capítulo 1 • teen challange

Cooper

Antes de dormir, prometi a mim mesma: nunca mais gastaria meu tempo me irritando com Daniel Kellan Carter. E, juro pela minha própria vida, eu estava realmente empenhada em fazê-lo quando o maldito despertador tocou pela manhã.

Puxei o celular, que estava sobre o criado-mudo ao lado de minha cama, pelo cabo. Acendi a tela, encarei o horário, eu precisava levantar, mas não queria. Revirei os olhos, desliguei o despertador quase desistindo das minhas próprias promessas e o coloquei sobre o criado-mudo novamente.

Virei-me para o lado, ficando cara a cara com a parede ao lado direito da cama, fechei os olhos novamente, contemplando o escuro do meu sono e as cobertas já aquecidas.

Era um novo dia, um novo ano letivo e, segundo os meus planos, um novo começo. O ano letivo anterior tinha sido estressante e, depois dos três meses de férias de verão sem pensar no meu maior problema, eu estava pronta para começar de novo... Mesmo que fosse difícil. Daniel Carter tornava tudo difícil, mas eu nunca abaixaria a cabeça para ele, nunca abaixei.

Daniel Carter tinha o poder de fazer a escola inteira ouvir o que ele tinha a dizer, e bastou ele me derrubar no primeiro dia de aula do ano anterior para se instalar a droga da minha reputação de esquisita neurótica. Eu não me achava esquisita, nem neurótica, mas eu também não achava que eu poderia ser tão popular quanto a minha irmã. Eu não era feia, era comum até demais, metade do universo parecia ser uma menina branca, magra de cabelos e olhos castanhos, então eu não me destacava muito entre as pessoas, diferente da minha irmã.

Me remexi na cama para ajeitar meus braços em uma melhor posição. Eu já tinha ouvido o despertador, eu estava acordada, mas meu corpo insistia em continuar deitado na cama, preguiçosa e miseravelmente, completamente oposta à minha irmã mais velha, Madison, que fazia questão de acender a luz do nosso quarto.

Virei-me para a esquerda, cobrindo parte da minha cabeça com a coberta, mas deixando uma abertura para que eu pudesse observar minha irmã. A garota de corpo atlético e longos cabelos ruivos e lisos caminhava de um lado para o outro, puxando os cobertores, esticando-os até deixar a cama perfeitamente arrumada, tudo em questão de segundos.

Madison se virou para mim, bufou, frustrada, e, com as mãos na cintura, me encarava desgostosa. Eu ainda me impressionava em como aquela menina conseguia estar deslumbrante, mesmo tendo acabado de acordar.

— Levanta dessa cama, Allison — revirou os olhos, caminhando em direção ao armário — Sei que está acordada!

Me encolhi relutante. Não queria sair dali, mesmo que eu tivesse consciência de que precisaria uma hora ou outra, mas não era como se eu fosse facilitar as coisas. Eu gostava de complicar as coisas, adorava desafios. Permaneci deitada por tempo suficiente para que Madison desistisse de me tirar da cama naquela manhã.

A ruiva revirou os olhos novamente, jogando a cabeça para trás como sempre fazia quando estava frustrada. Foi pisando forte até chegar no corredor, desceu metade das escadas com uma carranca que eu conseguia ver mesmo de olhos fechados.

— Mãe, eu desisto da Allison! — bateu o pé — Não vou mais acordar ela para ir pra escola, ela já tem idade suficiente pra fazer isso sozinha!

— Mas ela é sua irmã mais nova! — era o argumento que minha mãe sempre usava e, daquela vez, não era diferente.

— Não importa — protestou — Ela sempre enrola. Sempre!

Minha mãe bufou, irritada. Consegui ouvir a caneca batendo com força sobre a mesa de madeira, que ficava na sala de jantar, e os sapatos sociais de minha mãe baterem no assoalho de madeira em direção à escada.

— Allison Elizabeth Cooper, eu espero não ter que ir até o seu quarto para te acordar — gritou da beira da escada.

