CAPÍTULO 14

Depois de dar uma dura nas meninas pelo comportamento nada digno que tiveram ao se pendurarem em Zaden para não deixá-lo sair, prossegui com a aula sem mais imprevistos. Como de costume, nos aquecemos, tivemos um curto momento para dançarmos em estilo livre e então comecei o trabalho de verdade ao avaliá-las e ajudá-las a aperfeiçoar suas posições na execução do plié e relevé, que dependiam um do outro para serem efetuados. Logo em seguida fomos para o tendu e então para o treino dos saltos do jeté, que exigiam muita técnica. Enquanto as assistia, fui fazendo anotações mentais quanto ao desempenho de cada uma delas, para que pudesse fazer comentários a respeito mais tarde.

A verdade era que ser a professora de balé daquelas crianças demandava uma grande responsabilidade: elas estavam comigo há quase um ano e eu dava o meu sangue para ensiná-las tudo o que pudesse antes que o colégio terminasse e não houvesse mais como eu ser uma voluntária assídua no centro comunitário. Eram um grupo de dezesseis meninas – o que era um número consideravelmente grande, já que o balé era uma atividade que exigia muito foco e dedicação – e, surpreendentemente, todas elas tinham muito talento. Eu sentia muito orgulho por tê-las guiado até onde estavam agora e me partia o coração pensar que em apenas alguns meses teríamos que dizer adeus.

— Tchau, senhorita Walters! Até a próxima aula! — Tatiana exclamou, acenando antes de correr até seu pai, que já estava esperando por ela na portaria.

— Até! E não esqueça de praticar em casa o que aprendeu na aula! — acenei de volta, com um sorriso, observando-a se afastar.

— Parece que tudo correu bem depois que eu fui embora — Zaden disse, chegando de fininho atrás de mim, a proximidade de sua boca com o meu ouvido fazendo com que eu estremecesse levemente com o arrepio que percorreu minha nuca.

Me viro para encará-lo de imediato, para que ele não tenha a chance de fazer de novo.

— Sim, foi tudo tranquilo — abri um sorriso que desejei com todas as forças que não demonstrasse o meu nervosismo. — Obrigada de novo por ter lidado tão bem com o surto das meninas e por ter saído quando pedi. Sei que foi meio chato, mas era necessário.

— Não se preocupe. Fiquei ajudando a Helena na recepção e ela me contou várias fofocas envolvendo os seus colegas voluntários — ele disse, pondo a mão ao redor dos lábios e baixando o tom de voz daquela maneira característica de quem está prestes a confiar um segredo: — Sabia que a Victoria do segundo andar está grávida? E que descobriu logo depois de ter pego o marido traindo-a com a melhor amiga?

Me aproximei dele, boquiaberta, também baixando o volume da voz:

— A Victoria que é professora de música? — indaguei, chocada.

— A própria. — Zaden assentiu. — Também fiquei revoltado com a notícia. A coitada estava realmente apaixonada por aquele canalha.

— Estava mesmo — concordei, antes de franzir a testa, erguendo o olhar para o dele. — Mas por que é que você está falando como se a conhecesse? Ela nem deu aula hoje!

— Por favor, Alis. Você me subestima — ele disse, cheio de presunção. — É claro que pedi pra Helena me mostrar fotos. Pobre Victoria — lamentou. — É bonita, mas provavelmente não muito inteligente, porque cai entre nós, quem é que se casa com um homem feio daqueles?  — fez uma careta de desgosto. — Isso sem falar sobre aquela barbicha ridícula de adolescente que acabou de entrar na puberdade.

Sufoquei uma risada.

— Não é?! Dá muita vergonha alheia — balancei a cabeça, lembrando dos cinco fiapos de barba que o marido traidor de Victoria exibia orgulhosamente em seu queixo. — Espero que ela peça o divórcio. Ela merece coisa bem melhor do que aquele traste nojento.

— Também acho — Zaden assentiu, indicando um ponto à nossa frente, onde a recepcionista do centro comunitário acenava para nós dois com uma bebida na mão, tomando seu lugar atrás da bancada. Acenei em resposta, com um sorriso simpático. — Bem, parece que a Helena já voltou com o café que tinha ido buscar, o que significa que estou oficialmente liberado da minha curta carreira como assistente de recepção. Nós vamos embora agora ou você ainda tem mais alguma coisa para fazer?

