89| O Começo do Fim

SORA

Eu não pude proteger ninguém, nem mesmo meus melhores amigos. Enquanto corríamos para escapar de diversos ataques, fomos surpreendidos quando uma pilastra caiu sobre nós. Eu deveria ter morrido, aquela deveria ser minha hora, mas Lieff resolveu retardar minha partida e me empurrou para o lado. Sua perna foi atingida e completamente esmagada. Mesmo com todos os seus protestos de seguir em frente, eu não pude deixá-lo. Há muito não havia me sentido tão irada comigo mesma, aquilo foi algo primordial para se sentir naquele momento. A ira me fez criar forças e afugentou a covardia. Usei minhas correntes para arremessar a pilastra para longe. Li já estava desacordado quando consegui removê-la. Meu rosto estava duro. Expressão de ódio podia me descrever. Arrastei Li para um corredor isolado, onde as marcas do combate ainda não haviam chegado até lá. Eu não poderia deixá-lo ali, mas também não conseguiria carregá-lo sem antes limpar minha passagem. Ele era grande demais para mim, e se tornaria alvo facilmente de qualquer ataque se passasse comigo no meio do furacão de espadas e flechas. Corri até o anjo mais próximo e sim, eu o ataquei com uma voadora das boas. Meus dedos doeram quando soquei sua cara, aqueles filhos da mãe pareciam ser feitos de aço. Mesmo estando um pouco enferrujada na arte da batalha, eu consegui deferir uma sequência de socos no desgraçado e derrubá-lo.

Quando ele finalmente caiu, me agachei e quebrei seu pescoço com facilidade. Bem, eu sempre tive vontade de fazer aquilo quando estava com muita raiva, e parece que eu havia nascido com aquela habilidade. A maldita espada do querubim queimou minhas mãos quando a peguei, assim aquele pequeno detalhe estava dificultando minha fuga. Quando percebi que Li havia sido descoberto, a fúria não me impôs limites. Segurei a espada e não me importei com o quanto ela estava me queimando. Corri até três querubins covardes e decepei a cabeça do primeiro, que estava desprevenido quanto a minha chegada. Os outros dois foram mais espertos e sobrevoaram para me atacar por cima. Observei com rapidez que seu eu pulasse para cima da pilastra e a usasse como apoio, conseguiria alcançar o da direita, e foi o que eu fiz. Ele ficou surpreso com o meu ataque e nossas espadas colidiram, lançando faíscas para todo lado. Antes de cair, segurei sua asa para que viesse abaixo comigo. Ele me xingou (diaba!) e aquilo me fez ter mais energia para matá-lo.

Quando caímos, chutei seu braço e o fiz largar a espada. Entramos em um combate mano a mano e acabei levando um soco certeiro no nariz. Aquilo doeu para cacete. Outro soco, dessa vez no estômago. Cambaleei para trás e fui chutada nas costas. Os covardes estavam levando vantagem sobre mim. Meu primeiro combatente resolveu me sacanear mais um pouquinho e me arremessou contra a parede. A dor foi lancinante quando bati com a cabeça, meu crânio parecia ter se partido ao meio. Ele ria enquanto mantinha uma mão em volta do meu pescoço e com a outra rasgava meu moletom. Sua mão fria percorreu minha cintura quando terminou de rasgar minha blusa. Fiquei enojada quando ele lambeu meu pescoço e apalpou meus seios. A falta de ar estava me deixando louca quando combinada com a fúria de estar obsoleta. Seu corpo me imprensou contra a parede. Gritei no momento em que ele mordeu meu pescoço com muita força. Quanto mais eu lutava para me soltar e oferecia resistência, ele aumentava seus toques ousados sobre mim. O instinto de fingir-se de morta veio como uma brecha para escapar. Parei de gritar e pendi a cabeça para o lado, diminui o ritmo da respiração.

