Te beijei...


Antes que Pedro pensasse em responder, Lucas concluiu:

— Tem um dia pra pensar. Me busca na escola amanhã e me responde.

O jovem era imaturo sobre o que consistia um relacionamento e o mais velho tinha certeza que aquele beijo colocou muitas esperanças na cabeça do rapaz. Ele não queria esperar vinte e quatro horas pra responder porque a ansiedade ia perturbar a ambos e a resposta de Pedro estava pronta. Amava Lucas, mas não poderia lhe proporcionar o que lhe pedia.

— Não dá pra aceitar esse tipo de condições. Eu tô errado em te proibir de "ficar" com alguém.

— Tá já entendi. Não fala mais nada.

— Não é assim que funciona. Eu te beijei, mas não vamos namorar. Imagina se isso é certo, já pensou? Eu tô falando como o cara que ajudou na tua educação, que te carregava no colo quando tu chorava, que arrancou um dente seu que tava balançando, que te ensinou a limpar a tua bunda e sacudir o pinto depois de "usar"... você é como se fosse meu filho, meu irmão, Lucas eu não posso mudar doze anos de relacionamento fraternal e num dia te olhar com desejo.

O rapaz mordia a boca pra segurar o queixo trêmulo e viu racionalidade naquelas palavras, só que seus sentimentos eram ainda fortes.

— Ei, alemão... Não chora. — Pedro parou o carro dentro da porteira da propriedade e puxou o rapaz contra o seu corpo, esquecendo que esse gesto agora causaria uma reação diferente no jovem. Mesmo assim ele precisou consolar Lucas como fez por muito tempo na infância desse. Não foi um choro ruidoso, foi sentido e acalentado pelo abraço, afagos nas costas e beijo no topo da cabeça. — Tá mais calmo? Responde sem ser malcriado.

Lucas caiu na risada, ainda com os olhos molhados.

— Entendi. Mas você tá proibido de namorar. E outra coisa, não vou facilitar pra você. — Lucas ameaçou.

— Hum?

— É, você entendeu muito bem.

— Lucas...

— Me beijou e eu tenho certeza que vai beijar outra vez e depois vem com essa desculpa de que tá confuso. Presta a atenção, Pedro, eu não vou facilitar.

— Não tô entendendo é nada, mas não se preocupa que não vai acontecer tá. Depois, a mãe tá em casa, tá cheio de visita, o Bruno também veio e sossega o facho. Eu saio de uma loucura e entro em outra.

— Culpa sua.

— Me desculpa?

— Não! Tá pisando demais na bola comigo. Me beijou só porque sabe que gosto de meninos. E me aparece com mulher em casa pra ver.

— Olha lá...

— Olha lá, você.

Pedro lembrou de uma namoradinha que teve no passado, Amabile, que era fissurada em signos e de quando ela lhe dissera que arianos são aqueles que sempre dão a última palavra. Nunca coube melhor em alguém. Ficou ali com o braço apoiado no volante e passando a mão no cabelo, todo nervoso, estando totalmente incerto do que respondera ao Lucas. Olhou de esguelha para o rapaz que mastigava um chiclete e mexia no celular, então desviou o olhar para o campo onde as vacas pastavam durante o dia inteiro. A noite clara de lua cheia em meados de abril e os postes que ele colocou na estradinha, permitiam visualizar bem as árvores, o relevo de suas terras, as casas onde alguns empregados moravam...

— Vai dormir aqui dentro da caminhonete?

— Eu tô todo errado Lucas. Cansado. — Dito isso, deu a partida no carro e logo estava em casa. — Olha a folga do Bruno... Usou minha garagem pro carro dele.

— Normal, ele só pensa em si.

Lucas não estava tão recuperado do beijo e da rejeição, por isso buscava constantemente fica sozinho em seu canto. 

Bruno passou a buscar mais o contato com a família e sugeriu levar sua mãe com ele assim que ela estivesse mais forte. Dona Sandra havia regredido e muito, com o terceiro AVC e aquilo motivou Pedro a ligar ao seu tio Nelsinho para pedir um empréstimo, dando um trator novo como garantia.

— Tio, vou ter que pôr um profissional em tempo integral...

— Nem precisa me explicar, piá. Eu ajudo e a gente se entende, se acerta quando dá.

Depois da conversa, Bruno todo irritado e ofendido se intrometeu, chamando a atenção de seu irmão diante de alguns parentes.

