Te vi corar...


— Pedro que tu tem? — Mariana tentou abordar o primo que passava a mão nos cabelos, num gesto ainda irritado. — O Lucas andou respondendo? Não precisa descontar na Celina, né. Já pensou se ela faz uma loucura?

— Meu Deus! Você tem uma capacidade de supor coisas que eu nunca vi.

— Calma cara! — Rodrigo era sempre o conciliador. Tentou acalmar o primo da namorada e fez um sinal pra ela ficar calada. — Eu acho que o Pedro anda carregado demais. O seu João e o Bruno tão cagando pra ele e sobrou todo esse peso aqui... Olha Pedro sabe que amigo não é só reunir pra fazer churrasquinho, se eu posso ajudar me diz. A Mari, o Diego... O pai. A gente só não quer que tu fique assim.

— Tô nervoso, Guigo. Não estou tendo paciência pra namoro e a mulher fica em cima me cobrando e achando que não me esforço pra ficar um tempo junto, só fala de casar e casar e casar...

— Toda mulher pensa nisso, né!

— Eu sei, Mari, mas olha se o Guigo tá se fodendo com contas atrasadas, mãe doente, pai que deu um pé no rabo de toda a família e o Bruno que foi pegando de grão em grão e deve hoje um milhão e quatrocentos mil pro pai.

— Porra! Como ele fez isso? O tio não quebrou?

— Terrenos que ele vendeu... Máquinas, os dois caminhões, a casa onde ele mora que o pai vendeu pra ele e não recebeu, o galpão que ele construiu e não pagou o empréstimo.

— Mas... não tem como cobrar? Cobra ele e pede que ajude com a tia. Pra ele é mais fácil, tá numa cidade maior.

— A mãe e a Lorena se odeiam. Eu nem cogito isso, sabe. Vou cuidar da mãe, porque ela não merece ser jogada ou mal tratada.

— E o Lucas? Manda ele morar com o avô.

— Olha Mariana. Nem te respondo.

O clima ficou tenso demais para acontecer aquele jantarzinho de sábado e Lucas ainda "velava" dona Sandra que andava recebendo medicações mais fortes e antidepressivos que contribuíam para que tivesse longos períodos de sono.

— Psss... — Pedro fez um som pra chamar a atenção do jovem. — Tá tudo bem?

— Me deixa quieto.

— Eu ando de cabeça quente.

— Eu também. Vou morar com o opa.

— Vai nada. Para Lucas. Não vai aguentar a mulher dele. Olha, vou conversar com a Preta e pagar um salário pra ver se ela limpa aqui, faz comida e lava as roupas.

— Com que dinheiro?

— Entrou uma parcela do caminhão velho. Vou pagar os empregados e um pouco de conta que tá protestado. Depois converso com ela. E tem aquele dinheirinho que te dou todo mês que atrasei.

— Ainda bem né!

— Uia, que esse bicho não deixa barato. Vou aumentar um pouquinho tá.

— Acho bom. Se fosse pagar uma pessoa e assinar a carteira era mais caro.

— Vou fazer a tua e assino, só deixa eu dar essa respirada, alemão. Tá mais calmo agora?

— Eu? Não. Se tu tá falando do que aconteceu hoje a tarde, não tô! Achei bem chato, tá. Eu não posso ter amigos? Eu não vou ficar morando aqui o resto da vida.

Aquilo irritava Pedro de forma visível, pois suas narinas chegavam dilatar e ele repetia o cacoete de passar a mão no cabelo. Depois saiu do quarto e foi achar algo pra se entreter, e pelo resto do final de semana, ele e Lucas se alfinetavam por coisas bobas.


Um mês se passou e dona Sandra reagiu um pouco. Preta, uma sessentona cheia de energia que se amasiou com o seu Werner, avô de Lucas, aceitou limpar a casa duas vezes por semana, mas deixou claro que queria dinheiro na mão toda semana e Pedro estranhou aquela cobrança desnecessária. Voltou a entrar receitas de vendas e Pedro optou por priorizar o pagamento da folha, encargos, impostos e depois os insumos que não podiam faltar. Por último, ele passou a quitar o que estava protestado para recuperar o crédito.

— Ohhh tio Nelsinho. Chega aí...

Pedro estava operando uma máquina de moer milho para transformar em ração para as vacas e parou com a chegada do irmão mais novo de sua mãe.

— Mas olha esse piá, que cavalão dum homem. — Tio Nelsinho era um homem muito alto e seu apelido foi dado por gozação. Era um colono forte no extremo oeste e que não dispunha de muito tempo para visitar o resto da família. — A Sandrinha, tá "melhorinha" guri?

— Tá tio. Essa semana começou uma enfermeira que fica meio período. O pai e o Bruno não estão me ajudando e ficou difícil pra contratar antes, tio.

— Só te dando uns "laçaço" no lombo, mas me ligue e peça. A gente se ajuda, depois me devolve quando tá mais folgado. Eu soube pela Frida, que tu tava com crise. Teu pai tá por lá, em São Miguel e disse que deixou tudo em ordem aqui. O homem tá só fazendo merda e vai se quebrar...