Ok. Eu não quero pagar para ver!

Uma parte de mim ainda me obrigava a ter o mínimo de vergonha na cara. Levantei-me lentamente, peguei minhas roupas e, arrastando os pés pelo carpete aveludado do meu quarto, rumei para o corredor de madeira, indo em direção ao único banheiro — tirando o que ficava no quarto dos meus pais — funcional da casa.

Eu estava prestes a tocar na maçaneta, mas para a minha infelicidade, o diabo dormia atrás da porta do fim do corredor e aquele imbecil era ligado na tomada desde a hora que abria seus olhos castanhos até a hora de fechá-los.

Fui empurrada para trás por um vulto tão laranja quanto Madison, mas ainda mais baixo que eu, com força suficiente para me fazer dar alguns passos para trás e soltar a maçaneta, dando brecha para que aquele melequento miserável abrisse a porta, entrasse e me trancasse do lado de fora.

— Seja mais rápida da próxima vez, cabeçuda! — ele riu alto.

— Não é possível — retruquei.

Eu odiava conviver com o Samuel. Em dias normais, eu o teria xingado com todas as ofensas que não são proibidas pelo vocabulário dos meus pais. Mas era um novo dia, e eu tinha que manter a calma, tinha que deixar a cabeça no lugar; se eu não conseguisse lidar com Sam, eu nunca conseguiria lidar com Carter, que era umas mil vezes pior que meu irmão mais novo.

— Samuel, me deixa entrar, eu vou me atrasar pra aula! — bati à porta.

— E o problema é unicamente seu! — rebateu.

Grunhi irritada, batendo os pés no chão.

— Samueeeeeel! — soquei a porta mais algumas vezes.

Meu pai, com o cabelo loiro escuro e desgrenhado, abriu a porta de seu quarto. O rosto amassado pela fronha do travesseiro, os olhos inchados e a ponta de seu nariz vermelha não o deixava com um ar muito intimidador, mesmo que estivesse com o semblante fechado e furioso.

— Que bagunça é essa? — perguntou, a voz rouca e grave tornou-o um pouco mais intimidador.

— O Sam não me deixa usar o banheiro! — disse, alto o suficiente para que Samuel ouvisse de dentro do banheiro.

Meu pai apertou os lábios, bufando logo em seguida. Ele detestava aquele tipo de briguinha, que era muito comum entre Samuel e eu.

— Marianne! — meu pai chamou minha mãe pelo nome.

Ouvi o som da cadeira da sala de jantar gritar no chão, sabia que minha mãe já estava soltando fogo pelas ventas àquela altura.

— O que foi dessa vez? — perguntou, novamente da beira da escada.

— O Sam vai fazer com que eu chegue atrasada se ele não sair da droga do banheiro! — voltei a bater à porta, com força.

— EU NÃO VOU ABRIIIIR! — Samuel gritou ainda mais alto.

O diabo de 12 anos era bom.

— Allison, usa o meu banheiro! — exausta de tentar resolver todas as situações, minha mãe deu a sugestão, que era mais como uma ordem.

Ela odiava que usassem seu banheiro. Era um pouco encucada com limpeza e arrumação, tudo tinha que estar sempre do jeito que ela queria e tinha deixado. Por isso, desde que o Samuel aprendera a usar o banheiro sozinho, nos mudamos para uma casa maior, onde ela e meu pai dividiam um banheiro e meus irmãos e eu, o outro.

Ainda um pouco contrariada, passei por meu pai, empurrando a porta do quarto deles e virando à direita bem ao lado da entrada, onde ficava o banheiro deles. Fechei a porta atrás de mim, girei a chave e suspirei aliviada. Finalmente, paz!

Ou quase isso. Você sabe, eu acho... Quando se vive em uma casa com mais três pessoas e um projeto de gente endiabrado, "paz" não é exatamente algo que realmente exite. Fechar a porta do banheiro era como interromper, momentaneamente, todo o inferno que era conviver com meu irmão mais novo.

