Unbreathing

                    



Se pudesse enumerar as coisas que mais detestava na vida, ir a escola seria uma delas. 

A Vermont era nada mais nada menos que uma das melhores escolas de Sydney, já que grandes nomes mundiais cruzaram esses corredores anos atrás, e eu simplesmente detestava aquele lugar. 

Entrar naquela escola já era um sacrifício, pois mal colocava o pé na porta de entrada e uma chuva de meninas histéricas me abordava antes mesmo de chegar ao meu armário. Não tinha a oportunidade de conversar com meus amigos ou fazer novas amizades. Eu era a superestrela ali, sabe o que é não ter um minuto de paz nem no seu colégio? 

Muitos garotos da minha idade usavam a escola como refúgio da própria vida. Eu não tinha essa opção. 

Naquela manhã não foi diferente. Um grupo de garotas me barrou na porta, me obrigando a tirar dezenas de fotos. Eu olhava no relógio de pulso a cada segundo, pensando em quanto tempo teria que permanecer ali e se chegaria atrasado para a primeira aula. 

Queria voltar a Milão, onde eu era apenas mais um integrante do mundo na moda. Na capital da moda europeia, Dylan Turner só era um dos muitos que ocupava os outdoors e revistas. Eu conseguia ter uma vida normal, mas por motivos maiores, tive de retornar a Vermont e sua calamidade diária. 

Com algumas desculpas e um raciocínio rápido, consegui me livrar das fãs malucas e procurar meu armário no corredor, que como todo ano, ficava próximo ao de Nathan. Lyn fazia questão que fosse assim. Ela não queria que ficasse fora da vista do Roberts, para garantir que eu não matasse aula (de novo). 

Mal abro a portinhola meio enferrujada e uma chuva de papéis coloridos cai em cima de mim. Bilhetinhos, é sério? Joguei todos de volta, tentando não chamar a atenção pra mim novamente. Retirei meus livros de matemática com uma certa dificuldade, batendo a porta antes que os papéis caíssem novamente. 

– O que é isso? Você por acaso armou uma bomba? – Nathan perguntou, a mochila laranja apoiada em um dos ombros. – Porque parece que isso aí vai explodir. – Ele apontou pro meu armário.

– Encheram meu armário de bilhetes. Levei quase 10 minutos para jogar todos aí dentro de novo. Não posso abrir meu próprio armário, que saudade eu estava daqui. – Girei os olhos, insatisfeito.

Percebi Nathan esfregar as mãos suadas na calça jeans, olhando para o fim do corredor de maneira aflita. Me virei discretamente para seguir a direção de seus olhos, vendo Chloe conversar com Harriet. Sorri instantaneamente ao vê-la gesticular para a amiga de forma exagerada e dramática. Sua personalidade parecia ser a mesma de quando éramos crianças. 

Já estava para dar um passo em sua direção quando lembrei de Nathan ao meu lado. Ele estava com vergonha de ir até ela? 

– Ainda não acredito que ela está aqui. – Ele confessou, não conseguindo conter o tremor em suas pernas. – O que eu digo? O que eu falo?

– Talvez devesse apenas ir até ela. – Sugeri, com o olhar preso naqueles cabelos cor de fogo. – Afinal, o armário dela é ao lado do seu, não é?

– Como assim?

– Eu falei com o diretor, bastou um autógrafo pra filha dele e ele mudou seu armário pra, coincidentemente, ao lado dela. – Nathan não conseguia controlar sua animação.

– Sério? Mas e a Lyn? Ela disse que é bom eu ficar perto de você. – Nathan se lembrou de seu dever com minha cunhada.

– Ela não precisa saber.

O meu amigo loiro cruzou os braços.

– Está me afastando pra fazer alguma bobagem, Turner? – Ele ergueu a sobrancelha.

– Não, juro pelo meu carro. – Prometi, levantando os braços como um bandido flagrado por policiais.

– Tudo bem, eu vou lá! – Ele decidiu, empolgando e caminhando até seu armário calmamente, ou tentando.

Guardei meu livro de matemática na mochila e dirigi-me a sala, escolhendo um lugar mais afastado. Tudo que não precisava no momento era chamar atenção. Mandei uma mensagem para Devon perguntando se ele voltaria mesmo hoje. Mesmo me irritando na maioria das vezes, sentia muita falta do meu irmão mais velho. 