Quando ele liberou as mãos para segurar meu corpo suspenso, ergui a cabeça e a levei de encontro ao seu rosto. Ele cambaleou para trás, surpreendido com meu ataque repentino. Sangue escorria de seu nariz, e um olhar fulminante me acompanhava. Andei rapidamente até ele e o empurrei com as duas mãos. Ele parecia confuso com a minha reação, mas eu queria apenas distraí-lo. Quando finalmente consegui que ele pensasse que eu fosse indefesa, avancei até o patife e agarrei sua cabeça. Não pensei duas vezes e abocanhei seu nariz e o mordi. Não sei como, mas consegui arrancar aquele nariz de batata. Me senti como uma canibal, pedaços de pele e cartilagem ainda estavam na minha boca. Cuspi para longe o nariz, e apreciei com prazer enquanto ele agonizava no chão. (Não Ellai, eu não ignorei o que aprendi com você). Chutei a cabeça dele e finquei a espada em seus olhos. Muito distraída com o combate, acabei esquecendo que havia outro em meu encalço. Percebi tarde demais. Minha cabeça ardia. Chamas consumiram meu cabelo rapidamente. Minhas mãos já queimadas pela espada não conseguiram apaziguar as chamas furiosas sobre mim.

Não consegui distinguir o que houve comigo, mas logo as chamas estavam extintas. Pingos de água escorriam do que restou do meu cabelo para meu rosto. A dor corroía todo o meu corpo. O cheiro de cabelo queimado me dava náuseas. Os efeitos dos ataques só vieram depois que eles cessaram. Caí no chão. Minha cabeça girava. Olhei aliviada para Lieff, ele continuava inconsciente. O grande estrago em sua perna o fez perder muito sangue, isso era evidente pela enorme poça que se alastrava pelo chão. Tentei me arrastar até ele, mas meu corpo parecia protestar seu descanso. Gemi de dor e frustração. Um par de botas prateadas entrou em meu campo de visão, foi quando soube que tudo estava acabado e que fracassei com todos. Contudo, o guerreiro que apareceu me colocou nos braços. Ele sussurrou que tudo ficaria bem, que havia acabado de matar o anjo que ateou fogo em meu cabelo. Tentei acreditar que sim, pois estava disposta a me atirar sobre qualquer possibilidade de proteger Li. Samuel, esse era o nome de meu salvador. Ele nos levou para um lugar mais seguro e me deu algo para beber. Instantaneamente me senti mais revigorada, a dor me abandonou repentinamente. Algo de estranho pairava sobre aquele anjo.

Olhei mais atentamente para ele. Olhos castanhos, cabelo negro e pele morena. Era encantador. O seu modo de falar também o denunciou, parecia uma melodia quando ele pronunciava palavras suavemente. As cicatrizes da guerra não estavam visíveis nele, sequer ele possuía alguma.

-O que um arcanjo está fazendo no meio dessa bagunça? - indaguei, vendo-o sorrir ao ver que eu descobri o que ele era.

- Eu vim parar meu irmão. Já chega de tantas mortes - corei quando ele segurou as pontas de minha blusa rasgada e as uniu em um nó. - Está mais apresentável assim Sora Bloom.

Seu sorriso era cativante. Bondade emanava dele.

-Por que me ajudou? - aninhei Li em meus braços.

- Você deve viver. Você e seu marido não podem morrer - ele olhou para a perna de Li, e logo despejou na boca dele a água que havia me dado.

- Tantos estão morrendo, por que somente eu devo viver?

- Carrega dentro de si o fragmento da alma de Shaya, e ele o de Solária. Juntos vocês formam uma espécie de yin yang. É aquela velha história, controlam o equilíbrio na alma dos mortais. Essas duas Deusas tornaram-se importantes desde o dia em que o filho de Lúficer fez o que acreditávamos ser impossível. Como sabe, ele uniu dois fragmentos e depositou em um cadáver que aderiu às almas muito bem. Isso foi como uma espécie de violação da natureza para nós, afinal, o que está morto deve permanecer morto - ele tocou meu rosto. - Mas vimos que você havia se tornado uma nova divindade, e que era primordial mantê-la viva, para o bem dos mortais.

- Bem, eu já sei de tudo isso. O que acontece quando eu Li ficarmos velhos e morrer?