Passei as mãos pelos olhos, apenas para clarear a visão. Me olhei no espelho pensando em todas as possibilidades de penteados que eu poderia fazer. Era mais que frustrante me olhar no espelho, me deixava mais triste do que deveria ser. Eu não tinha os olhos azuis e nem os cabelos ruivos de Madison, minhas sardas quase não apareciam e eu não tinha um corpo atlético como o dela.

Puxei meu cabelo para trás, pensando em fazer algo diferente com ele, ou apenas deixá-lo solto, eu nunca ia com o cabelo solto para a escola. Pensei naquela possibilidade enquanto escovava os dentes as pressas, pentear o cabelo sempre me tomou muito tempo, por ele ser fino e comprido, eu detestava pentear o cabelo, mas talvez eu fizesse aquele sacrifício.

Cuspi a pasta de dente na pia enquanto subia a caça jeans de cintura alta, eu tinha a pegado emprestado com Madison. Coloquei a camiseta branca rapidamente e enfiei a parte da frente para dentro da cintura da calça, não tinha ficado tão ruim, mas ainda ficava melhor em Madison que em mim.

Eu tinha duas escolhas para fazer: me atrasar para me arriscar com alguma maquiagem ou correr e fazer o rabo-de-cavalo de sempre.

Mordi o lábio inferior, eu precisava fazer a escolha logo, mas nem tive muito tempo para pensar. Meu pai, que também se atrasaria para o trabalho se eu continuasse em seu banheiro, começou a bater à porta, me dizendo que eu estava demorando muito lá dentro.

Ok, rabo-de-cavalo nem é uma opção tão ruim assim...

E eu o fiz, rápido e prático, mesmo que um pouco desgrenhado, com alguns fios fugindo ao lado das orelhas e algumas mechas na frente de meu rosto.

Respirei fundo e abri a porta, deparando-me com meu pai estagnado bem na frente da porta, esperando apenas que eu saísse dali.

— Vê se não demora tanto amanhã, baixinha! — beijou o topo de minha cabeça e me empurrou para fora de seu quarto.

Desci as escadas, peguei minhas torradas e corri para o carro da minha mãe, que já estava cogitando em me deixar para trás.

Eu não gostava muito quando minha mãe me levava para a escola, não por ter vergonha dela, mas por ter que ir no banco de trás com o Samuel e, naquele dia, não foi diferente: Madison estava no banco da frente, ao lado da mamãe, enquanto Sam e eu estávamos atrás.

O pirralho não perdia uma. Esperou que eu colocasse o cinto de segurança para me dar o maior tapa na nuca que eu já tomei em toda a minha vida, com um sorriso travesso que ia de orelha a orelha. Aquilo bagunçou ainda mais o meu cabelo, que já não estava do jeito que eu queria.

Se acalma, Allison, ele é só um pentelho de doze anos, e você acabou de fazer dezesseis. Não se deixe levar, não se deixe levar!

— Você atrasou a gente, saco de bosta! — reclamou.

— A culpa foi toda sua, seu imbecilzinho — revidei.

— Dá para os dois pararem? — Madison virou-se para trás, irritada — Não são mais criancinhas!

— Samuel é uma criancinha que escapou do inferno! — retruquei, cruzando os braços.

— E você escapou do lixão, né? — Samuel provocou, rindo alto — Nem parece que é da família!

Mamãe apertou o voltante com força, irritada. O rosto vermelho se mesclava com os cabelos ruivos presos em um coque alto, ela engoliu em seco, se forçando a não surtar conosco bem no primeiro dia de aula, ela ainda tinha esperanças de que as coisas melhorariam.

— Ainda dá tempo de chegar no horário! — disse, encarando o relógio no painel do carro — Os dois podem parar com essa birra.