– Bom dia, turma. – Um professor que mais parecia um general entrou na sala. Os cabelos brancos estavam penteados para trás, assim como suas mãos descansavam em suas costas, como soldados faziam em um quartel. – Meu nome é Hugh Silver, e serei seu professor de álgebra. – Eu ri da mensagem que Devon me mandara de volta. – Senhor Turner.

Toda a classe virou para me olhar no último lugar da fila da parede. Eu pus meu celular no bolso instantaneamente, enquanto o senhor Silver ajeitava os óculos em seu rosto, que o faziam parecer ainda mais um velho biruta. 

– Senhor Turner, não pense que será tratado diferenciadamente dos outros estudantes. O comportamento na sala de aula é essencial, e não existem exceções. – Ele me fitou com aqueles olhos negros esbugalhados pela lente de seu óculos. – Fui claro?

– Sim, senhor Silver. – Respondi, meio irritado por não querer chamar a atenção e receber olhares da sala toda.

– Muito bem, crianças. – Tínhamos 17 anos. Não éramos crianças faz tempo, mas quem iria corrigir aquele homem?  – Hoje vamos falar de funções quadráticas. Abram suas apostilas na página 20. Como podemos ver, a parábola está para baixo, o que significa algo muito importante para a resolução do problema. Alguém sabe o quê? – Ele me procurou com os olhos novamente. – Senhor Turner, pode nos explicar?

Eu trinquei os dentes. Parecia que aquele doutor Frankstein havia escolhido um aluno para ter marcação, e como sou muito sortudo, imagine quem foi? 

– Significa que o "a" da função é negativo. – Expliquei contra a vontade, mas confesso que ver a expressão em sua face me deu um certo prazer.

– Sim, está correto. – Ele confirmou no meu semblante entediado minha animação por ter acertado, que no caso era nenhuma. – Muito bem, com essa informação...

A porta da sala foi aberta bruscamente e Griffin entrou na sala mexendo em seu celular. Ele mascava um chiclete e se dirigiu a um lugar mais afastado, ignorando completamente o senhor Silver e sua expressão de indignação. 

– Senhor Anderson! – Ele quase gritou. – Quem lhe deu permissão pra entrar assim em minha sala de aula?

Griffin fez uma bola com o chiclete. 

– Eu me dei permissão.

Senhor Silver cruzou os braços. 

– Essa não é a resposta que quero ouvir.

O gêmeo de Alyssa deu um suspiro irritado. 

– Ninguém, senhor.

– Muito bem. Volte para a porta e peça permissão como um rapaz educado. – Silver apontou para a porta da sala, vendo Griffin levantar irritado e repetir tudo o que fizera antes, mas dessa vez, de forma diferente.

– Senhor Silver, posso entrar? – Griffin trincou os dentes, se controlando para não responder o professor de forma não muito acadêmica.

– Sim, senhor Anderson, obrigado por perguntar. Educado de sua parte. Sente-se. – Ele sorriu falso para o professor, sentando em seu lugar novamente. – Muito bem, agora, depois dessa interrupção, podemos voltar a questão. Como podemos ver...

Apoiei minha cabeça em meu braço e minha visão passou a perder a nitidez, e quando dei por mim, estava dormindo profundamente. Acordei após o toque do sinal, com a cabeça deitada no livro, que já estava todo babado. 

– Não se esqueçam do dever para a próxima aula. – Silver avisou, entregando papéis que estavam em sua mesa para uma morena que deixou a sala. – Senhor Turner. Aqui.

Lá vinha mais bronca. 

– Esse é o formulário de inscrição para a equipe de matemática. – Ele avisou, me mostrando a folha com espaços em branco. – Se decidir participar, poderá entregar no próximo dia em que tivermos aula. – Silver arrumou suas coisas em uma maleta pequena e caminhou para a saída.

– Espera! O senhor quer que eu participe da sua equipe de nerds, digo, de matemáticos?

– Sim, suas notas são satisfatórias e o senhor parece ter um raciocínio rápido. Nos vemos na sexta, senhor Turner. – Hugh Silver curvou os lábios em uma tentativa falha de sorriso e me deixou na sala.

Eu olhei o formulário de inscrição e dei um riso debochado. 

Mais um compromissão para o qual não tinha tempo, e com certeza, seria obrigado a participar. 

