Capítulo 4 - Why you scared? (I'm not scared)
O fim de semana já tinha chegado, e Chloe já havia feito milhares de planos para ela e o Connor. Planos esses, que ela cogitou cancelar depois que eu lhe contei o quanto estava triste com a situação de minha mãe. Por mais que eu tenha desconfiado de que algo estranho acontecia, eu nunca poderia imaginar que era tão grave.
Eu e Kevin não iríamos nos encontrar hoje, pois eu estava completamente desanimada com a escrita, apesar de Valentina ter respondido meu e-mail com muita empolgação. Sim, ela tinha gostado do meu novo projeto, e estava me apressando, querendo que eu terminasse logo.
Mas eu não tinha cabeça para pensar em nada no momento.
Eu estava numa livraria, tentando ocupar a minha mente vendo os mais recentes lançamentos dos meus autores favoritos, mas eu não conseguia me concentrar em absolutamente nada.
— Esse livro é muito bom. — disse Kevin, mostrando um livro de um autor que eu desconhecia. — Acho que você deveria ler.
Desde que eu e Kevin começamos a andar juntos, percebi que ele deixou de ser aquele cara arrogante e mal humorado que não gostava de falar comigo.
Eu não sei o que teria acontecido entre nós ontem a noite caso o telefone dele não tocasse. Ele tinha recebido uma ligação importante de um tal de Gil, que exigia a presença dele num pub no Brooklyn, mas eu não podia me deixar levar por essa atração estranha que eu estava começando a sentir e que não me largava, mesmo tendo tantas outras coisas para me preocupar.
— Vou coloca-lo na minha lista. — eu disse de forma apática e que fez com que Kevin me olhasse com estranheza.
Eu saí da livraria sem nem ao menos me despedir, andando rapidamente pela calçada, tentando desviar das pessoas que passavam quando senti uma mão em meu ombro e me virei.
— Ally, você está bem? — Kevin perguntou, e parecia realmente preocupado comigo.
Lágrimas tomaram meus olhos e eu comecei a chorar. Kevin rapidamente me puxou para um abraço, onde enterrei a minha cabeça em seu peito soluçando. A tristeza que me invadiu era avassaladora, pois eu não conseguia parar de pensar na hipótese de que eu poderia perder a minha mãe.
— A minha mãe está doente, Kevin. Ela tem câncer.
— Vai dar tudo certo. Eu estou aqui com você.
Me afastei um pouco e olhei para seu rosto. Ele parecia sincero e convicto. Eu nunca tinha visto o Kevin me tratar com tanto carinho. Meu coração disparou de novo, e eu fiquei me perguntando porque ele ficava agitado daquela forma quando o Kevin me olhava daquele jeito.
Engoli em seco, tentando pensar com clareza, mas eu não consegui.
Eu tinha consciência de que todos aqueles sentimentos eram errados, mas eu não conseguia ligar para isso.
— Porque você está sendo tão gentil comigo esses dias? Eu achei que você não me suportasse.
Kevin deu uma pequena risada com a minha pergunta, e seu rosto ficou corado de repente. Fiquei tentando entender porque ele parecia estar envergonhado, mas os pensamentos que rondavam a minha mente sobre como ele era fofo não me deixaram manter o foco.
— Há muitas coisas sobre mim que você não sabe, Ally. — disse ele de forma totalmente enigmática.
✬.✬.✬
Mais uma semana de aula estava se iniciando, e eu não me sentia nem um pouco disposta. Meus deveres estavam em dia, mas a minha mente voava, e não era com a história nova. Valentina estava me cobrando mais capítulos, e eu já estava prestes a surtar com toda aquela cobrança.
Sem contar que eu não conseguia parar de pensar no Kevin, e no quanto era errado me envolver com ele.
— Como sua mãe está? — Chloe perguntou. Estávamos sentadas na arquibancada da quadra da escola esperando o intervalo acabar.
— Ela vai começar um novo tratamento amanhã, mas está bem triste.
Ficamos em silêncio por algum tempo. Enquanto eu mexia em meu celular, Chloe ficava me observando atentamente.
— Ainda não consigo entender porque você escolheu o Kevin como inspiração para uma história. O cara nem gostava de você e do nada passou a ser seu amigo. Tem alguma coisa errada nessa história. — disse ela, olhando-me com uma das sobrancelhas arqueadas.
