07
Karina's pov:
"Somos pessoas diferentes, mas ao mesmo tempo, nossa existência faz sentido — uma equilibra a outra."
Não sei bem porque vim conferir como ela estava, mas depois que vi o seu estado eu não podia simplesmente deixá-la assim. Eu sei muito bem como são crises de pânico. Durante meu período de reabilitação, tive minha cota pessoal delas. Crises como essas prendem a pessoa por inteiro e depois a libertam de tal modo que ela fica em pedaços. Agora estamos aqui, sentadas na cama dela, ainda no abraço uma da outra.
Hesitante, aproximo minha mão e acaricio os seus cabelos. Este momento e tão surreal que mordo o lábio para me assegurar de que não estou delirando. Pergunto-me se vai parecer mais real quando ela se der conta da nossa situação e finalmente me afastar.
— Por que você ainda está aqui? — Ela sussurra, afastando-se.
— Eu só queria me certificar de que você estava bem. Você está bem? — Pergunto, fazendo um gesto com a cabeça na direção dela. Depois que as palavras saem da minha boca, percebo como a pergunta é idiota. Claro que ela não está bem.
— Eu vou ficar bem — Minjeong responde, evitando me encarar. Não há mais nenhum indício de raiva em seu rosto, agora ela só parece cansada. — Deve ser difícil morar num lugar em que você não se sente completamente bem-vinda. Tenho certeza de que seus motivos para ficar aqui são válidos, mas isso não torna menos difícil lidar com essa minha atitude.
Fico surpresa com seu comentário, mas não respondo.
Minhas atitudes fizeram um ótimo trabalho para que muitas pessoas me desprezassem. Eu era a inconsequente do meu círculo social, a decepção. Mesmo quando decidi corrigir os meus erros e recomeçar, ninguém tinha o interesse em me conhecer de fato porque já conheciam bem a minha antiga reputação. Assim, eu nunca me apresentava para os seus julgamentos e eventualmente nunca era bem vinda.
— Sei que você não me conhece, mas se um dia precisar de alguém para conversar... — Digo, evitando falar sobre mim.
— Eu não preciso — Minjeong responde e quando as palavras saem de sua boca, ela parece incomodada.
Nos conhecemos há um tempo que pode ser contado em dias, não em anos, e ainda me parece tão improvável que estejamos nessa situação. Além disso, ela parece realmente querer me proteger de si mesma. Não sei como me sentir a respeito disto.
Tocada, talvez. E também vigilante.
— Está bem.
Seu lábio inferior estremece.
— Não é você. Eu não me sinto confortável para conversar com pessoas que não são próximas. E mesmo assim...
Assinto com a cabeça, compreendendo.
— Bem... Meu nome é Yoo Jimin. Eu adoro música e tive algumas aulas quando era mais nova, mas nunca terminei nenhuma composição. Sou a pior pessoa para se levar a um restaurante, porque nunca consigo decidir o que quero comer. Adoro sair para correr no parque, embora tenha pavor das aves que nele habitam, o que algumas pessoas acham uma frescura, mas eu acho aterrorizante. Tenho uma tatuagem no pulso direito que fiz para representar o significado da minha família e...
Ela estreita os olhos.
— O que você está fazendo?
— Estou te contando coisas sobre mim para ficarmos mais próximas. Assim, você vai poder conversar comigo.
Ela sorri de forma singela. E ainda mantenho minha opinião, sorrisos deixam ela ainda mais interessante.
— Por que você está se esforçando tanto para eu me abrir? — Pergunta Minjeong.
— Porque, mesmo que você não perceba, nós duas temos coisas em comum. Além disso, você é uma das únicas pessoas que não faz com que eu me sinta obrigada a fingir ser uma coisa que não sou.
— O que você está fingindo ser?
— Perfeita.
— Eu sei como é isso. — Ela fala baixo, em um tom inseguro. — Ter que fingir ser uma coisa que você não é.
— E o que você está fingindo ser? — Pergunto.
— Revoltada.
— Mas o que você é na verdade?
