Capítulo 1: KATHY
Spoiler: Quando tudo dá errado, fingir um namoro com o seu rival pode parecer uma ótima ideia. Ou pior.
Meu turno no restaurante deveria terminar às cinco, mas, como tudo na minha vida ultimamente, nada saiu como planejado. Ainda estava limpando a bagunça de uma mesa onde um grupo de adolescentes decidiu fazer uma guerra de ketchup, quando ouvi o grito do meu gerente.
- Kathy! Tem mais um pedido na mesa 12.
Olhei para o relógio: cinco e quarenta e cinco. Bufei, mas disfarcei. Então, levantei a bandeja.
- Claro, Sr. Lewis. Mais um pedido. Por que não?
Enquanto atravessava o salão, desviando de clientes e garçons apressados, minha mente estava em outro lugar. Cada passo parecia mais pesado que o anterior. Era difícil não lembrar de todas as vezes em que imaginei que estaria em um set de filmagens agora, e não em um restaurante, servindo hambúrgueres e milk-shakes.
"Atriz fracassada" ecoava na minha cabeça como uma sentença, uma verdade que eu não conseguia afastar. Talvez fosse isso. Talvez fosse hora de desistir.
Cheguei à mesa 12, onde um casal discutia se deveria ou não dividir uma sobremesa. Fiz meu sorriso automático e anotei o pedido enquanto eles riam, trocando olhares. Aquele tipo de olhar que fazia meu estômago se revirar. Quando foi a última vez que eu senti algo assim? Não digo nem em relação a homens, mas desfrutar de um frio na barriga por viver um desafio. Minha vida parecia estacionada enquanto todo mundo seguia em frente.
- Obrigada, volto já com o pedido.
O casal nem percebeu. Claro que não.
Ao me virar, algo chamou minha atenção na mesa ao lado: um folder colorido, deixado por alguém que já tinha ido embora. "Reality Together Forever - Concorra a $200.000!" dizia o título em letras chamativas.
Peguei o papel com uma sobrancelha arqueada, pensando em como as pessoas se expunham por dinheiro. Sem muito interesse, dobrei o folder e o enfiei no bolso da minha calça por debaixo do avental, mais por hábito do que por alguma esperança real. Talvez, depois de anos tentando ser notada, eu tivesse me acostumado a guardar qualquer coisa que pudesse ser uma chance, por mais improvável que fosse.
A noite finalmente acabou, e eu estava a caminho do meu apartamento. O lugar não era grande, mas era meu, apesar do aluguel atrasado me lembrando que isso talvez não durasse muito. Enquanto caminhava, passei a mão no bolso do avental e senti o folder que tinha guardado. Sorri com amargura. O destino definitivamente tinha um senso de humor cruel.
Foi então que eu o vi.
Estava tão perdida nos meus pensamentos que quase não percebi a figura encostada em um poste. Alto, forte, com aquele tipo de postura que exalava confiança. Meu coração deu um salto quando reconheci Bruce McAllister.
- Ai, meu Deus... - murmurei, analisando se ainda dava tempo de trocar de calçada. Não dava. Ficaria mais evidente se eu tentasse, então optei por fazer pouco caso.
Ele estava com o cabelo preto bagunçado de forma que parecia desleixado, mas, na verdade, era exatamente como ele queria que fosse. Seus ombros largos, por baixo de uma camisa de manga longa azul marinho, estavam relaxados contra o poste, as mãos no bolso da calça jeans surrada e aquele sorriso leve nos lábios. Mesmo em meio ao caos de Los Angeles, com suas luzes e barulho, ele conseguiu se destacar.
Engoli em seco.
- Kathy Morgan, quanto tempo... - disse ele, se aproximando.
- Bruce McAllister, que azar. - Ajustei a alça da bolsa no ombro. - O que você está fazendo aqui?
Ele deu de ombros, bem natural.
- Só dando uma volta. E você? Trabalhando em algum grande filme? Ou ainda esperando pelo "papel perfeito"?
