Capítulo 20: Kathy

Spoiler: Dizem que a verdade liberta. Mas, às vezes, ela destroi.

Estar tão próxima ao Bruce, às vezes, me dava medo. Tudo começava a parecer perfeito de uma forma assustadora. Qual foi a última vez que as coisas deram certo para mim? Eu não me lembrava. Por que agora a vida fluiria na direção certa?

Eu sabia, uma hora eu teria que falar sobre Tobby e conto de fadas viraria a hora do pesadelo. McAlister e eu éramos ótimos em discutir.

— O que foi, Kathy? — Ele perguntou, franzindo a testa.

Desci de seu colo e caminhei pelo quarto, tentando encontrar as palavras certas. Sentei no sofá, colocando uma distância entre nós. Era necessária para começar aquele assunto delicado sem me perder no conforto do seu olhar, pois senão iria adiar mais um pouco.

Ele me observava, sua fisionomia carregava algo entre apreensão e curiosidade.

— Já passa das quatro horas. — falei, pensando na dinâmica que começaria às 17:30.

Bruce olhou o relógio na parede e voltou a atenção para mim.

— Kathy?

— Olha, Brooh, eu preciso que acredite no que eu vou te dizer.

Ele coçou a cabeça, esfregou a barba... Seu silêncio fez meu estômago revirar. Eu não sabia quem tinha mais receio ali, eu de falar ou ele de ouvir.

— Bom, como você sabe, o Mark vai passar algumas cenas de ontem à noite para todos assistirem...

— Eu não estou sabendo. Quando falaram isso?

— Ué, Bruce? Lá embaixo, na hora do café.

Ele me olhou, confuso. Depois, arqueou uma sobrancelha e soltou, num tom provocador:

— Na hora em que você estava me masturbando? — Esboçou um sorriso de lado. — Eu não estava prestando atenção em nada... Não deu para perceber?

Bufei e me levantei. Passei as mãos pelos cabelos, nervosa, andei de um lado ao outro no quarto. Não era o momento para piada, porém ele não tinha ideia disso.

Parei de frente ao espelho e o analisei pelo reflexo, me esperando. Fiquei me perguntando naquela hora, por qual motivo ele e o amigo tinham deixado de se falar depois da faculdade. Será que foi um simples afastamento como acontece com todos? Ou tinha a ver comigo?

Apoiei as mãos no tampo da cômoda, enquanto reclinava minha cabeça, temendo que aquilo pudesse virar um caos. De repente senti um peso nos ombros, as mãos de Bruce me massageavam, na tentativa de me confortar.

— É por causa da Clara? Eu não...

— Não, não é isso...

Eu até tinha esquecido dela. A aparição do meu ex me tirou a chance de sentir ciúmes dos dois.

Respirei fundo e o encarei no espelho, antes de virar de frente para ele.

— É por causa do Tobby... Ele esteve aqui ontem.

Bruce congelou. Vi sua expressão mudar num instante. Ele não me respondeu, mas o seu maxilar travou e as sobrancelhas ficaram tensionadas.

Bruce me soltou.

Segurei o ar.

— E você não achou que isso era importante o suficiente para me contar antes?

A acusação na sua voz me fez encostar na cômoda.

— Eu ia contar, só... não sabia como.

Ele cruzou os braços. Fiz a leitura rápida da sua expressão corporal, tudo indicava que não estava aberto para as explicações. Qualquer fala minha podia soar pior do que realmente foi.

— O que ele veio fazer aqui?

— Tivemos um jogo estilo verdade ou consequência, mas só a parte das verdades... — Parei e pensei. — Quer dizer... Se bem que as visitas foram como uma consequência maldosa...

— O quê? Não estou entendendo nada! Pode ser clara, por favor? — Senti uma leve rispidez no seu timbre de voz e reencontrei o antigo rosto inimigo. Era um grande gatilho, não ia prestar. Eu tinha que ficar calma, manter a paciência e esclarecer com cuidado.

— O programa trouxe os ex-namorados dos participantes do meu grupo...

Bruce apertou os lábios, como se estivesse evitando falar algo que não devia, meneou a cabeça, bufando feito um touro.

— Qual o propósito nisso? Você sabe? — Ele abriu os braços dramaticamente. — Eles querem nos afastar? Fazer a gente terminar, é isso?

A preocupação com o possível término me deu um lapso de esperança, por ver que para ele tínhamos algo sério. Até então, havíamos falado de sentimentos, não de um relacionamento de verdade.