Ela deu partida no carro, pisando suavemente no acelerador até tirar o carro do lugar e, em poucos minutos, estávamos na frente da escola de Sam. Para a minha felicidade, ele era uma das pessoas mais hiperativas e entusiasmadas para chegar à escola. Escapuliu do carro em segundos, e os cinco minutos e cinquenta e seis segundos que se seguiram a partir dali foram os melhores cinco minutos e cinquenta e seis segundos do meu dia.

O carro parou na entrada da escola, onde o movimento de alunos já era grande o bastante para que eu me camuflasse ali no meio e, com sorte, não trombar em ninguém que fosse capaz de me dar um novo apelido, ou seja, não trombar com Daniel Carter e nem a sua gangue de moleques irritantes do time de Futebol Americano.

— Boa aula! — mamãe sorriu para nós, me olhando pelo retrovisor do carro.

E, ali, iniciava-se um dos piores dias do meu High School.

Tudo começou quando Madison pisou para fora do carro. Parecia que tudo que ela fazia era como naqueles closes que dão nas atrizes quando elas saem de algum lugar, os cabelos se esvoaçando graciosamente no vento, o tempo até parecia passar em câmera lenta. Ela desceu majestosamente, e eu mal conseguia abrir a droga da porta.

Era algo tão simples de se fazer: puxar a maçaneta, empurrar a porta e descer, nada de complexo. Mas assim que abri a porta, consegui — por motivos ainda não explicados pelos físicos do universo — prender o pé no cinto de segurança e me estatelar de joelhos no chão. Ótimo, Allison, ótimo começo!

Se isso tivesse acontecido em um conto de fadas, certamente apareceria um lindo garoto para me ajudar. Ele me ajudaria a pegar os livros, nossas mãos se tocariam por acaso, nossos olhos se encontrariam quando ele me ajudasse a levantar e, em um turbilhão de emoções intensas, encontraríamos um amor mágico e maluco. Ele me buscaria em casa para ir numa festa, eu ficaria bêbada, ele cuidaria de mim enquanto eu só falasse besteiras malucas sobre o quanto as coisas não fazem sentido e não são justas. Ele me beijaria quando estivéssemos na formatura, e três anos depois nós nos casaríamos em Paris, bem em baixo da Torre Eiffel. Mas a vida não é um conto de fadas e, na verdade, não sei até que ponto isso é algo bom.

Em vez de me ajudar, fizeram exatamente o que adolescentes entre quatorze e dezoito anos fariam: riram da minha cara. E, por ironia do destino, minha irmã já não estava mais por perto para fazer o que ela sempre fazia: dar uma bronca em todo mundo, enquanto eles babavam para ela e sua espetacular beleza.

Fechei a porta do carro e minha mãe saiu da frente da escola, já estava atrasada para o trabalho e eu não queri atrasá-la mais.

Respirei fundo, tentando manter a calma, e abaixei-me para pegar meus livros. É verdade que apareceu um garoto nesse meio tempo, o — infelizmente — lindo e implacável dono dos olhos verdes mais sarcásticos, arrogantes e desejados de Brookline High School e de, provavelmente, qualquer lugar que ele pisasse. Daniel Kellan Carter, o Lúcifer do meu inferno particular, não me ajudou em nada, fazendo o desfavor de passar chutando meus livros para mais longe.

Desgraçado!

— Mais cuidado da próxima vez, Cooper esquisita! — acenou de costas, rindo com o desdém de sempre.

Franzi o cenho confusa. Ele estava, no mínimo, dez centímetros mais alto que da última vez que tinha o visto, a voz estava mais grave, rouca e, aparentemente, ele precisou trocar o moletom do time de Futebol Americano, porque o antigo provavelmente ficaria com as mangas curtas agora.

— Obrigada por espalhar ainda mais as minhas coisas, seu retardado! — gritei de volta, querendo trucidá-lo.

— Não há de quê!

Mas antes que eu pudesse me levantar, correr na direção de Carter e iniciarmos mais uma das nossas intermináveis discussões, um garoto de cabelos loiros, um bom tanto mais baixo que Carter, aproximou-se furioso do garoto. Os olhos azuis do mais baixo transitava entre mim e Carter, ele segurou o mais alto pelo braço, com força, impedindo que o moreno seguisse seu caminho.

