13 - O QUE ME ACALENTA O CORAÇÃO
Mais um capítulo para vos compensar os últimos dias!!!
Notem o rumo que estamos tomando nesta história...
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Eu sabia que o Natiel detestava quando a Natalie fazia isso...Aliás, acredito que essa seja a verdadeira razão dela vir até mim. A melhor maneira de provocá-lo, era se encontrar comigo sem a presença dele... Eu estava sendo usado mais uma vez, mas não pagaria por isso desta vez.
— Melhor você vir logo, sujeito da touca — falei ao celular, enquanto no banheiro. — Mais um pouco ela me enlouquecerá com tanto falatório e melindres.
Eu tinha certeza que ele chegaria em cinco minutos. Eu só esperava que ele não perdesse a cabeça no caminho... Posso ter sido meio inconsequente com isso, mas eu não queria ser réu de mais um crime.
Fui até a Natalie e disse, sério, meio robótico:
— Se recomponha, ok? Ele está vindo...
— Quem? Você falou com o Natiel? — Seu espanto era visível.
— Não era isso o que você queria?
Natalie piscou, desviando o olhar, como que não acreditando. Foi devagar que se levantou com apoio, devido a dificuldade da distrofia muscular. Eu não me movi.
— Por que você fez isso? — Proferiu, ofegando um pouco.
— O que mais eu deveria fazer? O problema é de vocês... Precisam conversar e resolver sozinhos.
Ela me olhou com incredulidade. Seus olhos castanhos claros ainda reluziam.
— Está certo — concordou cabisbaixa.
Dei dois passos para trás.
Natiel logo chegaria e eu não veria, nem ouviria mais.
— Até uma próxima — me despedi, distante, e saí. Eu logo teria plantão.
***
Aquele dia parecia já durar um mês!
— Hey Jadir, por que você está tão calado hoje?
— Ah, Keller, irmão... Muita coisa acontecendo...
— Eu que o diga — falou, fitando o suporte com medicamentos. — Já me picaram tanto que acho que nem sai mais sangue do meu braço... Isso aqui é água, ah é água.
Eu ri, enquanto ele batia no próprio braço. Foquei-no:
— Vai deixar de andar de moto depois dessa, não vai? Faz quase vinte dias que você está por aqui e saiu há pouco da terapia intensiva.
— Não tem como, Jadir... Uma vez motoqueiro, sempre motoqueiro.
Expirei um riso e disse:
— Simbora levantar e caminhar. Chega de moleza!
O ajudei com o suporte de medicamentos e lhe ofereci o braço para apoio.
— Ainda bem que não tem muita gente por aqui agora...
— Por que? — Intriguei-me.
— Poderiam interpretar mal essa nossa amizade — riu.
Acompanhei o riso e reforcei:
— Deixe de preconceitos e se concentre no caminhar, caso queira sair daqui algum dia...
— Ok, mas me fala aí... Qual é o veneno que estão me dando agora?
Eu já havia me certificado dos seus acessos, é claro. Daquela vez se tratava de uma dosagem relativamente alta de um remédio para dor, o que permitia que ele ficasse em pé por alguns minutos. Logo o medicamento o derrubaria. Eu não poderia exigir muito, daquele meu novo amigo, na fisioterapia, ao menos naquela noite. Tomara que suas dores cessem... Será que daria certo comigo? Uma dose cavalar para dor seria interessante... Quem sabe...
***
Eu amanheci no leito 23.
Não quis me certificar com o celular, que ficara em casa aliás, e evitaria ao máximo saber o que houve com a Natalie e o Natiel no mais recente. A bem da verdade, era óbvio que eles voltaram. As chateações da Natalie eram muito pequenas comparadas com o que ela pudesse saber sobre o passado nada regrado dele. E o passado importaria? O que ela diria se soubesse que acompanhei o meu amigo cabeludo em algumas dessas andanças, enquanto com ela? Ainda me consideraria como amigo? Será que depois daquela noite ela ainda me procuraria para ouvir suas fracas lamentações?
Se livre deles!
Fala sério... Se eu me "livrasse" deles, quem eu teria? Somos todos imperfeitos, não somos? Eu principalmente.
Eu teria que deixar a dosagem cavalar da medicação para um outro momento. Estava na hora de ver a Victória.
***
— E eu senti um pouco de falta de ar no final da noite, quase amanhecendo.
— Sei...