Ele se virou de costas, esfregou a testa. Parecia perdido nos pensamentos. Resmungava algo baixo que eu não conseguia discernir. Encostei no aparador e fiquei esperando ele se recompor da sua agitação. Porém ele demorava demais.

— Brooh — Eu me acheguei e o abracei por trás. — É com você que eu quero ficar.

Ele alisou minhas mãos em volta da sua cintura e me olhou de esguelha.

— O Tobby tentou alguma coisa?

Hesitei, mas não passou nem dois segundos e ele se virou com o olhar intrigado. Por que esses caras me conheciam tão bem? Não dava para disfarçar mais nada?

— Ele... Ele descobriu sobre a gente. Sobre o que estamos fazendo aqui no reality.

— Então estamos fodidos.

— Não. Ele não vai contar nada. Ele não sabe que a gente está junto.

Seus olhos se estreitaram de novo.

— Calma aí, deixa eu ver se eu entendi. — Bruce riu, um riso curto e sem humor. — Ele acha que estamos fingindo... O que de fato estávamos mesmo. Mas... por que ele saber da mentira não é ruim? Para mim, é ruim o bastante. Ele é meu amigo, mas se tratando de você, as coisas meio que fogem do controle.

Ainda são amigos?

Eu não compreendia a relação de amizade esquisita que eles tinham. Mas o problema estava entre nós. E precisávamos lidar juntos.

— Brooh, eu precisei deixar ele se aproximar de mim ontem.

— Se aproximar quanto? — Sua voz saiu baixa, tensa. — Ele beijou você?

— Não! — falei rápido demais, o que também ficou estranho.

Que droga! Nem rápido, nem demorado... Qual é o tempo exato para respostas?

— Foi só abraço e carinho — respondi vagarosamente. — E fingi que podíamos nos encontrar depois do programa.

— Foi só fingimento?

— Sim.

O silêncio dele pesou mais do que eu esperava. Mesmo sem palavras, eu sabia que ele estava analisando cada detalhe, tentando descobrir se eu omitia algo.

— Ai, meu Deus, Bruce! Será que pode parar de me olhar assim? — reclamei, me dirigindo ao banheiro.

O que eu ia fazer lá, eu não sabia. Talvez fingir que desci pela descarga do vaso. Eu não queria brigar com ele. Não mesmo.

Entrei no cômodo e, quando fechava a porta, percebi sua expressão de decepção. Ele me seguia, mas não havia nada que pudesse fazer. Logo, me tranquei.

Sentei atrás da porta, envergonhada com a minha atitude infantil. Imaginando que Bruce estivesse arrependido de ter se envolvido comigo.

Eu apoiei a testa nos joelhos e fechei os olhos, tentando enganar a mente.

— Brooh, você ainda está aí?

Perguntei, só por perguntar. Eu tinha ouvido um barulho que parecia ser a porta do quarto batendo.

— Onde eu iria, Kathy?

Fiquei surpresa. Sua voz estava tão próxima. Olhei por baixo da porta e o vi sentado atrás dela.

— Você agora foge de batalha? — Ele provocou.

— Era muito mais fácil quando eu detestava você. Agora, esses seus olhos pretos me deixam... Eles acabam comigo. Eu morro de medo de te chatear. E antes... Antes até que era divertido — completei com um sussurro.

— Pois é. Alguma coisa me dizia que você gostava...

O silêncio veio repentinamente. Então, depois de um tempo, a voz dele soou baixa, como se me contasse um segredo:

— Eu queria poder voltar no tempo. Sabendo o que ia rolar agora entre a gente, eu não teria ficado intimidado com o seu jeito. Você foi a primeira garota que eu reparei.

— Jura?

— Sim... Mas no início achei que eu não fazia o seu tipo. Você sempre foi gata demais, eu ficava com medo de tomar um fora...

Sorri, achando a coisa mais idiota que ele podia ter pensado.

— Se você soubesse como fiquei apaixonada pelo seu sorriso...

— Sério? — Senti que sorria pela empolgação.

— Sério. Eu amei o seu chapéu de cowboy. Depois eu fui te procurar no Instagram, só para ver se tinha alguma foto em cima do cavalo. Achei que ficaria lindo cavalgando... sem blusa... suado...

Ele gargalhou.

— Eu não uso redes sociais.

— Eu sei disso. E te odiei por isso.

O riso dele ficou mais baixo, mas não desapareceu completamente.

— Brooh, eu também queria que tivesse sido diferente.

— Teria sido perfeito a gente junto desde o primeiro dia de aula. — Ele suspirou. — Mas agora vai ser melhor ainda. Ninguém vai poder separar a gente.

— Ninguém...