As palavras me atingiram como um soco, mas não deixei transparecer.
- E você? Perdeu a chance de ser estrela da Broadway para ser um... mendigo de esquina?
Bruce riu, aquele tipo de risada agradável para todos e principalmente para as garotas, mas não para mim. Ela sempre me deixava irritada.
- Não exatamente. Longa história. Mas, já que nos encontramos, que tal tomar um café? Pode ser minha forma de pedir desculpas por todos os trabalhos que roubei de você na faculdade.
Por incrível que pareça, aceitei.
Na cafeteria da esquina, sentamos numa mesa qualquer. Eu não consegui evitar o pensamento: como era surreal vê-lo ali, depois de tudo que passamos. Depois daquele último olhar de revolta que me deu. Porém, Bruce parecia levemente amigável agora. Desconfiei. Mesmo assim, havia tensão em seu rosto, diferente da habitual.
Eu tentava desvendá-lo antes da conversa, ganhar um tipo de vantagem, como se estivesse presa em uma emboscada. Porque ele sempre foi o tipo de pessoa que parecia estar no lugar certo, fazendo as coisas certas. Ou melhor, certas para ele, pois sempre dava um jeito de me ferrar. Não vou ser hipócrita, eu fazia o mesmo.
- Então, o que você está fazendo aqui, de verdade, cowboy? - perguntei, num tom de sarcasmo, mexendo o café com a colher.
Ele olhou para a xícara, como se a resposta estivesse lá dentro.
- Estou tentando juntar dinheiro. Depois que meu pai morreu, fiquei com a responsabilidade de cuidar da fazenda e da minha família. Mas não está fácil. E... bom, ser ator nem sempre paga as contas.
Aquilo me pegou de surpresa. Eu tinha a imagem de seu pai tão vívida na memória, nem parecia que cinco anos haviam passado.
Bruce tinha uma seriedade que eu nunca tinha visto antes.
- Eu sinto muito... - sussurrei.
- Tudo bem, tudo bem...
Olhei para minhas mãos levemente engorduradas, porque, por mais que eu as lavasse antes de deixar o trabalho, o sabão líquido barato no banheiro dos funcionários não fazia milagres.
Eu também não estava bem, tinha que admitir para mim mesma. E algo no seu olhar fez com que eu me sentisse à vontade para também desabafar.
- Acho que vou desistir. Voltar para casa. Nada está dando certo aqui... Não trabalho como atriz... bem, você pode imaginar.
- Você? Desistir? Isso não parece com você, Kathy.
- Talvez você não me conheça tão bem quanto pensa.
Bruce apertou os lábios em um sorriso fraco de compaixão. Acho que ninguém no mundo me entenderia mais do que ele. Éramos nós ali, os ex-estudantes mais dedicados da turma de arte cênica de 2020. Frustrados com o desenrolar da nossa falta de sorte.
- Bom... É isso... - Dei de ombros, desolada. Enfiei a mão no bolso da calça para pegar uns trocados para pagar o café.
Foi quando senti um papel dobrado. Era o folder que eu tinha guardado. Tirei-o e o coloquei na mesa entre nós.
- Já ouviu falar disso, Bruce?
Ele levantou as sobrancelhas.
- Reality "Together Forever"? Sério? Você quer participar disso?
- Não exatamente. Mas... é dinheiro. O suficiente para resolver meus problemas. E parece que resolveria os seus também.
Ele ficou em silêncio por um momento, refletindo. Quando finalmente falou, estava com aquele sorriso de canto no rosto.
- Você sabe que isso significa que teríamos que passar alguns dias fingindo que estamos apaixonados, certo?
- Fingir que está apaixonado por uma garota nunca foi um problema para o maior mulherengo da universidade.
Ele riu de novo, e eu tive a sensação desconfortável de que ele gostava da ideia.
- Ok, Morgan. Vamos fazer isso.
E foi assim que começou.
💗💗💗
Bom, amigas! E foi assim que começamos também mais um livrinho aqui. Estão ansiosas?
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