***

A próxima aula era física. Isso é algum tipo de brincadeira? Acabei de sair de uma aula de álgebra e me entregariam de bandeja para uma de mecânica? Já posso me ver saindo daqui e vendo números ambulantes no lugar de pessoas. 

– Dylan, adivinha! – Nathan me assustou, me abordando de forma exagerada no corredor.

– O que foi? Achou o clube de xadrez? – Sorri de canto ao ver ele me mostrar o dedo do meio.

haha, você é uma comédia, Turner. – Ele ironizou. – Eu vou na casa da Chloe hoje!

Instantaneamente, deixei meu material de física cair no chão. 

– Sério? Legal. – Forcei um sorriso, torcendo para que Nathan não percebesse ser falso.

Me abaixei para pegar meu material de volta, vendo o loiro me ajudar. 

– Está tudo bem? Você parece meio... Incomodado, não sei. – Sabia que não iria me safar das investidas de Nathan tão facilmente.

– Nada, só estou um pouco cansado, só isso. – Menti, mas por sorte, Nathan estava muito eufórico para perceber.

– Desmarco os seus compromissos hoje, assim você pode dormir um pouco. – Ele ofereceu. – Agora, precisamos ir pra aula.

Eu assenti, me despedindo de Nathan e caminhando até minha sala, quando vi Alyssa vindo na direção oposta, usando suas roupas de líder de torcida e falando com todos os alunos que ainda cruzavam o corredor, de forma despreocupada. 

Ao me ver ali, ela sorriu e abriu os braços. 

– Dylan! Que bom que está aí! – Ela procurou por algo na bolsa, retirando um convite quase improvisado. – Esse é o seu.

– O que é isso? – Perguntei, examinando aquele papel. Estava recebendo muitos papéis hoje.

– É um convite bobinho, para nossa festa hoje à noite. – Ela riu, como se dissesse algo óbvio.

– Festa? Onde?

– Como assim? Na minha casa ué. Meus pais viajaram e temos a casa somente pra mim, Grif e Chloe. – Ela explicou e eu cheirei confusão.

– Tem certeza que é uma boa ideia? Uma festa? Hoje não é segunda?

– Todo dia é dia de diversão, Dyl. – Alyssa respondeu,  mandando um beijinho no ar. – Quero mesmo que vá. Até mais tarde!

Antes que pudesse falar algo, ela já acenava e caminhava em direção a um grupo de amigos conversando. 

– Isso me cheira a confusão. – Falei para mim mesmo, guardando o convite no bolso e voltando a procurar minha sala.

Quando esperava por um pouco de paz, mesmo em uma aula de física, deparei-me com uma cena um tanto estranha. 

Kimberly segurava firme o pulso de Chloe, que lutava para sair. Ela não tinha medo da Sparks, mas estava parecendo que fora pega de jeito. Me assustei quando Kimberly levantou a mão contra Chloe, e tive de intervir para evitar uma briga. 

– Chega, Kimberly. – Falei, quase que ordenando para que ela se afastasse. – Deixa ela em paz.

– Mas Dydy! – Eu odeio muito quando ela me chama assim. – Ela que me provocou! Essa zé ninguém está no meu lugar. 

– Tem um lugar do meu lado ali, vai por suas coisas. – Avisei, já ficando impaciente. Kimberly tinha aquela necessidade de sempre querer ser superior a todo mundo, e aquilo me tirava do sério. Por quê? Por quê ela era tão fútil?

Percebi Chloe meio corada e tive de dar um meio sorriso. Adorava como ela ficava da mesma cor de seus cabelos quando estava envergonhada. Tive de controlar minha vontade de tocá-la. 

Ao ver que Kimberly tinha se afastado,  virei-me para ela. 

– Tudo bem com você? – Perguntei, preocupado e envergonhado por algo que minha namorada havia feito. – Desculpe a Kimberly, ela consegue ser meio... geniosa às vezes. – Tentei achar uma resposta plausível que não desse tão na cara que ela era louca. 

Chloe sorriu fraco pra mim, e senti meu estômago embrulhar.  Por quê ela tinha de ser tão linda, droga?! 

– Estou bem sim, graças a você escapei de levar um tapa. –  Ela respondeu e eu dei uma risada baixa.– Essa Kimberly é muito agressiva.