— Nem fale, eu tô pagando uns pecados, tio. Mas se precisar eu peço mesmo. Negociei dois bens do ativo da empresa e consegui desmembrar mais uma parte da fazenda lá perto da rodovia. Esse dinheiro vai ajudar a pagar umas taxas da obra do prédio da mãe que o pai deu na separação...

— Vendeu imobilizado, piá? Mas não faz isso.

— Uma máquina e um caminhão velho. E vou negociar aquele trator que tá parado. — Pedro apontou para um trator agrícola.

— Deixa eu ver a véia e "despois" "nóis" conversa. Aquele alemãozinho bagunceiro ainda mora aí?

— Ah o Lucas? Sim tio. Tá um homem feito, tem dezesseis. Meu Deus, quando foi a última vez que o tio viu ele?

— Vi ele bem pequeno e depois quando tinha uns treze pra quatorze. Mas eu já queria adotar aquele gurizinho. Nós nunca tivemos filho, porque a Nilza não engravidava e ficamos pra vô direto.

Depois de risadas e de acomodar o casal de tios, Pedro saiu a caça do Lucas que tinha sumido a manhã toda e o achou em seu quarto arrumando o próprio guarda roupas.

— Ah! Que susto.

— Tava escondido? Tem visita. O tio Nelsinho.

Lucas saiu correndo pra abraçar umas das poucas pessoas que o trataram bem na infância, foi educado e agradável com eles e até recebeu convite pra morar junto com o casal.

— Depois que o Pedro se ajeitar, eu acho que vou mesmo. Lá tem faculdade?

— Mas claro, piá. Se for morar com a gente, te ajudamos. — Tia Nilza sempre teve vontade de ter filhos e gostava do rapaz.

— Mas olha uma coisa dessa... Vem fazer visita e querem roubar meu menino. — Pedro brincou com eles, mas parecia preocupado de verdade. Lucas desviou o rosto, mas não conseguiu esconder o quanto estava corado. — Aqui também tem faculdade, né, Lucas.

O rapaz não respondeu e bem no seu íntimo se sentiu um pouco vingado pelo dia de cinema frustrado. Pedro parecia ter medo que ele fosse embora, mas se acostumaria, pois tinha uma namorada naquele vai e volta que sempre voltava...

...Então passaram-se três meses e Celina não voltou. Pelo que ficaram sabendo, ela estava até saindo com outra pessoa e tiveram certeza quando Pedro recebeu um envelope com a aliança dentro.

— Gente! Hahaha... ela terminou por carta? — Lucas estava com um sorriso tão grande que não conseguia fechar a boca e isso irritou o mais velho que passou o sábado longe de casa. 

Mariana revezava com a Preta e com a dona Frida, uma parente do seu Werner, que se compadeceu com dona Sandra quando a viu e também com Lucas que estava radiante por ter como obrigação, apenas um final de semana por mês como cuidador.

As pessoas não se revezavam pela questão financeira, mas para fazer companhia a uma pessoa que definhava por falta de carinho, falta de atenção e o próprio ócio forçado, que foram consequência da falta de coordenação motora, perda de musculatura e da força nos braços.

Dona Sandra andava bem mais animada e até sorria quando dona Frida passava duas manhãs e duas tardes inteiras falando igual a um papagaio perto dela. E como isso foi bom.

Pedro não estava totalmente recuperado financeiramente, pois seu pai havia tirado muito do capital que estava no CNPJ do agronegócio deles, para injetar na construtora. Por isso, Pedro ainda não cantava vitória e acautelava-se de todas as formas.

Bruno lentamente se achegava com a desculpa de que sentia saudade da mãe e trazia os filhos para amolecer o tio Pedro e a vó, que com razão andava sentida com ele. Lorena não aparecia, pois não perdoava a sogra por coisas ditas no calor das discussões entre ambas. Seu João ligava apenas para o Pedro e se oferecia pra ajudar, chegando a prometer que um dia faria uma visitinha pra apresentar uma namorada que tinha se achado e na hora, o filho sentiu aquele cheiro de coisa errada. Aconselhou apenas para tranquilizar a própria consciência, mas deixou que o pai se lascasse. Isso era algo que ele se negava em absorver.

Depois do verão, finalmente Pedro deu aquela respirada e chamou Lucas.

— Ei alemão, se ajeita que vamos fazer a carteira pra te registrar.

— Sério? Nossa! Quero uns três mil por mês.

— Vai te cagar! Começa a me explorar pra ver se não te registro só pra te demitir. Seu ruinzinho. Leva esse dinheirinho pra Preta, pra ela nem ficar me cobrando e chama o vô para assinar a folha.

— Tá! Seu explorador.

O mais velho deu uma gargalhada e quando Lucas passou, deu-lhe um tapa na bunda, costume que ambos tinham quando passavam um pelo outro.


— Preta, ó o Pedro mandou o dinheiro da limpeza.

— Só isso?

— A senhora que combinou com ele, vai lá e reclama, comigo não adianta. Ah e assina o recibo.