- Suas almas serão acolhidas de bom grado em Lumen, e reencarnarão em outra pessoa. Assim o ciclo não terá fim, e tudo estará equilibrado. Seu corpo é uma espécie de receptáculo até o fim de sua vida. Sora Bloom, você tem que ficar viva. Eu sempre soube que meu irmão aspirava fazer um novo dilúvio, mas isso não vai acontecer, eu o impedirei. Solária e Shaya não serão páreas para ele, eu tenho igual poder e glória. Vou levá-la até o filho de Lúficer, ficará segura com ele...

- Por que não o chama pelo nome?

- Bem, digamos que isso é um tabu. Preferimos assim - ele me segurou nos braços e colocou Lieff em seu ombro. - É melhor se segurar, pode ser uma viajem um pouco turbulenta.

Enquanto sobrevoava, vi que o exército de exilados já havia chegado e que estávamos ganhando. Muitos anjos estavam mortos no chão e restavam poucos que ainda resistiam. Vi até que alguns anjos lutavam entre si, aqueles deveriam ser nossos aliados de Lumen. Chegamos onde Grendel estava. Ele ficou furioso quando soube o que havia acontecido comigo. Com um cumprimento frio, ele falou com Samuel e o arcanjo se retirou. Um grupo de anjos tentou nos atacar justo quando o Sr. Morte estava totalmente furioso. Sua cólera afugentou alguns antes mesmo deles começarem a batalha. Sob a proteção de Grendel, eu finalmente consegui algum descanso. Meus joelhos fraquejaram e eu caí, aninhei Lieff em meus braços e finalmente consegui ver o real estrago que estava na perna dele. O peso da responsabilidade agora aumentou sobre mim, e de repente me senti uma verdadeira inútil por não conseguir salvá-lo inteiro. Enterrei minha cabeça em seu pescoço e finalmente me pus a chorar.

Grendel tinha concluído seu ritual e os mortos errantes finalmente haviam se levantado para lutar por nossa causa. Sei que não foi nada fácil para ele fazer aquilo. Mesmo mortos, aqueles cadáveres tinham uma escolha, e ele tinha que pedir permissão para eles para interromper seu descanso. Aqueles que se levantaram de boa vontade eram os que há muito conheciam o seu senhor. Grendel era bonzinho até certo ponto, e eu felizmente já tive oportunidade de vê-lo fazendo seu árduo trabalho. Se controlar uma dimensão próxima ao submundo era difícil, imagine como deve ser lá! O mais estranho de tudo é que Lúcifer não se manifestou em nada. Sua fadiga era evidente. Olheiras já apareciam debaixo de seus olhos cansados. Ele carregava Lieff enquanto seguíamos até onde uma grande explosão denunciava que acabávamos de perder mais alguém. O rosto de Soren também estava duro e triste.

Uziel não conseguiu escapar da flecha de Hazael, e infelizmente deixou seu melhor amigo sozinho. O vasto campo por onde passamos estava tranquilo. Nossas tropas estavam em vantagem, e muitos querubins já batiam retirada. Deparamo-nos com alguns grupos aliados, e fiquei feliz por não ser apenas um. A grande camada de poeira chegou até nós como uma grande tempestade de areia. Cobri o rosto, mas não diminui o ritmo das passadas.

-Não acredito que Blair fez essa estupidez - grunhiu Grendel. - Já era, essa poeira pertence aos dois. Blair e Neil também estão mortos.

A dor tornava-se pior à medida que mais de nossos amigos morriam. Quando avistei o corpo de Dandy caído e inerte, eu soube que também o havia perdido. Desejei que tudo aquilo terminasse logo e que mais ninguém morresse. Soren se interpôs em meu caminho quando tentei ir até Dandy. Eu queria ver o seu rosto, queria que soubesse que não estava sozinho, mas ele já estava morto. Meu amigo, aquele que sempre falava em enigmas e vestia roupas esquisitas. Morto.

-Deixe-o onde está Sora, agora aquilo é apenas uma carcaça, Dandy não está mais lá. Vamos tirar Lili daqui enquanto ainda podemos mantê-la viva - advertiu Soren.