— Perdida — ela confessa com sinceridade, e sinto as palavras dela tocarem minha alma.
— Eu também. Tão perdida.
Ela abaixa a cabeça e olha para o chão, mas não diz mais nada. Me inclinou na sua direção.
— Se você precisar de alguma coisa...
— Não preciso. Nós não precisamos.
— Mas se houver um momento em que precisar, estou aqui. Mesmo que seja só para trocar insultos com você.
Ela parece tão perplexa diante da minha oferta — quase irritada por eu ter dito isso —, mas não responde nada.
— É melhor eu ir agora. Não quero tomar mais do seu tempo.
Ela assente com a cabeça e me acompanha até a porta.
— Desculpe — diz com voz baixa.
— Pelo quê?
— Por agir daquela forma e por isso — ela aponta para os meus braços e só então noto algumas marcas avermelhadas na minha pele.
Dou de ombros.
— Não é nada demais.
Ela resmunga e contrai os lábios.
— Você estava tentando me ajudar e eu fiz isso...
— Veja pelo lado bom, eu posso dizer que tive uma noite intensa com uma garota — brinco. — Acho que isso vai me atrair atenção na faculdade.
Ela inclina a cabeça um pouco, como se eu fosse um quebra-cabeça.
— Sério que você acabou de falar isso? Talvez minha visão sobre você não esteja tão errada, afinal.
— Você tem que admitir que é uma boa ideia.
— Sem contar com o que você vai tirar disso — ela diz, cruzando os braços. — Se quer ser uma das populares na faculdade, fica à vontade, mas vai ter que encontrar outra garota que tope ser sua cúmplice nisso.
Apesar de tudo, eu rio, porque ela é mesmo diferente de tudo o que eu imaginei.
— Não sei se gosto de você — digo, surpresa que minha mão tenha se erguido para puxar uma mecha de cabelo dela.
Minjeong parece um pouco assustada com o gesto, mas seus olhos aparentam se abrandar um pouco e ela se esforça para sorrir.
— Estou chocada. Tinha certeza de que você ia me convidar para um passeio no parque.
— Bom, talvez...
— Sério — ela me interrompe. — Você não quer mesmo dar uma olhada nesses arranhões?
Abro um sorriso inocente.
— Não. Eles são a lembrança da nossa intensa noite juntas.
Minjeong revira os olhos.
— Você é sempre irritante assim?
— Olha quem está falando.
Ela sorri, e eu agradeço por seu sorriso.
— Bem, se você tem certeza — diz com um tom de incerteza.
— Tenho certeza absoluta, mas obrigada por se preocupar.
Quando me viro para ir embora, a voz dela me faz parar.
— Por que você não se afastou?
— O quê?
— Por causa da minha crise. Por que não se afastou como muitas pessoas fizeram?
Meus olhos encontram os dela, e mesmo que suas palavras sejam indiferentes, o olhar não é. Seus olhos simplesmente brilham de tristeza. Ah, Minjeong. Ela é jovem demais para ser tão triste assim, tão irritada, tão quebrada.
— Por um motivo bem simples — respondo. — Porque não sou como as outras pessoas.
Ela não diz mais nada. Apenas se vira e fecha a porta do quarto, enquanto eu sigo pelo corredor até o meu quarto.
Não há a menor chance de eu pegar no sono tão cedo.
Tudo pelo que Minjeong passou hoje é perigoso. A emoção que está sentindo é mortal. A última coisa de que ela precisava era ficar sozinha e achar uma maneira de calar os ruídos em sua cabeça.
Eu sei o que é se afogar em seus problemas dessa maneira. A última coisa que eu quero é que Minjeong siga o mesmo caminho de destruição. Ela é uma boa garota. Os poucos minutos em que ficamos conversando mostraram como ela está perdida, mas ao mesmo tempo se mantem firme. Só espero que ela possa permanecer assim.
Deito na minha cama e respiro fundo, perguntando-me o que estou fazendo afinal.