Eu cruzei os braços, como se Chloe pudesse chamar outra pessoa de agressiva, mesmo que a em questão fosse Kimberly. 

– Não se faça de vítima, sei muito bem que deve ter provocado ela também. – Ela se fingiu de ofendida, sabendo muito bem que não me enganava.  – Eu te conheço, lembra? 

Chloe estava prestes a me dar uma resposta, quando o professor entrou na sala. Amaldiçoei ele no mesmo instante. 

– A aula vai começar. Nos falamos depois. – Avisei, tendo de me afastar contra minha vontade. – E Chloe? – Eu o encarei. – Posso estar errado, mas acho que essa já é a terceira vez que te salvo de apanhar. 

Pus as mãos em meus bolsos, ajeitando minha mochila no ombro, virando-me rapidamente para que Chloe não visse o sorriso de retardado que surgira em minha face. 

Um sorriso idiota, mas verdadeiro, o que pra mim valia muito. 

Sentei-me em meu lugar e ainda a vi parada no mesmo lugar, confusa e meio lenta, da mesma maneira que era na infância. 

Kimberly estava ao meu lado, emburrada. 

– De onde conhece aquelazinha? – Mal sentei e ela já jogava seu veneno. – Não minta pra mim, quem é essa tal de Chloe?

– É uma antiga amiga. Devia ser mais legal com ela. – Kimberly mordeu a unha do dedo indicador, a fuzilando com o olhar. 

Ela era perigosa, eu sabia, mas ela não faria nada de realmente mal, faria? 

Chloe ainda escrevia com a cabeça deitada na mesa, como se estivesse dormindo, da mesma maneira que fazia quando ainda éramos duas crianças no infantil. 

Ela não parecia ter mudado muito, e pelo visto eu também não. 

Pois Chloe Madsen continuava a me encantar da mesma forma que fazia quando eu tinha oito anos.

***

Quando o sinal tocou para o almoço, Kimberly praticamente me arrastou para fora da sala, me puxando pela mão até o refeitório. Enquanto esperávamos na fila, ela tagarelava sobre o kit de maquiagem que pedira da França ou algo assim, não me deixando falar uma palavra. Parei de escutar quando vi seu peito se estufar para falar. 

Passei a olhar ao redor, todos os alunos caminhando para o pátio com as bandejas de seus almoços em mãos. Avistei Harriet e Chloe cruzando o corredor, conversando como se conhecessem uma a outra desde sempre. Aquela com certeza seria uma amizade divertida. 

Nathan conversava com Josh Kellan e outros garotos do grupo de audiovisual, sobre alguma coisa que provavelmente me daria sono. Alyssa estava sentada na mesa, sim, literalmente na mesa, com os pés apoiados no banco, sendo o centro de uma rodinha de amigos. Vi Kimberly estreitar o olhar para ela. 

– Se Alyssa pensa que irá me vencer no top 5, queridinho, ela está muito enganada, posso garantir. – Kimberly deixou bem claro, com um tom malvado em sua voz.

– Achava que ela era sua amiga. – Comentei, desinteressado na conversa e naquela comida pavorosa. Senti uma saudade profunda de Maisie ao ver aquela carne que mais parecia... nem sei o quê.

– Ela é, quando está abaixo de mim no top 5, claro. – Ela jogou os cabelos para trás e eu girei os olhos.

Senti um olhar queimar sobre nós e me deparei com Griffin sentado em uma mesa mais afastada. Seus amigos conversavam despreocupadamente sobre banalidades, mas seus olhos estavam cravados em mim e em Kinberly, exalando puro ódio. Ao reparar que eu também passei a olhá-lo, ele virou o olhar. 

Kimberly seguiu meu olhar e se manteve presa a Griffin por um instante. 

– Algum problema? – Perguntei e finalmente ela pareceu voltar a si.

– Ah, não foi nada, só me distraí. – Kimberly mentia com maestria, mas essa mentira fora óbvia demais. – Mas então, a festa nos Anderson, você vai?

– Eu não sei... Não estou com vontade. – Confessei, enquanto a merendeira me servia com um... resíduo que era impossível de identificar o que era.

– Dydy, precisa sair mais, como quer se manter nos holofotes ficando trancado em casa com sua cunhada chata e sua sobrinha chorona?