Por mais que eu soubesse que fora do reality seria complicado, me permiti acreditar.

💗

Descemos quando a prova estava prestes a começar. O clima na casa parecia um pouco carregado. Percebi que não foi só eu que precisei passar por conversas complicadas naquela tarde. No entanto, Derek e Clara, como se estivessem em realidade paralela, brincavam se agarrando, sentados em uma poltrona minúscula que mal cabia o ruivo grandalhão.

Assim que Bruce e eu sentamos no sofá, a televisão ligou. Esperamos a imagem se ajustar com o som, pois havia tido alguma intercorrência na gravação. De repente, Mark Evans apareceu. Aquela prévia das cenas era só um suspense para mexer com os participantes. E deu certo, porque o silêncio reinou no ambiente.

— Boa tarde, pessoal! — ele anunciou, divertido. — Espero que todos estejam curtindo o reencontro.

Como ele era sarcástico!

— Pessoal, vamos relembrar os momentos mais interessantes da experiência dos grupos vermelho e azul. Prestem atenção, porque a prova é baseada nos acontecimentos dessa mágica noite!

Bruce bufou, sem paciência. Deitei a cabeça no seu ombro e ele logo se ajeitou, de um modo que aquilo virasse um abraço.

As cenas começaram a passar. Primeiro, foi a vez do meu grupo. Apareceram alguns participantes com seus ex-namorados, alguns abraços demorados, carícias impróprias... Fiquei angustiada por eles. Ainda mais por Sandy, presenciá-la chorando, enquanto via o seu namorado Alec num beijo tão intenso, quase engolindo sua ex, foi de partir o coração.

Apesar de tudo, eu estava aliviada, esclarecer o ocorrido com Tobby foi a melhor escolha que fiz. E então, veio a minha vez. Meu coração disparou quando me vi na tela. Não era a gravação do quarto, era o momento do jogo.

Fiquei estática, assistindo de relance a reação de Bruce à pergunta que fizeram a mim.

"Kathy, é verdade que a sua primeira vez não foi com o Bruce, mas com o melhor amigo dele?"

Seus músculos à minha volta se tensionaram.

"É verdade."

Eu podia jurar que minha resposta ficou suspensa no ar por mais tempo que um simples eco.

Bruce não disse nada, porém os olhares à nossa volta pareciam dizer muito.

E então... as imagens mudaram.

Era a praia.

Uma cama improvisada dentro da barraca.

As meninas se deitando juntas.

E Bruce, se arrumando ao lado de Clara.

Cheguei um pouco para frente no sofá, me desencostando dele. Apoiei os cotovelos nos joelhos e me encolhi, torcendo para que as imaginações que brotavam antecipadas na minha mente não fossem réplicas do que aconteceu no mundo real.

De repente, Clara o abraçou.

Minha mente gritou em negação quando vi a cena. Mas o pior ainda estava por vir.

Sob a coberta, a mão dele se movia.

Devagar.

Alisando o braço dela.

Meu peito apertou.

Olhei para ele, esperando uma reação, esperando que ele protestasse, esperando qualquer coisa.

Mas ele estava paralisado.

Pálido...

Boquiaberto.

Ele olhava fixamente para a tela.

Eu me levantei.

Ele... Ele teve a coragem de segurar a minha mão.

Nos seus olhos, vi o desespero. E nos meus, ele viu desilusão, raiva, decepção, a minha ruína.

Eu só queria pelo menos ouvir um "não é o que está pensando." Porém, seus dedos se afrouxaram em volta do meu pulso, porque certamente não tinha argumentos contra tudo que foi mostrado.

Admito, não fui forte o bastante para permanecer sentada como Sandy, sofrendo na frente de todos.

Eu não era obrigada a nada.

— Eu não sou obrigada. — Sussurrei, aos prantos, depois passar pela porta da sala e caminhar por entre as árvores do jardim que escurecia.

De vez em quando, era surpreendida por alguém da equipe de filmagem, tentando pegar bons ângulos do meu surto. Estendi minha mão, pedindo para que parassem. Eu estava trêmula, fragilizada, arrasada.

— Por favor... — insisti novamente.

Não estava preparada para mais uma humilhação. E dessa vez, seria em rede nacional.

Sentia-me sufocada, precisava ir para casa... para a minha casa em Ohio. Queria o colo dos meus pais.

E então me decidi, sairia do programa naquele instante.

— Kathy, espera!

A voz dele me atingiu como um golpe.

Bruce vinha logo atrás.


Ah, gente, vocês acham que não tem que ter uma briguinha nos livros de romance? Claro que tem! A gente gosta de babado!

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