Não tenho como ajudar essa garota dado o momento pelo qual venho passando. Na verdade, nem sei se é possível ajudar alguém que não quer mudar. Mas não foi isso que me deixou toda tensa e no limite. É que, lá no fundo, sei que a razão pela qual vim para cá foi a noção inocente de recomeçar. Que, de alguma forma, eu poderia consertar o que estivesse quebrado dentro de mim. Mas...
E se Minjeong estiver certa? Será que não é possível consertar a si mesmo?
\[...]
Minha terceira aula do dia se arrasta, ou é o que eu sinto enquanto minha mente insiste em lembrar do que aconteceu na noite passada. Ao menos descubro que minha dupla pelo resto do semestre vai ser Ningning, então acho que vou conseguir sobreviver.
— Essa coisa de termos mais de uma aula em comum está dando certo. Não está? — Ela sorri, virando para mim enquanto caminhamos pelo corredor.
Dou de ombros. Não há muito tempo que eu estou aqui, então tudo ainda é meio novo para mim.
Ela não se importa muito com a minha resposta e se aproxima.
— Bom, tenho uma novidade para você. Giselle vai dar uma festa daqui a algumas semanas, quando os pais dela forem viajar, e quero saber se você não quer aparecer por lá.
Ergo uma sobrancelha e dou uma risada.
— Não, obrigada.
Yizhuo faz beicinho e cruza os braços.
— Vamos. Eu sei que você ainda é novata, mas talvez essa seja a oportunidades perfeita para conhecer algumas pessoas. — Ela junta as mãos e começa a implorar. — Por favor, Jimin?!
— Eu... — Faço uma pausa. — Eu não sou muito de festa, Ningning. — Percebo que ela franze a testa e imediatamente me sinto mal. — Talvez numa próxima? — Abro um sorriso gentil e a cutuco no braço.
Ela sorri e assente com a cabeça.
— Tudo bem, mas eu vou cobrar.
Como estamos no horário de almoço, vamos até o refeitório. Aeri esta sentada em uma mesa no fundo e acena para nós.
Como descobri há alguns dias, Yizhuo e Aeri são namoradas. Elas se conheceram no último ano do colegial e desde então são quase inseparáveis. Mas apesar da sintonia de casal, elas são praticamente o oposto uma da outra. Aeri tende a ser mais quieta e reservada. Ningning é mais direta e agitada.
— Ei, Jimin. Fiquei sabendo que você e Ningning tem mais de uma aula em comum. — Ela bate na cadeira à frente dela e me diz para colocar minha bandeja ali. — Então, como está sendo sua experiência acadêmica?
— Está sendo tranquila. — Tenho vontade de dizer a ela que a faculdade atualmente é o menor dos meus problemas, porque minha vida particular em si já é bem difícil às vezes. Mas acho melhor não assustá-la.
— Ah, não precisa mentir. Eu sei que essa situação toda está sendo uma droga.
Aeri me lançar um olhar divertido, e eu acabo sorrindo.
Ela também é um ano mais nova do que eu e se mudou para Seul alguns anos atrás, quando sua mãe não tinha mais condições de assumir a frente dos negócios da família sozinha.
Não somos exatamente próximas, mas isso nunca a impediu de me tratar como uma amiga. O visual dela é incrível, e se você precisar de ajuda com algo, Aeri rapidamente se oferece para resolver a questão. Como ela estuda no departamento de administração, só nos encontramos pelo campus em momentos como esse.
Fico em silêncio enquanto observo um garoto alto e moreno entrar no refeitório e vir na nossa direção.
— Quais são as novidades, gente? — Ele puxa uma cadeira para a nossa mesa e se senta.
Alterno o olhar entre Yizhuo e Aeri, como quem pede uma explicação. Elas sorriem e Aeri o apresenta como Choi Seugcheol, veterano no curso de administração e a melhor pessoa que eu poderia querer ter por perto quando o assunto é diversão.
Dou de ombros enquanto sorrio, e provo do meu almoço.
— Quase tive uma discussão com o professor Park. — Ele diz, parecendo realmente chateado, antes de virar para mim. — Você vai beber esse suco?
Assinto com a cabeça.