— Não, eu já finalizei a aula que tinha para dar — falei, me encaminhando para a saída do prédio. — E como Max não está para te entrevistar e você já preencheu a sua ficha de inscrição, acho que não temos mais nada a fazer aqui hoje.

— Legal — ele disse, tirando o celular do bolso para conferir a hora e erguendo o olhar para mim logo em seguida: — Já que estamos saindo mais cedo do que o previsto, o que você acha de irmos tomar um sorvete antes de voltarmos para casa? Aquele de creme de avelã com amendoim que você gosta?

Por um segundo, tenho o impulso de perguntar como ele pode ter tanta certeza de que aquele ainda é o meu sabor favorito de sorvete, mas me contenho bem a tempo. Estamos tentando nos dar bem, repito a mim mesma, engolindo em seco. Além do mais, eu não queria correr o risco de ouvir Zaden dizer mais uma vez que não esquecia de nada que fosse sobre mim. Sei que combinamos de sermos agradáveis um com o outro e não levantar nenhum tópico a respeito do passado que tivemos juntos, mas como ele esperava que eu conseguisse fazer isso quando vinha com aquele tipo de coisa sem o menor aviso prévio?

Eu não esqueço de nada que tem a ver com você.

No momento em que o ouvi dizer aquilo, apenas o encarei em silêncio, totalmente pega de surpresa, a garganta queimando com a resposta que eu realmente queria lhe dar.

Eu estou tentando esquecer de tudo que tem a ver com você, então não torne as coisas mais difíceis.

— Vamos, Alison. — Zaden insistiu, tocando meu cotovelo coberto pelo casaco. — Podemos ir naquela sorveteria extravagante que abriu perto daqui. Ouvi dizer que eles fazem umas caldas muito boas. Você adora sorvete com calda.

Suspiro, quase sentindo o gosto doce na boca.

— Mas parece que vai esfriar — falei, indicando o céu acima de nós, que se tornava cada vez mais cinzento.

— E daí? — Zaden fez pouco caso, erguendo as sobrancelhas. — Desde quando o tempo frio te impediu de tomar sorvete? Você é praticamente feita de gelo.

Um sorriso involuntário cresce em meu rosto, porque ele está certo: eu sou uma amante assumida de sorvete. Guardo potes grandes só para mim no freezer de casa, com sabores específicos para combinar com seja qual for o meu mood do dia. Pode estar nevando e congelante do lado de fora, e ainda assim não tiro a colher do pote. É um dos poucos vícios que me permito manter.

Respiro fundo, me dando por vencida.

— Acho que um sorvetinho não vai fazer mal a ninguém... — comecei, ao passo que Zaden já exibia um sorriso vencedor coroado de covinhas em seu rosto irritante. 

 — Sabia que você não iria recusar um sorvete. Além do mais, são só nuvens — ele disse, apontando para cima com o queixo enquanto eu destravava o carro. — Nem vai chover mesmo.


🎸

Vinte minutos depois, Zaden e eu estávamos tomando sorvete dentro do meu carro, parcialmente encharcados pela chuva torrencial que caía do lado de fora do veículo, as grossas gotas de água batendo contra o vidro ruidosamente.

— Nem vai chover mesmo, huh? — eu ri, enfiando uma colher cheia de calda de framboesa na boca, contendo um gemido de apreciação. — Você teve sorte de eu ter levado um guarda-chuva, ou o seu gesso teria molhado inteirinho.

— Fala sério, foi só a gente sair da sorveteria e esse temporal começou a cair — ele resmungou, com o pote de sorvete de baunilha e trufas com calda de chocolate entre as coxas. O observei dar uma colherada grande demais com apenas uma mão livre e levá-la até a boca, a bola de sorvete caindo de sua colher na metade do caminho e manchando sua camisa. — Puta merda.

Deixei meu pote de sorvete no apoio para copo entre os nossos bancos, me inclinando para abrir o porta luvas e tirar um lenço de papel de dentro, oferecendo-o a Zaden sem dizer nada.

— Obrigado — ele murmurou, emburrado, aceitando o lenço que eu estava lhe estendendo. — Não vejo a hora de tirar esse gesso estúpido. Fico parecendo um idiota me atrapalhando todo para fazer uma coisa besta como enfiar a porcaria de uma colher de sorvete na boca. 

Fiquei calada por um minuto, apenas olhando enquanto ele limpava o excesso de sorvete da roupa. Zaden tendia a xingar sem parar sempre que se aborrecia.