— Te pagam pra ser tão chato ou é de nascença? — o loiro perguntou, empurrando Carter que, forte, quase não se moveu — Vai mexer com alguém do seu tamanho, Carter!

— Se liga, Young, seu papo de bom moço não cola comigo! — riu, sarcástico — Vai mexer com alguém do seu tamanho, aproveita e pega os livros dela no chão também, você tá mais perto dele que eu, no fim das contas — gabou-se da diferença de altura.

Young... Eu já ouvi esse sobrenome em algum lugar.

Os dois se encararam por mais alguns segundos, era como se ambos se fuzilassem com os olhos. Carter não era muito bom com esses jogos de manter-se em silêncio, ele gostava de ação, gostava da provocação e fazia aquilo muito bem.

O mais alto desistiu de esperar alguma reação do loiro e, rindo, trombou o corpo propositalmente no garoto que tinha me defendido, caminhando triunfante para dentro da escola. Aquilo demorou tanto tempo que eu já tinha até recolhido meus livros.

Olhei para o menino loiro, confusa. Ninguém nunca me defendia, quer dizer, meus amigos me defendiam, mas quando meus amigos e minha irmã não estavam por perto, ninguém costumava se importar o suficiente para me defender das provocações de Carter, isso porque as pessoas adoravam o Carter.

O loiro sorriu para mim, mostrando seus dentes alinhados e seus olhos quase se fecharem com o sorriso, as sardas na ponte de seu nariz deixavam-no com um ar ainda mais simpático e, sem reação, eu o retribuí com um sorriso tímido.

Virei-me na direção oposta, eu sentia que ele se aproximaria se eu continuasse olhando. Era o que acontecia quando um garoto te encarava por muito tempo e, conhecendo todos os garotos daquela escola, eu sabia que ele devia ser como a maioria dos garotos do seu tipo: bonito demais para não ser um babaca.

Passei as mãos pelo rosto, eu ainda não acreditava que todos os meus primeiros dias de aula sempre seriam estragados enquanto Carter estivesse por perto. Pelas minhas contas, faltavam apenas um ano, nove meses, três semanas e seis dias para que oficialmente me visse livre de Daniel Kellan Carter. E, sim, eu contei!

Angeline e Michael chegaram juntos, empolgados, ambos passaram os braços sobre meus ombros, com um sorriso largo estampado em seus rostos. Eles amavam os primeiros dias, porque nada nunca acontecia com eles, ninguém implicava com Angeline e Michael nunca ligava muito para as coisas que falavam sobre ele comer guacamole quase todo almoço.

— Que cara é essa? — a loira alta e de nariz pequeno, filha de russos, perguntou, com as mãos na cintura — Aconteceu alguma coisa que eu perdi?

Antes que eu pudesse responder, Nathan, seu namorado, e Adalia, nossa melhor amiga, aproximaram-se entusiasmado, mesmo que Nathan não tivesse muita expressão na cara, diferente do irmão mais novo, Ethan, que era um excelente ator.

— E precisa perguntar, Angie? — Adalia fez uma careta.

— Pela cara dela, é mais que óbvio que Carter aconteceu! — Michael deu de ombros, era sempre a mesma coisa.

Nathan não segurou a risada. Ele riu porque conhecia Carter muito bem. Sabia exatamente que tipo de gente ele era, principalmente por ter que aguentá-lo a mais tempo que eu, já que Carter e Ethan se conheciam praticamente desde que eles nasceram.

Sempre me perguntei como ele suportava Carter sem querer matá-lo, mas eles se davam bem até demais. Carter sempre fez questão de ser o mais arrogante, insuportável, teimoso e briguento ser humano que já pisou na terra, enquanto Ethan e Nathan eram o completo oposto disso. Ethan e Nathan eram garotos gentis e calmos.