Quando alcançamos o morro, aumentei as passadas. Meu coração batia descompassado em meu peito. Encontramos Lili completamente vestida com uma armadura de algum querubim. Ela correu para mim e nos unimos em um abraço. Sorri para mim mesma, pois sabia que aquela ideia vinha de Nero. Procurei por ele em meio aquela poeira grossa. Ele cambaleava para rás, totalmente desorientado. Gritei para que parasse, pois um imenso abismo o aguardava se desse mais alguns passos. Uma flecha estelar estava enfiada em sua coxa. Soren agarrou Lili para impedi-la de ir até ele. Mais um. Mais um morto. Ele logo explodiria. Como se desejasse a morte, um querubim agarrou-se a ele quando caíram juntos. Segurei Lili quando ela caiu. Seu sofrimento era maior do que o de todos nós.

-Já chega! Vocês precisam voltar para Statera! - guinchou Grendel. - Vão voltar agora mesmo!

Ele andou rapidamente até onde Nero estava há alguns minutos atrás e recolheu algo no chão.

-Aqui estão alguns cristais. Volte com Lili e Lieff Sora - ele me entregou a pequena bolsa. - Ficaremos bem por aqui, já ganhamos mesmo.

- Eu não quero ir...

- Você quer ficar e ver mais de seus amigos morrerem? - grunhiu. - A parte mais fácil acabou de passar, derrotamos o exército de Miguel, mas Shaya e Solária ficaram com a parte difícil.

- A parte fácil? Chama isso de fácil? Olha quantos morreram! - guinchei.

- A QUEDA TEM QUE SER INTERROMPIDA ANTES QUE ELE CHEGUE ATÉ STATERA! - um trovão ribombou pelo céu. - TALVEZ ELAS NÃO TENHAM CHANCES CONTRA ELE! TODOS NÓS PERDEMOS ALGUÉM HOJE, NÃO PRECISAMOS DE MAIS MORTES. VÁ PARA CASA AGORA!

- ESPERE! GRENDEL ESPERE! SAMUEL...! - eu precisava contar que o arcanjo impediria Miguel.

- Samuel? Quem é Samuel? - ele tomou a bolsa da minha mão e lançou os quatro cristais no ar, e eles abriram um portal negro. - Entre.

- ESPERE, É SÉRIO! - ele me olhou impaciente e já começava a ficar furioso de novo. - Ele me salvou e disse que vai impedir seu irmão, que é Miguel! Era aquele anjo, o que me entregou a você!

- Diados - ele murmurou para si mesmo. - O amigo dos homens retorna... SORA! ISSO É SÉRIO?

Pulei para trás com aquele surto repentino.

-Sim! Ele disse que eu não posso morrer...

- Sim, sim. Eu também já sei disso. Veja só, mais um motivo para você voltar para Statera. É ótimo saber que Samuel está conosco. Fico aliviado por Shaya, eu não suportaria perdê-la. Agora entre - ele acomodou Lieff dentro do portal e estendeu a mão para Lili. - Vá segura com seu irmão, ele não vai morrer por causa dessa perna.

- Mas... mas e Nero? Ele também tem que vir conosco - ela ainda soluçava, estava em algum estado de choque. - Chame ele para mim Grendel...

- Vamos lá Sora, ela não está bem, precisa sair daqui. Quando tudo por aqui estiver mais tranquilo, daremos notícias - ele me abraçou. - Você foi ótima.

- Obrigado Grendel, me desculpe por não conseguir proteger todo mundo - chorei. - Me desculpe...

- Sshhh. Vai ficar tudo bem. Quando chegar até Statera, leve Lieff para um hospital e cuide bem de Lili - me sentei entre os gêmeos e olhei para todos enquanto o portal começava a se fechar. - Até mais Sora Bloom, não se esqueça que você tem um gato em casa.

- Fique bem - disse Daniel.