Ele dá de ombros, estica o braço para a bandeja de Yizhuo e pega uma das suas batatas fritas. No mesmo instante, Aeri se vira e tenta atingir a mão dele, mas é tarde demais.
— Foco aqui, Seungcheol. — Ela diz, chamando a atenção dele. — Você quase discutiu com o professor Park? Pensei que aula de inovação e empreendedorismo fosse a sua preferida!
Eu ainda estou tentando entender como isso aconteceu.
— E você está certa. Mas então o idiota tinha que estragar tudo dizendo que minha visão sobre o mercado é idealista e sem fundamento. Que dramático e exagerado, né? Que droga. — Ele faz uma pausa. — Sendo assim vou pedir a outro professor que seja o meu orientador.
Aeri assente com a cabeça para o amigo, mas não parece que ela está surpresa em saber disso.
— Vai com calma, Seungcheol. — Diz Ningning.
Ele passa as mãos nos cabelos e seus olhos se estreitam.
— Ah, vamos! Por que diabos eu faria isso quando estou sendo menosprezado por um ancião que se acha melhor do que todo mundo simplesmente por ficou parado no tempo.
Não consigo evitar sorrir.
— Você é tão idiota — Yizhuo murmura, cruzando os braços.
— E é exatamente por isso que você gosta tanto de mim, garota — ele diz, passando o braço pelos ombros dela.
Eu ainda estou perdida.
— Então... posso fazer uma pergunta? — Me manifesto, relutante.
Seungcheol empurra meu ombro de brincadeira.
— Vá em frente.
— Você ficou com raiva desse professor porque exatamente?
As garotas riem, antes dele responder:
— Eu não lido muito bem com menosprezo. A maioria das pessoas que me conhecem estão cientes disso, mas sempre aparece alguém com a ilusão de que vai me humilhar por se sentir melhor do que eu. Eles só não entendem que eu nunca vou deixar isso acontecer.
— Você deve ter uma vida bem agitada.
— Nem me fale. — Ele sorri. — Mas tirando isso, juro que sou uma pessoa bem tranquila.
Sorrio.
— Então, como fica sua questão com esse tal professor?
— Ah, provavelmente vou ser marcado pelo resto do semestre, mas quem se importa? — Seungcheol dá uma piscadela.
— Você pelo visto não. — Digo, sorrindo.
Ela assente com a cabeça enquanto se levanta da cadeira.
— Vou comprar meu almoço. Volto já. —Enquanto caminha até a fila, ele é cumprimentando por alguns dos alunos das mesas pelas quais passa. Pelo visto, ele é bem popular, e eu posso entender por quê.
Aeri balança a cabeça antes de virar para mim.
— E quanto a você? — Ela pergunta. — Como está sendo sua estadia na casa da família Kim?
Queria poder contar a ela sobre Minjeong. Queria contar que, assim que nos conhecemos, percebi que ela era diferente das outras pessoas. E, mais do que tudo, queria contar sobre como foi incômodo vê-la despedaçada por conta de um passado que insiste em omitir de todos. Mas sei que não posso. Ainda que Aeri e Yizhuo sejam amigas delas, eu não posso contar isso para ninguém. Então é o que faço. Respondo apenas:
— Mais confortável do que eu imaginei.
— Sério? Bom, a gente sabe como Minjeong consegue ser bem difícil — ela diz, trocando um rápido olhar com Ningning. — Mas acredite, ela é uma boa pessoa.
— Vocês não precisam se preocupar com isso. Minjeong e eu estamos conseguido conviver relativamente bem. Ela tem uma paixão por literatura, então já temos um ponto em comum.
Aeri assente com a cabeça, sorrindo.
O almoço corre bem. E, de alguma forma, consigo sobreviver a sessão de provocações entre Yizhuo e Aeri. Sério, elas rapidamente começaram a pegação no pé que é parte do relacionamento entre pessoas que estão juntas a bastante tempo.
Mas sendo sincera, é impossível não se divertir estando na presença delas. Por um momento até me esqueço dos meus problemas.
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