 — Eu sei que é difícil estar com o braço imobilizado e não poder realizar tarefas simples do dia a dia sem sentir dor ou acabar falhando, mas você não vai ter que aguentar isso por muito mais. Duas semanas já se passaram. Falta menos de dois meses para você se livrar do gesso — falei, tirando mais um lenço de papel para ajudá-lo. Ele parou de se mexer quando segurei a barra da sua camisa, enquanto eu me movia milimetricamente para não encostar sem querer na pele do seu abdome. — Além do mais, você deveria ser grato; poderia ter sido pior, mas você vai ficar bem. E não precisa se estressar por ter se sujado de sorvete. Isso acontece com qualquer pessoa — terminei de limpar a mancha de chocolate, abrindo um sorriso satisfeito com o meu trabalho. Mal dava para notar.

Zaden suspirou, deixando a cabeça pender contra o encosto do seu assento.

— Você tem razão. Eu poderia ter me machucado muito mais feio do que isso, talvez até definitivamente. Deveria mesmo ser grato — disse, virando o rosto na minha direção para que pudesse olhar em meus olhos, o azul dos seus tendo adquirido um tom acinzentado em reflexo ao tempo lá fora. — Não só por estar me recuperando, mas também... por você estar aqui.

Desviei o olhar, meu coração traidor errando uma batida dentro do peito.

— Zaden...

— Não, Alison. Me deixa continuar — ele me cortou, suavemente. — Hoje pode ter sido a primeira vez que você admitiu estar se sentindo solitária, mas sei que isso não é de agora. Desde o ano passado, quando os rapazes e eu decidimos que iríamos nos mudar para Nova York depois da escola porque seria o melhor para a banda, eu tenho percebido você se isolando e escondendo o que se sente numa tentativa de bancar a inabalável diante de uma despedida que chegaria cedo ou tarde. Sei que foi horrível ter nos visto ir embora. E também suponho que não tenha sido muito mais fácil ver Amélia partir para outro país sabendo que depois dela não haveria mais nenhum de nós por perto — continuou, em voz baixa, seus dedos gelados elevando meu queixo para que eu voltasse a olhar para ele. Pressionei os lábios, prendendo a respiração. — E você ficou sozinha. Sozinha, e mesmo assim não ligou chorando dizendo que estava com saudade nem uma vez sequer. O que estou tentando dizer é que... se fosse eu no seu lugar, não seria forte o bastante para aguentar. Por isso sou grato por você estar aqui comigo. Porque você me mantém firme, Alis. 

Fechei os olhos, piscando para afastar a ardência das lágrimas. Vulnerabilidade. Eu a odiava. E odiava Zaden por ser o único que fazia com que eu me sentisse assim. Deveria ser crime que uma pessoa tivesse o poder de deixar outra tão emocionalmente frágil com apenas palavras e alguns poucos segundos de contato visual.

— Eu te odeio — expressei meus pensamentos, com um sussurro ressentido.

— Não, não odeia — ele sussurrou de volta, seu polegar contornando as extremidades da minha boca. — Você só sente raiva de como eu te conheço melhor do que qualquer um.

— Zaden — adverti, lutando para não baixar o olhar para os lábios dele, que estavam cada vez mais próximos dos meus. — Não complique as coisas.

— É você quem complica, Alison — replicou, com a respiração pesada antes de se afastar. Tento não pensar no frio que sinto com a ausência súbita do seu corpo próximo ao meu. — Tinha um pouco de calda no canto da sua boca — disse, mostrando o rastro de framboesa em seu dedo antes de lambê-lo. — Eles estavam certos. É deliciosa.

Limpo a garganta, o rosto queimando de vergonha.

— É mesmo — balbucio, voltando minha atenção para o volante à minha frente. — Já está escurecendo. Acho melhor eu ir deixar você em casa.

— Também acho — ele concordou, soltando o ar contra janela enquanto eu ligava o carro. — Prometi a Zara que faríamos uma sessão de filmes de terror hoje à noite, então não posso deixá-la esperando — explicou.

— Filmes de terror? — sorri, lembrando de como a irmã mais nova de Zaden sempre fora louca por histórias assustadoras. — Parece exatamente o tipo de diversão que a Zara precisa agora. Ela teve um dia meio difícil na escola.

— Bem que notei que ela parecia abatida — Zaden franziu a testa, se ajeitando no banco do carona. — Você sabe o que foi que aconteceu?

