CAPÍTULO 40


Quando o almoço estava quase chegando ao fim, o senhor e a senhora Walters pediram licença e se retiraram da mesa explicando que tinham uma reunião via chamada de vídeo com uma representante internacional da Walters Grife. Em resposta, eu e os rapazes nos despedimos com alguns sorrisos e acenos de cabeça educados, ao passo em que Charles visivelmente relaxou em sua cadeira. Ele sempre ficava tenso na presença da mãe dele; isso era algo que todos nós já tínhamos percebido. Alison, por sua vez, estava com a testa levemente franzida, parecendo perdida em seus pensamentos. Eu queria tocá-la e perguntar o que estava errado, mas ela tinha se sentado muito longe de mim para que eu pudesse fazer isso.

— Alis? — eu indaguei em voz alta, meu chamado atraindo a atenção do trio de amigos sentado conosco e fazendo com que ela sacudisse a cabeça atordoada antes de me encarar. — Está tudo bem com você?

— Claro que sim. Por que não estaria? — ela respondeu, mal erguendo os olhos na minha direção antes que seu telefone vibrasse em cima da mesa com a chegada de uma nova notificação. O que quer que fosse, Alison passou quase um minuto inteiro encarando a tela do aparelho em suas mãos antes de se levantar de sua cadeira com um sobressalto, ato que pegou a todos nós de surpresa. — Desculpem, meninos, mas surgiu um problema com a minha equipe de dança que eu tenho que resolver o mais rápido possível.

— O que aconteceu? — Charles perguntou.

— Alguém quebrou a perna? — Loren tentou adivinhar.

— Não é nada com que vocês tenham que se preocupar — ela murmurou, dando a volta na mesa para seguir em direção à porta que dava para o interior da casa, hesitando por um instante: — E não, Loren, felizmente ninguém quebrou a perna — acrescentou, dando um tapa na cabeça dele, que estava sentado ao meu lado.

Aproveitei a proximidade para puxá-la para perto.

— Você precisa de ajuda? Quer que eu vá com você? — ofereci, segurando seu pulso com delicadeza.

Alison não respondeu de imediato, o que significava que ela tinha ponderado sobre pedir que eu a acompanhasse. No fim, ela apenas abriu um sorriso minúsculo e disse:

— Não. Como eu disse, não é nada com que vocês devam se preocupar — repetiu, dando um tapinha em meu ombro antes de se distanciar e caminhar até a saída do deque. — Aproveitem para colocar o papo em dia. E comam a sobremesa por mim.

— Pode deixar — Sebastian assentiu, com a boca já cheia de pudim de chocolate. — E boa sorte com o problema da sua equipe.

— Obrigada — e com um último aceno, ela simplesmente foi embora.

Franzi a testa, confuso com aquela despedida tão fria e impessoal. Alison mal tinha sorrido. E tinha respondido à minha pergunta como se estivesse falando com todos nós ao mesmo tempo. Como se eu não passasse de um amigo qualquer.

Ela só estava com pressa, disse a mim mesmo, tentando ignorar a sensação estranha que havia se formado em meu estômago.

Loren me dá uma cotovelada.

— "Oh, doce e majestosa Alison, única em minha vida e em meu coração, você precisa da minha ajuda? Quer que eu vá com você, ó minha rainha? Quer que eu lamba os seus sapatos?" — ele zombou, arrancando sorrisos divertidos de Charles e Sebastian. — Per l'amor di Dio, fratello mio. Passo dois meses longe de você e puft!, você vira o capacho oficial da Alison, perguntando se ela quer que você vá com ela quando na verdade é você que está implorando para ir junto. Só o que falta é ela te comprar uma coleirinha e te levar pra passear dentro de uma das bolsas dela como se você fosse um cachorrinho.

Dou a ele o segundo tapa do dia, acertando sua cabeça com força suficiente para fazê-lo pender para frente.

Cazzo, Zaden! Sua mão é pesada, seu merda — meu amigo grunhiu, irritante e dramático como sempre.

— Foda-se — eu disse, apenas.

— Pelo visto, todos vocês ficam temperamentais quando arranjam uma namorada — Loren alfinetou, olhando sugestivamente para Sebastian, que o ignorou enfiando mais uma colher de pudim na boca.

— De acordo com a minha irmã, não existe namoro nenhum entre ela e o Zaden — Charles comentou, pegando sua própria porção de sobremesa.

Sinto meu coração gelar.

— Alison disse que não namoraria comigo? — perguntei, aflito.

— Ela não disse que não namoraria com você. Só disse que vocês dois não estão namorando — Chuck especificou, estreitando para mim dois olhos verdes repletos de seriedade. — O que me faz questionar o porquê você estava todo cheio de liberdade beijando minha irmã no quarto dela quando ainda nem sequer a pediu em namoro.

