15
Karina's pov:
"Cada vez que ela sorri, sinto algo em mim viver. Ela não está brincando. Cada momento mostra o imenso carinho em suas palavras simples."
Ainda não acredito que vou mesmo levar Minjeong até a faculdade. Antes ela teria me atacado com seus comentários grosseiros e me dispensado. Agora, no entanto, ela prefere enfrentar seus temores. É como se quisesse encontrar uma forma de recuperar o que perdeu.
Enquanto espero que Minjeong termine de se arrumar, desço até a cozinha para tomar alguma coisa. Quando entro, olho para Hayun, que está limpando uma coleção de utensílios.
— Oi, Jimin. O que foi? Já está pronta para o passeio?
— O quê?
Hayun abre um sorriso tímido para mim.
— Você vai sair com a Minjeong hoje, não? Estou vendo que as coisas estão indo bem entre vocês.
— Sim, mas não é bem assim — minto. Ela continua sorrindo.
— Eu tenho 59 anos, querida. Já vivi muita coisa, então, pode acreditar quando eu digo que tem alguma coisa acontecendo.
Olho para a janela, sem querer encarar seu olhar atento.
— Talvez você tenha razão.
Hayun dá uma risada e acena para que eu me aproxime.
— Aceita um suco? — Ela pergunta.
— Aceito, obrigada.
Sento na banqueta de sempre em frente ao balcão enquanto ela vai até a geladeira e serve um copo para mim.
— Então, o que realmente está acontecendo entre vocês duas? Vocês estão...
Ela deixa a frase morrer no ar, para que eu preencha as lacunas. Bebo um gole do meu suco.
— Nós somos apenas... — começo, mas noto sua sobrancelha arqueada. Ela não está acreditando em mim. — Ainda não definimos bem o que temos.
— Ah — ela diz. — Então tem alguma coisa acontecendo mesmo.
Hayun volta ao que estava fazendo, pensativa. Faço o mesmo, enquanto nos examinamos.
— Eu conto se você contar — digo de uma vez só.
Ela fica interessada.
— É mesmo? E o que é que você acha que eu sei?
— O que aconteceu com Minjeong. Quer dizer, o que realmente aconteceu com ela naquele dia.
— Entendo. E o que você pretende me contar em troca?
— O que está acontecendo entre nós — Respondo. Apesar de que acredito que ela já saiba.
Hayun me lança um olhar.
— Admito que estou curiosa para saber como a relação de vocês evoluiu dessa forma, mas não é uma troca justa.
Ela está certa. Nosso atual relacionamento não está no mesmo nível do que levou Minjeong a ser testemunha em um caso de segredo de justiça.
— Valeu a tentativa — digo, abrindo um sorrisinho bobo ao beber o resto do meu suco. Por fim, me levanto para ir até a sala.
— Jimin...
— Oi?
— Eu contaria. Sobre Minjeong. Se soubesse.
Preciso de um segundo para entender.
— Do incidente, você diz?
Ela assente com a cabeça.
— Sei os detalhes do inquérito, claro. As consequências com as quais ela tem que lidar. Mas não sei o que realmente aconteceu. E não sei se alguém próximo a ela sabe.
— Ninguém nunca perguntou? Nem mesmo a Sra. Kim?
— Bom, ela perguntou, mas não sei o quanto Minjeong lhe contou. E acredito que muita gente perguntou logo depois que aconteceu, mas ela estava perturbada demais para falar a respeito. Mais ou menos seis meses depois, acho que todo mundo meio que quis dar espaço para ela.
Mordo o interior da bochecha enquanto penso sobre isso.
Talvez ter espaço demais não seja uma coisa muito boa. Talvez ela precise ser cercada para poder se curar por dentro.
— E, Jimin? — Hayun me chama quando eu já estou quase saindo. — Vá devagar. Não precisa apressar as coisas. Deixe a ligação entre vocês falar mais alto. Não queremos que o progresso que você está tendo com ela seja perdido.
Esse, sim, é o tipo de conselho que eu gosto de receber.