Ethan e Carter não pareciam se encaixar no mesmo mundo, mesmo assim, tinham uma ligação tão forte quanto verdadeiros irmãos. As únicas coisas que ambos compartilhavam eram os gostos peculiares por cigarros de menta, jogos de arcade e roupas monocromáticas.

— Um dia eu ainda vou quebrar a cara daquele babaca — Angeline resmungou, cruzando os braços.

Angeline tinha alavancado um namoro com Nathan no ano anterior e, desde então, era obrigada a aguentar Carter a importunando até na casa do namorado, já que ele vivia enfurnado na casa dos Mullins pra passar mais tempo com o melhor amigo.

— Ele não é de todo uma pessoa ruim — Nathan comentou, e eu o encarei irritada — Mas é verdade que ele sempre faz questão de ser um pau no cu com vocês duas!

— É só um cara inconformado — Adalia riu, ela também conhecia Carter muito bem, já que Carter era bastante amigo de seu irmão mais velho — Acho que ele não consegue entender como existem pessoas que não são apaixonadas por ele, sabem como é, ele tem um ego do tamanho de Júpiter!

Eu ri abafado, aquela era a definição perfeita para Carter: o garoto com o ego do tamanho de Júpiter.

Nós caminhamos juntos pelos corredores da escola. Subimos as escadas, como todo grupo de amigos que cresceu junto e que possui uma sincronia e uma química imbatível entre si. Mas, depois de ingressarmos no High School, nossas realidades de conjunto mudaram completamente. A única aula que eu conseguia ver um deles, era a de inglês, onde eu fazia junto com Michael.

Chegamos no terceiro andar um pouco ofegantes. Corredor quatro, em frente às salas 121, 122, 123 e 124, nos encaramos por alguns segundos — com exceção de Nathan, que nunca estudou em nossa turma por ser um ano mais velho, ficando no andar de baixo na sala de química. Tirando Angeline e Adalia, que eram sociáveis o suficiente para fazerem amigos em qualquer buraco que as enfiassem, Michael e eu sempre acabávamos isolados em nossas turmas. Por fim, sorrimos uns aos outros e, sem olhar para trás, entramos em nossas salas.

Sala 121, turma 10-A de matemática. Eu amava matemática, mesmo tendo certeza que o professor Grothe não fosse muito com a minha cara.

Engoli o nó em minha garganta, suprimindo a vontade de sair correndo para fora dali. A turma inteira já estava dentro da sala, que ainda estava sem o professor. Os olhos da sala inteira se voltaram para mim, a Cooper que não sobressaia em nenhum lugar.

— Bem-vinda de volta, cabeçuda! — Peter Walls, jogador do time junior varsity de Futebol Americano, disse, jogando um aviãozinho de papel em mim.

Mordi o lábio, tentando manter a postura.

O time junior varsity de todos os esportes da escola eram destituídos pelos alunos Freshmans e Sophomores, como eu, por serem mais novos e, na teoria, menos fortes e menos treinados que os jogadores do time varsity, o que, na verdade, parecia ser mais uma forma de chamá-los de imaturos.

Peter Walls era o Cornerback do time junior varsity, ou coisa assim. Ele era doido para entrar no time varsity, como o Carter entrou logo que chegou na escola — o que, definitivamente, não é algo comum de se acontecer, mas reconheço o talento dele, é realmente assustador —, mas nunca conseguiu notoriedade suficiente para isso, então ele costumava jogar suas frustrações nos alunos que ele julgava serem tão fracassados quanto ele e, ironicamente, eu era um desses alunos.

— Para de ser idiota, Peter — Rebecca Hall, a perfeita queridinha das líderes de torcida, revidou por mim.

Ela era legal.

Respirei fundo, erguendo a cabeça. Eu não me deixaria abater. Caminhei até a carteira na qual eu costumava me sentar, deixando a mochila em baixo do baco. Peguei o caderno, o abrindo em uma página vazia. Eu nunca escrevia nada, no fim das contas, mas gostava de passar o tempo vago antes de começar a aula desenhando o que vinha em minha mente. Era melhor que ouvir o resto da turma.