— Ih, caramba... Se eu fosse você teria cuidado, Zaden — Loren me cutucou. — Parece que o Charles tá pronto pra descer a mão na tua cara. Bem que eu desconfiei que dar em cima da irmã de um amigo não era lá uma das suas melhores ideias — se voltando para Sebastian, ele acrescentou: — Seb, eu estou contando com você para chutar a bunda dos dois caso haja alguma briga. Já está mais do que na hora de você mostrar pra gente o potencial da sua faixa preta no taekwondo.

— Eu adoraria ser útil, Loren, mas estou meio cansado hoje. Acho que se o Chuck e o Zaden quiserem sair na porrada, você e eu vamos ficar só assistindo.

— Para ser sincero, essa opção me parece bem mais atrativa mesmo — o italiano disse, se recostando relaxadamente em sua cadeira. — E aí, quem vai iniciar o primeiro round? Chuck ou Zad?

Com apenas um revirar de olhos, Charles o ignorou completamente, mantendo sua atenção em mim:

— E então, Zaden?

— É bem óbvio que tenho intenção de pedir Alison em namoro, apesar de não saber direito como fazer isso depois de já ter me declarado pra ela tantas vezes. Acho que deveria ter pedido primeiro e depois me declarado. Talvez eu tenha invertido um pouco a ordem das coisas. Ou não — fiz uma careta, sem conseguir formular uma linha firme de raciocínio. — Sebastian, me ajuda aqui. Como você e a Amélia começaram a namorar?

— Eu não fiz um pedido espalhafatoso ou algo do tipo, se é isso que você está esperando ouvir — meu amigo foi logo dizendo, um sorrisinho besta já nascendo no canto do seu rosto só de falar da namorada. — Eu já era apaixonado por ela há muitos anos, então só fiz de tudo para me certificar de que ela soubesse como eu me sentia. Amélia tem um grande problema em acreditar que é importante para as pessoas, por isso que, apesar de eu ser totalmente óbvio, levou alguns meses até eu convencê-la de que faria de tudo por ela. Quando finalmente consegui, não perdi tempo e já fui logo apresentando ela como minha namorada para todo mundo que eu conhecia.

Loren ergueu uma sobrancelha.

— Resumindo: você praticamente obrigou a garota a namorar com você — ele concluiu.

— Ei, também não foi assim...

— Dessa vez eu vou ter que concordar com o Loren — eu interrompi a desculpa esfarrapada de Sebastian pela metade. — Você nem a tinha pedido em namoro e já foi logo apresentando ela como sua namorada pra toda a família. Tímida do jeito que é, a coitada da Amélia claramente ficou com vergonha de dizer que não.

— Ela não ficou com vergonha...

— Para mim parece bem plausível que ela tenha ficado — Charles comentou, com um aceno de cabeça.

Sebastian arfou, ultrajado.

— Eu estava com medo de pedir diretamente e ela dizer que não, ok?! Amélia já tinha passado meses me enrolando, por isso tive que tomar uma atitude... E querem saber? Vocês nunca nem tiveram uma namorada, então quem são pra me julgar? — desdenhou, gesticulando com descaso em nossa direção. — Vamos voltar a falar do que realmente interessa, que é de como o Zaden vai pedir a Alison em namoro.

Contive um gemido de desespero.

— Boa sorte, fratello mio — Loren murmurou, enquanto dava alguns tapinhas em minhas costas. — De tantas garotas mais fáceis de agradar pelas quais você poderia ter se interessado, foi logo se apaixonar pela Ali. Bem capaz de você pedi-la em namoro e ela passar duas horas em silêncio só escrevendo todos os pontos negativos e positivos da sua proposta em um caderninho de anotações.

— Isso é a cara dela — Sebastian riu.

— Vocês não estão ajudando — enfatizei, só para o caso de eles não terem percebido.

— Você conhece a Alison muito bem, Zaden. Tenho certeza de que vai pensar em alguma coisa — Charles falou, pegando sua taça de pudim. — E de que vai pensar rápido.

— Caramba, Chuck. Você encarnou bem demais o papel do irmão mais velho carrasco — eu apontei. — Como alguém que também é irmão mais velho, devo dizer que você tem o meu respeito. No entanto, como futuro namorado da sua irmã, quero mandar você ir se ferrar.

Ele gargalhou.

— Você deveria me agradecer por estar pegando leve.

— Ah, claro, claro. Muito obrigado — ironizei, arrancando risadas de Loren e Sebastian, que logo em seguida começaram a tagarelar sobre como os últimos shows da turnê tinham sido uma completa loucura.

Eu estava tão entretido pela volta dos rapazes e pela nossa conversa que só me lembro de ter deixado o telefone desligado quase uma hora depois, quando Loren me pede para ver o post que ele tinha me enviado sobre uma fã que havia tatuado o nome dele na bunda. Assim que reinicio o aparelho, uma onda de notificações repleta de mensagens e ligações não atendidas do meu pai preenche a tela, e me lembro do motivo pelo qual eu tinha desligado o celular em primeiro lugar.

