Capítulo 11: Alucinações

Uma semana depois

Uma semana nesse lugar é como se fosse a eternidade queimando no inferno. Há uma semana não vejo a luz do sol porque estou trancafiada num porão recebendo altas doses de LSD e outros medicamentos que me fazem ter alucinações a todo momento, me deixando confusa do que é a realidade ou não.

A comida também só é trazida uma vez por dia, estou me sentindo uma esquelética de novo. A roupa que me deram - uma camisola velha - está tão larga que caberia duas de mim agora, tudo isso pela falta de peso. Durante esses dias, não tive notícias de nada do que acontece lá fora, nem do que aconteceu com Emily, Ann e Magnum. Nem mesmo Baxton compareceu. Só o cara que me dá as injeções de LSD - Elliot o nome dele - tinha lido no crachá.

- Você precisa achar um jeito de sair daqui, Mel. - A voz do meu pai se tornou algo constante na minha cabeça depois que começaram a me dar essas injeções. O lado bom disso é que pelo menos não fico completamente sozinha. Bom, na minha cabeça. - Olha pra você, está amarela.

- Devia me confortar e não terminar de me derrubar - dou um sorriso fraco enquanto encaro minhas mãos finas. A porta é de aço com uma janelinha de vidro no meio, o que ajuda os guardas me observarem a cada 10 minutos. Papai está encostada nela com as mãos dentro dos bolsos. Ele está como da ultima vez que o vi, careca brilhante e barba por fazer, um blazer preto e calças marrons.

Não consigo ignorar todas as vezes que as alucinações começam porque é sempre ele que aparece. E querendo ou não, isso me conforta. Pelo menos a droga foi um jeito de conversar com ele nesse plano, se é que existe outro. Papai acreditava que as almas boas ficavam vagando e ajudando aqueles a quem amavam, nunca fui de acreditar nessas besteiras.

- Mel, sabe que eu não te culpo, não sabe? - a pergunta do meu pai me atinge como uma flecha. Franzo minhas sobrancelhas sentindo meus olhos arderem com as lágrimas que se formam.

Sempre admirei isso no meu pai, seu raro dom de saber o que eu pensava sem nem mesmo ter poderes. Era só olhar para minha cara que ele sabia o que se passava na minha cabeça.

- Princesa, olha pra mim. - ainda olhando para baixo, consigo ver o par de botas na minha frente por cima dos cílios - Já se passaram meses, Mel. E nós dois sabemos que a doença tinha voltado mais agressiva e eu não ia durar muito. Você só adiantou o processo. - começo a ficar tão exausta ao ponto de sentir duas mãos levantando meu rosto, mesmo que alucinação, mas me fazem encarar o par de olhos cinzas-azulados. - Culpe aqueles idiotas, não você mesma. Eu não te amo menos por isso.

Meus olhos começam a pesar de sono - outro efeito da droga e dos medicamentos. É sempre assim quando começo a alucinar: primeiro as visões e depois um sono desgraçado. Papai deita-se no chão e me estico ao lado dele deitando em cima do seu peito, como faziamos quando tinha pesadelos. Os dedos acariciam minha cabeça e a ultima coisa que ouço é um "durma bem, princesa".

..

Não sei por quantas horas dormi, mas quando acordei papai não estava mais aqui e havia um prato de comida na mesa de madeira que há nesse porão. Pelo menos não o jogaram como das outras vezes. E dessa vez, o cardápio veio mais diferenciado com uma macarronada. Mesmo parecendo nojenta, minha fome é tanta que não me importo em atacar a comida. Só era sopa, sopa, sopa e mais sopa. Ou melhor, um caldo que nem legumes tinha. Já estava com saudade de ver algo sólido para comer.

- Está bom? - papai aparece novamente, agora sentado na cadeira de frente pra mim. Nem ao menos tinha percebido outra cadeira, deve fazer parte da alucinação. - Parece que não só pela sua cara.

- Acertou. - respondo colocando o prato de lado - Tem gosto de molho vencido.

Começo a sentir meu corpo suar excessivamente. Levanto e faço um rabo de cavalo, passando a mão na nuca e vendo-a se enxarcar com o suor. É a primeira vez que sinto algo assim desde que me trancafiaram aqui. Não exito nem por um segundo e acabo fazendo uma coisa que sei que não deveria por causa das câmeras, tiro a camisola ficando apenas com as roupas intimas.

Escoro as duas mãos na parede e abaixo minha cabeça respirando fundo, mas me arrependo assim que começo a colocar o almoço/janta para fora do meu estomâgo não dando tempo nem de chegar no pequeno banheiro. O cheiro de vômito insuportável atinge o ambiente me deixando zonza, sempre odeiei esse odor. 

Demoro uns segundos para me recompor e quando o faço, coloco minha camisola no lugar depois de lavar minha boca e bato na porta de aço na esperança de ter algum guarda passando nesse momento. Minutos se passam até ela ser destrancada revelando Negan - o cara da cafeteria. Sinceramente seu tamanho me assusta. Negan deve ter uns cem quilos de musculos e uma estatura alta pra caramba. Negan tenta manter uma postura ameaçadora, mas muda completamente quando sente o cheiro e olha para a bagunça que eu tinha feito minutos atrás. Parece que quem vai vomitar agora é ele. Bom, ninguém mandou darem comida estragada pra uma desnutrida e drogada. Resultado? Explosão.

Negan sai me deixando sozinha novamente. Bufo e tento procurar algum pano pra limpar essa desgraça. Mas não tem nada. Apenas..

- Tira a camisola e começa a limpar - Negan entra num estrondo e pela primeira vez ouço sua voz extremamente grave e alta. Ele joga na minha direção um balde com um miséria de água e cruza os braços.

- Tá brincando comigo, né? - questiono - Eu não tenho outra roupa.

Não, ele não está brincando e eu não tenho um pingo de força para tentar revidar, jogá-lo no chão, esfregar a cara dele nesse vômito e dar o fora desse lugar. Pois, sei que nessa situação quem teria a cara esfragada naquilo seria eu, além da possibilidade de levar uma boa surra.

Respiro fundo e conto até três antes de tirar minha camisola na frente de Negan. Não sei se ele é bom ator ou isso é dele mesmo, mas ele não demonstra nenhuma reação, mantém sua postura neutra. Até porque no que uma aparência esquelética poderia chamar atenção? Pelo menos minhas costelas quase a mostra afastam os olhares maliciosos, eu acho.

Me ajoelho perto da poça e molho minha roupa limpando o chão logo em seguida, torcendo o pano me segurando para não colocar tudo para fora de novo. Ouço Negan resmungar algo baixo como se estivesse com nojo, não o julgo.

- Mais rápido - Negan me empurra com os pés na base da minha coluna, acabo caindo de barriga e justo em cima do pouco de vômito que ainda há.

Respiro fundo e dessa vez a vontade de chorar se sobressai. Negan me deixa sozinha trancando a porta enquanto me levanto deixando as lágrimas rolarem silenciosamente pela minha bochecha.

- O que vai fazer agora? - me assusto ao ver Joe encostado na parede com o rosto deformado. Fecho meus olhos e balanço a cabeça tentando expulsar essa visão, mas Joe se aproxima cada vez. - Olha pras câmeras, Mel. Alguém vai vir, confia em mim.

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