Capítulo VI

Um feixe de luz começou a crescer dentro da caverna estrelada; quando deu por si, Tarnin estava em um jardim estonteante, de flores sortidas e gramado verdejante. Lindos arbustos esculturais envolvia uma delicada fonte jorrando água da montanha incessantemente.

A luz das estrelas dava às flores uma tonalidade prateada e o breu celeste tinha algo envolvente que o jovem Finra jamais vira em sua existência. Parecia acolhedor e, ao mesmo tempo, misterioso. Como se estivesse mais próximo e ao mesmo tempo esconso aos matizes terrenos.

À frente, Tarnin avistou palácios elevados de pedras alvejadas e luzes de tom ocre pontilhando as infinitas janelas arredondadas. As torres se perdiam nas alturas desafiadoras, mergulhando no céu como se fossem flechas de um grande arco. De fato, ele havia encontrado a lendária cidade de Gonomle.

Passou pelo portão e avistou estátuas de pássaros e dragões esculpidas na mais fina precisão. Ninguém andava pelas ruas de pedras perfeitamente encaixadas. Estavam todos nas torres mais altas para admirarem a noite estrelada.

Aquela era especial. Dizem que nunca o manto noturno esteve tão pontilhado como na vez em que Tarnin subiu a cordilheira. Ele pensou no reino de Finshares e Nethal e sentiu tristeza. Estavam sob a tempestade e não podiam desfrutar de tamanho espetáculo.

Ainda que a rainha Haia das florestas e o rei Dunah dos mares ostentassem as mais belas vestes e as mais finas joias dos grandes reinos, nunca teriam a chance de comtemplar tão majestoso céu. O verdadeiro tesouro estava acima das nuvens.

Tarnin adentrou o palácio do reino perdido e viu pilares a perder de vista em uma galeria com imensas janelas de vidro estampando a noite. As tochas nas paredes eram refletidas pelo chão polido, e enquanto o rapaz caminhava por aquele ambiente, por um instante, pensou estar flutuando.

Depois de muito andar pela gigantesca galeria, o jovem Finra chegou a um grande salão arredondado com teto de cristal transparente e esculturas prateadas estampadas nas colunas. Pôde avistar um trono com semelhantes traços aos afrescos e um velho de cabelos extremamente brancos sentado nele. Sua barba era igualmente esbranquiçada e sua roupa refletia uma lembrança quase esquecida a Tarnin.

A capa de seu livro, enegrecida com um grande círculo prateado no meio, era exatamente como as vestes do longevo sentado ao trono. Em sua cabeça, um chapéu pontudo, como dos antigos magos das florestas.

Tarnin então se ajoelhou diante do ancião contemplativo da noite estrelada e quebrou o silêncio ecoando sua voz por aquele imenso salão.

— Majestade?!

O velho que olhava para cima com imensa paixão nos olhos acordou de seu transe com uma piscadela e um movimento repentino com a cabeça. Tratava-se do rei Thurinles, da grande cordilheira de Gonomle e de todos os Giales que nela habitavam, portador dos segredos do vento e das grandes torres seladas, senhor das aves e dos cânticos do entardecer.

— Quem és tu, que deixas de contemplar a grandiosa noite dos séculos do mundo? — disse ele com voz de trovão.

— Sou Tarnin, Finra das grandes florestas de Finshares! — respondeu com certo pavor de levantar os olhos ao rei.

— Há muito não recebemos viajantes. Nosso povo se isolou do mundo quando descobriu os tesouros do céu. O que fazes aqui para interromper a noite de Thurinles, filho das estrelas e conhecedor dos segredos da montanha?

— Venho pois o mundo não é mais o mesmo de outrora. Os povos das florestas e dos mares estão enfrentando uma tempestade devastadora que vai destruir todos os reinos. Inclusive o de Gonomle. Venho implorar a sua ajuda para acabar com a tormenta que avassala o nosso tempo.

— Tempo? — disse o rei. — Os Giales não sabem mais o que é tempo. Há muito o nosso único desejo tornou-se o de subir mais alto para avistar as estrelas de perto. Subimos tanto que não mais pudemos ir além. E desde então uma melancolia oprime nosso povo. Consegues ver alguém por aqui? Não! Pois todos estão nas grandes torres comtemplando os astros desta noite histórica. Não mais pertencemos a este mundo, meu caro. Pertencemos às estrelas e elas cintilam nos chamando a adentrar a noite sem fim. Este mistério está sem solução nas páginas de nossos livros. Podes resolver isto, jovem das florestas?

— Não só posso como vou! — Tarnin então tirou a pérola dos mares e o cristal das terras férteis de seu alforje e mostrou-os ao rei. — Farei com que todos os Giales encontrem as estrelas!

Saiu do palácio e subiu ao pináculo da mais alta torre de Gonomle. Lá pôde ver antigas escrituras que falavam a respeito de um astro prateado que iluminava todas as noites em fases de um ciclo interminável. Tinha o formato da pérola das profundezas secretas de Nethal e o brilho do cristal das florestas sagradas de Finshares.

O rapaz colocou-os no pedestal que ali se erguia e leu as palavras dos antigos profetas escritas no livro esquecido. Nesse instante, um estrondo rasgou as entranhas da terra. Um vento forte soprou incessantemente junto aos tremores que se seguiam por toda parte.

As montanhas ganharam vida e ascendiam ao breu do infinito céu. De seu trono, o rei Thurinles viu as estrelas se aproximando e lágrimas eram estampadas em sua face. Em toda sua vida havia esperado por este momento. Gonomle subia e se desprendia das raízes terrenas. As bases das montanhas se descolaram e ganharam forma arredondada. O círculo ia subindo e dissipando as nuvens da tempestade perpétua.

Tarnin também percebeu que não fazia mais parte daquele mundo. Lá debaixo os reinos avistaram tamanho espetáculo de luz no céu. A tempestade se extinguiu e os mares foram controlados novamente.

No firmamento o místico astro imperava soberano nas noites sem fim. Ora em sutileza, ora absoluto. Mas sempre presente fazendo a memória de quem trouxera harmonia aos povos da terra, que se uniram na emoção do espetáculo noturno daquele breu histórico.

O jovem Finra de Finshares se tornou o desbravador da tempestade, e durante uma miríade de décadas todos falavam de seus feitos para dissipar a terrível intempérie. O astro formado nunca mais deixou os céus, permanecendo numa eterna dança com as estrelas. Àquela noite a lua fora criada a partir da coragem e audácia de alguém que encontrou nas páginas de um exemplar a razão de sua existência.

Os livros de história agora levavam o nome de um  Finra das florestas de Finshares, responsável por iluminar as noites sombrias com um grande círculo no firmamento, que agora inspirava corações repousantes na mais pacífica tranquilidade de estações fabulísticas, tudo iluminado pelo brilho prateado do reino que repousava em alento nas noites sem fim.

"1112 palavras."

Bạn đang đọc truyện trên: AzTruyen.Top