— Pra que isso, parece que ele não confia na gente.

— Ele, eu não sei, mas eu não confio. Na aula, eles explicaram que não tem como provar que pagou, se não tem recibo. Opa, é pro senhor ir lá falar com o Pedro.

— É o pagamento?

— Preta, eu não sei o que é. — Lucas respondeu seco, como era do seu jeito de ser e não reparou no rapaz que conversava com seu avô e que lhe parecia tão familiar

— Oi tudo bem? Ihh nem lembra de mim. O Naldo. Arnaldo. Lembra?

— Ah oi! Lembrei sim... a Preta é tua tia, nem tinha me ligado. Tá passeando?

— Sim, o pai ainda trabalha aqui, o seu Aldo.

— Ah... Mas então tá, depois a gente conversa. Tchau.

Arnaldo era um rapaz de vinte e seis anos, cabelos pretos e crespos, meio gordinho, sorridente, educado e encantou Lucas com isso. O alemãozinho genioso, ariano e insociável na infância estava tornando-se homem e com certeza também encantaria alguém.

Lucas e Pedro, tinham se distanciado um pouco, afinal eram tantas pessoas que de repente passaram a se interessar por dona Sandra, que eles dois puderam ter mais espaço pra si e entre si. O jovem estava confortável, mais maduro e pronto pra se permitir ter alguma paixãozinha, mas tinha receio em deixar alguém se aproximar demais...e decidiu esperar por algo forte e certeiro.

Naldo estranhamente, vinha mais seguido a fazenda e Pedro notou.

— De novo aquele cabeludo por aí? É o filho do Aldo, né.

— Aham... ele mesmo. É tão querido. Pessoa fofa.

— Quê? — Pedro usou um tom alto e rude. — Já disse que não tolero essa coisas. Vai se esfregar num macho quando ir morar longe daqui. Na minha casa nem pensar!

— Eu vou embora, seu grosso. — Lucas subiu correndo e chorando. Fazia tanto tempo que não chorava que não viu motivos pra segurar naquele dia. Mas Pedro foi atrás arrependido de ter dito aquilo e por razões que ele não entendia, imaginar Lucas com um homem lhe parecia grotesco.

— Olha... Para... solta isso. — Pedro tirou a bolsa das mãos do rapaz e o apertou num abraço tentando acalmá-lo. — Desculpa.

— Vai a merda. Me solta. Eu nunca mais quero te ver. Já é a segunda vez que fala assim. Eu não tenho culpa tá. Sou desse jeitinho, você disse pra Mariana que tinha percebido.

— Eu? Olha, Lucas eu não comentei por mal. É que eu não ligo, mas não acho certo. Nem sei...

— Pede desculpa já!

— Perdoa, Lucas. Me perdoa. Não vou dizer isso nunca mais. Não pode ir embora. Tu vai onde? Vai morar com a Preta?

— O teu tio Nelsinho.

— Vai nada. O Pedro não deixa. Lembra que você era o neném do Pedro?

— Era!

—  Desculpa, não sei porque estourei desse jeito, desculpa.

Lucas se acalmou e olhos nos olhos do mais velho, sentindo que estava no mesmo nível de confusão.

— Desculpo. Mas te dou um chute no saco na próxima vez. Eu gosto de você, mas não fica dizendo essas coisas. Não consigo falar contigo sobre essas coisas. 

— Lucas, não me sinto confortável, mas não vou mais falar dessa maneira grosseira. Não fica com raiva, por favor.

— Perdoei, mas ainda tô brabo.

— Chato! Perdoou ou não? Perdão é esquecimento, sabia?

— Eu nem disse nada. Tá me solta. — Pedro ainda não o tinha soltado de seus braços.

— Lucas, eu não posso te prender aqui, mas eu não quero que saia. Não tem porque. Vai morar de favor em outra casa? Então fique aqui.

Pedro estava certo, mas Lucas era alguém que guardava rancor e somou aquelas coisas negativas que o mais velho já lhe dissera... Estava anotado.

— Não vou embora. Mas pensa bem antes de me tratar como uma puta. Fique sabendo que só beijei uma vez e sou vir... eu nunca fiz aquelas coisas.

Lucas corou forte, uns cinquenta tons de vermelho. Pedro também ficou todo errado e completamente sem assunto. Coube a ele sair do quarto do mais novo antes e apenas cuidar de sua vida, sentindo que seu menininho estava crescido e em algum momento voaria pra longe ou ele teria que suportar vê-lo se relacionar com alguém.

Os ventos que passaram por aqueles meses não deixariam muita coisa no lugar... Só que eles ainda não sabiam.

...

Oioioi!!! Hoje eu tava acabadinho e peguei no sono, kkkk Mas enfim, estou postando o que está pronto. 

Esse romance (logo) terá hot, então já estou avisando que vou mudar a "classificação" para conteúdo adulto. 

Amanhã que já é hoje, não, dia 15 já termino um trecho do próximo e posto.

Muitos kisses e vou responder os comentários agora, babando no note. hehe... :D

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