— Esperou todo esse tempo, porque não pediu antes. Até eu te ajudava. Agora que a Lorena aceitou cuidar da mãe, tu pra não dar o braço a torcer, prefere contratar alguém.

— Se tu queria ajudar, teve chance antes. Se é pra jogar a mãe na mão da Lorena, antes eu mesmo cuido dela.

— Tá achando que ela vai fazer alguma coisa contra a mãe?

— E porque ela disse pra Mariana que a mãe tá fazendo "hora extra"?

— Eu não ouvi isso.

— Só ouve o que é conveniente.

Por uns dias, Pedro e Bruno sob o mesmo teto, não se entendiam mais então o irmão mais velho acabou voltando para a sua casa. Na verdade muita gente sobrara quando duas cuidadoras foram contratadas revezando entre si a jornada de trabalho e escala de folga. 

Lucas teve mais tempo pra ajudar Pedro com assuntos administrativos que podiam ser incumbidos a ele, como pagamento de contas, recebimentos de pequenos bens que precisavam ser conferidos, ajudava até mesmo na contagem de estoque dos insumos e baixa nos pagamentos lançados num sistema que o mais velho conseguiu adquirir. Dava pra ver no rosto do jovem o quanto se sentia importante ao ter funções que não fossem o serviço doméstico e principalmente por ficar o tempo todo com o Pedro.

— Pedro o Naldo comprou um carro e chamou pra dar uma volta, posso?

— Não! Não tenho namorada e tu também não vai ter.

— Hahaha, ai meu Deus... dá até dó de você. Quem falou em namoro, o cara é, não é... ele é hétero.

— Tanto faz. — Pedro conferia dentro de uma caixa que parecia com um cooler, os frasquinhos no tamanho de uma ampola com sêmen congelado que seria usado pelo veterinário doutor Tarcísio.

— Ai, o doutor Tarcísio vem por isso  nas vacas?

— Hahaha, sim. Vai inseminar, Lucas. Já viu como faz?

— Já e quase vomitei, não quero saber. Tchau!

O jovem saiu do escritório que ficava ao lado do grande galpão do maquinário e foi em casa tomar um copo de água e comer algo. 

Uns três minutos mais tarde, Pedro também foi tomar um café. Depois aproximou-se do jovem e num gesto tão natural abraçou Lucas por trás e cafungou seu cabelo, notando que o jovem prendeu a respiração.

— Pedro não me abraça assim... — Lucas usou o tom mais manhoso que podia em sua voz. — Depois, fica me dizendo que não adianta eu me iludir.

Pedro relutou em soltar o corpo do rapaz magricelo, comeu duas bananas e saiu de dentro de casa sem dizer nada. 

Lucas usou o banheiro e olhou-se com atenção no espelho. Era tão diferente de Pedro, com seus traços de beleza clássica, lábios cheios, nariz bem feito, cabelos louros de tom escuro, sempre cortados bem curtos e penteados para o lado como Pedro fazia desde que ele era pequeno, seus olhos escuros e verdes, a barba tão rala que tornava o barbear algo quase dispensável. Era bonito para padrões ditados. Já o Pedro era quase bruto, peludo, barbudo e entroncado, isso lhe conferia um aspecto de homem mais velho, cujo rosto não era o que comumente, acham bonito. Mas atraia Lucas e o despertava a lascívia com mais frequência.


— Opa... tá passando bem? — Pedro estranhou sua demora, reparando o rosto corado.

— Tô.

— Olha aqui... tá pensando ainda? A gente conversa um pouco quando tu voltar da aula... tá.

— É aquilo?

— É. A gente senta e conversa. Agora que tem uma cuidadora de noite a gente pode dar uma volta.

Antes Pedro nem tivesse prometido, porque Lucas ficou o dia inteiro ansioso.


— Robinho, encosta a carteira aqui. — Lucas queria ouvir a opinião de alguém que tinha sua idade que era mais descolado e não era mais virgem.

— Fala Princesa da China!

— Hã?

— Lesadinho, fala... hahaha. Tu é branco demais pra ser minha "mulher".

— Eu juro que um dia entendo essas besteiras que tu diz. Que mulher?

Demorou até que Lucas conseguisse dar uma explanada rápida no assunto.

— Lucas! — Fabiano era o mais escandaloso das "maninhas" como chamavam a si, naquele pequeno grupo. — Gente, que é esse macho?