Espero na sala de estar até Minjeong aparecer. Finalmente a vejo descendo as escadas, parecendo tão perdida em pensamentos quanto eu estava poucos minutos antes.
— Oi — cumprimento assim que ela se aproxima. Ela está perfeita, como sempre.
— Oi — ela responde, enfiando as mãos no bolso de trás da calça. Ficamos ali por alguns segundos, apenas olhando uma para a outra. Quando ela sorri, eu sorrio. Quando eu sorrio, ela sorri.
E é basicamente o que fazemos.
— Hum, é melhor irmos para o carro — digo, fazendo um sinal em direção a porta. Ela sorri e assente. Entramos no meu carro e seguimos viagem em silêncio. Essa situação deveria ser desconfortável, só que eu já estou acostumada a ficar assim com Minjeong.
Quando olho para o lado, vejo que ela está mexendo nas mãos, perdida em pensamentos. E eu imagino o porquê de estar assim.
— Você está bem? — Pergunto por fim.
Minjeong abre um sorriso meio sem graça e dá de ombros. Respiro fundo, porque vejo um sinal de pânico passar pelo rosto dela. Seguro sua mão, entrelaçando nossos dedos.
— Posso fazer uma pergunta? — Digo com suavidade.
— Claro.
— O que se passa na sua cabeça quando uma crise acontece?
— Parece que estou parada na frente de um trem de carga, incapaz de sair do lugar.
Assinto com a cabeça, entendendo.
— Você é uma pessoa incrível por estar enfrentando tudo isso de frente. Pode parecer algo simples, mas eu sei o quanto significa para você fazer isso, Minjeong.
Ela sorri de forma singela.
— Ainda não sei bem o que pensar sobre isso... — Diz quase em um sussurro. — Então vou continuar confiando em você.
Sorrio para ela, quase convencida de que eu estou tendo algum tipo estranho de alucinação.
As últimas semanas parecem mais um sonho do qual eu tenho medo de acordar. Coisas como Minjeong não acontecem para garotas como eu, não na vida real.
Assim que chegamos, entramos no campus da Yonsei University. De vez em quando eu respiro fundo para ter certeza de que estou realmente acordada. Eu a guio pelos corredores de acesso livre e percebo que ela está começando a ficar ansiosa.
— Juro que é totalmente seguro — digo, e ela chega mais perto de mim, entrelaçando um braço no meu.
Fazemos um breve tour pelo prédio principal da faculdade, incluindo uma visita a biblioteca de que tanto falei para ela. Não sei por que, mas começamos a compartilhar histórias sobre nossas vidas. Minjeong me conta de seu pai, como nunca foram muito próximos até um ano atrás. Ela para um pouco e respira fundo, entrelaçando os dedos nos meus. Não falo nada, porque o pesar de sua linguagem corporal está dizendo tudo o que precisa ser dito.
Nós também rimos de como estamos excessivamente cansadas e de como não conseguimos dormir de verdade. Em determinado momento, ela parece ficar para baixo, e eu a abraço e a puxo contra meu corpo. Ficamos assim por um bom tempo.
Pouco depois, conto a ela sobre o meu lugar favorito no campus, e ela pede para vê-lo. Saindo do prédio da faculdade, vamos até os jardins do fundo. Estendo as mãos e digo, em tom de brincadeira:
— Bem vinda ao paraíso!
— O que estou vendo exatamente? — Ela pergunta.
— A questão não é o que você vê, e sim o que você sente... — Digo, inclinando-me na sua direção. — Normalmente, eu vou para o gramando e fico sentada ali, mas duvido que uma garota... — Eu nem terminei de falar quando vejo Minjeong sentando na grama. Então faço o mesmo. — Tenho alguns intervalos entre minhas aulas, então gosto de vir aqui para ler já que é uma área mais reservada. — Ficamos sentadas ali, sob um sol cálido da manhã, e peço a ela que feche os olhos. — Diga o que você está sentindo.
— Tranquilidade — sussurra Minjeong, me fazendo sorrir.
— Eu entendo. O que mais?
— Hum... Acho que... Paz o suficiente para esquecer um pouco os meus problemas.