– A Lyn não é chata, e não fala da Emeraude. – Eu fechei a cara.

– Só estou dizendo o que ninguém tem coragem de dizer, até mesmo seu irmão saiu fugindo dela. – Eu apertei meus dedos na bandeja de plástico, tentando conter minha raiva.

Comecei a respirar mais rápido e com dificuldade. Quanto mais sugava o ar, mais parecia que iria me faltar. Inspirei de forma mais desesperada e Kimberly ergueu a sobrancelha. 

– Dydy? O que você tem? – Ela perguntou, estranhando meu comportamento. 

Deixei a bandeja cair e me apoiei no balcão, respirando com cada vez mais dificuldade. 

– Garoto, está tudo bem?! – A mulher que servia o almoço perguntou e tentei puxar o ar mais uma vez.

Não, não podia ser. 

Meu asma. 

Comecei a tatear o balcão em pânico, sentindo tudo ao meu redor tremer. Pratos e talheres foram ao chão, assim como a gosma nojenta do almoço caiu por cima de Kimberly. 

– Dylan! Esse vestido é um clássico Arturo Vitalli! – Ela reclamou, se afastando. Essa era minha namorada. Eu aqui morrendo por uma crise de asma e ela estava mais preocupada com o vestido.

Kimberly realmente sabia como conquistar qualquer um. 

Alguns alunos correram em meu auxílio, enquanto minha visão começava a ficar turva e a escurecer aos poucos. Meu fôlego começava a diminuir, enquanto eu suava frio. Comecei a tossir desesperadamente, enquanto meu nariz escorria.

– SAI DA MINHA FRENTE. – Nathan se ajoelhou no chão, pouco se importando se estava em cima da comida, que sujou toda a sua calça. – Respira, Dylan! – Ele passou a procurar algo na mochila. – Alguém chama um médico! Que merda!

Ele retirou uma bombinha de asma da bolsa e começou a disparar ar contra meu nariz, enquanto parecia que meus órgãos iriam ser vomitados com aquela tosse, acompanhada do suor frio nas mãos e na irritação nos olhos. 

Aos poucos, senti o ar voltar a circular por meu organismo e minha respiração normalizar. Minha visão voltou a ficar nítida e vi a roda de alunos que se formara em volta de mim. 

– Tá tudo bem? – Nathan perguntou. Tentei responder, mas minha voz cansava meu ritmo respiratório.. – Não fala, poupa o fôlego. Vem Dylan, hora de sair daqui.

Me apoiei em seu ombro e no de Josh Kellan, o amigo de Nathan do audiovisual. 

Apoiado nos dois, fui retirado do refeitório. 

***

Sair da Vermont mais cedo era algo que queria todos os dias, mas não daquela maneira. 

Consegui melhorar completamente quando voltei para casa. Lyn havia pego uma cadeira de rodas no porta-malas (não me pergunte o porquê dela ter uma), e saiu me empurrando pela sala de estar. 

– No que estava pensando?! – Ela me perguntou, irritada. – Já disse mil vezes para nunca sair sem a bombinha de asma. Se Nathan não estivesse com ela, você poderia ter morrido, Dylan!

– Mas eu não tinha um crise de asma desde que tinha treze anos. – Expliquei, mas Lyn não pareceu estar convencida.

– Asma não some assim, Dyl. Lembra do que seu médico sempre disse? Nunca arriscar. – Ela entregou a bombinha de asma na minha mão. – Não saia mais sem ela, ouviu bem? – Eu assenti. – Ok, vamos te por na cama, você precisa de muito repouso agora.

Lyn me levou até meu quarto e me cobriu da cabeça aos pés. Me senti um pirralho de novo, na época em que estudava naquele internato em Londres e quando Devon estava ocupado, mandava a namorada para cuidar de mim. Sempre amei a companhia de Lyn. 

– E o Nathan?

– Ele foi na casa da amiga dele fazer um trabalho, disse que voltava logo para te fazer companhia. – Ela avisou, desligando a luz do quarto. – Agora durma, senhor Dylan.

– Lyn. – A chamei.

– Sim?

– Obrigado. – Ela sorriu, fechando a porta e me deixando ali sozinho com meus pensamentos.