— Para com isso, Chloe.
— Mas é verdade! Um dia desses você estava ai dizendo que ele nunca vai conseguir vencer na vida porque é um fracassado e agora...
Ouvimos um barulho embaixo da arquibancada em que estávamos sentadas e nos assustamos. Porém, ao procurar a origem do barulho, não encontrei nada que pudesse estar fora do normal.
Por mais estranho que pudesse parecer, eu tive a sensação de que o barulho tinha sido bem embaixo de nós, e não gostei nada daquele pensamento.
✬.✬.✬
Eu estava preocupada. Kevin havia me ignorado no colégio quando tentei falar com ele e não estava atendendo as minhas ligações. Eu não sabia se iríamos nos encontrar hoje, se ele estava com raiva de mim ou se simplesmente não tinha mais saco para falar comigo.
Alguma coisa estava errada e eu sentia isso em meu coração.
Foi enquanto eu andava pelo Central Park que o vi, cambaleando pelos cantos, e com os olhos vermelhos. Corri na direção de Kevin e o virei de frente para mim.
— Kevin, o que aconteceu com você? — perguntei, passando a mão pelos seus braços e olhando-o com preocupação.
— Nada, eu só decidi fumar uns baseados com meus amigos. — Ele deu de ombros, e seus olhos estavam bem pequenos devido a quantidade de drogas que havia usado.
— Você mal consegue ficar de pé.
Kevin deu uma gargalhada estrondosa e colocou as mãos em meus ombros de forma desajeitada. Não demorou muito para a seriedade tomar seu rosto, fazendo com que ele me encarasse de um jeito diferente.
Os olhos estavam bem vermelhos, mas ainda conseguia enxergar o azul que reluzia em seu olhar.
Kevin se aproximou de mim rapidamente e me beijou. De início, fiquei assustada com o contato, mas meu corpo se aqueceu, e eu senti que era certo estar ali. Meu coração acelerou, e minhas mãos foram de encontro a sua nuca, mas eu me lembrei do quanto tinha medo de me envolver com ele e me afastei.
— Eu... Eu não posso...
Saí correndo do Central Park sem esperar uma resposta, mas ainda pude ouvir Kevin gritar:
— EU SOU UM FRACASSADO, NÃO É MESMO?
Aos prantos, eu saí dali, ficando com as palavras de Kevin na cabeça. O barulho que eu e Chloe tínhamos ouvido mais cedo era ele, agora não restavam dúvidas.
Eu não queria admitir, mas eu tinha medo sim de me envolver com o Kevin. Eu não o achava um fracassado, mas apesar do que eu sentia, eu queria alguém que pudesse caminhar junto comigo, que quisesse viver e ter um futuro.
E eu percebi que o Kevin ainda não está pronto para isso.
✬.✬.✬
— Kevin, acho que devíamos conversar sobre o que aconteceu ontem. — eu disse, sentando-me ao seu lado num banco onde os excluídos da escola ficavam. Ele tinha me ignorado em todas as aulas que tivemos juntos, e não tinha olhado em minha direção um segundo sequer.
— O fracassado aqui tem coisas melhores para fazer. — Kevin disse, já se preparando para se levantar do banco porém, eu segurei seu braço, impedindo-o.
— Para com isso, Kevin! Vamos conversar como duas pessoas civilizadas, por favor?
— Então você quer que conversemos como duas pessoas civilizadas? — Ele levantou uma das sobrancelhas e me olhou de forma cética. — Tudo bem, vamos conversar então. Podíamos falar sobre o quanto você me julgou sem ao menos me conhecer direito, só torcendo o nariz para mim sempre que eu passava por você, ou podemos falar sobre o fato de que eu sou apaixonado por você desde que começamos a ter as mesmas aulas. Ou podíamos falar sobre o quanto me arrependi de ter deixado você se aproximar de mim. Temos muitos assuntos, não acha?
O ar faltou e meu coração pareceu parar por alguns segundos com todas aquelas confissões. Permaneci imóvel e estática, enquanto absorvia lentamente todas as informações que recebi.
— Porque você tem tanto medo? — Ele perguntou, e agora me encarava como se não entendesse o meu dilema.