— Então estamos no caminho certo. — Digo, olhando para o céu ensolarado. — Parece meio improvável se sentir assim em um lugar como esse, mas é o que realmente acontece quando estamos em contato com a natureza.
— Talvez a gente pudesse sair para correr algum dia desses...
Olho para ela, surpresa.
— Você está mesmo me propondo isso?
Ela cora e desvia o olhar.
— Talvez eu esteja propondo, sim.
— E por que quando eu comentei que corria você implicou comigo?
— Porque... eu queria continuar falando com você, mas não sabia o que dizer. Às vezes, fico sem saber o que dizer.
— Para mim?
Ela assente com a cabeça.
— Você me deixa nervosa.
— Por quê?
— Porque, quando você olha para mim, realmente olha nos meus olhos. Várias pessoas nunca olham nos olhos.
— Azar o delas — digo. — Seus olhos são lindos.
Ela fica corada outra vez.
— Obrigada, Jimin.
— Estou vendo que você realmente mudou.
— Mudei? — Ela questiona, olhando para mim.
— Você sabe. Para alguém que dizia me odiar, agora você não tem receio em demonstrar o quanto está entregue aos meus encantos.
Ela me lança um dos seus olhares maçantes e tento evitar um sorriso.
— Acredito que você tenha razão, sabe? Eu realmente mudei. Acho que enlouqueci depois de todo esse tempo, afinal.
Sorrio. Sei que é meio esquisito, já que ela está brincando com sua condição, mas sorrio porque, caramba... foi engraçado. Eu sinto falta de momentos engraçados na minha vida.
— Desculpe... — Digo, aproximando-me dela e de brincadeira cutucando seu ombro. — Mas é inevitável não te provocar em momentos como esse. — Quando falo isso, seu nariz se mexe e suas sobrancelhas arqueiam.
— Não sei bem o que pensar sobre isso.
Quando seu rosto fica mais perto do meu, solto o ar pela boca, roçando meus lábios nos dela. Eu nunca soube que beijar alguém poderia ser tão natural e tão viciante. Ela permite que eu faça todo o trabalho, explorando seus lábios com os meus.
Eu posso sentir seu coração batendo por baixo da camisa, e ela coloca a mão sobre o meu.
Uma última vez, meus lábios encontram os meus, quase sem tocá-los, como uma cerimônia de encerramento. Quando ela abre os olhos, encontra o meu olhar, e sorrio para ela.
— Me conte algo que eu não sei sobre você.
— Eu estou trabalhando em um livro.
Arqueio uma sobrancelha.
— Sério?
— Sério. Como você sabe, eu amo literatura, então comecei a escrever como uma forma de lidar com todo o meu tempo livre. Mas não sei se vou conseguir quebrar todas as minhas barreiras pessoais e ser capaz de seguir esse sonho.
— Você só vai saber quando tentar, Minjeong. A escrita não é apenas algo que você vê, e sim algo que você sente. Ela transcende estereótipos. Você vai ser a maior escritora que a humanidade já viu.
Ela ri.
— Você nem leu nenhum conto meu ainda.
— Então vamos mudar isso. — Digo em tom gentil. — Me mostre alguma coisa quando se sentir confiante.
— Combinado. — Minjeong diz. — O que a literatura é para você? O que isso significa para você?
— A literatura... hum... Literatura é um lembrete de que nunca estou sozinha.
— É isso que também penso. Os livros são os meus melhores amigos quando todo o resto são apenas conhecidos.
Meu sorriso se alarga enquanto volto a observar o ambiente. Quando eu estou prestes a mudar de assunto, um rapaz se aproxima de onde estamos. Seus cabelos são castanhos, quase negros, e ele está usando uma jaqueta de couro e calças jeans.
— Minjeong? — Ele diz em tom surpreso.
Ela desvia sua atenção e olha para o garoto. Os dois se encaram por alguns segundos antes dela dizer:
— Oi, Sunghoon.
Fico em silêncio. Esse é Park Sunghoon, o ex namorado idiota dela. Imediatamente meus instintos me deixam alerta.