Tudo ficou escuro e frio. Senti Lili se recostar em mim. As portas do grande hospital surgiram em nossa frente quando chegamos. Li foi atendido com pressa pela equipe médica. Aguardei com Lili na sala de espera. O reflexo do balcão metalizado mostrava o quanto meu cabelo estava horrível. As queimaduras me deixavam com uma aparência medonha. Recusei a ajuda de duas ou três enfermeiras que olhavam preocupadas para mim. Lili resolveu sofrer em silêncio. A perda de Nero também estava me afetando, mas ela não sofria apenas por ele. O estado do irmão também a deixava preocupada. Mesmo ele estando fora de risco. Segurei sua mão e a apertei. Queria que ela soubesse que eu estava ali para qualquer momento. Uma enfermeira baixinha apareceu para nos dizer que Li estava bem e que logo receberia alta.

-Isso é muito estranho! O corpo dele se recuperou muito bem em poucos minutos! - exclamou ela, com sua voz doce. - Querida, tem certeza de que não quer ajuda com essas queimaduras?

- Vá Sora, você tem que cuidar disso. Eu ficarei bem - disse Lili, com sua voz chorosa.

- Até parece que vocês saíram de uma guerra! - ela riu. - Vamos lá querida, eu a deixarei novinha em folha! - ela olhou desconfiada para Lili. - Lindinha, você não é filha de Amanda Lecter?

- Sou - disse Lili.

- Minha nossa! Onde está sua mãe? Ela precisa saber o que aconteceu com seu irmão! Imagine só, um acidente de carro justamente no solstício de inverno. Ela já não voltou de viagem?

Grizelda. Esse era o nome escrito no crachá dela.

-Não. Ela já sabe do ocorrido e está voltando logo - mentiu Lili, Amanda estava na Província do Leste e nada sabia, ainda estava sob o transe que Dandy havia lançado nela. - É melhor você cuidar logo de Sora.

- Oh! Tem razão. Ah, me desculpe! Não consigo controlar essa minha matraca! Vamos querida - ela me arrastou até uma sala confortável.

Meus longos cabelos já não me mantinham tão imponente. O que restou deles caíam até os ombros. Grizelda retirou de sua bolsa uma touca rosa que havia o símbolo dos Rolling Stones. Coloquei a touca para cobrir a metade do que ficou queimado. Agradeci pela enorme gentileza e voltei para Lili. Ela havia limpado a fuligem de seu rosto alvo. Notei que a armadura não viera com ela, e sim as roupas que vestia antes.

Li recebeu alta depois de dois dias. Sua recuperação foi extremamente rápida, o que me fez suspeitar da água que Samuel nos deu para beber. Logo chegamos em casa. Parecia que havia se passado séculos. Tudo permanecia como estava, e Haru continuava o mesmo gato peludo e gigante. Ele sabia caçar esquilos, então logo vi que minha ausência não o prejudicou em nada. Deitamos Lieff na cama. Como de costume, ele logo adormeceu. A ausência de notícias sobre a guerra estava me deixando agoniada. Odiei não sentir meu bolso esquentar, pois era assim que Grendel se comunicava comigo. Nenhum pedaço de pergaminho. Nada.

-Você vai deixar de me amar? - indagou Li certa manhã.

- É claro que não. Eu vou te amar para sempre - aninhei minha cabeça em seu peito. - Sua nova perna chegará amanhã, e tudo vai voltar a ser como antes.

Ele riu.

-Espero que essa seja tão útil como à outra.

- Será, tenho certeza - exclamei. - Já se passaram três dias, e nada de notícias de Tenebris.

Beijei seus lábios sedentos enquanto ele fazia carícias em meu corpo. Fomos interrompidos por uma batida leve na porta. Imediatamente fiquei nervosa, mas era apenas Lili. Desci para a sala para que ela pudesse falar particularmente comigo. Percebi sua inquietação. Ela andava de um lado para o outro até que resolveu se sentar. Sentei ao seu lado e fiquei em silêncio até que ela resolvesse falar. Ficamos assim durante quinze minutos.

-Sora eu... - ela me olhava aflita - eu tenho que contar algo para você... mas me sinto um pouco constrangida.

