Capítulo 5 - O Reencontro
Marjorie ia ter seu primeiro encontro logo na festa de desencalhe de Santo Antônio. Disse que ia virar devota, já que o Santo havia arrumado um encontro pra ela mesmo antes de ela fazer promessa.
- Ceci, o santinho sabe que eu sou braba e, como não queria ficar de castigo, se antecipou e me arrumou um encontro.
Ela era uma figura. Eu amava aquela garota!
- A cidade está cheia.
- Vai ter barraca com todo tipo de comida, bebida, até bingo vai ter. Ah, e também vai ter sertanejo universitário. Pista pra dança country! Acho que é melhor marcar esse encontro pra depois da festa. E se ele for grudento? Marquei bobeira.
- Também acho. Eu vi que vai ter fogueira e quadrilha também.
- Para todos os gostos.
As duas caíram na gargalhada.
- A gente tem também que tocar na imagem do santo, se não você não vai desencalhar e meu encontro não vai vingar.
- Para de ser boba, garota. Vou tomar banho.
Duas horas depois, as duas saíam de casa bem no estilo country: calça jeans justa, botas cano alto, camiseta justa. Ceci levava um cardigan de pelinhos e Marjorie, chapéu na cabeça.
Ceci lembrava as festas de Santo Antônio mais simples. Essa parecia mais uma superprodução.
Bem, o santo merecia.
Pararam na barraca de caipifruta.
Cada uma pediu um drinque – um com sidra, outro com vodca. Ficaram lá vendo o vai e vem das pessoas e conversando até que Gérson chegou.
- E aí, meninas. Estão se divertindo sem mim? Não pode! Pra empatar, vou comprar uma cerveja. Vem comigo, Marji?
Ceci zoou:
- Marji?
- Pode parando. Marji é bonitinho.
Marjorie virou para Gérson.
- Olha, não quero deixar minha prima sozinha.
- Nada disso! – Ceci foi falando – Pode ir se divertir. Eu tô muito bem. Qualquer coisa, a gente se fala por mensagem, ok?
- Tem certeza?
- Meninas, se vocês quiserem a gente fica por aqui e depois podemos assistir a dança country e finalizar com o show. Que tal?
Ceci balançou a cabeça.
- Não, não, não. É sério, eu estou bem. E, depois, não vou aguentar ficar até tarde aqui. Acho que mais uma horinha e vou embora.
- Tudo bem então, prima?
- Claro! Vai se divertir.
Marjorie e Gérson formavam um belo casal. Cheios de tatuagens e bom humor. Saíram pela noite de Santo Antônio coladinhos um no outro.
Ceci
Saí pela festa com um drinque na mão.
Santo Antônio já havia passado e eu nem consegui chegar perto. Na verdade, eu nem tentei. Era tanta mulher querendo tocar no santo. Eu não sabia que tinha tanta moça procurando sua alma gêmea a ponto de apelar para o santinho.
As ruas estavam fechadas para os carros. Os bares abertos e lotados. Alguns estavam tocando música ao vivo. Foi num desses que eu parei na entrada. Lá dentro não tinha mais lugar pra sentar. Gostei da música
Mulher de Fases
(DIGÃO; RODOLFO, 1999)
Eu estava amando aquela energia toda da alegria das pessoas.
Quando a música acabou, resolvi dar mais uma volta antes de ir embora. Foi quando passei por um bar cheio de motos na frente. Como os outros, estava cheio. De repente, vi os irmãos Cavalero – Anabela, Rafael e Ele.
Without Your love
And if I ever wonder away
Too far
You'd come looking for me with
Open arms
I could forget my home
Be like a rolling stone
But who would I be
Without your love
(DALTREY, 1980)
Estanquei no mesmo lugar.
Meu coração disparou, minha boca secou, minhas pernas fraquejaram. Pensei que ia desmaiar.
Ingenuidade a minha achar que poderia chegar a não dar de cara com ele. Eu estava querendo era me enganar. Por mais que fosse rico e poderoso, Rio das Almas ainda era a cidade dos Cavalero.
Eles estavam com uma turma, conversando alto, bebendo. Ele estava abraçado a uma loira muito bonita. Ela falava no ouvido dele e beijava seu pescoço.
Antes que eu pudesse desaparecer dali, Anabela me viu.
Ela saiu do meio deles, sem ser notada e veio em minha direção. Não falou nada, só me abraçou com tanta força, com tanto carinho. Meus olhos encheram de lágrimas. Eu também não falei nada. Ficamos na calçada abraçadas por um tempo.