— Faz tempo que não te vejo — ele diz, indiferente.
— É mesmo? — Ela pergunta, com os olhos arregalados. — Que estranho. Não me viu pelo campus com as outras garotas? Adoro ficar no circuito das fraternidades.
— Você entrou para a faculdade? — Sunghoon pergunta. O senso de humor de Minjeong está muito além da capacidade da cabeça cheia de gel dele. — Sabe, estou surpreso em ver que você está retomando sua vida depois do que aconteceu. Tranquei meu curso há alguns meses, mas pretendo retomar minhas aulas na próxima semana. Então se você tiver tempo livre e quiser...
Ela solta um suspiro triste.
— Sinto muito, mas meio que estou com alguém.
— Ah, é? — Ele franze o cenho de maneira nada sutil.
Meus dedos ficam tensos e eu abro um sorriso duro. Odeio caras assim; Terminam com uma garota da pior forma possível e depois agem com toda naturalidade, como se nada tivesse acontecido e ainda tivessem direito de saber sobre a vida dela.
— Foi mal, cara — digo, passando o braço pelo ombro de Minjeong e entrando no jogo. — Ela já está em ótima companhia.
— Ah, claro. — Ele sorri de modo constrangido. — Foi bom ver você, Minjeong.
— Igualmente — Ela diz, friamente.
Sunghoon assente e se afasta rapidamente.
— O que foi isso? — Pergunto, embora saiba o que acabou de acontecer.
Minjeong parecia completamente segura enquanto falava com seu ex, conversando calmamente e usando do seu sarcasmo habitual, mas eu consegui enxergar além das aparências. Percebi a linguagem corporal dela, o modo como seus movimentos revelavam a verdade. Seus ombros estavam curvados e seus dedos tamborilavam nervosamente no gramado, e o sorriso era mais forçado do que eu imaginava que um sorriso pudesse ser.
Quando ele deu as costas e se retirou, também percebi o quanto ela pareceu relaxar.
— Nada. Só encontrei com alguém do meu passado no lugar mais improvável possível — Minjeong diz. Apesar do tom indiferente, seu olhar mostra o quanto está magoada. — Aposto que ele está se fartando só de nos ver conversando aqui.
— Eu posso ir lá resolver essa questão com ele — acrescento rapidamente, não querendo deixar que isso estrague o nosso dia.
— Não, não. Tipo assim, nós já estamos juntas mesmo, não é? Além disso, estou farta de sempre mudar a minha vida para tentar atender às expectativas dos outros.
— Outra descoberta de Minjeong? — Pergunto.
— Estou me divertindo muito com essa coisa de tentar redescobrir quem eu sou. Se isso significa ter que encarar alguns dos meus problemas de frente, então acho que vou precisar aprender a lidar com isso.
— Bom, então você já pode começar a me agradecer — Brinco.
Ela sorri, e fico feliz de não ser o sorriso forçado.
Olho para o céu ensolarado uma última vez antes de me levantar e estender a mão para Minjeong. Ela a segura e fica surpresa quando a puxo em meus braços para um abraço bem apertado. Ela não vacila e enterra o rosto em meu pescoço, me abraçando também.
— Você não sabe o que isso significa para mim — sussurra.
Eu me afasto um pouco e olho para ela, sorrindo.
— Vou garantir que você realize os seus sonhos, lembra? Mas agora acho melhor voltarmos para casa.
Minjeong me observa em silêncio por alguns instantes. Seus lábios se aproximam dos meus, e, quando tocam o canto da minha boca, sinto uma onda de calor subir por meu corpo.
— Obrigada, Jimin — ela diz, tocando levemente a ponta dos meus dedos antes de dar um passo para trás, arrancando outro sorriso meu.
— Não precisa agradecer, Minjeong. — Meu coração está se perdendo em um mundo de desejo, e permito que ele viaje para esse território desconhecido. — Ah, e só para você saber... vou cobrar a corrida que me propôs.
— Acho que vou me arrepender de ter feito isso — Ela reclama, sorrindo.
Eu estou oficialmente encantada.
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