Instantaneamente, todo o meu bom humor se esvai e qualquer vestígio de riso desaparece em minha garganta. Leio uma mensagem de mamãe dizendo que tenho que estar em casa para o jantar de boas vindas de Zaya e desejo ter ao menos um pretexto bom o suficiente para não aparecer. Não estou pronto para encarar meu pai e fingir que está tudo bem. Eu não quero fingir. Mas também não quero arruinar tudo.

Solto o ar com força, tentando me acalmar.

— Zaden? — Sebastian chama o meu nome, me fazendo erguer o olhar em sua direção. — Aconteceu alguma coisa?

— Você tem parecido estranho desde que a gente chegou — Loren adicionou, com aquele seu tom cuidadosamente despretensioso. — Quase não fez nenhuma piada e mal riu das minhas.

— Está tudo bem com a sua família? — Charles pergunta, levantando a questão de forma tão certeira que sinto vontade de xingá-lo, de xingar a todos os meus três melhores amigos por me conhecerem tão bem ao ponto de passarem meses sem me ver e saberem que algo está errado comigo com apenas algumas horas na minha presença.

Ao invés disso, eu engulo em seco e conto toda a verdade para eles. Falo de tudo o que descobri sobre o meu pai, desde a sua traição até o filho ilegítimo que ele vinha escondendo de todos nós por só Deus sabe quanto tempo. A decepção em minhas palavras deixa um gosto amargo em minha boca e o meu coração apertado dentro do peito, mas consigo segurar as lágrimas. O choque e o sentimento de culpa infundado que eu estava sentindo quando me abri com Alison a respeito da situação agora já tinham desaparecido; ela tinha feito com que eu passasse a enxergar tudo de modo mais racional e entendesse que eu não tinha responsabilidade nenhuma pelos atos do meu pai. Tudo o que havia restado era a chama de uma tristeza raivosa que queimava lentamente, à espera do momento de sua explosão.

— Não sei o que vou fazer — digo, com sinceridade. — A família sempre foi tudo pra mim. Vocês sabem disso porque são minha família tanto quanto aqueles com quem compartilho o sangue. Eu faço tudo o que posso para nos manter unidos, mas não posso encobrir as mentiras do meu pai. E sei que assim que eu contar tudo, nada será como antes — encaro minhas próprias mãos, desolado. — Zelina, Zaya e eu podemos ser maiores de idade e ter nossas próprias vidas, mas Zara e Zoe ainda são crianças. Eu não quero ser o responsável por desestruturar o mundo delas.

— Eu entendo que você queira protegê-las, Zaden, mas elas merecem saber a verdade. Será muito pior se elas continuarem vivendo num mundo de mentiras — Sebastian disse, a compreensão em sua voz aplacando parte da ansiedade em meu estômago. — Independente do que acontecer, você vai ter feito a coisa certa.

— Se eu fosse as suas irmãs, eu nunca te culparia por falar a verdade — Charles falou, apertando meu ombro. — Eu só te respeitaria ainda mais por ter escolhido ser tão corajoso.

— E justo — Loren acrescentou, gravemente. — Você está dando a sua mãe a escolha de decidir o que fazer a respeito da traição do seu pai, coisa que ele nunca teve culhão o suficiente pra fazer por ela. E foda-se o resto; o que quer que você faça, eu vou estar do seu lado.

Olhei para ele, grato por seu apoio. Esse idiota rabugento com que eu sempre podia contar.

— Quer saber de uma coisa? Acho que esse é o momento ideal para um dos nossos abraços em grupo — Sebastian anunciou, se levantando de sua cadeira e contornando a mesa até estar parado à minha frente. — Vamos lá, meu guitarrista derrubado. Essa turnê não foi nem de longe o que teria sido se você estivesse com a gente.

— Odeio dar motivos para o Zaden se gabar, mas é a mais pura verdade — Charles inclinou a cabeça em concordância. — O guitarrista substituto não te fez jus.

— Ele tocava bem, mas era meio feio — Loren zombou, bagunçando o meu cabelo. — Não dava pra fazermos uma dupla de impacto. Eu monopolizava toda a atenção.

Eu ri, embasbacado, ficando de pé para me igualar ao bando de imbecis que eram os meus companheiros de banda, meus melhores amigos e irmãos de vida.

— Seus merdinhas — resmunguei, me juntando a eles em um dos nossos tradicionais abraços em grupo, daqueles que eram tão apertados que quase te sufocavam. Era levemente doloroso, mas não tinha nada melhor do que um desses para te dar firmeza. — Obrigado.

Não pude deixar de agradecê-los, mesmo que minha gratidão fosse grande demais para caber em apenas uma palavra.

🎸


Mensagem Recebida de Kimmie:

Alison, é urgente. Eu estava saindo da sala da Redação do Davencrown's Journal quando vi a Professora Brunet conversando com Alina na saída da Diretoria. Não pude ouvir tudo, mas ela estava dizendo algo sobre as suas notas na matéria dela estarem baixas demais para que você representasse o colégio no Festival de Arte anual. Achei que você deveria saber. Tomara que Alina não dê ouvidos a ela e você não acabe se prejudicando.

Beijos, Kim.

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