Quando a noite finalmente chegou, me sentia completamente novo. Arranjei forças para caminhar e respirava espontaneamente. Guardei a bombinha no bolso e olhei a tela do celular. Nenhum sinal de Nathan. Será que ele estaria na festa? 

O convite de Alyssa ainda estava em meu bolso. O papel rosa amassado escrito com caneta porosa roxa. Bem a cara dela. 

A casa estava silenciosa, parecia que Lyn havia saído. 

Antes que ela voltasse e me desse outra bronca, me arrumei rápido e quando dei por mim, já dirigia pela rua dos Anderson Madsen. A música alta e as luzes cegantes denunciavam a casa, e alguns garotos conversavam na entrada. O sofá que havia visto no dia anterior na sala de estar, estava de cabeça pra baixo no jardim. 

Desviei daquela população bêbada, entrando na residência. Um casal quase se comia ali mesmo na parede, dois caras brincavam de jogar um vaso de cristal para cima e uma maluca escorregava pelo corrimão da escada. 

– Nathan! – Chamei por ele, sem ouvir resposta alguma. Onde diabos ele teria se metido?

Subi um pouco as escadas para ver melhor a situação, e foi quando vi os cabelos ruivos de Chloe correndo como um tigre da sala de estar para a cozinha. Resolvi segui-la. 

– Hey, Chloe! – Tive que praticamente gritar para que minha voz vencesse a música alta. Ela olhou pra mim com o rosto em uma mistura de desespero e raiva.

– Dylan! Essa festa é um erro! – Ela respondeu no mesmo tom.

– Está parecendo um enterro?! – Foi o que ouvi ela falar com aquele barulho.

– NÃO! Essa festa, eu falei que é um erro! – Da segunda vez havia escutado certo. – O Griffin está tão bêbado que não me escuta! Vou achar a Alyssa!

– Vou com você. – Me ofereci e ela assentiu, agradecida.

Demorou um tempo para que encontrássemos Alyssa no meio de tanta gente. O número de pessoas aumentava a cada minuto, e a festa parecia estar apenas começando. Tive de segurar na mão de Chloe para não perdê-la na multidão. 

Alyssa estava no quintal, próxima à piscina. Um batidão tocava em duas caixas de som, enquanto a loira dançava sensualmente em cima das cadeiras de tomar sol. Chloe pisou duro até lá, empurrando para longe de seu caminho os abutres pervertidos que formavam um círculo para ver a gêmea de Griffin. 

– ALYSSA! DESCE JÁ DAÍ! – A loira segurava um copo de vodka e descia até o chão sensualmente, pouco se importando com os gritos de Chloe.

Cansada de ser ignorada, a Madsen puxou a meia irmã pelo pulso a fazendo descer de seu "palco" e decepcionar sua "plateia". 

– Acabou o show aqui, podem ir embora! – Ela gritou, ainda segurando Alyssa pelo pulso, que mal se aguentava em pé de tão bêbada.

haha, Chloe, tem uma clone? Haha. – Alyssa ria pelo efeito da bebida e tive de segurar uma risada quando ela abraçou a cintura de Chloe. – Te amo sis, mesmo você usando essas roupas horrorosas de aposentada.

– Alyssa, você tá bêbada! E eu não uso roupas de aposentada! – Chloe rebateu, irritada. – Alyssa, me escuta, precisa acabar com essa festa, agora, já!

Ela soluçou, e por um minuto pensei que iria vomitar nos meus pés. 

– Mas agora que a diversão começou! – A Anderson respondeu, grogue, levantando sua taça. Iria tomar outro gole se Chloe não tivesse roubado.

– Chega de beber. – A ruiva me entregou a taça. – Alyssa, ou você manda todo mundo ir embora, se não... Eu juro que sumo com o seu secador!

Alyssa arregalou os olhos e começou a chorar. 

– O secador não! Tudo que mais evito é acordar parecendo você... – Chloe me olhou incrédula com a resposta da irmã bêbada.

– Eu vou bater nela. – Tive de rir. – Alyssa, isso está passando dos limites! Se você e o Griffin não terminarem essa loucura agora, vou ligar pro papai.

A loira ficou séria. 

– Podemos conversar sobre isso? Por favor, não quero confusão. – De um momento para o outro, Alyssa pareceu ficar sóbria de repente. – Vamos pra um lugar mais reservado.

Eu e Chloe nos entreolhamos, confusos. 