Ela me soltou, mas continuou segurando na minha mão.
- Eu achei que estava tendo uma visão. – Ela estava chorando – Que saudade!
Abraçou-me mais uma vez e eu correspondi ao abraço com a mesma intensidade.
Neste momento, eu senti o olhar dele. Me controlei pra não olhar pro lado do bar. Foquei em Anabela; ainda assim, sentia todo o peso daquele olhar em mim.
Meu coração de novo disparou, minhas pernas de novo fraquejaram.
- Você quer...
Notei que ela ia me chamar pro bar, mas travou. Olhou pra onde eles estavam e meu olhar acabou acompanhando o dela. Foi minha perdição.
Nossos olhares se cruzaram e o mundo parou.
Estênio
Malu jogou o cabelo pra trás e aninhou a cabeça no meu ombro. Chegou perto do meu ouvido e disparou:
- Hoje a noite é nossa.
Deu um risinho rouco e beijou o meu pescoço. Ela sabia me deixar ligado. Eu sorri de volta, sabendo que a noite prometia.
- Malu! – uma amiga chamou.
- Amor, eu já volto. Não sai daí, hein.
- Depois do que você me prometeu pra esta noite?! Claro que não!
Ela saiu rindo e rebolando.
Gostosa.
- Cadê Anabela? – perguntou Rafael.
Johnny apontou pro outro lado da rua.
- Olha ela ali com uma gatinha.
Todo mundo olhou, inclusive eu.
Cecília...
Eu não deveria ter olhado.
Fiquei sem ação.
Putz! Eu não acredito!
- Linda pra caralho! – Johnny era um idiota!
Eu ia arrancar a cabeça daquele puto, se ele não calasse a boca.
Ela não estava olhando pra mim. Prestava atenção no que minha irmã falava.
Eu senti que Rafael se aproximou de mim, mas eu não conseguia tirar os olhos dela.
Uma necessidade cresceu dentro de mim como um monstro. Eu queria que ela olhasse pra mim.
Olha pra mim!
Eu a queria atormentada como eu estava naquele instante.
Louco, desnorteado.
Olha pra mim! Porra!
Anabela falou algo e olhou na nossa direção, o que fez com que ela olhasse também. Nossos olhares se cruzaram e foi como se eu tivesse voltado dez anos atrás. Como se nada tivesse mudado desde a última vez que nos vimos.
Isso foi foda!
Ceci
Eu acho que foram segundos de transe, onde tudo a nossa volta congelou. Nenhum dos dois conseguia disfarçar o choque. Eu sentia que dele vinha raiva, mas eu devolvia com ressentimento. Tanto conflito em segundos. Daí, a loira voltou, abraçou-o por trás e ele se virou pra abraçá-la também, cortando qualquer conexão entre nós dois. Ele não se virou mais pra mim em nenhum momento. Aquilo doeu. E não era pra doer. Depois de tanto tempo, achei que estava vacinada de qualquer mágoa ou de qualquer coisa que viesse dele. Eu me enganei redondamente.
- Anabela, eu vou passar uns tempos aqui na cidade. Estou na rua das Flores. Uma casa branca com muro baixinho. Vai me ver. Vou te dar meu celular.
Anabela não era boba. Sentiu todo o clima e concordou em me encontrar depois.
- Tudo bem, Ceci.
- Eu preciso ir, mas vamos ter muito tempo pra saber uma da vida da outra.
Trocamos telefone; depois, nos abraçamos e nos despedimos. Ela voltou pro bar e eu fui pra casa.
Chorando, chorando, chorando.
Estênio
Quando Anabela entrou no bar, sozinha, eu me segurei pra não olhar pra trás. Cecília estragou minha noite e nem Malu ia conseguir me animar. Fiquei mais um tempo no bar aturando os olhares preocupados de Rafael e os especulativas de Anabela, até que enchi a paciência. Decidi ir embora; mas não sem antes ceder ao irracional.
Sussurrei ao ouvido de Anabela:
- Depois, você vai me dizer onde ela está.
Nem dei chance de resposta.
Montei na moto com Malu e fui embora.
Ia ser difícil aquela noite.
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Raimundos. Mulher de Fases. Disponível em
Roger Daltrey. Without your love. Disponível em
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Oi, leitores queridos.
O destino preparou uma armadilha e jogou-os de volta ao início.
Cabeça para cima e muita coragem para encarar um grande amor do passado.
Curtam e comentem.
Bjs
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