Mordi o lábio, pensando por um momento se deveria ou não contar a ele.

— Não foi nada de mais — eu disse, por fim. — Ela está interessada em um garoto da turma dela, que inclusive é amigo do primo do Loren.

— Eu o conheço. Harvey, não é? — perguntou, em busca de confirmação. Eu assenti em resposta. — Ele é um garoto legal. Atleta. Dedicado. Tem minha aprovação.

Revirei os olhos.

— Como se a Zara precisasse da sua aprovação para namorar alguém — alfinetei, cheia de ironia. — Sim, o Harvey é ótimo, mas já está apaixonado por uma garota, e ela não é a sua irmã. Para piorar, ele e ela são uma dupla na patinação desde crianças, o que significa que são muito próximos um do outro e que as chances da Zara são quase zero.

— É... parece que a minha irmãzinha chegou atrasada na competição — ele disse, com um suspiro. — Mas quer saber? Não faz mal. É só a primeira paixonite dela. Zara ainda terá muitos outros pretendentes na vida.

— Espero que ela perceba isso em breve, porque não é lá muito agradável observar a pessoa de quem você gosta com outra bem na sua frente.

— Quer dizer que o Harvey e a garota já estão juntos?

— Ela é a melhor amiga dele.

Zaden ergueu as sobrancelhas.

— Apaixonado pela melhor amiga? Eu estou familiarizado com esse tipo de história.

— Cala essa boca — exigi, apertando meus dedos com mais força ao redor do volante.

— Quero dizer... é clichê, mas eu entendo.

Bufei.

— Você é ridículo.

— E você adora. 

Não me dei ao trabalho de respondê-lo, apertando no botão do rádio e ignorando-o deliberadamente enquanto aumentava o som de "Telephone" até o volume máximo e cantava a plenos pulmões a parte do rap da Beyoncé, imitando parte da coreografia do clipe da melhor maneira que podia estando sentada. Ouvi a risada grave de Zaden sob a música, fazendo um esforço monumental para não sorrir em resposta. Ele era mesmo um paspalho.

No entanto, mais tarde, quando o observei sair do carro e atravessar o portão de entrada da enorme mansão que era a sua casa, me ocorreu que, apesar dos pesares, eu também estava grata por tê-lo aqui.


🎸

No dia seguinte, na mesa do refeitório onde eu usualmente sentava na hora do almoço, eu ouvia atentamente o falatório de Bryan e Kimmie, que discutiam a respeito de algum trabalho chato de inglês que eles teriam que fazer juntos na próxima semana.

— Estou atolada de coisa para fazer — minha amiga disse, limpando com esmero as lentes redondas de seus óculos antes de colocá-los outra vez sobre o nariz sardento. — Fora os testes para os quais tenho que estudar, ainda preciso corrigir e aprovar as matérias do jornal da escola antes de publicar a edição dessa semana. Isso sem falar nos problemas que estou tendo com o garoto que ficou como fotógrafo substituto no lugar da Pamela enquanto ela está em Los Angeles para a fase final do concurso de fotografia no qual se inscreveu no ano passado.

— Deve ser um saco ter que ficar conferindo se os outros estão fazendo o trabalho deles direito — Bryan fez careta, enfiando um cookie de limão na boca. — Eu admiro você por ainda não ter surtado. Eu nunca teria a paciência necessária para estar à frente da redação de um jornal ou para ensinar uma classe de dança — ele olhou para mim. — Eu no seu lugar sairia gritando no segundo passo errado que alguém desse na coreografia.

Eu ri.

— Não exagera, Bry. Você sabe que é gentil demais para isso. E em relação ao que você disse — apontei para Kimmie, que estava sentada de frente para mim. — Não acho que esse estresse seja por causa da escola; você sempre trabalhou bem sob pressão. E quanto a implicância com as fotos mal tiradas do fotógrafo novato, acho que é só a sua maneira de demonstrar que está com saudades da Pam. Vocês duas estão sempre juntas, então é totalmente compreensível que sinta falta dela.

A ruiva respirou fundo, soltando o garfo dentro da tigela de salada de frutas que estava comendo.

— Está tão na cara assim? — lamentou. — Você está certa. Não vejo a hora desse concurso acabar para que ela possa voltar de uma vez. Claro que não digo nada disso quando nos falamos por vídeo. Não quero que ela pense que sou grudenta.