Sr. Grothe adentrou a sala rapidamente, carregando sua pasta preta ao lado do corpo. A turma fechou a boca rapidamente, a figura de estatura média e acima do peso sabia impor respeito na turma, sempre impôs, principalmente com seus olhos escuros e estreitos, seu bigode com mechas grisalhas e seu cabelo ralo.

As cadeiras foram rangindo enquanto os alunos se sentavam rapidamente e, como sempre acontecia, assim que Grothe fechou a porta, o maldito rosto de Carter apareceu com um sorriso malandro na janelinha da sala, empurrando a porta logo em seguida. O professor já imaginava que aquilo aconteceria, era uma rotina que tinha se arrastado durante o ano letivo anterior inteiro, ele apenas revirou os olhos e colocou a pasta sobre a mesa.

— Esse ano não tolerarei mais seus atrasos, Daniel Carter — cruzou os braços, virando-se para o garoto.

— É, pois é — Carter deu de ombros — Acontece.

— Toda aula acontece — resmungou, impaciente — Vá se sentar logo, preciso começar a aula.

Carter, conformado, foi indo em direção ao outro lado da sala, onde ele normalmente se sentava — última carteira da fileira da parede da porta, ao lado de Ethan —, mas, daquela vez, para a minha infelicidade, pude ver o hesitar de Grothe brilhar em seus olhos ao transitar o olhar entre mim e Carter. O velho pigarreou e Carter parou instantaneamente, espremendo os lábios e trancando os olhos, já imaginando o que Grothe faria.

— Michelle, troque de lugar com Daniel, por favor — Grothe pediu, e a menina sentada atrás de mim se levantou um pouco atordoada.

— Porra — Carter e eu murmuramos em uníssono.

Nós dois sabíamos que ele queria nos torturar mais um pouco.

— Sr. Grothe, não sei se você percebeu, mas das férias pra cá, eu fiquei meio grande demais para sentar na quarta carteira — Carter virou-se para o professor, com um sorriso amarelo.

— Isso não é problema meu — indicou o lugar vazio atrás de mim.

Eu não desviei meu olhar do caderno um segundo sequer, mas sabia e sentia que ele vinha praguejando do local onde estava até passar ao meu lado, jogar a mochila no chão de qualquer jeito e sentar-se espaçosamente na carteira atrás de mim. Espaçosamente até demais, fazendo questão de empurrar a mesa de forma a me espremer o máximo que conseguiu.

Grothe nem estava mais nos olhando. Ele anotava milhares de coisas na lousa, coisas que eu deveria prestar atenção e anotar, mas eu estava ocupada demais tentando não ser esmagada.

Eu não o deixaria fazer aquilo sem revidar. Assim era o nosso relacionamento desde sempre: uma provocação infinita que partia de ambos os lados, ele me irritava e eu o irritava de volta. Era uma espiral de vingança mútua e infinita.

Prendi os pés no chão e, com toda a força necessária, empurrei minha cadeira para trás, fazendo com que ele quem ficasse espremido. Mas aquilo não acabaria por ali, ele era teimoso e competitivo demais para me deixar vencer. Forçou a mesa com as mãos e eu empurrava com os pés, fazendo força para trás. Ok, sei exatamente o que você está pensando e, sim, quando o assunto era Carter e eu, nós sempre brigaríamos como duas crianças.

— Você nem tá tão alto assim, não precisa de tanto espaço — grunhi para ele.

— E você precisa de menos ainda, tampinha — empurrou mais uma vez a mesa.

Revidei com força, empurrando a cadeira para trás novamente. Ao nosso redor, os alunos se seguravam para não rir, a maioria na torcida para que alguma merda acontecesse e, obviamente, sempre acontecia.

Ele empurrou novamente, sabendo que eu empurraria de volta, mas ele tinha um plano daquela vez. Estava decidido a acabar com aquilo de uma vez por todas.