— Nem adianta Fabi, o Lucas não fala o nome. Deve ser coisa da imaginação "perva" dele. Depois que começa a "piscar" miga, já era.

Lucas obteve conselhos imaturos e ficou agradecido quando seus amigos acharam que o macho fortão era produto de sua imaginação, pois jamais associariam o Pedro a quem entendiam por irmão do Lucas, como sendo esse cara. Nada deu pra aproveitar daquela conversa, pois jamais se portaria das formas vulgares que foram sugeridas. Era ariano e se fosse pra seduzir um cara, imaginava-se um pouco melhor que as dicas aconselhadas.

Como era costume, Pedro lhe aguardava fora da escola na caminhonete branca. Quando entrou, Lucas sentiu todo o corpo responder de forma instintiva ao macho que viera lhe buscar. Pedro havia aparado bem a barba, estava de cabelo cortado, penteado e úmido, seu perfume fresco e mais forte, denunciavam que ele recentemente tinha se banhado.

— Tá com fome?

— Ah não. Onde a gente vai?

— Nem sei. Só queria mesmo rodar um pouco e pegar um vento na cara. Quer um sorvete?

— Pedro, eu não quero comer nada, quero conversar. O que a gente tinha que conversar?

— Tá... vou achar um lugar tranquilo. Hahaha... aqui nessa cidade tudo é tranquilo né... É mais difícil achar um lugar que não seja. Ah espera...

Lucas deu uma risadinha, mas estavam sem graça e tão sem propósito. Ou será que o mais velho queria ficar um pouco sozinho com ele? Isso trazia ao corpo jovem, arrepios, calor e sensibilidade em várias partes de seu corpo.

Pedro dirigiu até uma parte da fazenda onde ficavam algumas cabeças de búfalo. Quando o carro parou... houve silêncio e dois caras ainda presos pelo cinto de segurança olhando para fora, sendo possível ver alguns relampejos, que avisavam uma chuva que poderia cair logo mais. Pedro respirava pesado e Lucas sentia o cheiro do corpo do homem.

Loucamente, Pedro se soltou do cinto, puxou Lucas de forma brusca e colou sua boca na dele. A barba áspera arranhava o rosto macio, os dentes apenas mordiam, a saliva era sugada com desespero e Lucas gemeu com manha puxando o homem mais velho pelo pescoço que desceu as mãos para lhe tirar o cinto e puxá-lo para seu colo. Não havia silêncio, havia o respirar que saia com notas graves de voz e os gemidos incontidos do jovem, som de beijos, sussurros manhosos, quase ronronados, a fricção dos jeans deles que roçavam as virilhas...

O som de um "boom" estrondoso de um raio fez Lucas levar um susto e sair do colo de Pedro.

— Porque tá fazendo isso? Só de curiosidade?

— Ah não começa. Eu tô passando por cima de tudo que me ensinaram nessa vida como o certo pra estar aqui contigo, não fica me julgando mais do que as pessoas quando souberem disso.

— Tá me pedindo pra namorar? — Lucas abriu o maior sorriso.

— Ei, se acalma. Lucas o meu pai, o Bruno, a mãe... toda a família e parentes não aprovam esse tipo de coisa e não dá pra assumir "isso" assim... Pensa na confusão que tá na minha cabeça.

— Problema seu. Foi tu que me beijou aquele dia, eu tava bem na minha. Tá confuso, né? Pode até ficar confuso, mas nada de me beijar outra vez se não namorar comigo.

— Para que ficar impondo.

— Pedro... — Lucas falou baixinho, se aproximando feito um gato caçador. — Meu beijo é gostoso?

O escuro não deixou o jovem notar, mas fora Pedro que corou dessa vez.

— Sim...

— Quer mais um? Bem gostoso... — Lucas montou no colo de Pedro que reagiu, tendo uma ereção indiscreta. — Hummm...?

— Sim...

— Então me pede em namoro!

— Não vem com essa.

Lucas desmontou e cruzou os braços.

— Tô com sono.

Aquela súbita provocação de Lucas deixara o mais velho atordoado, que claramente estava duro feito uma rocha e isso levou o par de olhos bonitos a descerem àquela região. Podia estar corado, mas Pedro dava o que ele queria ou nada feito.

*****************************************

Gente hoje adiantei um bocado desse conto  e não respondi todos os comentários. Mas dou um jeitinho. Vou dormir.... 

Beijos e carinho. Estou vestido de sono.

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top