Losing Myself

"Mundos fechados,
feridas abertas"
- Suicide Room (2011)

Doente.
Ridículo.
Lixo.
Todos te odeiam.
Seus pais te odeiam: eles têm pena de você.
Ridículo.
Patético.
Sinta a dor, ela é sua amiga.
Sinta a dor, ridículo.
Sinta isso.

Três batidas na porta me fez parar. Larguei a lâmina em cima do meu dever de física, respingando sangue na folha em branco.

— Sou eu, Jonas. — minha mãe anunciou.

Virei-me e olhei para a porta fechada. Li o que estava escrito em um papel grudado na mesma:

"Eu mato todos ou me mato?"

— Sim? — levantei-me da cadeira da escrivaninha.

Escorria sangue pelo meu braço e mão. Minha mãe não podia ver aquilo. Ninguém podia.

— Eu quero conversar com você. Pode abrir a porta? — ela gritou, mesma sabendo que seria desnecessário.

— Agora? Estou meio ocupado com uma tarefa de física. O professor irá cobrar amanhã.

— Eu preciso que abra a porta, Jonas May Junior. — eu sabia que quando ela pronunciava meu nome todo, estava falando sério.

Escondi a lâmina debaixo do meu travesseiro, fechei o caderno e limpei o braço com uma camiseta suja.

— Jonas! — ela bateu na porta. — Não quer que eu arranje a chave, não é?!

Encontrei um band aid em cima do criado-mudo e cobri aquele corte, assim como os outros dois. Corri até a porta e a abri. Em seguida, minha mãe entrou no quarto feito um furacão e olhou ao redor.

— Como está? — cruzou os braços.

Eu odiava essas perguntas: "como você está?", "tudo bem?", "como tem andado?", "como vai a vida?". A resposta era automática:

— Bem.

Mas eu queria gritar: "Eu estou muito mal aqui, sabia?! Estou me afogando e vocês estão assistindo de camarote! Eu quero estar bem longe de vocês e de tudo. Eu quero que a morte venha, eu quero me livrar de tudo isso. Eu não estou bem! Eu quero sair daqui!"

Minha mãe balançou a cabeça positivamente, engolindo a minha perfeita mentira.

— Já tomou o remédio? — me perguntou.

Não, eu não tomei. E não iria tomar.

— Sim. — era a minha resposta.

Minha mãe deu uma última olhada no meu quarto antes de se virar para sair e dizer:

— Os convidados chegaram. Não demore. — bateu a porta.

Respirei fundo e troquei de roupa. Optei por um suéter vermelho, uma calça jeans preta, o tênis deixei o mesmo: um All Star "branco encardido". Desci as escadas e fui para a sala de visita enorme.

— Jonas! — exclamou minha tia Emily.
Eu a chamava de "Tia Duck", porque ela vivia lendo para mim a história do Patinho Feio.

— Oi, Tia Duck. — a abracei.

— Oh, Jonas... Como você cresceu... Está maior que eu! Olha isso, Clay! — ela se virou para o tio Clay, que estava no celular.

Ele ergueu o olhar para mim e se levantou.

— O que andou comendo, rapaz? Está do meu tamanho! — ele me abraçou de lado, pelos ombros.

Sorri e balancei a cabeça.

— O que é isso? — Tia Duck segurou o meu braço esquerdo. — São cortes? Por que tem três curativos aqui, Jonas?

— Eu caí do skate. — menti.

— Ah, nem me fale! Cam está inventando de andar de skate também. Não estou aguentando fazer curativos nele. Eu falo para ele usar capacete e os outros equipamentos de proteção... — ela suspirou. — ... Mas ele teme em não usar.

— Já falei o mesmo para Jonas. Ele não escuta... — minha mãe falou, cruzando as pernas e me olhando firmimente.

— Mas as crianças são assim! — Tia Duck sentou-se ao lado de minha mãe. Ela era eufórica demais e falante demais. — É um modo de provar que são os donos do mundo.

Quem dera eu ser o dono do mundo...

— Como você está, Jonas? — tio Clay perguntou, ainda com os braços ao redor dos meus ombros.

— Estou bem. — respondi.

Mentira.

— Como vai a escola?

— Bem, também.

Mentira.

— E a namorada? — ele ergueu uma das sobrancelhas.

Eu não ia mentir outra vez.

— Não tenho, tio Clay. — respondi, sinceramente.

— E aquela Alice... Alica... Alic...

— Alicia. — o corrigi. — Terminamos há alguns meses.

— Por quê? Ela era linda! — ele me sacudiu de leve.

Eu sou gay, tio, meus olhos diziam e ele precisava lê-los para saber da verdade, eu não tenho namorada porque sou gay, tio.