– Foi fácil. – A ruiva deu de ombros, seguindo Alyssa.

Alyssa nos guiou para o outro lado da piscina, onde estava a poolhouse, ou seja, a casa da piscina, onde os mantimentos eram guardados, como toalhas, materiais de limpeza e outras coisas do tipo, também podendo servir como um quarto de hóspedes, coisa muito comum na Austrália. 

Alyssa abriu as portas de correr de vidro e deu passagem para que eu entrasse. Agradeci com um aceno e entrei, e Chloe veio em seguida. Me distraí olhando o ambiente. Era legal. 

– Então Alyssa, podemos começar limpando a cozinha e... – Depois que Chloe entrou, Alyssa fechou a porta e trancou-nos ali dentro.

Eu e Chloe corremos para a porta e gritamos para que abrisse, mas a loira se fez de cínica e fingiu não escutar nada. 

– Desculpem, mas não vão estragar minha festa. – Ela mandou um beijinho no ar. – Volto quando ou se me lembrar, bye.

– Alyssa! – Eu e Chloe gritamos para ela, que ignorou.

– Não tem nenhum telefone aqui ou coisa parecida? – Perguntei, olhando ao redor para ver se achava uma saída.

Chloe fez que não com a cabeça. 

– Só a secretária eletrônica. Laura pôs aqui depois que Griffin começou a mandar sons de pum pelo telefone e o negócio começar a gravar. – Ela girou os olhos, pensando em como o meio irmão era crianção.

Sentei na cama pensando em como fui parar naquela situação. Se Lyn chegasse em casa antes de mim, tinha certeza que ela ia implantar um rastreador ou me algemar a perna de uma mesa. Merda. Eu só queria saber onde o Nathan estava. 

– Sabe onde está o Nathan?

– Eu adormeci enquanto fazíamos o trabalho, e... quando acordei ele já tinha ido. – Chloe respondeu. – Está com seu celular aí?

Mostrei o aparelho sem bateria. 

– O meu está no quarto. – Chloe cruzou os braços, emburrada.

O silêncio se instalou instantes depois, e acabaria sendo total se não conseguíssemos escutar a música vinda da casa. Comecei a fitar o relógio analógico que havia na parede constantemente, improvisando uma cama com as toalhas que ficavam guardadas ali. 

– Então... O Nathan... Você gostou dele? – Chloe me encarou. – Quer dizer, achou ele legal?

– Sim, ele é um cara ótimo, tem sorte de ter ele como amigo. – Ela respondeu, já desistindo de também procurar uma saída.

– Pois é. Ele parece gostar muito de você. – Comentei.

– Também adoro o That, não achei que ainda existissem meninos tão fofos como ele. – Chloe respondeu.

– Ele é legal sim.

O silêncio enlouquecedor surgiu novamente. 

Chloe começou a andar pelo cômodo, preocupada com a quantidade de pessoas entrando em sua casa. A vizinha já estava na janela e não parecia nada satisfeita com o que via. 

– Chloe? Tá tudo bem? Parece que você tá me evitando. – Expliquei e ela pareceu ficar nervosa.

– Claro que pareço estar nervosa! – Ela soltou toda a tensão que percebia que estava carregando em seus ombros.  – Estou presa aqui com meus meio irmãos idiotas destruindo a casa que jurei que ia tomar conta! Meu pai vai ficar super decepcionado comigo e vai me mandar de volta pra Londres! – Chloe revelou, já derramando algumas lágrimas. – Só aceitei cuidar dessa... dessa merda de casa pra que eles vissem que sou responsável e útil, mas agora...

– Ei... – Eu me ajoelhei de frente, enxugando suas lágrimas com meus dedos. – Seu pai jamais vai te mandar embora se você não quiser...

– Você não entende... Minha mãe. Ela ligou. Quer que eu volte pra Londres, logo agora que...

– Que o quê? – Ela parou de repente.

– Que eu tenho meu melhor amigo de volta. – Chloe me abraçou forte, e senti suas lágrimas molharem minha camisa. – Eu senti sua falta.

Eu retribuí o abraço, descansando minha cabeça em seu ombro. 

– Senti a sua também. – Confessei, sentindo meu coração disparar ao tê-la tão próxima a mim.