— Pamela nunca pensaria isso de você. Pelo contrário: ficaria muito feliz de saber que sente falta dela — eu disse, ao passo que Bryan imediatamente assentiu em concordância.

Kimmie e Pamela se gostavam há tanto tempo que eu já nem lembrava da época em que as duas ainda não tinham se conhecido. Como redatora e fotógrafa oficiais do Davencrown's Journal, eram inseparáveis pelos corredores do colégio, sempre rindo e trocando olhares. Qualquer pessoa com olhos percebia que uma gostava da outra como mais que amiga, mas fora algumas vezes nas quais ficaram juntas, nenhuma tinha dado o primeiro passo para oficializar um relacionamento – o que dizia muito sobre a insegurança que Kim estava sentindo por estar há tanto tempo longe da Pam.

— Eu não sei... — a ruiva suspirou. — Você sabe como a Pamela é linda, engraçada, talentosa e cheia de vida. Tenho medo de que ela conheça outra garota mais interessante e parecida com ela em LA e perceba que eu sou só uma nerd sem graça.

— Ei — Bryan protestou, alcançando a mão dela sobre a mesa. — Ser nerd não é sinônimo de sem graça; não caia nesse estereótipo ultrapassado. Você é inteligente e tão linda e talentosa quanto a Pam, e ela tem muita sorte de ter alguém como você gostando dela. Não rebaixe a si mesma, ok?

Sorri para o rapaz ao meu lado, apertando seu ombro em aprovação. Bryan sempre sabia o que dizer para melhorar o ânimo de alguém.

— Você tem razão, Bry. Eu tenho que parar de ser tão paranoica e de me colocar para baixo — Kimmie sorriu de lado, voltando a comer sua salada. — Afinal, ninguém vai me valorizar se eu não fizer isso por mim mesma.

— É assim que se fala — eu disse, orgulhosa, antes de dar um sobressalto ao sentir uma mão tocar a minha nuca.

— E aí, gatinha — César, o garoto insuportável do segundo ano que vivia dando em cima de mim disse, puxando uma cadeira e se sentando ao meu lado. — O que estamos comemorando?

— Nada que seja da sua conta — Bryan retrucou, irritado.

— Calminha aí, bailarina. Não foi com você que eu falei.

— E não foi com você que nenhum de nós aqui falou, então por que diabos você está aqui? — retorqui, com raiva.

— Não precisa ficar impaciente, Alison — ele deu uma risadinha, tocando no meu cabelo mais uma vez. Dei um tapa em sua mão, afastando seus dedos sujos das minhas tranças. — Eu vim aqui pra te convidar para um show que vai ter no sábado naquela boate legal que fica perto da praia. Tudo por minha conta, é claro.

Ergui as sobrancelhas.

— Primeiro: quem disse que eu preciso de você para pagar alguma coisa para mim caso eu queira ir a algum lugar? — questionei, olhando-o de cima a baixo com tanto descaso que fiz com que ele se endireitasse na cadeira. — Segundo: obrigada, mas pela milésima vez, não. Eu não estou interessada em ir a esse ou a qualquer outro show que seja com você, que parece não ser nem esperto o bastante para entender que eu não sinto a menor vontade de desperdiçar o meu tempo com alguém que não tem a educação necessária para saber que deve pedir licença antes de interromper a conversa alheia ou para tratar os meus amigos com o respeito que eles merecem — me coloquei de pé, encarando-o diretamente nos olhos. — Fui suficientemente clara, ou você quer que eu repita?

Um silêncio sepulcral se fez ao nosso redor, e só então percebi que a minha conversa com César tinha atraído a atenção de outras pessoas sentadas nas mesas próximas à nossa, que seguravam o riso diante da minha recusa ao convite dele.

Humilhado e enraivecido, o rapaz se levantou de sua cadeira tão bruscamente que ela quase pendeu para trás.

— Você foi claríssima — respondeu, me dando as costas e caminhando a passos largos para a saída do refeitório, esbarrando em duas outras meninas no seu percurso.

— Você está bem? — Kimmie indagou, preocupada.

Soltei o ar profundamente, voltando a me sentar ao lado de Bryan.

— Estou. Foi uma conversa desagradável, mas não vou deixar que o idiota do César estrague o meu almoço — falei, treinando um sorriso, antes de morder um pedaço da maçã fatiada em meu prato e ignorar o gosto amargo que havia ficado em minha boca.

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