- Sabe que eu não vou rir de você, não vou te julgar e muito menos fingir estar indiferente - segurei suas mãos. - Me fale e acabe logo com essa sua angústia.

- Euestougrávida - ela falou rápido demais, típico de Lili quando ficava nervosa.

- Ah, eu não entendi o que você falou.

- Eu... eu estou grávida - ela baixou o olhar para as mãos. - E não quero...

- Você não quer o que? - ergui seu rosto e olhei muito séria para ela. - Você não quer o que?

- Você sabe o que eu não quero! - ela levantou e andou até a cozinha, estava fugindo de mim.

- Desculpa Lili, mas eu espero que o que eu estou pensando não seja o que você não quer - andei até ela. - Quer me dizer o que é?

- ELE ME DISSE QUE NÃO PODIA TER FILHOS, QUE ERA UMA CRIATURA ESTÉRIL! E AGORA EU ESTOU GRÁVIDA! EU NÃO QUERO CRIAR ISSO DENTRO DE MIM!

- Não fale isso Lili...

- EU O AMAVA DEMAIS SORA! E AGORA EU O ODEIO POR TER ME DEIXADO SOZINHA! NÃO QUERO ESSAS COISAS DENTRO DE MIM!

- CALA A DROGA DESSA BOCA! OLHA SÓ O QUE VOCÊ TÁ DIZENDO! ELE ESTÁ MORTO LILI! MORTO!

- Ah meu Deus... - ela começou a chorar descontroladamente. - Ah meu Deus...

- Me escute. Nero está dentro de você agora, ele deixou isso para você...

- ELE ERA UM VAMPIRO SORA! E SE ESSAS CRIANÇAS NASCEREM COM SEDE DE SANGUE? ISSO É ABOBINÁVEL! EU JURO QUE ELE NÃO PODIA TER FILHOS... ELE ME DISSE!

- SÉRA QUE VOCÊ PAROU PARA SE PERGUNTAR COMO ELE PODE TER FEITO ISSO? QUERO QUE SE LEMBRE, SUA IMBECÍL, QUE ELE TINHA UM COLAR MATERIALIZADOR...

- Aquele colar dos desejos?

- Sim, esse mesmo! Talvez ele quisesse apenas provar que podia ser importante na sua vida. Nero usava o colar da última vez que transaram?

Ele fez que sim com a cabeça.

-Sim, ele não quis tirar quando eu tentei...

-Ótimo. Agora sabe que ele não mentiu. Ele dizia a verdade quando disse que não podia ter filhos. Foi alguma coisa que você disse que o fez desejar aquilo. Conheço você Lili, o que disse para ele?

- Ah Sora, eu estava zangada quando disse que não podia levar adiante uma vida com um homem que não pudesse ter filhos... a culpa é toda minha.

- Ninguém tem culpa de nada, isso foi apenas consequência. Lili, eu sou casada com seu irmão. Agora somos uma família quase completa. Eu adoraria ser titia.

Ela soltou uma risada entre as lágrimas.

-Viu só? Você está feliz por isso, e vai ficar mais feliz quando tiver seu filho e lembrar da besteira que pensou em fazer hoje...

- Filho? - ela voltou a rir. - A nanica Ishtar me disse que são gêmeos, dois garotinhos.

- Ah Lili, estou tão feliz por isso! E eu sei que você também está. Olhe só! Está até corando! - a abracei com força enquanto não pude evitar me emocionar. - Me prometa que não vai abortar, por favor não faça isso. Me prometa.

- Mas e se...

- Sem essa de mas. Por favor, me prometa.

- Por você e por Nero, eu prometo. Eu prometo que vou amá-los mais do que já amo agora.

- Sora? Lili? Está tudo bem ai em baixo? Eu ouvi vocês gritarem e fiquei preocupado... vocês sabem que eu sou um perneta agora, não posso ir até ai!

Rimos do protesto de Li. Agarrei Lili pelo braço e nos dirigimos até o quarto.

-Vamos lá, o tio Li vai adorar saber de tudo isso.



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