Desfiz o abraço aos poucos, fitando aquele rosto cheio de sardas que tanto amava. Enxuguei as últimas lágrimas que desciam de seus olhos, repousando meu olhar em seus lábios. 

Foi quando percebi estar fazendo esforço para respirar. Esforço demais. 

Não. De novo não. Ali não. 

Puxei o ar com força e ele não vinha, passei a sufocar e a suar frio, os olhos irritados e minhas mãos tremendo. 

– Dylan! Calma! O que foi? DYLAN! – Chloe me segurou antes que eu caísse.

Então eu comecei a tossir. Tossir muito. Fechei os olhos com força e soltei uma tosse, com a mão na boca, quando senti algo úmido e quente encostar em minha palma. Afastei para ver o sangue rubro escorrer entre meus dedos. 

Chloe se desesperou quando dei outra tosse e sujei o chão com vermelho. O gosto metálico invadiu minha boca, e minha visão aos poucos perdia o foco. 

– ALYSSA SOCORRO! GRIFFIN! – Ela gritava desesperada. – É a fumaça daquele maldito cigarro que os idiotas dos amigos do Griffin estavam fumando!

Tateei meu bolso e minha bombinha de asma não estava mais ali. Nathan também não estava para me ajudar, assim como meu irmão. Eu achava que tinha superado essa fase, mas o asma ainda estava ali. 

Me lembrando todos os dias que eu poderia acabar como minha mãe. 

– Dylan! Dylan! – Ela gritava desesperada.

DYLAN! – Devon segurava minha mão pequena, enquanto estava deitado em uma maca, sendo empurrado por um corredor branco e comprido.

Mano... Dev... – Eu tentava falar, mas cada sílaba parecia ser um soco no estômago. Todo meu corpo queimava com uma tosse infernal.

Você vai ficar bem irmãozinho! Seu irmão mais velho não vai deixar nada de mal te acontecer! – Sentia Devon tremendo. – Vai melhorar irmão.

Uma máscara de ar foi colocada em meu rosto enquanto tentava respirar, sugando todo o ar que estava ao meu redor como um aspirador de pó.

Não pode levar o Dylan como levou minha mãe. – Escutei Devon falar para o teto, com lágrimas de ódio descendo por sua face. – Não pode...

A voz de Chloe foi se tornando cada vez mais baixa e inaudível, até se tornar um eco distante, à medida que minha visão tornava-se turva e a força de meu corpo parecia ir embora. 

– Dylan, fica comigo! – Chloe desabotoou os botões de minha camisa para verificar se conseguia respirar com mais facilidade.

– M-me d-desculpa. – Falei com toda a força que me restava. 

A expressão preocupada e desesperada de Chloe foi a última coisa que vi, antes de desistir de lutar e me entregar totalmente a escuridão. 

No próximo capítulo de 

Someone To Save You... 

NÃO! ESSA MIMADA PRECISA OUVIR! – Eu já estava de pé, tentando não perder o controle. – POR SUA CAUSA ALYSSA, O DYLAN ESTÁ ENTRE A VIDA E A MORTE! ELE ESTÁ MORRENDO E A CULPA É TODA SUA! – Alyssa começou a soluçar. – VOCÊ NÃO SE DIZIA TÃO FÃ DELE? POIS FIQUE SABENDO QUE SEU ÍDOLO ESTÁ MORRENDO POR SUA CAUSA. TÁ FELIZ?!

(...)

Lyn, precisamos que você se acalme. – Ele pediu, segurando-a para que ela não corresse em direção aos quartos. – Estão examinando ele agora, vai ficar tudo bem.

Não, não vai... – Lyn respirou fundo, sentando em uma das cadeiras e parecendo pensativa.

Como assim? – Nathan parecia confuso, se ajoelhando de frente a ela e a fitando com seu olhar interrogador. – Lyn? Tem alguma coisa que você sabe que eu não sei?

(...)

O silêncio sepulcral teve seu fim quando o médico adentrou a sala de espera. Todos nos levantamos apreensivos, vendo a expressão imparcial do pneumologista.

Então doutor, como ele está? – Lyn perguntou, nervosa e esperançosa.

(...)

Parecia que eu tinha tomado um banho de água fria.

Aquele era o irmão mais velho de Dylan.

O magnata de 32 anos mais poderoso de Sydney.

O dono das Turner Corporation.

Eu estava de frente com Devon Turner.

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