— Eu não estou com medo!
Ambos sabíamos que eu estava mentindo.
Eu sabia que tudo o que Kevin me disse era verdade. Eu torcia o nariz sempre que ele passava por mim, e fazia questão de dizer que nunca me deixaria levar por um garoto como ele, mas eu não podia negar que tudo em mim respondia positivamente a Kevin.
O que eu mais temia era que Kevin me machucasse. Eu sabia que éramos de mundos opostos, mas esse não era um problema tão grande se eu levasse em consideração todas as minhas inseguranças.
— Sabe porque eu nunca me aproximei de você antes? Porque eu sabia que uma garota como você nunca iria se interessar por um cara como eu. Eu já estava conformado.
Kevin tinha uma expressão triste no olhar. Seus olhos não buscavam mais os meus, e eu fiquei tão estática com todos os pensamentos e emoções que se passavam pela minha cabeça que não consegui impedi-lo de ir embora.
✬.✬.✬
A doença da minha mãe parecia sugar cada vez mais a vitalidade dela. Enquanto eu acariciava seus cabelos e a observava dormir, eu pensava no quanto a nossa vida era frágil. Ela estava lutando por sua vida, mas a doença era cruel, e não queria deixar que ela vencesse essa batalha.
Papai estava tentando se manter forte pela família, mas ele não conseguia ser assim o tempo todo. Eu não o culpava. Afinal, eu também não conseguiria.
Estive pensando em Kevin e na minha mãe a maior parte da tarde. Tentei abrir o Word para terminar de escrever o décimo capítulo do meu romance, mas não consegui passar do segundo parágrafo.
Deixei a minha mãe descansando no quarto e fui atrás de Jasper e Ronan. Tinha certeza de que eles eram os únicos que sabiam onde Kevin poderia estar, e eu precisava esclarecer as coisas entre nós.
Os encontrei próximos ao Central Park jogando baralho com outros homens.
— Vocês podem me dar o endereço do apartamento do Kevin? — Fiz a pergunta olhando diretamente para Ronan, que era mais amistoso do que Jasper, que me olhava de um jeito estranho.
— Achei que soubesse onde o seu namorado mora. — Jasper disse, fazendo os outros darem risadinhas. Revirei os olhos e fiz a minha melhor expressão ameaçadora.
— Ronan, você pode me dar o endereço dele? Por favor, é importante.
Ronan largou as cartas viradas para baixo em cima da mesa e suspirou, dando-se por vencido.
— Você tem como anotar?
✬.✬.✬
O prédio que Kevin morava ficava localizado no Brooklyn, numa das ruas mais perigosas que eu conhecia, e seu estado era decadente.
A pintura estava desgastada, havia rachaduras no teto, a iluminação era precária e não tinha elevadores. Kevin morava no sétimo andar, e eu já estava morta de cansaço no quarto lance de escada.
Os moradores do prédio também não eram muito amistosos e discretos, pois eu conseguia ouvir sons de pessoas gemendo e grunhindo em alguns andares, além de música alta e muita sujeira.
O sétimo andar estava tão fétido quanto os outros, e o apartamento de Kevin era um dos últimos do corredor. As paredes cinzentas e gélidas pareciam combinar com os moradores do local.
Parei em frente a porta do apartamento de Kevin e me surpreendi ao vê-la entreaberta. Empurrei a porta devagar e entrei, chamando por ele.
— Kevin?
Ninguém respondeu.
Seu apartamento era pequeno, e estava uma bagunça. Havia roupas suas espalhadas pelo chão e amontoadas em cima de uma cadeira na sala. Seus móveis também não eram muitos, e consistiam em um sofá surrado, uma mesinha de madeira, uma televisão pequena e a cadeira.
Abri a porta do que deduzi ser seu quarto, e emiti um grito com o que eu vi:
Kevin estava desmaiado no chão, em cima de uma poça de vômito e vários saquinhos vazios de pó estavam ao seu redor.
Corri em sua direção e me abaixei ao seu lado. Coloquei sua cabeça em meu colo e com as mãos trêmulas, disquei o número da ambulância.
Eu estava completamente assustada, e tinha medo de que os paramédicos chegassem tarde demais.
Se eu o perdesse, nunca iria me perdoar.
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