Capitulo 10: Não guarde
Novamente o clima romântico foi para ralo abaixo. O semblante da Amberly é de desespero por causa do lugar, então a deixo entrar primeiro. Ando pela sala a procura de alguma pista até ver um papel branco na mão de Amberly.
- O que é isso?
- Um bilhete.
- Só tem a letra M - digo quando o pego.
Sinto um arrepio estranho no meu corpo. Quando entrei e vi a bagunça, a primeira coisa que veio na minha mente foi que alguém que prejudiquei aproveitou para invadir e nos atingir. Mas agora, vendo essa letra que reconheço de longe, só pode significar uma coisa: Mateo fugiu do galpão que o mantínhamos preso. Com o julgamento, Tyler não teve tempo de ir lá, então Mateo deve ter aproveitado isso.
Levanto algumas coisas do chão e começo arrumá-las em seu lugar.
- Mateo não pode destruir esse lugar, ok? - Amberly diz - Tem muita coisa aqui que eu não posso perder. - balanço minha cabeça devagar - Não posso.
- Ei. - coloco as mãos nos ombros de Amberly para acalmá-la - Tudo bem. Podemos.. Ficar no abrigo do Joe até de manhã.
- Toma banho. - Amberly diz - Eu vou terminar por aqui.
- Vou terminar de te ajudar primeiro - pego uma vassoura. Amberly me olha com as mãos na cintura.
- Preciso de tempo pra pensar.
Respiro fundo me sentindo culpada por ela estar passando por isso, com medo de perder a casa dela. Estalo a língua deixando a vassoura de lado.
- Sinto muito.
Dou as costas entrando rápido no banheiro, já arrancando a roupa e entrando no chuveiro quente. Deixo as mãos apoiadas na parede e aproveito a água caindo na minha nuca. Minha pele costuma ser sensível por causa das cicatrizes e agora mais ainda pela porcaria da energia.
FLASHBACK
Camiseta rasgada. Pulsos amarrados pra cima em correntes. Cabeça baixa sangrando e os vários estalos de chicote nas costas.
- Chega. - uma voz grave ordena. - Ela já aprendeu.
Levanto minha cabeça devagar na direção de Mateo vendo-o desamarrar meus pulsos. Com o soltar, meu corpo cai de uma vez para frente, mas sou segurada por ele. O contato das mãos dele nas minhas costas faz com que eu gema de dor.
- Estou impressionado - ele tenta me manter de pé - Você não chora mais.
- Minhas lágrimas não impediriam. - digo baixo sentindo uma dor insuportável.
- Não, nunca impediram. E agora.. - ele me olha - Você já é uma mulher de 20 anos. Não tem porque chorar por isso mais.
Com toda lerdeza do mundo envolvo meu braço ao redor do ombro de Mateo, que me ajuda ir para um dos quartos.
- Agora deita ai - ele me joga de barriga pra baixo na cama e grito de dor - Vou chamar a enfermeira.
- Não. O Tyler. Chama o Tyler.
Mateo me encara com a testa franzida, tomba a cabeça pra trás e bufa, fechando a porta e trancando-a, mas permanecendo no quarto comigo.
- Você e o Scott são muito íntimos. - Mateo pega uma cadeira, uma maleta de primeiros socorros e se senta do meu lado - Vou acabar ficando com ciúmes assim.
- O que vai fazer? - o olho.
Sem dizer uma palavra, Mateo pega uma tesoura e corta minha roupa de cima a baixo, me deixando apenas com a roupa íntima suja de sangue. Sinto seu olhar quente sobre mim, o mesmo olhar quando faz de mim sua maior presa. Queria lutar, levantar e socá-lo até que desmaiasse, mas a dor não deixa nem que eu mova um centímetro.
- Sabe Parker.. - Mateo pega um algodão - Eu sempre tive uma.. Tara pelo seu corpo. - ele molha o algodão com álcool e resmungo quando entra em contato com meus cortes - Até machucada você continua sexy. Difícil não pensar besteira com isso. Principalmente com você só de calcinha deitada de barriga pra baixo.
- Chama o Tyler.
- Não. Scott está ocupado. Quem vai cuidar de você agora sou eu. - Mateo lança um meio sorriso diabólico - Relaxa, só vou limpar os ferimentos.
FLASHBACK
Termino o banho minutos depois ainda sentindo um pouco de desconforto pelo apartamento. Queria retribuir Amberly de algum jeito por isso, mas não consigo nem pensar agora.