Quando fui empurrar a cadeira para levar a mesa de encontro com seu tórax, o garoto, com os malditos pés, conseguiu empurrar-me poucos milímetros para frente, travando os pés da mesa na pequena depressão entre os pisos quadrados e, apenas para garantir, manteve os pés na base das pernas da cadeira. Quando empurrei, não deu outra: a cadeira despencou para trás e eu caí pateticamente no chão, recebendo de brinde a gargalhada da turma inteira. Era a segunda vez naquele dia que eu era premiada com o inferno pelo mesmo cara.

Carter era infernal e sabia disso, ele amava isso e fazia questão de demonstrar.

O garoto atrás de mim, de pele branca ao ponto das pontas de seus dedos serem vermelhas, de cabelo extremamente escuro e de olhos verdes penetrantes, cruzou os braços vitorioso, segurando-se para não rir, mas sim esbanjando em seu rosto apenas o sorriso sarcástico de quem sabia que tinha vencido daquela vez. Ele adorava mostrar para todos a sua volta o quanto era intocável.

— Escuta aqui, seu amontoado de lixo orgânico — levantei-me rapidamente, sentindo meu corpo inteiro doer, fazendo questão de apontar o dedo para sua cara — Qual a porra do seu problema?

— Já parou para pensar que talvez o meu problema seja você, Cooper esquisita? — rebateu com um sorriso de canto.

Eu hesitei por um momento e, lógico, ele percebeu.

Eu sempre soube, desde que éramos pequeno, que eu era o problema de Carter, eu era a pedra no tênis dele. Mas eu nunca tinha parado para pensar no porquê.

Minha irmã e eu, além de Angeline — porque ela começou a namorar no ano anterior —, éramos as únicas garotas que não se rendiam aos caprichos de Carter. Eu era o problema dele. Isso porque ele não fazia ideia do relacionamento da minha irmã e, como sempre, fazia questão de sempre se demonstrar disponível para ela.

Madison sempre achou Daniel "um gatinho", mas sempre disse que ele era muito novo pra ela, que já estava no último ano e ele e eu, na décima grade. Carter era, sim, muito bonito, mas, pelo amor, né? Ele era um saco!

Eu nunca babei e nunca fiz questão de inflar o ego daquele pedaço de merda ambulante, eu era, provavelmente, seu maior problema, ao menos na escola. Era a única capaz de tirá-lo completamente do sério.

— Vai se foder — grunhi para ele.

Mas seu olhar desviou do meu e foi parar nos olhos do professor. Grothe nos encarava desaprovador, e nós sabíamos que não nos puniria de imediato. Talvez porque ele sempre tinha algum plano para me torturar de alguma forme, ele nunca nos daria uma detenção, não era o suficiente para ele. Ele queria que nós nos destruíssemos sozinhos.

Eu reergui minha cadeira, sentei-me de braços cruzados, escutando apenas o que o professor tinha a dizer sobre a aula, sobre a matéria e sobre o quanto Carter precisava parar de jogar aviões de papel no meu cabelo. Eu já tinha, em cima de minha mesa, uma coleção de seis aviões de papel que Carter jogara no meu cabelo durante toda a aula.

O professor finalmente sentou-se em sua mesa, encarando a turma por uns instantes, analisando a cara de cada um dali. Ele esbanjava o mesmo olhar de antes, como se milhares de ideias acabassem de surgi em sua mente. Aquilo era tão óbvio que todos perceberam que ele queria incinerar tanto Carter quanto eu.

— Bom, dessa vez, nossa primeira avaliação será dividida em duas partes — começou a explicar e, naquele momento, cruzei os dedos em baixo da mesa, esperando que não fosse algo horrível que, com certeza, faria com que eu tivesse vontade de me dar um murro no meio da cara — Farão duplas de estudo para a primeira avaliação. No dia da prova, precisarão me entregar uma lista de exercícios sobre o conteúdo da prova.

E, por um momento, eu suspirei aliviada.

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