do que nunca. As palavras de Aemond ainda ecoavam em sua mente, a raiva dele, a dor de Alicent, tudo misturado em uma tempestade de emoções que parecia impossível de resolver. Agora, ela tinha que enfrentar outra realidade amarga: encontrar Aegon e lidar com a decepção que ele representava, mais uma vez.

Alyssane vagava pelos corredores do castelo com um peso crescente em seu peito, o vazio de sua busca infrutífera por Aegon aumentando sua angústia. As sombras da noite se adensavam à medida que ela decidia ir ao único lugar onde ainda podia encontrar um pouco de paz: o Dragonpit.

A escuridão envolvia o Dragonpit, um refúgio de pedra e mistério, onde as escamas e as chamas se misturavam com o silêncio das paredes antigas. A imenso caverna, habitado por dragões, parecia o único lugar onde Alyssane ainda se sentia minimamente livre e forte. Cada passo seu era guiado por uma necessidade de se conectar com Aetherion, seu dragão, a única criatura que sempre a compreendeu sem palavras, sem julgamentos.

Alyssane sentiu a onda de calor familiar que emanava dos grandes corpos escamosos. O som dos dragões, seus rugidos baixos e o bater de asas, ressoava no ar. Ela caminhou até o compartimento onde Aetherion estava, e a visão de sua grande criatura a encheu de um alívio inesperado.

Aetherion, com suas escamas de um azul profundo que refletiam a luz das tochas, estava agora muito maior do que na última vez que Alyssane o viu. Ele rugiu ao sentir sua presença, o som retumbante ecoando pelo salão. Alyssane parou, a respiração pesada, tentando acalmar o dragão, que parecia agitado com a sua chegada.

Ela se aproximou com passos suaves, estendendo a mão para acariciar o lado da criatura. Aetherion, percebendo o toque familiar, começou a se acalmar, suas enormes narinas flutuando no ar com um som profundo de contentamento. Alyssane sentou-se ao lado dele, sentindo as vibrações do dragão enquanto ele a reconhecia e se adaptava à sua presença.

Acariciando o dragão, Alyssane fechou os olhos por um momento, mergulhando na sensação de segurança que Aetherion proporcionava. Aqui, ela não era apenas uma peça em um jogo de intrigas e desilusões, mas uma parte de algo mais grandioso e primordial. As preocupações do mundo externo pareceram se dissipar, se transformando em um sussurro distante.

O dragão continuou a emitir um som baixo e contínuo, como se estivesse respondendo à sua tristeza com uma promessa silenciosa de proteção. Alyssane sentiu lágrimas escorregarem por suas bochechas, mas não havia mais dor. Com Aetherion ao seu lado, ela encontrou um espaço para respirar, para se recompor e, de alguma forma, se preparar para enfrentar as realidades cruéis que ainda estavam por vir.

 Alyssane sentiu uma presença familiar. A lamparina que Aemond carregava lançava uma luz suave sobre as paredes de pedra, lançando sombras dançantes ao redor. Ele se aproximou com passos cautelosos, os olhos fixos nela, enquanto o brilho da lamparina iluminava seus traços intensos e seu olhar resoluto.

Alyssane ergueu o olhar para ele, sua voz tingida de cansaço e expectativa. 

— Você vai embora de novo? — perguntou, sua voz quase um sussurro no meio da quietude.

Aemond, com uma expressão que misturava determinação e ternura, balançou a cabeça. 

— Não — respondeu ele, sua voz grave e firme. — Eu não vou. O que eu disse sobre sempre estar por perto para protegê-la não era apenas um voto em vão. É uma promessa que eu levo a sério.

Ele era um homem de ações mais do que palavras, sempre dedicado ao que fazia. O montador do maior dragão vivo, o mais inteligente e o melhor lutador. A ambição dele pelo trono era conhecida, mas em momentos como este, Alyssane via o lado mais pessoal e profundo dele, aquele que estava disposto a tudo por ela.

Aemond se aproximou, suas mãos fortes segurando gentilmente a cintura dela. Ele a levantou com um movimento cuidadoso, seus dedos transmitindo um calor familiar e reconfortante. Aetherion, acostumado com a presença de Alyssane, se agitou inesperadamente, um rugido baixo e inquieto ressoando no ar.

Alyssane percebeu a agitação do dragão e se voltou para Aetherion, repetindo algumas palavras em Alto Valiriano para acalmá-lo. 

— Lykiri. Lykiri Aetherion. Fique tranquilo, Aetherion — ela murmurou, seu tom firme.

A agitação do dragão era nova, uma reação incomum comparada à aceitação tranquila que normalmente demonstrava quando Aemond estava por perto. Talvez, pensou Alyssane, os dragões percebessem de alguma forma a conexão especial entre eles, como se fossem um reflexo um do outro. Vhagar aceitava Alyssane com facilidade, assim como Aetherion parecia ver Aemond como uma extensão de Alyssane.

— Alyssane — começou ele, sua voz carregada de uma urgência palpável e uma emoção que ele dificilmente demonstrava. — Vá embora comigo.

— O que você está dizendo, Aemond? — Ela o olhou, um misto de surpresa e dúvida cruzando seu rosto. 

— Eu não posso suportar não estar perto de você do jeito que eu quero. Não consigo aceitar o jeito que Aegon te trata, como se você fosse apenas uma opção e não a rainha que você deveria ser.

— Quando Aegon tomar o trono de Rhaenyra, eu serei a rainha, Aemond.

 — Aegon será um rei de merda. Você sabe disso tanto quanto eu. Se você concordar, pegaremos os dragões e conquistaremos outros reinos, onde você poderá ser a rainha de onde quiser.

—  Isso é traição à coroa. — Ela olhou para ele, o choque e o medo misturados com uma faísca de esperança.

 — Não importa. — A palavra caiu da sua boca como um feixe de luz cortando a escuridão. — O que importa é você. E eu não posso ficar aqui, sabendo que você está presa a um homem que não merece sequer o seu olhar.

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