Visto-me e jogo o resto da minha roupa e outros pertences numa mochila. Amberly destranca uma porta e murmura alguma coisa que não entendo direito. Quando ela vem ao quarto pra pegar as coisas dela não resisto e pergunto sobre a porta misteriosa que ela tanto mantém fechada.
Amberly aceita me mostrar o quarto. Quando ela abre fico impressionada, se essa for à expressão certa. Roupas espalhadas, brinquedos, fotos, coisas de adolescente, mas o que me chama atenção é a banheira ao fundo do cômodo. No chão, aviso uma foto com duas crianças: uma menina de cabelos pretos lisos e um menino parecido com ela. Crianças lindas na verdade. Pego várias outras fotos que estavam no chão e as junto nas mãos para ficar olhando. Passo uma por uma. Amberly senta ao meu lado e fica me olhando.
- Por que você nunca me mostrou isso?
- Não senti que precisava. - Amberly responde - Mas agora sinto.
- Eu preciso conhecer. É uma parte da sua vida. - deixo as fotos de lado e passo a mão na cama antes de me levantar e continuar minha aventura pelo quarto. - Quem dormia aqui?
- Minha filha. O outro não parava em casa.
- Onde ele está?
- Com o pai. Foi quem o criou tecnicamente - Amberly diz. Sinto que sua voz fica meio estranha, mas ainda sim ela mantém sua pose firme.
Estar andando nesse quarto só me faz ver que não sei tudo sobre a Amberly. Como eu sempre digo, ela é misteriosa. Mas.. Eu não gosto da ideia de estar me relacionando com alguém, me entregando a uma pessoa sem saber alguns detalhes da sua vida. Sou muito desconfiada de tudo, e o fato de eu ter contado até mesmo detalhes obscuros sobre a minha vida a ela, só me deixa com mais vontade de saber sobre Amberly.
- Amberly.. - faço uma pausa para tentar encontrar as palavras corretas. - Eu sei.. Relativamente pouca coisa de você. Nunca me contou algo profundo como esse.
- O que quer saber?
- O que aconteceu aqui?
O olhar de Amberly fraqueja a cada palavra da minha pergunta. Acho que ela estava esperando que eu fizesse em algum momento.
- Ficou abandonado depois que ela saiu daqui. Tive que guardar tudo. - ela se levanta. - Nem deu tempo dela pegar as coisas direito.
- E por que você mesma não leva?
- Não posso - Amberly responde e a olho em entender - Ela não quer me ver. Fui muito ruim com ela.
- O que você fez de tão ruim que não pode se redimir?
- Não é o que eu fiz, mas o que ela fez - Amberly vai perto da banheira e mantém os olhos fixos nela. Aproximo-me com cuidado e por algum motivo, sinto uma energia completamente negativa dessa história toda. - Ela tentou se matar, Mel. E eu não percebi na hora. - acabo me arrependendo de me intrometer na vida particular da Amberly. Esse era um detalhe que ela omitia, e agora eu entendo porque. Eu também escolheria omitir se isso acontecesse com Daya. - Era sangue por todo o chão. Desmaiou e quase morreu. Quando acordou no hospital, ela parecia pior do que antes. Ela.. Viu que até nisso tinha fracassado. Não tinha medo da morte, tinha medo de não dar certo. Depois disso, ela foi morar com os parentes dela. - Amberly faz uma pausa - Eu não sei se ela está bem ou não. Mas definitivamente, melhor do que aqui.
- E-eu sinto muito, Amby.
- Tudo bem - ela balança a cabeça - Já superei. Foi melhor pra ela.
- Devia procurá-la um dia - digo - Pode se arrepender senão fizer.
- Você não imagina o quanto eu quero isso.
- Então não perde tempo - digo. - A gente nunca sabe o dia de amanhã. - deixo a foto de lado e seguro sua mão indo pra fora do quarto. - Amby.. - me viro pra ela - Obrigada, por me mostrar.
- É eu estava precisando falar com alguém.
- Ei.. - seguro sua mão novamente - Não é porque eu tenho que me focar em tudo isso que não me interesso por você. - dou um sorriso leve - Eu quero te conhecer, fazer parte disso como eu estou deixando você parte. Não guarda tudo ai dentro, conta comigo. - Amberly dá um sorriso fraco e balança a cabeça devagar - Vamos.
Deixei avisado para o Joe que iríamos para o abrigo. Junto às coisas da Daya e as coisas do meu pai em outra mochila. Antes de ir, olho mais uma vez para o quarto que dormi durante três meses e respiro fundo.
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