— Hm... — pensei um pouco. — Não era pra ser.

— Não se preocupe, meu rapaz. Logo estará acompanhado outra vez! — bateu duas vezes em meu peito.

Como sempre fui meio frágil, quase caí, mas o tio Clay me segurou.

— Está molenga, Jonas. Já pensou em fazer academia?

Olhei para o seu rosto, o seus cabelos ruivos longos caindo pelos ombros, as sardas sob os olhos, um corpo atlético e branquelo. Ele com certeza ia para a academia e poderia me detonar com um único toque. Mas eu não precisava ficar gostosão, eu precisava parar de sentir dor.

— Já pensei. Mas não é para mim. Estou feliz do jeito que sou. — sorri.

Mentira.

Alguém adentrou a sala e ambos nos viramos para ver quem era. Ele estava abotoando a calça e jogou a camisa branca por cima. Estava distraído, mas seus olhos pararam em mim. Sorri ao vê-lo. Sorri de verdade.

Era um protótipo do pai: cabelos ruivos, porém curtos, sardas no rosto, atlético. Vestia uma camiseta branca, uma jaqueta vermelha, uma calça jeans azul-marinho e um coturno vermelho. Estava divino. Parecia até ser de maior, mas tinha dezessete. A mesma idade que eu estava fazendo naquele dia.

— Cameron! Ei, Cameron! Olha o Jonas, veja como ele cresceu! Está do seu tamanho! — gritou Tia Duck.

— Oi, Jonas. — Cameron me cumprimentou.

Me lembrei de quando tínhamos doze anos. Estávamos no meu quarto, brincando de verdade ou desafio. Ele me desafiou à mostrar o meu pênis, e assim eu fiz. Eu o desafiei à tocá-lo, e ele tocou. Camarim desafiou a beijá-lo. Então eu vesti-me outra vez e o fitei. Em seguida, o beijei. Foi o meu primeiro beijo, e o primeiro beijo gay também.

— Oi, Cam. — cumprimentei de volta.

— Você cresceu mesmo. Estava muito menor quando te vemos pela primeira vez! — ele me abraçou.

— Por que não vão para o quarto de Jonas enquanto os resto chega? — minha mãe sugeriu.

Balancei a cabeça positivamente e subi as escadas. Cameron me seguiu em silêncio. Atravessei o corredor e entrei no meu quarto. Quando Cameron entrou, fechei a porta.

— Quanto tempo, primo... — ele cruzou os braços e sorriu.

— É, verdade. — eu respondi.

Eu não sabia o que fazer em seguida. Cameron andou pelo meu quarto, lendo cada frase na parede e atrás da porta. Sentou na minha cama e me fitou.

— Como está a sua vida? Seja sincero, por favor. — ele pediu.

— Péssima. Eu quero morrer. Preciso sair daqui. — me aproximei dele.

— Sua mãe, ela...

— Ela acha que é só uma fase da puberdade. — sentei-me ao seu lado.

— E seu pai, onde está?

— Vive trabalhando. Deve estar comendo uma vadia agora.

A única pessoa a quem conto sobre a minha vida é para o meu psicólogo e Cameron. Eram os únicos que entendiam.

— Não se preocupe, Jonas. Eu estou aqui. — segurou a minha mão.

Eu conversava com ele por mensagens. Ele morava na cidade vizinha e só nos encontrávamos umas quatro vezes por ano, o que era uma droga. Mas ele sempre ficava sabendo tudo sobre mim, mesmo estando longe.

— Estou aqui, Jonas.

Ficamos fitando o chão de madeira do meu quarto por alguns minutos. Daí ouvimos minha mãe gritar para descermos.

Quando estava lá embaixo, tive que cumprimentar todos e fingir estar feliz. Mas cada sorriso que eu dava era como uma facada na alma. Era tudo mentira. Eu não estava feliz, eu não era feliz.

E quando eu estava sentado na mesa, as luzes desligadas, as velhas do bolo iluminando o meu rosto, as pessoas rindo e sorrindo, felizes e batendo palmas e cantando "Parabéns pra você...". Mas eu não queria muitos anos de vida. Eu nunca quis. A cada dia, era mais cansativo manter a minha máscara de garoto feliz.

Eu estava sério, olhando para além das velas, o corpo curvado, esguio e sem cor, olhos sem brilho algum. Eu era uma aberração. E aquelas pessoas vazias? Muito delas pouco se importavam comigo. Só estavam pela comida.

Então me sacudiram e eu tive que assoprar a vela.

— O que desejou, Jonas? — perguntou tio Clay.

Estar morto.

Abri um sorriso triste e fraco e respondi:

— É segredo, tio.

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