— Com o novo colírio minha visão tem ficado menos opaca também. Tenho enxergado bem melhor.
— Que bom...
— Jadir? O que você tem? Está distante...
Voltei a me situar num repente. Pisquei e zombei, dizendo:
— Disseram que ando falando demais.
— Deixa disso, Jadir — riu ao falar. — O que aconteceu desta vez?
— Ah, não foi nada — dei de ombros. — Só mais uma noite pouco dormida, devido ao plantão...
— É, mas isso não costuma te colocar tão distante assim...
Zombei:
— Que é? Vai me diagnosticar outra vez, doutora?
— Existe uma injeção de ânimo?
— Até existe, mas já não me faz efeito — continuei, com uma animação forçada.
— Será que não faz? — Victória se pôs pensativa.
— O que tem em mente? — perguntei curioso. Lá vinha coisa...
— Sabe aquele sítio no centro, ao lado do parque?
— É claro. Ele está fechado há anos... O que tem?
— Faz algum tempo que eu o comprei, mas não sabia bem o que iria fazer...
— E...?
— Que tal abrirmos uma clínica especializada no tratamento de crianças?
— O quê? — sobressaltei.
— Com sua licença poderíamos fazer... Não seria legal que mais crianças como a Lila tivessem um espaço exclusivo? Seria como um parque de diversões para crianças especiais.
A animação da Victória estava quase me contagiando. Mais um pouco e...
Suspirei profundamente e me pus a rir.
— O que é, Jadir? — perguntou, ainda sorrindo e com brilho nos olhos. — Não acha uma boa ideia?
— Minha amiga que flutua... — falei ainda em risos. — Você não é desse mundo, é?
— Por que diz isso? — mantinha o humor. — Acha impossível?
— Eu achava — afirmei. — Mas, vindo de você soa muito mais irreal e ao mesmo tempo, bastante possível. Sabe que eu cheguei a pensar em trabalhar somente com crianças , por isso estou fazendo outra pós graduação. Seres mais verdadeiros eu jamais encontrei...
— Sim, achei mesmo que você se animaria com essa ideia — sorria com sinceridade. — Quer se associar comigo, então?
— Você? Minha sócia? — zombei, mas logo me situei. — A ideia é mesmo a melhor de todas que eu já ouvi nessa minha vida miserável. Eu até poderia arquitetar tudo o que se faria necessário para a clínica funcionar. Meu pai também me deixou um dinheiro considerável que ajudaria... Mas, não sei. Você fala mesmo a sério?
— Muito a sério — enfatizou. — Assim eu também me ocuparia e não enlouqueceria de saudades do meu Daniel...
— Ah, é... O seu Daniel — ri. — Ele sabe disso ou você falou comigo primeiro?
— Não se preocupe, Jadir. Ele sabe — sorriu satisfeita.
— Ah, eu espero que sim. Cansei de segredos — zombei, mas estava sendo sincero.
— Eu sei, Jadir... Eu sei.
Bem sei que a Victória não brincava quando falava em dinheiro. Ela fora a maior patrocinadora para reerguer a academia cuja Natalie e o irmão se tornaram os responsáveis. Eu sabia que ela ainda faria muito mais...
— Bem... Graças a você acho que já posso definir, ao menos, um objetivo pessoal para os próximos anos. Meu professor de metodologia ficará feliz.
— Objetivo? Não precisa mais caminhar sem objetivos, amigo — falou fraterna. — Sei que não conseguiria me associar com uma pessoa melhor. Em alguns meses poderemos conseguir.
— É muito bom te ver otimista e confiante — retribuí a amabilidade. — Vamos nos empenhar nisso, então.
— Sim, vamos.
Havia muito tempo que meu coração não se acalentava com tamanha esperança. Ao menos o dinheiro do meu pai serviria para algo bom... Consegue me ouvir? Acho que estou aprendendo a viver...
Logo uma turma de crianças chegaria e faria um piquenique especial no quintal da casa, incluindo a minha linda Lila, é claro. Por isso e por tudo eu sabia que a Victória falava a sério, muito a sério. Naquele momento, ela era a minha amiga mais confiável. Que ironia!
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Precisamos falar sobre o Jadir:
São tantas coisas, muitos projetos... Qual deles será o do seu verdadeiro empenho? Qual lhe fará feliz ao reger pela vida?
Você já sabe do que gosta e no que quer se empenhar? Como tem feito isso?
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