Prólogo: KATHY MORGAN
Spoiler: Formaturas são momentos felizes... até acabarem em ameaça de processo.
Formaturas deveriam ser sobre esperança. Novos começos. O começo do "deu tudo certo". Pelo menos foi isso que o Sr. Washington disse no discurso cansativo que escutamos.
Mas lá estava eu, ajustando a beca, suando desesperada em um ginásio abafado, encurralada por pessoas sentadas em cadeiras, ao lado da pior companhia do mundo: Bruce McAllister. Até o som da sua respiração me dava nos nervos.
Não era para eu ficar na mesma fileira que meu adversário. Mas, pelo fato de termos apresentado juntos uma releitura de Romeu e Julieta, nos acomodarmos perto um do outro foi o mais viável para manter o evento organizado.
A cerimônia encerrou. Os formandos saíam com dificuldade, tentando ser educados.
- Vai admitir que fez de propósito? Tudo isso só porque eu estava indo melhor que você, Morgan? - perguntou Bruce, vindo atrás de mim, passando pelas cadeiras de plástico amarelas, numa fileira estreita demais para um cara do seu tamanho.
Revirei os olhos, pois tamanha era a vontade de socá-lo. Mas aquele dia era para ser tranquilo, uma lembrança de quando finalmente iniciei a trajetória de atriz profissional. Porém, eu não conseguia ficar por baixo. Como eu dormiria naquela noite se a última provocação fosse a dele? Como eu dormiria por todos os anos seguintes?
- Quer que eu admita o quê? Nem era para você contracenar comigo nesse papel principal... Só foi o Romeu por ser um puxa-saco do professor...
- Puxa-saco, eu? Ai, meu Deus, Morgan... Você é que...
Prendi o ar nos pulmões, com medo de que o meu maior trauma fosse mencionado no meu último dia naquele lugar, porém ele hesitou.
- Fala sério, garota! Não tem mais o que inventar ao meu respeito?
Seus passos eram maiores que os meus. Bruce deveria ter quase dois metros de altura. Não sei se era sua intenção, mas pisava na barra da minha beca, me fazendo quase tropeçar.
Virei para trás e bufei, estressada: - Você pode parar?!
Os outros recém-formados nos olhavam, estalando a língua de tempos em tempos.
- E você, vai parar quando de improvisar durante as cenas? - Ele semicerrava os olhos negros, parcialmente cobertos pelos fios de cabelo bagunçados e escuros. - Ah, não, esqueci... - O sarcasmo se destacava. - Agora não precisa mais, já acabou... Finalmente vou trabalhar com quem sabe decorar as falas...
Sacudi a cabeça e me voltei para frente, continuando a caminhar: - Você é o maior idiota de todos.
- Você queria roubar o show e me fazer de palhaço, como sempre.
Eu ri, lembrando do olhar que ele me lançou na hora, fulminante.
- Ah, você ainda está ofendido por isso? Achei que atores deviam saber improvisar. Ou será que você só é bom quando tem um roteiro, garoto do Canyon?
- Você é... - Ele suspirou, desistente. - Você é insuportável, Morgan.
Por um segundo, quando deixamos a área dos bancos, ficamos calados, encarando um ao outro. Não de forma romântica, é claro. Era mais como dois boxeadores esperando o anúncio da próxima rodada.
- Sabe o que é bom nisso tudo, McAllister? - interrompi o silêncio, ajeitando o capelo com um movimento exagerado. - Nunca mais vamos precisar nos ver.
- Até que enfim algo em que concordamos.
Ele se virou, e eu respirei fundo, me forçando a sorrir. Só faltavam mais alguns minutos e, depois das fotografias, eu estaria livre.
Meus pais me esperavam do lado de fora do ginásio. Minha mãe, sempre impecável, ajeitou meu capelo com cuidado, como na época em que arrumava o meu coque cheio de fitas para o balé. Já meu pai, por outro lado, estava obcecado, remoendo uma história antiga. Ele não tinha esquecido a briga que Bruce e eu tivemos numa excursão.
- Foi aquele garoto, não foi? - ele disparou, sem nem esperar eu dizer nada. - O McAllister? Ele te desrespeitou, não foi?
- Pai, pelo amor de Deus, não é o momento... Não preciso de um advogado agora. Não está trabalhando... É a minha formatura - lembrei, um tanto sem graça.
- Katheryn, o que ele fez? - minha mãe perguntou, apreensiva. - Ele te machucou?
- Não, mãe! Não foi nada! - menti, porque a última coisa que queria era transformar onde estávamos em palco. Eu não tinha contado à minha mãe o ocorrido. Sabia que sua preocupação me atrapalharia a terminar o curso.
Mas meu pai, mesmo já tendo dado um jeito na situação, não desistiria de arruinar tudo. Ele já tinha localizado Bruce e sua família.
- Ei! Você! - Ele marchava, com o indicador esticado na direção deles.
Corri atrás, mas já era tarde. Meu pai parou em frente ao Bruce, o dedo na cara dele desceu direto para o seu peito e o tocou. Tocou ali algumas vezes, instigando uma reação. Embora eu estivesse um pouco longe, vi o quanto Bruce ofegava de nervoso.
- Escuta aqui, garoto, se você acha que pode humilhar minha filha, está muito enganado. Você ainda vai ouvir falar de mim.
Bruce franziu a testa e me olhou, confuso. Foi nessa hora, depois de quase três anos, que tive dúvidas se culpei a pessoa errada. Ele se colocou para frente como se fosse revidar a ameaça do meu pai de forma violenta, mas o homem ao seu lado, segurou-o pelos ombros.
- Calma, filho... - Seu pai, que tinha o famoso estereótipo de velho motoqueiro que gosta de arrumar encrencas em bares, falou com timbre apaziguador.
Bruce olhou para trás, parecendo constrangido.
Seu pai, um homem alto, de cabelos raspados e barba longa, chegou perto do meu, com o terno todo engomadinho, falando tranquilamente: - Meu amigo, eles são jovens. Isso acontece. Meu filho é um bom garoto. Foi só o calor do momento. Nada que precise ir além disso...
- "Calor do momento"? - meu pai resmungou, mas, antes que ele pudesse continuar, minha mãe o puxou pelo braço.
- Vamos, meu bem. - Ela me olhou e fez um pedido, mexendo apenas os lábios: "resolve isso".
Engoli em seco e encarei Bruce. Pela primeira vez, eu vi algo diferente em seus olhos. Não era raiva ou arrogância. Era... cansaço? Estava cansado de mim?
Eu não disse nada. Não sabia o que dizer.
Logo, nos afastamos. Nossas famílias seguiram em direções opostas, cada uma voltando para suas próprias vidas.
Olhei para trás, sem pensar muito, e encontrei os olhos de Bruce pairando sobre mim.
Naquele momento, me perguntei se algum dia essa rivalidade iria acabar.
E então ele virou o rosto.
"Não", falei para mim mesma, voltando a olhar para frente.
- Nunca mais verei Bruce McAllister - balbuciei baixinho.
Pelo menos, esse era o plano.
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